CAPÍTULO IV – DO INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

Capítulo IV – Do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica (art. 133 ao art. 137 do Novo CPC)

Art. 133. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica pode ser instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, quando este tiver legitimidade para intervir no processo.

§ 1º O pedido de desconsideração da personalidade jurídica deve seguir os requisitos legais estabelecidos. § 2º As disposições deste Capítulo aplicam-se igualmente à hipótese de desconsideração inversa da personalidade jurídica.

Art. 134. O incidente de desconsideração pode ser instaurado em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução baseada em título executivo extrajudicial.

§ 1º A instauração do incidente deve ser comunicada imediatamente ao distribuidor para as devidas anotações. § 2º Não é necessária a instauração do incidente se o pedido de desconsideração da personalidade jurídica for feito na petição inicial, caso em que o sócio ou a pessoa jurídica será citado. § 3º A instauração do incidente suspende o processo, exceto na hipótese prevista no § 2º. § 4º O requerimento deve demonstrar que os pressupostos legais para a desconsideração da personalidade jurídica estão presentes.

Art. 135. Instaurado o incidente, o sócio ou a pessoa jurídica será citado para apresentar sua manifestação e requerer provas no prazo de 15 (quinze) dias.

Art. 136. Após a conclusão da instrução, caso seja necessária, o incidente será decidido por meio de decisão interlocutória.

Parágrafo único. Se a decisão for proferida pelo relator, cabe recurso de agravo interno.

Art. 137. Se o pedido de desconsideração for aceito, a alienação ou oneração de bens realizada em fraude de execução será considerada ineficaz em relação ao requerente.

Comentário dos artigos 133 a 137

 

A desconsideração da personalidade jurídica, prevista tanto no Código de Defesa do Consumidor (art. 28) quanto no Código Civil (art. 50), permite que as obrigações de uma sociedade sejam transferidas para o patrimônio pessoal dos sócios quando houver abuso na utilização da pessoa jurídica, como em casos de desvio de finalidade, confusão patrimonial ou liquidação irregular. Além disso, o instituto também abrange a desconsideração inversa, que imputa à sociedade o cumprimento de obrigações pessoais dos sócios.

O Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015) regula a desconsideração da personalidade jurídica em termos processuais, conforme disposto no art. 133, § 1º, abordando o tema como um incidente no capítulo destinado à intervenção de terceiros.

Ao contrário de procedimentos processados em autos apartados, como ocorria comumente no CPC/1973, o CPC/2015 adota a tramitação dentro do próprio processo principal, exceto se o juiz entender que a organização do incidente ou a separação dos pedidos justifica uma autuação em separado. Isso é especialmente útil quando há pedidos cumulados que não se relacionam diretamente ao incidente de desconsideração.

A suspensão do processo, prevista no art. 134, § 3º, geralmente faz sentido nos casos em que a desconsideração é necessária para avançar com atos como a penhora, durante a fase de cumprimento de sentença ou execução. Quando não há patrimônio penhorável, a decisão sobre o incidente se torna uma condição essencial para o prosseguimento da execução, e, sem essa decisão, o processo deve ser suspenso.

No entanto, a desconsideração pode ocorrer em outras situações. Assim, seguindo o princípio da celeridade processual, a suspensão só deve ocorrer quando o incidente for imprescindível para a continuação do processo. Fora dessas circunstâncias, o processo principal pode prosseguir sem interrupção. Nessa lógica, a autuação em separado pode ser uma alternativa eficiente para garantir a agilidade e a organização do procedimento.

Em relação à suspensão mencionada no § 3º do art. 134, a referência ao § 2º não indica que o simples fato de o incidente estar na petição inicial seja suficiente para determinar a suspensão. O § 2º trata de casos mais raros em que a desconsideração faz parte do litígio principal, como em ações que envolvem bens desviados para o nome do sócio ou da sociedade.

O legislador optou por dispensar uma ação autônoma para a desconsideração, incorporando o incidente ao próprio processo. Isso reafirma o caráter sumário do debate, com menor foco na coleta de provas e prazos extensos, garantindo uma tramitação mais rápida. Embora não haja uma limitação explícita na lei quanto aos tipos de provas ou prazos, o tratamento da questão deve ser mais resumido, semelhante ao da exceção de pré-executividade. Caso necessário, a decisão final pode ser submetida a revisão posterior, por meio de ação própria.

Existe uma corrente doutrinária que discorda dessa visão, argumentando que não deve haver restrição na produção de provas e que a decisão sobre a desconsideração deve ter os mesmos efeitos de uma sentença que transita em julgado, conforme sugerem autores como Tereza Arruda Alvim Wambier e outros, em “Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil”.

Se a desconsideração estiver relacionada a uma fraude à execução, a declaração da fraude e a ineficácia dos atos de desvio patrimonial ainda dependem da instauração do incidente (art. 792, § 3º). Caso o incidente não seja proposto, o prejudicado poderá recorrer a embargos de terceiro (art. 674, § 2º, III).

A citação dos sócios ou da pessoa jurídica segue as formalidades legais previstas nos artigos 238 a 259, e o incidente deve ser registrado na distribuição (art. 134, § 1º). Dependendo do tipo de incidente, pode ser necessário o registro da sua existência, como nos casos de desconsideração em execução pecuniária (art. 828) ou em demandas reais ou reipersecutórias (Lei 6.216/75, art. 167, I, n. 21). Tais registros são importantes para prevenir a alienação de bens pelo terceiro, conforme o art. 137.

Se o incidente for acolhido, o sócio ou a pessoa jurídica será tratado como parte no processo, assumindo a condição de litisconsorte, inclusive nas fases de execução.

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