Capítulo I – Disposições Gerais (art. 236 e art. 237 do Novo CPC)
Art. 236. Os atos processuais serão realizados mediante ordem judicial.
§ 1º Será expedida carta para a prática de atos fora dos limites territoriais do tribunal, da comarca, da seção ou da subseção judiciárias, salvo nos casos previstos em lei.
§ 2º O tribunal poderá expedir carta para um juízo a ele vinculado, caso o ato precise ser realizado fora dos limites territoriais de sua sede.
§ 3º Admite-se a realização de atos processuais por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico que permita a transmissão de som e imagem em tempo real.
Art. 237. Será expedida carta nos seguintes casos:
I – Carta de ordem, pelo tribunal, nos termos do § 2º do art. 236; II – Carta rogatória, para que uma autoridade jurisdicional estrangeira pratique ato de cooperação jurídica internacional relacionado a processo em curso perante um órgão jurisdicional brasileiro; III – Carta precatória, para que uma autoridade jurisdicional brasileira realize ou determine o cumprimento, dentro de sua competência territorial, de ato solicitado por outro órgão jurisdicional de competência territorial diversa; IV – Carta arbitral, para que uma autoridade do Poder Judiciário pratique ou determine o cumprimento, dentro de sua competência territorial, de ato solicitado por um tribunal arbitral, inclusive aqueles que envolvam a execução de tutela provisória.
Parágrafo único: Se o ato relacionado a processo em curso na justiça federal ou em tribunal superior precisar ser realizado em local onde não haja vara federal, a carta poderá ser dirigida ao juízo estadual da comarca correspondente.
Comentários dos artigos 236 e 237
O processo judicial é impulsionado pela atuação oficial, com atos que devem ser cumpridos conforme as determinações judiciais. Quando esses atos precisam ser realizados dentro da jurisdição do tribunal, são executados pelos auxiliares do juízo. No entanto, se for necessário realizar um ato fora dessa jurisdição, como em outra comarca, subseção ou até mesmo em território estrangeiro, são expedidas cartas – de ordem, precatória, rogatória ou arbitral – para que o ato seja cumprido pelo órgão competente, conforme descrito no art. 237 do Novo Código de Processo Civil (NCPC).
Essas cartas são ferramentas essenciais para garantir a cooperação entre diferentes jurisdições, tanto no âmbito nacional quanto internacional. O NCPC, em comparação com o CPC/73, reforçou essa cooperação ao tratar de forma detalhada a colaboração entre os órgãos judiciais de diferentes esferas. A cooperação nacional é regida pelos arts. 67 a 69 do NCPC, que estabelece o dever de colaboração mútua entre as diversas instâncias judiciais, sejam elas estaduais, federais ou especializadas.
No cenário internacional, a cooperação jurídica é fundamentada no princípio de solidariedade entre os Estados, que busca facilitar o cumprimento de atos judiciais e administrativos entre diferentes países. A cooperação internacional pode ser formalizada por meio de tratados e acordos bilaterais ou multilaterais, mas, na ausência desses instrumentos, pode-se recorrer a vias diplomáticas ou ao princípio da reciprocidade. O art. 26 do NCPC consolida esses mecanismos de colaboração entre nações.
Quando o Brasil solicita a ajuda de um país estrangeiro para a execução de um ato processual, utiliza-se a carta rogatória, prevista no art. 237, II, do NCPC. Esse é um exemplo de cooperação jurídica internacional ativa. Já a cooperação passiva, quando outro país solicita que um ato seja cumprido no Brasil, está disciplinada nos arts. 28 a 41 do NCPC. Esses artigos tratam dos procedimentos que o Brasil deve seguir quando recebe pedidos de cooperação de outras nações, como a execução de cartas rogatórias ou auxílio direto.
Outra inovação do NCPC é a introdução da carta arbitral, que não existia no CPC/73. Quando uma questão é submetida a um tribunal arbitral, seja por meio de cláusula compromissória ou compromisso arbitral, conforme a Lei nº 9.307/96 (Lei de Arbitragem), e há necessidade de cumprimento de algum ato fora da área de atuação do tribunal arbitral, o Poder Judiciário deve ser acionado por meio da carta arbitral. Esse instrumento facilita a interação entre o juízo arbitral e o Poder Judiciário, mesmo que haja divergências sobre a natureza jurisdicional da arbitragem. O art. 189, IV, do NCPC também garante que os atos processuais envolvendo arbitragem, inclusive as cartas arbitrais, sejam sigilosos quando estipulado em convenção.
Além disso, o art. 237, IV, do NCPC permite que a carta arbitral seja utilizada para a efetivação de tutelas provisórias. A Lei de Arbitragem, em seu art. 22, § 4º, já previa que, em situações que exigem medidas coercitivas ou cautelares, os árbitros devem recorrer ao Poder Judiciário competente para aplicar tais medidas.
O NCPC também trouxe inovações no que diz respeito à modernização tecnológica dos atos processuais. O art. 236, § 3º, autoriza expressamente a utilização de videoconferência e outras tecnologias de transmissão de áudio e vídeo em tempo real para a realização de atos processuais, como depoimentos pessoais, audiências e até sustentações orais. Essa medida está em consonância com a Lei nº 11.419/2006, que regulamentou o processo eletrônico, e visa garantir maior celeridade e eficiência, atendendo ao princípio da duração razoável do processo, previsto no art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal.
As críticas que sugerem que o uso dessas tecnologias violaria o princípio da oralidade não se sustentam. Embora o juiz não tenha contato físico com as partes, ele ainda pode interagir diretamente e observar o comportamento das testemunhas e partes envolvidas. Além disso, mesmo nos casos em que os atos são realizados por meio de cartas precatórias, o juiz responsável pela decisão não tem contato direto com os elementos de prova, o que desqualifica o argumento de que a tecnologia comprometeria a qualidade do julgamento.