(art. 599 ao art. 609 do Novo CPC)
Art. 599. A ação de dissolução parcial de sociedade pode ter por objeto:
I – a resolução da sociedade empresária contratual ou simples em relação ao sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso; e
II – a apuração dos haveres do sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso; ou
III – somente a resolução ou a apuração de haveres.
§1º A petição inicial será necessariamente instruída com o contrato social consolidado.
§2º A ação de dissolução parcial de sociedade pode ter também por objeto a sociedade anônima de capital fechado quando demonstrado, por acionista ou acionistas que representem cinco por cento ou mais do capital social, que não pode preencher o seu fim.
Comentário do artigo 599
O procedimento especial para dissolução parcial de sociedade, introduzido pelo CPC/15, representa uma inovação importante. Embora a Comissão de Juristas que elaborou o anteprojeto buscasse reduzir os procedimentos especiais em favor do procedimento comum, essa inclusão foi considerada muito positiva, pois preencheu uma lacuna legislativa que existia até então.
A ideia de dissolução parcial de sociedade foi desenvolvida ao longo das últimas décadas, principalmente pela doutrina e jurisprudência. Um estudo pioneiro nesse tema foi conduzido por Fábio Ulhoa Coelho (A ação de dissolução parcial de sociedade. Revista de Informação Legislativa. Brasília. Ano 48. n. 190. t.1. Abr./jun. 2011). Até a entrada em vigor do Código Civil de 2002, que trouxe o Art. 1.028, a legislação apenas tratava da dissolução total de sociedades. O CC/02 passou a regulamentar a “resolução da sociedade em relação a um sócio”, permitindo a preservação da empresa ao mesmo tempo que um sócio pode se desligar sem dissolver a sociedade como um todo.
Com o avanço do princípio da preservação da empresa e da função social da mesma, surgiu a necessidade de regulamentar a dissolução parcial de sociedades. Isso permitiu que a sociedade continuasse existindo mesmo com a saída de um sócio. No entanto, como a dissolução parcial estava apenas prevista no Código Civil, surgiam muitas discussões sobre o procedimento adequado para sua implementação. O CPC/15 resolveu essa questão ao optar por um procedimento especial, reconhecendo a complexidade das relações materiais envolvidas, que passam por duas fases: a desconstituição do vínculo societário e, posteriormente, a apuração e satisfação dos haveres do sócio desligado.
A segunda fase, referente à apuração de haveres, é um processo técnico que visa determinar o valor patrimonial do sócio desligado em relação à sociedade, conforme descrito por Hernani Estrella (Apuração de haveres de sócio. Rio de Janeiro: Forense, 2010). Essa etapa, por sua natureza, justifica a especialidade do procedimento adotado pelo novo CPC. O Art. 599 do CPC/15 também esclarece que a ação de dissolução parcial pode incluir tanto a desconstituição do vínculo quanto a apuração de haveres, ou apenas uma dessas demandas, dependendo do conflito específico entre os sócios.
Além disso, o legislador ampliou o conceito de “dissolução parcial” para abranger todas as formas de saída de um sócio de uma sociedade, sem dissolver a entidade em si. Isso inclui o direito de retirada, exclusão promovida pelos demais sócios, e a saída em razão de falecimento. Embora a dissolução parcial tenha sido restrita às sociedades contratuais, o CPC/15 permite sua aplicação em companhias fechadas, especialmente em sociedades anônimas familiares, algo já reconhecido pela jurisprudência do STJ.
Art. 600. A ação pode ser proposta:
I – pelo espólio do sócio falecido, quando a totalidade dos sucessores não ingressar na sociedade;
II – pelos sucessores, após concluída a partilha do sócio falecido;
III – pela sociedade, se os sócios sobreviventes não admitirem o ingresso do espólio ou dos sucessores do falecido na sociedade, quando esse direito decorrer do contrato social;
IV – pelo sócio que exerceu o direito de retirada ou recesso, se não tiver sido providenciada, pelos demais sócios, a alteração contratual consensual formalizando o desligamento, depois de transcorridos 10 (dez) dias do exercício do direito;
V – pela sociedade, nos casos em que a lei não autoriza a exclusão extrajudicial; ou
VI – pelo sócio excluído.
