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[MODELO] Ação Civil Coletiva Revisional de Cláusulas Contratuais no SFH

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA CÍVEL COMPETENTE POR DISTRIBUIÇÃO DA COMARCA DE CAMPINAS-SP.

 

 

 

 

 

 

 

 

ASSOCIAÇÃO PAULISTA DOS MUTUÁRIOS DO SFH, pessoa jurídica de direito privado, legalmente constituída desde 1º de Janeiro de 1984, com Estatuto e respectivas alterações registrados e arquivados no Cartório de Registro de Títulos e Documentos da Comarca de São José do Rio Preto/SP, cidade em que mantém sua sede, devidamente inscrita no CGC/MF sob o nº 71.745.400/0001-74 (doc. inclusos), com endereço à Rua 13 de Maio, nº 172, sala 03, centro, Mogi Mirim-SP, ora agindo na qualidade de substituta processual dos Mutuários do HSBC Bamerindus (que financiaram imóveis situados dentro do território de jurisdição desse R. Juízo), em defesa dos direitos individuais homogêneos destes, com supedâneo no inciso IV, do artigo 82, da Lei 8.078/90 (CDC), através dos procuradores in fine subscritos, constituídos pelo instrumento de mandato incluso, vem à presença de Vossa Excelência, respeitosamente, com fulcro na Lei nº 4.380/64, art. 5º, § 1º (instituidora da correção monetária nos Contratos Imobiliários); no art. 4º do Decreto-lei 22.626/33 (Lei de Usura); na Súmula 121 do STF; na Lei 8.078/90 (CDC); na Lei 7.347/85 (LACP); e na decisão prolatada na ADIN 493-0-DF (em que o STF julgou inconstitucional a incidência da Taxa Referencial – TR – nos mútuos habitacionais lavrados com recursos do SFH), a fim de propor:

AÇÃO CIVIL COLETIVA REVISIONAL DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS E DO VALOR DE PRESTAÇÕES E SALDOS DEVEDORES DE MÚTUOS HABITACIONAIS CELEBRADOS NO ÂMBITO DO SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO – SFH.

em desfavor de:

 

XXXXXXXXXXXXXXXXXX – pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CGC/MF sob Nº XXXXXXXXXX, com sede em XXXXXXX, na Rua José Inocêncio de Campos, Nº 153, Cambuí; e

BANCO HSBC BAMERINDUS S.A. – pessoa jurídica de direito privado, sob a forma de sociedade anônima, sediada na Travessa Oliveira Belo, Nº 11-B, 4º Andar, Centro, Curitiba-PR.

 

DOS MÚTUOS NO SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. BREVES CONSIDERAÇÕES.

Nos contratos de financiamento habitacional, típicos e indiscutivelmente de adesão, predomina a regra da assinatura pelo mutuário no balcão do agente financeiro, às pressas, sem uma leitura acurada das quase sempre ininteligíveis cláusulas que vão gerar obrigações e compromissos de 10, 20 ou 25 anos, como ocorre nos casos presentes.

O objetivo primordial do Sistema Financeiro da Habitação – SFH –, quando criado por proposição do Governo Federal, através da Lei 4.380/64, consistia na facilitação à aquisição da casa própria, sobretudo pela população de baixa renda, tendo-se em vista os "fins sociais" e as "exigências do bem comum".

Considerando que o SFH possui cunho estritamente social, proporcionando a aquisição da casa própria através de um contrato de mútuo que se propõe a respeitar uma proporção entre a renda familiar do mutuário e o valor das restações do financiamento, sem comprometer a sua subsistência, não resta dúvida de que a atualização dos valores dos contratos habitacionais em hipótese alguma deveria ser superior aos reajustes salariais da categoria profissional do mutuário (princípio da equivalência salarial) ou à variação do poder aquisitivo da moeda perante o processo inflacionário (princípio da correção monetária de prestações e saldo devedor).

Mas, infelizmente, o SFH não vem cumprindo o seu papel institucional, seja pelas práticas abusivas de seus agentes financeiros, seja pela inconstitucionalidade de atos legislativos forjados sob a justificativa da satisfação do "interesse coletivo" – na verdade, somente das classes que operam e controlam o mercado habitacional e financeiro –, mergulhando os mutuários-consumidores, às dezenas de milhares pelo país afora, no seguinte dilema: comprometem seu bem-estar e de sua família, cortando gastos até com alimentação, para tentar manter em dia as exorbitantes prestações do financiamento; ou, tornam-se inadimplentes e perdem seu imóvel de moradia ao agente financeiro. Eis o "pesadelo" da casa própria.

