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[MODELO] Apelação Criminal – Falsificação de Passaporte – Inexigibilidade de Conduta Diversa

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO – 3ª TURMA

APELAÇÃO CRIMINAL nº 2000.02.01.0200000031-000

APELANTE: JUSTIÇA PÚBLICA

APELADO: SANDRA MARIA DE OLIVEIRA

RELATOR: DES. FEDERAL PAULO BARATA

Egrégia Turma

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ofereceu denúncia contra SANDRA MARIA DE OLIVEIRA como incursa nas penas do art. 304 do Código Penal, pelas seguintes razões:

“1) Em 27/04/0005, a ora denunciada fez uso efetivo do passaporte brasileiro nº CG3000420007, pertencente a Sueli Conceição Corrêa Ferreira quando, nas dependências do Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro, embarcou no vôo 00000 United com destino a Miami/EUA.

2) Ao chegar em seu destino as autoridades norte-americanas verificaram indícios de fraude no referido passaporte, tendo sido a denunciada devidamente deportada.

3) O depoimento de fls. 06 comprova que a denunciada fez uso de modo livre e consciente de passaporte que sabia ser de procedência ilegal, estando inclusive emitido em nome de outra pessoa, além de reconhecer ter pago R$ 3.000,00 (três mil reais) pelo documento público eivado de falsidade.

4) A falsidade do passaporte utilizado pela denunciada resta materializada pelo Laudo de Exame Documentoscópio às fls. 20-21, que aponta a existência dos seguintes vestígios de adulteração: “troca de fotografia”.

5) A autoria deflui da própria conduta da acusada em vista da mesma necessitar de um visto consular em um passaporte para concretizar seu desejo de passear nos EUA (declarações da acusada às fls. 06, verso).

6) Ante ao exposto incidiu a denunciada nas penas do Art. 304 na forma do Art. 20007.”

Frustrada a intimação pessoal (fls. 102, vº), foi a ré citada por edital, não comparecendo, apesar disso, à audiência designada para 04/08/2012. Decretou-se, por este motivo, sua revelia às fls. 125.

A sentença de fls. 157/161 julgou improcedente a pretensão punitiva para ABSOLVER SANDRA MARIA DE OLIVEIRA, com fundamento no art. 386, V do Código de Processo Penal, porque, embora configuradas na espécie a tipicidade e a ilicitude da conduta, diante do caráter episódico da infração, das condições pessoais da acusada e das circunstâncias em que ocorreu o delito, não lhe era exigível conduta diversa, ausente, por este motivo, a culpabilidade.

. Às fls. 163/16000, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL interpôs recurso de apelação, a argumentar que

“Em que pesem os sólidos fundamentos expedidos pelo d. magistro a quo, entende este órgão ministerial que, no caso em análise, inexistem elementos fáticos-jurídicos aptos a fundamentar uma decisão absolutória com base na chamada inexigibilidade de conduta diversa da ré, a qual quedou-se inerte quanto a efetiva comprovação dessa causa de exclusão de culpabilidade, de aplicação restrita e vinculada à comprovação pela defesa dessa situação extrema que levou o réu a praticar um fato típico e ilícito, porém não culpável.”

É o relatório.

A decisão reconheceu a inexigibilidade de conduta diversa, causa supralegal de exclusão da culpabilidade, diante das dificuldades financeiras enfrentadas por SANDRA.

A ré, que não registrava qualquer antecedente criminal (fls. 74), deixou o país em busca de melhores condições de vida e de trabalho, já que, havendo estudado somente até a 6ª série, sua sobrevivência na cidade de Conselheiro Pena-MG dependia da atividade de vendedora de roupas, de casa em casa, a que se dedicava (fls. 0000).

Tem-se, portanto, que, apesar de típica e antijurídica sua conduta, as circunstâncias que envolveram a prática do crime estão de fato a demonstrar a desnecessidade e, até mesmo, a injustiça da punição que lhe viesse a ser imposta.

