[MODELO] Contestação à Ação de Anulação de Penalidade – Competência do Estado para processo administrativo
Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da 5ª Vara Cível de Coquinhos
Processo nº 00/00000000
Autor: Fulano de Tal
Réu: Município de Coquinhos
Município de Coquinhos, pessoa jurídica de direito público, com sede na Praça Coronel Pedro Osório, n°101, por meio de seu procurador abaixo firmatário, vem respeitosamente perante V. Exa., na forma do art. 188 CPC, apresentar contestação à Ação Anulatória de Penalidade, ajuizada por Fulano de Tal , já qualificado no feito em epígrafe, pelos seguintes fatos e fundamentos jurídicos:
Resumo da Lide
1) O autor ajuizou a presente ação visando anular o processo administrativo que foi originado no auto de infração nº 013226A, lavrado pelo fato do autor trafegar sem placa de indentificação, infringindo o art. 230, IV do Código de Trânsito Brasileiro.
2) Alega nulidade do processo administrativo por falta de notificação da infração e cerceamento de defesa.
Das Razões do Município
Preliminarmente
Da Ilegitimidade passiva
De fato, o Município lavrou o ato de infração.
Contudo, a competência para o processo do julgamento da infração de trânsito é do Estado do Rio Grande do Sul, nos termos da Resolução/CONTRAN (Conselho Nacional de Trânsito) nº 66/98, que distribui a competência dos órgãos executivos de trânsito, onde lê-se em seu art. 1º: “Fica instituída a tabela de distribuição de competência, fiscalização de trânsito, aplicação das medidas administrativas, penalidades cabíveis e arrecadação de multas aplicadas, conforme anexo desta resolução.
A infração em que o autor está incurso, como mencionado, é a do art. 230, IV: “conduzir o veículo sem qualquer uma das placas de identificação”, cuja competência para aplicação das medidas administrativas, penalidades cabíveis e arrecadação é da competência do Estado, conforme o campo nº 658-0, da Resolução/CONTRAN nº 66/98, em anexo.
Portanto, falece ao Município competência para responder à presente, visto que há expressa previsão legal atribuindo competência ao Estado do Rio Grande do Sul processar as medidas administrativas decorrente do auto de infração lavrado contra o autor.
Anote-se, ainda, que o simples fato do Município ter lavrado o auto de infração não tem o condão de transferir a competência da infração para sua esfera, eis que o ato administrativo da municipalidade limitou-se a lavrar o auto, que o fez por força do convênio firmado com o Estado do Rio Grande do Sul para fins de fiscalizar o trânsito.
Da legalidade do procedimento administrativo
3) Ab initio, cumpre esclarecer que o agente de trânsito, na sua atividade de exercer o poder de fiscalização do trânsito, limita-se a lavratura do auto de infração quando se depara com uma situação em que alguém comete flagrante de desrespeito a legislação de trânsito.
Obviamente que é absolutamente impossível, pelas circunstâncias do momento da autuação, que se exija a instauração de procedimento de “defesa prévia”, visto que tratam-se de situações de emergência, que colocam em risco a segurança das pessoas e a eficiência dos meios de transporte, exigindo ação pronta e enérgica por parte do Poder Público.
4) Depois de lavrado o auto de infração pelo agente de trânsito, que não julga nem aplica penalidade, é deferido o prazo de 30 dias ao autuado a apresentar recurso à Junta Administrativa de Infração de Trânsito- JARI, nos termos do art. 282 do CTB:
“Aplicada a penalidade, será expedida notificação ao proprietário do veículo ou ao infrator, por remessa postal ou por qualquer outro meio tecnológico hábil que assegure a ciência da imposição da penalidade. § 1° (…); § 2° (…); § 3° (…)
§ 4° Da notificação deverá constar a data do término do prazo para apresentação do recurso pelo responsável pela infração, que não será inferior a 30 dias, contados da data da notificação da penalidade.”
Anote-se que a JARI possui prazo de 30 dias para julgar o recurso, em caso contrário, o recurso terá efeito suspensivo (art. 285, § 3° do CTB).
Quando o art. 282 do CTB declara que “aplicada a penalidade, será expedida notificação ao proprietário do veículo ou ao infrator…” deve ser interpretado como sendo “da lavratura do auto de infração, será expedida notificação ao proprietário do veículo ou ao infrator…” porquanto a interpretação literal estaria, de fato, levando a entender que o autuado seria penalizado sem a produção de defesa, contudo é regra evidente que o aplicador da lei deve interpretá-la de forma que leve a um significado harmonizando o sentido com outras normas, dentre elas, a própria Constituição Federal que assegura o direito de defesa.