Parágrafo único. O cônjuge ou companheiro do sócio cujo casamento, união estável ou convivência terminou poderá requerer a apuração de seus haveres na sociedade, que serão pagos à conta da quota social titulada por este sócio.
Art. 601. Os sócios e a sociedade serão citados para, no prazo de 15 (quinze) dias, concordar com o pedido ou apresentar contestação.
Parágrafo único. A sociedade não será citada se todos os seus sócios o forem, mas ficará sujeita aos efeitos da decisão e à coisa julgada.
Art. 602. A sociedade poderá formular pedido de indenização compensável com o valor dos haveres a apurar.
Art. 603. Havendo manifestação expressa e unânime pela concordância da dissolução, o juiz a decretará, passando-se imediatamente à fase de liquidação.
§1º Na hipótese prevista no caput, não haverá condenação em honorários advocatícios de nenhuma das partes, e as custas serão rateadas segundo a participação das partes no capital social.
§2º Havendo contestação, observar-se-á o procedimento comum, mas a liquidação da sentença seguirá o disposto neste Capítulo.
Art. 604. Para apuração dos haveres, o juiz:
I – fixará a data da resolução da sociedade;
II – definirá o critério de apuração dos haveres à vista do disposto no contrato social; e
III – nomeará o perito.
§1º O juiz determinará à sociedade ou aos sócios que nela permanecerem que depositem em juízo a parte incontroversa dos haveres devidos.
§2º O depósito poderá ser, desde logo, levantando pelo ex-sócio, pelo espólio ou pelos sucessores.
§3º Se o contrato social estabelecer o pagamento dos haveres, será observado o que nele se dispôs no depósito judicial da parte incontroversa.
Art. 605. A data da resolução da sociedade será:
I – no caso de falecimento do sócio, a do óbito;
II – na retirada imotivada, o sexagésimo dia seguinte ao do recebimento, pela sociedade, da notificação do sócio retirante;
III – no recesso, o dia do recebimento, pela sociedade, da notificação do sócio dissidente;
IV – na retirada por justa causa de sociedade por prazo determinado e na exclusão judicial de sócio, a do trânsito em julgado da decisão que dissolver a sociedade; e
V – na exclusão extrajudicial, a data da assembleia ou da reunião de sócios que a tiver deliberado.
Art. 606. Em caso de omissão do contrato social, o juiz definirá, como critério de apuração de haveres, o valor patrimonial apurado em balanço de determinação, tomando-se por referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual forma.
Parágrafo único. Em todos os casos em que seja necessária a realização de perícia, a nomeação do perito recairá preferencialmente sobre especialista em avaliação de sociedades.
Art. 607. A data da resolução e o critério de apuração de haveres podem ser revistos pelo juiz, a pedido da parte, a qualquer tempo antes do início da perícia.
Art. 608. Até a data da resolução, integram o valor devido ao ex-sócio, ao espólio ou aos sucessores a participação nos lucros ou os juros sobre o capital próprio declarados pela sociedade e, se for o caso, a remuneração como administrador.
Parágrafo único. Após a data da resolução, o ex-sócio, o espólio ou os sucessores terão direito apenas à correção monetária dos valores apurados e aos juros contratuais ou legais.
Art. 609. Uma vez apurados, os haveres do sócio retirante serão pagos conforme disciplinar o contrato social e, no silêncio deste, nos termos do § 2º do art. 1.031 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil).
Comentários dos artigos 600 a 609
O procedimento especial para dissolução parcial de sociedade, introduzido pelo CPC/15, trouxe importantes inovações. Mesmo indo contra a tendência original de simplificar o processo, essa inclusão foi vista como necessária, preenchendo uma lacuna legislativa existente.