Assim é que os instrumentos trazidos à revisão desse Juízo estão tisnados em sua essência – por abusos das Requeridas e pela inconstitucionalidade de atos legislativos. Respeita a questão aos mecanismos adotados para a "correção" do valor das prestações e do saldo devedor dos financiamentos.

 

DOS FATOS

 

Visando a aquisição de imóvel para moradia própria através do Sistema Financeiro da Habitação – SFH –, celebraram os mutuários substituídos com as Requeridas contrato particular de compra e venda e de mútuo com garantia hipotecária, em que se previu como sistema de reajuste dos encargos mensais o PLANO DE COMPROMETIMENTO DE RENDA – PCR –, segundo o qual as prestações devem ser reajustadas mensalmente "mediante a aplicação do mesmo índice utilizado para reajustamento do saldo devedor …", conforme a redação da cláusula 6ª e de seu §2º, dos contratos modelo jj. O saldo devedor, por sua vez, reajusta-se consoante o prescrito na cláusula 13ª dos contratos sub examinem, que reza:

 

"o saldo devedor do financiamento ora contratado será atualizado mensalmente, mediante a aplicação de percentual igual ao utilizado para a atualização dos saldos em depósitos de Caderneta de Poupança Livre (pessoa física), mantidos nas instituições integrantes dos Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), que tenham data de aniversário no mesmo dia do mês de assinatura deste contrato." (grifos nosssos).

 

Verifica-se pelo disposto nas cláusulas 6ª, §2º, e 13ª que as prestações e os saldos devedores dos contratos em referência sofrem reajustes pelo índice de "atualização dos depósitos em Caderneta de Poupança", qual seja, a Taxa Referencial – TR –, criada pela Lei Nº 8.177, de 01.03.1991. Eis o fato que configura o cerne da questão de fundo da presente demanda.

 

DA CARACTERIZAÇÃO DA RELAÇÃO DE CONSUMO – APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE PROTEÇÃO E DEFESA DO CONSUMIDOR.

Com o advento do Código de Defesa do Consumidor – Lei Nº 8.078/90 – de ordem pública e de interesse social – veio permitir-se a defesa judicial de direitos individuais homogêneos via AÇÃO CIVIL COLETIVA.

Assim, busca a Requerente através da presente ação a tutela estatal em defesa dos direitos individuais de origem comum de todos os mutuários substituídos que contrataram com as Requeridas, na condição de consumidores, sob o fulcro do art. 81, parágrafo único, inciso III, do CDC.

É inegável que o mutuário integrante da relação jurídica consubstanciada no contrato de mútuo, identifica-se como consumidor nos moldes do art. 2º da Lei 8.078/90 (CDC). Ao seu turno, o agente financeiro, ao pactuar o contratro de financiamento pelo SFH, exerce duas atividades: a primeira, a concessão do crédito (produto, art. 3º, § 1º, Lei 8.078/90); a segunda, a aprovação de financiamento ao mutuário obedecendo às normas do SFH e a prestação de um serviço contínuo com prazo de duração equivalente ao número de meses do financiamento (serviço, art. 3º, § 2º, L. 8.078/90).

Desse modo, as atividades das Requeridas estão identificadas com ambos os conceitos estabelecidos nos §§ 1º e 2º do art. 3º do CDC: o produto: a concessão do crédito; o serviço: aprovação do financiamento e a prestação de serviço contínuo até o termo final do contrato.

Com efeito, os contratos de mútuo em referência têm por finalidade o crédito de dinheiro, que é utilizado para aquisição da casa própria, caracterizando relações jurídicas de consumo.

Nessa esteira proferiu o Eg. Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul a seguinte decisão:

"Ementa Oficial: O conceito de consumidor, por vezes, se amplia no CDC, para proteger quem "equiparado". É o caso do art. 29. Para efeito das práticas comerciais e da

proteção contratual, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas, determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas.