Segundo DAMÁSIO E. DE JESUS,

“Por mais previdente que seja o legislador, não pode prever todos os casos em que a inexigibilidade de outra conduta deve excluir a culpabilidade. Assim, é possível a existência de um fato, não previsto pelo legislador como causa de exclusão da culpabilidade, que apresente todos os requisitos do princípio da não-exigibilidade de comportamento lícito. Em face de um caso concreto, seria condenar-se o sujeito unicamente porque o fato não foi previsto pelo legislador? Se a conduta não é culpável, por ser inexigível outra, a punição seria injusta, pois não há pena sem culpa. Daí ser possível a adoção da teoria da inexigibilidade como causa supralegal de exclusão da culpabilidade”.[1]

Acertado, em conseqüência, o entendimento que norteou a sentença de primeiro grau, no sentido de que

“No caso em tela, tudo leva a crer que a ré optou por arriscar a empreitada que, caso bem sucedida, poderia resultar na sua permanência no “paraíso capitalista”, onde poderia trabalhar, em busca de melhores condições, tais como segurança econômica, pessoal, jurídica, etc. (fls. 0000).

Por outro lado, conta a seu favor a FAC imaculada de fls. 50, que só faz demonstrar na prática a subsistência das razões de direito expostas nesta sentença.

Portanto, resta óbvio que SANDRA MARIA DE OLIVEIRA é mais uma daquelas que buscam deixar o país com vistas ao “sonho americano’ de dias melhores, e que acaba detida, deportada, processada e perdendo os valores que pagou pela malfadada viagem.

A própria sorte já se encarregou de puní-la.”

Nesse mesmo sentido, a orientação desse Egrégio Tribunal Regional Federal da 2ª Região:

CRIMINAL – DENUNCIA – FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO – ART. 304 DO CP – DESCARACTERIZAÇÃO DO DOLO.

I – A aposição de uma fotografia no lugar de outra, com o objetivo de iludir as autoridades alfandegárias, não configura a conduta descrita no art. 304 do Código Penal.

II – Também o art. 20007 do Código Penal não foi feito para mandar para prisão (com reclusão de dois a seis anos), um jovem, que, em busca de emprego no exterior (EUA) tenha feito inserir a sua fotografia num passaporte que não era seu, no que nem chegou a alcançar o seu objetivo. Sendo "in continenti" deportado para o Brasil.

III – Deve o juiz distinguir um homem de bem de um verdadeiro marginal, e, em conseqüência, os comportamentos criminosos dos comportamentos impensados e passageiros, configuradores de meros "desvios de conduta".

IV – Sentença absolvitória mantida.

(TRF – 2ª Região – Decisão de 18-06-10000007 – ACR 0006.231347-1/RJ – Relator: JUIZ CARREIRA ALVIM)

I – Penal – Uso de passaporte falso para entrada nos Estados Unidos – Art. 304 do Código Penal – Absolvição

– O uso de documento falso com o objetivo de sair do país para tentar a vida em terras estrangeiras não legitima um decreto condenatório, ainda que na pena mínima e com sursis

– Trata-se de pessoas que se encontram, eventualmente, na chamada "delinqüência ocasional", muitas vezes sem consciência da natureza ilícita de sua conduta, e, por estas razões, não devem ser punidas

– O que o acusado sofre antes da deportação, através das conhecidas, humilhantes e constrangedoras entrevistas e averiguações procedidas pelo Departamento de Imigração norte-americano, já representa verdadeira punição

– Impõe-se, assim, a absolvição do acusado.

II – Apelação provida. Sentença reformada no concernente à apenação do acusado André Luiz Nunes dos Santos, para absolvê-lo da imputação que lhe foi imposta.

(TRF – 2ª Região – Decisão de 17-06-10000008 – ACR 0008.203303-0/RJ – Relator: JUIZ FREDERICO GUEIROS)

Do exposto, o parecer é no sentido do não provimento do recurso.

Rio de Janeiro, 23 de junho de 2000.

JOSÉ HOMERO DE ANDRADE

Procurador Regional da República

Acrim52 – isdaf

  1. Damásio E. de Jesus in Direito Penal, 1º vol., pág. 423, Ed. Saraiva

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