A dissolução parcial de sociedade começou a ser desenvolvida pela doutrina e jurisprudência ao longo dos anos, com um estudo importante de Fábio Ulhoa Coelho (A ação de dissolução parcial de sociedade. Revista de Informação Legislativa. Brasília. Ano 48. n. 190. t.1. Abr./jun. 2011). Até a chegada do Código Civil de 2002, que regula a resolução da sociedade em relação a um sócio no artigo 1.028, a legislação apenas tratava da dissolução total de sociedades. A valorização da função social da empresa e o princípio da preservação da empresa trouxeram novos institutos, como a dissolução parcial, que permite o desligamento de um sócio sem encerrar a sociedade.
Antes do CPC/15, existiam dúvidas sobre o procedimento a ser seguido para a dissolução parcial. A nova legislação esclareceu que a complexidade desse tipo de ação justificava um procedimento especial, já que envolve a desconstituição do vínculo societário e a apuração dos haveres do sócio desligado. A apuração de haveres, conforme descrita por Hernani Estrella (Apuração de haveres de sócio. Rio de Janeiro: Forense, 2010), é o processo que revela a situação patrimonial de um sócio no momento de sua saída. O CPC/15, no artigo 599, também estabelece que a ação de dissolução parcial pode envolver tanto a desconstituição do vínculo quanto a apuração de haveres, ou apenas um desses aspectos, dependendo da situação.
O CPC/15 ampliou o conceito de “dissolução parcial” para abranger diferentes formas de saída de sócio, como direito de retirada, exclusão promovida pelos demais sócios ou falecimento. No entanto, o legislador limitou sua aplicação às sociedades contratuais, permitindo a dissolução parcial em companhias fechadas apenas em situações específicas, como já era reconhecido pela jurisprudência, especialmente no caso de sociedades anônimas familiares.
Questões importantes também foram abordadas quanto à legitimidade ativa e passiva. O artigo 600 deixou claro que a legitimidade ativa é reservada aos sócios ou à sociedade, com algumas exceções para sucessores, espólio, ex-cônjuge ou ex-companheiro. Em relação à legitimidade passiva, o artigo 601 estabelece que todos os sócios e a sociedade devem ser citados, exceto se todos os sócios forem citados, dispensando a citação da sociedade. Contudo, essa regra é criticada, pois a sociedade é a responsável pelo pagamento dos haveres, e não os sócios individualmente.
O artigo 602 introduz a possibilidade de a sociedade formular pedido de indenização em sede de defesa, o que pode ser compensado com o valor dos haveres a serem apurados, especialmente nos casos de exclusão de sócio por falta grave. Já o artigo 603 elimina a condenação em honorários advocatícios quando a parte demandada concorda com a dissolução do vínculo, agilizando o processo de apuração de haveres.
Outra inovação importante é trazida pelo artigo 604, que exige que o juiz estabeleça elementos essenciais para a apuração de haveres, como a data de resolução da sociedade e o critério de apuração. O artigo 606 determina que a apuração será feita com base no valor patrimonial real da cota do sócio, salvo se houver outro critério no contrato social. Isso busca evitar que os cálculos sejam baseados apenas no valor contábil, já que isso pode subestimar o valor real da participação do sócio.
Além disso, o artigo 606, parágrafo único, estabelece que o perito encarregado da avaliação deve ser preferencialmente um especialista em avaliação de sociedades, garantindo a precisão no cálculo dos haveres. Os haveres incontroversos devem ser depositados e podem ser levantados imediatamente, conforme previsto no artigo 604, evitando o uso da dissolução parcial para adiar o pagamento.
O artigo 609, por sua vez, regula o pagamento dos haveres, que deve seguir o contrato social, e na ausência de disposição, o valor será pago em dinheiro dentro de 90 dias após a liquidação. Até a data da resolução da sociedade, o sócio mantém todos os seus direitos, incluindo participação nos lucros e recebimento de pró-labore, se for administrador. Após a resolução, o sócio perde esses direitos, e os valores devidos passam a ser corrigidos monetariamente e acrescidos de juros.
Essas disposições refletem um esforço para trazer maior clareza e eficiência ao processo de dissolução parcial de sociedade, ao mesmo tempo em que respeitam os direitos e deveres de todos os envolvidos.