O CDC rege as operações bancárias, inclusive as de mútuo ou de abertura de crédito, pois relações de consumo.

O produto da empresa de banco é o dinheiro ou o crédito, bem juridicamente consumível, sendo, portanto, fornecedora; e consumidor, o mutuário ou creditado."

Dessa forma, estando qualificados os Mutuários substituídos como consumidores, lhes promove a lei a facilitação na defesa de seus direitos, por representarem a parte mais frágil na relação de consumo (princípio da vulnerabilidade do consumidor – CDC, art. 4º, I), prevendo a interpretação dos contratos sempre favorável a eles e a possibilidade de inversão do ônus da prova em proveito dos mesmos (CDC, arts. 47 e 6º, VIII, respectivamente).

 

DA ILEGALIDADE DA APLICAÇÃO DO ÍNDICE DE REMUNERAÇÃO DA POUPANÇA (TR) PARA ATUALIZAÇÃO DOS MÚTUOS EM EXAME.

Como é cediço, com a entrada em vigor da Lei Nº 8.177/91, que, dentre outras providências (algumas contrárias ao texto constitucional), estabeleceu regras para a desindexação da economia, os depósitos em caderneta de poupança deixaram de ser corrigidos ou atualizados monetariamente, para serem remunerados pela Taxa Referencial (TR), por força do artigo 12, da cit. lei, in expressis:

"Art. 12. Em cada período de rendimento, os depósitos de poupança serão remunerados:

I- como remuneração básica, por taxa correspondente à acumulação das TRD’s, no período transcorrido entre o dia do último crédito de rendimento, inclusive, e o dia do crédito de rendimento, exclusive;

II- como adicional, por juros de meio por cento ao mês…"

Por outro lado, desde a criação do Sistema Financeiro da Habitação, através da Lei Nº 4.380/64 (que, após a promulgação da CF/88, foi promovida ao patamar de lei materialmente complementar, a exemplo da L. 4.595/64 – reguladora do Sistema Financeiro Nacional, do qual o SFH é integrante), ficou sedimentado que o reajustamento das prestações e dos saldos devedores dos mútuos imobiliários deve ser feito pela aplicação de índice que reflita adequadamente as variações do poder aquisitivo da moeda nacional, i. é, índice de correção monetária ou de inflação, nos termos do art. 5º, § 1º, da referida lei .

Não obstante tenha havido ao longo do tempo "n" mudanças de índices, esse princípio basilar do SFH somente poderá ser modificado através de lei complementar, consoante o comando constitucional do art. 192 da Carta Magna. Então, exceto por aprovação de lei complementar revogadora desse critério, não poderão os contratos habitacionais celebrados no âmbito do SFH adotar índice de reajuste que não exprima as variações do poder aquisitivo da moeda no processo inflacionário, tal qual a TR – taxa remuneradora (juros) dos depósitos em poupança.

E, mesmo tendo o Decreto-lei Nº 19/66 revogado parcialmente algumas normas do art. 5º da L. 4.380/64, no sentido de conceder autorização ao BNH para baixar instruções sobre a atualização dos contratos do SFH, afastando, então, a atribuição que competia ao Conselho Nacional da Economia, jamais foi afetada a regra (o que, como já dito, só poderá sê-lo mediante lei complementar) de que os valores dos mútuos devem ser atualizados ou corrigidos por índice que reflita adequadamente as variações no poder aquisitivo da moeda nacional.

Assim, temos que, independentemente da data de assinatura do contrato de mútuo, é ilegal a incidência da Taxa Referencial como índice de reajuste, seja em prestações ou saldos devedores. No tocante aos pactos firmados anteriormente a jan/91, a questão já se encontra superada em face da decisão proferida pelo STF no julgamento da ADIn 493-0-DF, a qual declarou inconstitucionais os artigos 18, caput, §§ 1º e 4º, 20, 21, par. único, 23, §§, e 24, §§, da Lei Nº 8.177/91, por ofenderem tais dispositivos direito adquirido dos

 

 

mutuários. Já no que respeita aos contratos firmados a partir de fev/91, também inincidível a TR, vez que § 1º do art. 5º da L. 4.380/64 expressamente se refere a índice de reajuste que reflita adequadamente as variações do poder aquisitivo da moeda nacional.