Não é outro o entendimento de Arnaldo Rizzardo, em Comentários ao Código de Trânsito Brasileiro, 3° Edição, Editora Revista dos Tribunais, pág. 621, …”o direito de defesa não é subtraído. Exerce-se perante as JARIs, que , na prática, funcionam como instância originária, tanto que, nelas, permite-se o exercício pleno de defesa, inclusive a produção de prova. Embora integre a sua composição mais de um julgador, mantém o caráter de defesa originária. Não concordando a pessoa com a homologação do auto de infração, faculta-se o recurso para a JARI. Todavia, o sentido de recurso, pela maneira como se desenvolve no processo, compreende a apreciação das razões da parte e das provas. O recurso propriamente dito é para o CETRAN (quando de penalidade imposta por órgão de trânsito municipal ou estadual ou municipal), ou para um Colegiado especial (nos casos de penalidade imposta pelo órgão ou entidade de trânsito da União), ou para o CONTRAM (se a penalidade consistir em suspensão do direito de dirigir por mais de seis meses, ou cassação da habilitação, ou pela aplicação de penalidade por infrações gravíssimas, se aplicadas por órgão ou entidade de trânsito da União).
Após transcrever o art. 5°, LV,da CF, segundo o qual “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”, Maria José Schmitt Sant´Anna interpreta o significado de defesa prévia: “Quando o constituinte previu o princípio político-constitucional democrático, pré-condicionou os os princípios jurídicos-constitucionais de inscreverem a necessidade de previsão de uma instância recursal, o que veio configurado no inciso supracitado, quando este criou o recurso, e não poderia ser diferente. Deste modo, o que a Constituição requer, para atendimento ao princípio democrático estabelecido, é que não recaia em apenas um agente (pessoa) ou órgão (instância única) o poder de decisão de um processo ou uma lide.”
Mais adiante: “O Código de Trânsito Brasileiro assegura a defesa do infrator com direito a um recurso desta decisão – arts. 285 e 288 – ,atendendo, assim, à ampla defesa defesa e ao devido processo legal administrativo (formal). Interpretar-se que por ocasião do exame do auto de infração -art. 281 – é necessária defesa do infrator pelo simples uso da palavra julgará acarretará na criação, pelo Poder Judiciário, que não tem tal atribuição legislativa, de mais um recurso do infrator, sem a devida previsão legal. Quer dizer, na via administrativa, quando se tratar de infração de trânsito, adotando-se a interpretação de que a aplicação do art. 281 é julgamento (solução de uma lide), com direito à defesa, teremos, então, duas oportunidades de defesa – arts. 281 e 285 – e um recurso – art. 288. Salienta-se que na esfera judicial há somente uma possibilidade de defesa e de recurso e, depois, apenas não cabíveis os recursos especial e extraordinário…Também quanto ao uso da palavra recurso no art. 285 do CTB, há igual impropriedade, pois, na verdade, trata-se de defesa do infrator. O recurso propriamente dito é o previsto no art. 288 (…).”
Sinale-se que no julgamento, será o auto de infração declarado subsistente ou insubsistente, quando finalmente será aplicada a multa, conforme o art. 281, caput, do CTB:
“A autoridade de trânsito, na esfera da competência estabelecida neste Código e dentro de sua circunscrição, julgará a consistência do auto de infração e aplicará a penalidade cabível.”
5) Improcede, portanto, a alegação de que não há observância ao do direito ao contraditório ou ampla defesa assegurados na Carta da República. Anote-se que a Constituição prevê direito à ampla defesa aos litigantes nos processos judiciais e administrativos. Não obriga à defesa prévia, e sim produção de ampla defesa estatuída nas várias leis ordinárias que compõem o ordenamento jurídico pátrio.
Apenas por argumento, se a “defesa prévia” fosse exigida em todos os procedimentos judiciais e administrativos, institutos processuais que visam tutelar situações de perigo e o fumus bonis juris como antecipação de tutela e liminares sem ouvida da parte seriam eivados de inconstitucionalidade. Ainda existem processos judiciais que sequer admitem ampla defesa, no caso do processo de execução, onde o devedor da obrigação só poderá produzir defesa após penhorar seus bens, e nem por isso alega-se inconstitucionalidade do processo de execução.
6) Aduziu o Autor que é ilegal a notificação de infração de trânsito c/c notificação da penalidade aplicada sem observar-se a defesa prévia, ampla defesa e o contraditório.
Em verdade, o autuado é notificado do auto de infração (e não da infração cometida), justamente com o escopo de produzir defesa administrativa, visto que se um cidadão está sendo imputado alguma infração administrativa, justo e jurídico que se dê conhecimento da infração imputada, bem como a multa a que está sujeito. Inclusive, o pagamento da multa não é pré-requisito para produzir recurso na esfera administrativa.
Neste sentido, a jurisprudência:
Ementa: Direito Público não Especificado. Infração de Trânsito. Desconstituição da Multa. O julgamento da consistência do auto de infração, preconizado no art. 281 da Lei 9503/97, relacionado com os aspectos formais do ato, não reclama o direito de prévia defesa com os aspectos formais do ato, não reclama o direito de prévia defesa e do contraditório, no rito próprio da Lei de Trânsito. Direito de defesa sob a denominação de recurso, exercido a partir da notificação, independente do pagamento da multa, cujo vencimento visa a permitir o pagamento com o benefício da antecipação. Pressupostos a tutela antecipada não presentes. Agravo improvido. (AI n° 70003000874, 3° Câmara Cível, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.
Isto posto, requer a extinção do feito sem o julgamento do mérito, se a preliminar não prosperar, a improcedência do pedido, condenando o autor nas custas, despesas processuais e honorários advocatícios.
Coquinhos, 27 de março de 2007.