A propósito, o emprego da TR como índice de correção monetária já há vários anos vem sendo condenado pelos nossos Tribunais, inclusive Superiores, conforme se denota dos julgados abaixo reproduzidos:

"A taxa referencial de juros, TR, não é índice de correção monetária e, portanto, como tal não pode ser utilizada." (STJ, 1ª T, REsp 57802-7, Rel. Min. Asfor Rocha, j. 5.11.94, DJU 13.2.1995, p. 2.223).

Índices TR e IPC (FIPE). O índice TR não mede a inflação e, mesmo que a Lei 8.177/91 não o excluísse, não podia ser adotado, devendo ser substituído pelo IPC (FIPE). Recurso provido para esse fim (1º TACivSP, Ap 494739, rel. Juiz Antonio de Pádua Ferraz Nogueira, j. 16.6.1992).

"EMENTA. Civil. Correção Monetária. Liquidação de sentença. Índice Aplicável em Débitos da Previdência Social. Precedentes do STF e do STJ (6ª Turma e 3ª Seção). Embargos Acolhidos.

I – A Taxa Referencial (TR) não é índice de correção monetária, uma vez que não reflete a variação do custo de vida, achando-se atrelada à captação dos depósitos bancários. Precedentes do STF: ADIN 493-0/DF e ADIN 959/DF.

II- Embargos de Divergência acolhidos para que o índice aplicado seja o INPC, e não a TR.

(Acórdão nº 0038495, 3ª Seção, Rel. Min. Adhemar Maciel. Embargos de Divergência em Recurso Especial)"

 

 

No que pertine ao SFH, também caminha a jurisprudência decididamente em oposição à utilização da TR para correção dos valores nos mútuos habitacionais. Vejamos alguns arestos:

"(…) 8. Contrariamente ao que vinha entendendo esta Turma, não pode a TR reajustar os saldos devedores; o INPC é o índice adequado, já que corresponde à variação do poder aquisitivo da moeda." (TRF – 1ª Reg, DJ, Seção 2, de 17.05.96, p. 31.863)

O Eg. TRF da 5ª Região, por sua 2ª Turma, promulgou, na ementa e voto do Relator, o Juiz LÁZARO GUIMARÃES, o seguinte:

"Civil. Sistema Financeiro da Habitação. Plano de amortização mista. Aleatoriedade de índice prejudicial ao adquirente. Cláusula contratual abusiva. Apelo improvido.

(…)

O desequilíbrio entre a política salarial e a inflação motivou o descompasso entre o crescimento do saldo devedor e a sua amortização pelo pagamento das prestações, de tal modo que, ao final do contrato, o saldo remanescente equivale muitas vezes à soma superior ao valor de mercado do imóvel, o que implica em inviabilizar o sistema de cobertura.

(…)

O agente financeiro predispôs o contrato de modo a aplicar o maior índice de variação salarial ou na falta de parâmetro, o índice que serve à correção da poupança, ou seja, a TR, que mede a taxa de juros, e, por isso, não serve à correção monetária. Ambas as alternativas oneram excessivamente o mutuário."

(…)

Como as duas alternativas são injustas e desequilibram o contrato, depois da decisão do STF sobre a imprestabilidade da Taxa Referencial os agentes financeiros estão desesperados à cata de um índice para corrigir as prestações."

 

A decisão do Supremo Tribunal Federal a que se refere o aresto retro transcrito foi proferida na já mencionada ADIn 493-0/DF, Relator o Ministro MOREIRA ALVES, sacramentando a tese advogada pelos doutos de ser inaplicável a TR como fator de correção por se tratar de taxa de juros, e, inobstante haver sido proferida em 25/06/92, surte efeitos ex tunc e erga omnes, alcançando inclusive contratos assinados posteriormente a ela.

No voto do eminente Ministro Relator, consta: "A TR é um indexador para o mercado financeiro de títulos e valores mobiliários, refletindo as variações do custo primário da captação dos depósitos a prazo fixo, não consistindo, portanto, índice que reflita a variação do poder aquisitivo da moeda. EM PERÍODO DE PLENA ESTABILIDADE MONETÁRIA, UM INDEXADOR COMO A TR PODERÁ CERTAMENTE APRESENTAR PERCENTUAIS ELEVADOS, REFLETINDO TAXAS DE CAPTAÇÃO ATRATIVAS AO MERCADO FINANCEIRO." (Destaques nossos).

Outro motivo que, por si só, já demonstra a ilegalidade do emprego da TR nos contratos aqui tratados: — tendo em vista que o cálculo inicial das prestações dos mútuos foi executado utilizando-se o Sistema Francês de Amortização – TABELA PRICE e que nessa fórmula já incidem juros compostos, pré-fixados (q.v. cláusula 6ª, dos contratos anexos), a aplicação da TR+0,5% em tais contratos na forma das cláusulas revisandas constitui, indubitavelmente, prática reprovável de anatocismo, vedada pela Lei de Usura (DL 22.626/33, art. 4º) e repelida pela Súmula 121, do Supremo Tribunal Federal.

A jurisprudência do Eg. Superior Tribunal de Justiça, como corolário do entendimento da Excelsa Corte, inclina-se neste sentido:

"Capitalização de juros. Prevalece a proibição do Decreto-lei nº 22.626/33, art. 4º, ainda em relação às instituições do Sistema Financeiro Nacional." (STJ, 3ª T., REsp 13829-PR, Rel. Min. Dias Trindade, j. 29.10.1991, DJU 2.12.1991, p. 17.537).

"O Decreto-lei nº 22.626/33, art. 4º, não foi revogado pela

 

Lei nº 4.595/64 (RTJ 108/277, 81/919). A capitalização de juros (juros de juros) é vedada pelo nosso direito, mesmo quando expressamente convencionada, não tendo sido revogada a regra do Decreto-lei nº 22.626/33, art. 4º, pela Lei nº 4.595/64. O anatocismo, repudiado pela Súmula 121 do STF, não guarda nenhuma relação com a Súmula 596 do STF. (RSTJ 22/197)"

Mais um abuso: a 2ª Requerida, ao receber o pagamento das capitalizadas – revés de corrigidas – prestações dos financiamentos, primeiro remunera o saldo devedor pela TR (+0,5%), para depois deduzir da dívida a parcela de amortização paga pelo mutuário (v. §3º, da cláusula 13º). Os mutuários são lesados na adoção do índice aplicado e no ato de se anteceder o reajuste do saldo devedor à amortização.

Pela lei criadora do SFH e instituidora da correção monetária nos contratos imobiliários, Lei 4.380/64, na alínea "c" de seu art. 6º, o correto (e lógico) seria o agente financeiro primeiro abater da dívida o valor amortizável pago pelo mutuário, e somente depois atualizar monetariamente o saldo devedor remanescente por índice de correção monetária (como o IPC ou o INPC).

Se mantida a aritmética da Requerida, baseada no antijurídico "binômio anatocista" TABELA PRICE + TR e na dedução atrasada da dívida, os saldos devedores dos empréstimos habitacionais continuarão em escala crescente, mesmo após longos anos de pagamento das prestações por parte do mutuário, gerando no final do prazo contratual um resíduo (para o qual não há plano de cobertura) muito superior ao preço de mercado do imóvel à época!

Para demonstrar num primeiro momento a disparidade entre a ilegal TR e o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor, divulgado pelo IBGE) – tido atualmente como índice oficial de correção monetária (juntamente com o IPC da FIPE), anexa-se à presente o estudo apresentado pela 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, material este que acompanha a manifestação da Procuradora da República Drª Raquel

 

Branquinho Pimenta Mamede Nascimento, nos autos da AÇÃO CIVIL COLETIVA que a Requerente, em litisconsórcio com o MPF, promove contra a Caixa Econômica Federal, perante a 2ª Vara Federal da 5ª Subeseção Judiciária em Campinas-SP (Processo nº 97.0603819-1).

E que não venha o agente financeiro dizer que repassa aos valores dos mútuos o mesmo índice que é aplicado às contas de poupança e do FGTS (fundos de onde provém os recursos utilizados para a concessão dos empréstimos), pois a TR paga às referidas contas é devida por lei como contraprestação ou remuneração (o que equivale a juros) ao capital deixado à disposição do banco, tal como os juros contratuais (no máximo de 12% a.a.) que pagam os mutuários por se lhes conceder o empréstimo para compra da casa própria.

Então, se o mutuário já paga juros em contraprestação ao financiamento que contraiu, não há como se conceber a incidência da TR (+0,5%) sobre os valores de seu contrato, sendo cabível apenas a correção monetária de tais valores, para recuperação de eventual perda do poder aquisitivo da moeda, coisa para a qual a TR não serve.

Destarte, dúvidas não restam de que a utilização da TR nos mútuos habitacionais em alusão é contrária à ordem jurídica e tem onerado excessivamente os mutuários substituídos (principalmente no período de estabilidade monetária que estamos vivenciando, onde existem meses em que os índices de correção registram, inclusive, taxas de deflação!), desequilibrando a relação contratual de consumo, assim não havendo como se falar em PACTA SUNT SERVANDA, também por força da exceção contida no art. 6º, inciso V, do CDC.

Cumpre, por fim, à Autora esclarecer que o percentual de comprometimento máximo de renda – 30% (trinta por cento) – serve apenas para teto, não significando que as prestações dos mutuários devam necessária e exatamente corresponder a esse percentual, salvo se da aplicação do índice de correção monetária resultar em tal limite.

 

DOS REQUERIMENTOS

 

EX POSITIS, vem a Autora requerer a Vossa Excelência, com estribo nos argumentos retro e precipuamente na Lei 4.380/64, no art. 4º do

Decreto-lei 22.626/33 (Lei de Usura), na Súmula 121 do STF, na decisão proferida na ADIn 493-0–DF, e na Lei 8.078/90 (CDC), digne-se em julgar PROCEDENTE a presente Ação Civil Coletiva, a fim de condenar as Requeridas a revisionarem a cláusula 13ª (décima terceira) e seus parágrafos, dos contratos celebrados com os substituídos através do SFH, adotanto para o reajuste dos saldos devedores e, por conseguinte, dos encargos mensais, em substituição à Taxa Referencial –TR, índice que reflita a variação do poder aquisitivo da moeda nacional frente à inflação, o IPC da FIPE ou o INPC do IBGE, e consignando que os saldos devedores sejam corrigidos após as respectivas amortizações.

Requer, via de consequência, condene-se as Requeridas a efetuarem em todos os mútuos aqui discutidos o recálculo das prestações e dos saldos devedores, nestes precedendo a amortização ao reajuste, substituindo o índice ilegal (TR) pelo julgado adequado por V. Exª. (IPC ou INPC), e deduzindo do valor da dívida dos mutuários substituídos o quantum pago indevidamente desde a origem contratual, ou restituindo-os desse indébito, em qualquer caso, com a dobra prevista no art. 1.531 do CC.

Outrossim, requer as CITAÇÕES das Requeridas para que, querendo, contestem os termos da presente sob as penas da lei adjetiva, e a CIENTIFICAÇÃO do ilustre Representante do Ministério Público, custos legis, de conformidade com o art. 92, da Lei 8.078/90.

 

REQUER, POR DERRADEIRO

  1. A isenção de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas processuais, na forma do art. 87 do CDC c.c. art. 18 da LACP;
  2. Os benefícios legais da interpretação contratual favorável aos mutuários-consumidores (CDC, art. 47) e da possibilidade de inversão do ônus da prova em proveito dos mesmos (CDC, inciso VIII, art. 6º), em reconhecimento da hipossuficiência dos substituídos frente às Requeridas (CDC, inciso I, art. 4º);

3. A publicação de EDITAL no Órgão Oficial (L. 8.078/90, art. 94) a fim de que os interessados possam ingressar no processo;

4. A condenação das Requeridas em custas e demais despesas processuais, bem como em honorários advocatícios ao prudente arbítrio de V. Exª.

 

Sendo a matéria toda de direito e documental a prova, desnecessária, data venia, a dilação probatória; entretanto, caso assim não entenda Vossa Excelência, protesta pela juntada posterior de documentos, perícia técnica e pelos depoimentos pessoais dos representantes legais das Requeridas sob as penas da lei processual, sem prescindir de outros meios de prova em Direito admitidos e moralmente legítimos.

Dá-se à causa o valor de R$ 1.000.000,00 (hum milhão de reais).

Nestes termos,

Pede deferimento.

Campinas-SP, janeiro, 22, MCMXCVIII, 2.

 

 

 

 

 

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