[MODELO] Danos Materiais e Morais – Responsabilidade do Estado
ESTADO DO RIO DE JANEIRO.
PODER JUDICIÁRIO
COMARCA DA CAPITAL
JUÍZO DE DIREITO DA 10ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA
Processo nº 99.001.087228-0
SENTENÇA
Vistos etc…
I
MARIA ELOISA AVEINO DE OLIVEIRA e OUTROS, qualificados na inicial, aXXXXXXXXXXXXaram a presente demanda em face do ESTADO DO RIO DE JANEIRO, pedindo a condenação do réu ao pagamento de indenização a título de danos materiais e morais.
Como causa de pedir, alegam os autores, em síntese, o conhecimento, quando passados 109 (cento e nove) dias do desaparecimento do seu marido e pai, que este se internara no Hospital Getúlio Vargas no dia 23.07.98, vindo a falecer nesta mesma data, sendo enterrado como indigente no Cemitério de Santa Cruz em 18.08.98. Inconformados com as circunstâncias em que se deram os fatos, na medida em que os funcionários do Hospital negaram a existência da internação do de cujus, por ocasião da procura do mesmo em referido nosocômio pelos familiares, por três vezes, permitindo, com isto, o seu sepultamento como indigente, apesar de encontrar-se portando documentos de identificação, ajuízam os autores a presente demanda, objetivando compensação dos danos a que foram expostos. Esclarecem, ainda, que após todos estes incidentes, para ser identificado adequadamente o cadáver, foi necessária sua exumação para proceder ao exame de DNA, permanecendo até o presente momento insepulto (fls. 02/07).
Com a inicial vieram os documentos de fls. 08/28 e 28/30.
O pleito de antecipação dos efeitos da tutela foi deferido (fls. 30/31), determinando a liberação do cadáver para sepultamento.
Inicial emendada às fls. 83/86.
Regularmente citado, o réu apresentou contestação (fls. 86/87), mencionando, em síntese, ter permanecido o corpo do marido e pai dos autores durante um mês na câmara frigorífica do Hospital, sem reclamação de qualquer interessado, razão pela qual foi providenciado o seu sepultamento. Assim, não pode ser responsabilizado pelo fato de ter ocorrido negativa de pagamento de benefício previdenciário por parte do INSS, em virtude da certidão de óbito não consignar dados mais precisos, já que não dispunha dos mesmos para tanto. No tocante ao dano moral, salienta o exagero do montante pretendido.
Com a contestação vieram os documentos de fls. 88/96.
Réplica às fls. 99/102.
Novos documentos juntos às fls. 188/151.
Parecer do Ministério Público às fls. 179/182, no sentido da improcedência do pedido.
II
É o relatório. Fundamento e decido.
Conforme se nota, os autores mencionam que, em razão do desaparecimento do seu pai e marido, procuraram o Hospital Getúlio Vargas, por três vezes, em busca de informações sobre o seu paradeiro, tendo este nosocômio deixado de mencionar a presença da internação do de cujus e posterior sepultamento, na qualidade de indigente no Cemitério de Santa Cruz.
Assim, por ter ocorrido omissão de informações, fazendo com que os autores, apenas quando passados mais de 100 (cem) dias, viessem a tomar ciência da internação e do sepultamento realizado pelo Hospital Getúlio Vargas, entendem caracterizada a responsabilidade do réu pelos momentos de angústia e sofrimento a que ficaram expostos durante este período.
Esta a questão posta a debate.
Para efeitos de análise de uma eventual responsabilidade do Estado do Rio de Janeiro pelos danos descritos na inicial, checa-se, por primeiro, a natureza da responsabilidade incidente na hipótese.
Esta é objetiva. Com efeito. A tanto basta ver que se está diante de uma omissão específica. A Administração, internando o pai e marido dos autores, mesmo estando identificado, deixou de comunicar aos familiares este fato, a causar o enterro como indigente do mesmo, trazendo angústia aos familiares que durante meses não tinham a certeza do paradeiro do falecido.
Veja-se que em nenhum momento o Hospital Getúlio Vargas procurou a utilização de meio adequado para encontrar os familiares do falecido. O réu, em sua contestação, assim como na informação constante à fl. 89, aduz apenas que o corpo do Sr. Agnaldo de Oliveira – marido e pai dos autores – permaneceu em câmara frigorífica durante certo tempo, sem que houvesse qualquer reclamação por parte dos familiares.
Ora, ainda que se considere o fato de não ter a autora comprovado o comparecimento em referido nosocômio, em busca de notícias do seu falecido marido, tal circunstância, por si só, não afasta a responsabilidade do réu, diante da inexistência de provas de ter prestado serviço regular, de forma normal e correta, tendente a localizar familiares do de cujus.
Nada sendo feito, contribuiu sobremaneira para toda a situação causada, desde o sepultamento do de cujus como indigente, até o desgaste de uma exumação, cuja finalidade de realização do exame de DNA, não foi possível, trazendo enorme sofrimento para a família, já que, diante de toda a burocracia, somente em 12.08.03 foi liberado os restos mortais para o sepultamento.
Quanto ao dito, não seria muito ver que o réu poderia se valer da expedição de ofício para outros órgãos, com o objetivo de descobrir a residência do falecido marido e pai dos autores, de forma a comunicá-los do ocorrido. Nada fez. Veja-se que o réu tinha o nome do falecido. Poderia, com este dado, localizar eventual domicílio do mesmo. Todas as pessoas prestadoras de serviços públicos provavelmente teriam condições de informar dados neste sentido.
Caracterizada, portanto, a culpa do réu pelos danos. A falha ou falta do serviço público importou em toda a situação descrita.
Constatada a conduta, o nexo e o dano, passa-se a sua quantificação, ou seja, ao exame das verbas pleiteadas.
A primeira delas, referente ao pagamento de indenização a título de danos materiais, se divide em dois pontos: lucros cessantes, consubstanciados na impossibilidade de levantamento de benefício junto ao INSS, liberação do FGTS e PIS, em decorrência de irregularidades na certidão de óbito; e verbas com luto e funeral.
Quanto à pretensão a lucros cessantes, improcede. A negativa de tais órgãos em liberar o pagamento das verbas pleiteadas, por uma suposta irregularidade na certidão de óbito, não possui qualquer relação com a conduta do Estado. Caberia a autora demonstrar ser beneficiária das verbas deixadas pelo de cujus e, havendo resistência quanto ao pagamento, que se valesse de meios próprios para sua obtenção.
Em relação as despesas com luto, funeral e sepultura perpétua, diante da ausência de provas documentais da sua ocorrência e, considerando-se as regras de experiência comum (art. 335, do CPC), denotativa de que algum gasto foi empreendido pela família com a realização do sepultamento, tem-se como justo impor o pagamento da quantia equivalente a 1 (um) salário mínimo.
Resta, por fim, apreciar o pleito de reparação moral.
Quanto a este não restam dúvidas sobre o seu cabimento. O Estado, agindo de forma omissiva, impediu que os autores tomassem ciência do falecimento de um ente querido e próximo – pai e marido, no momento oportuno. Contribuiu para momentos de angústia, sem uma justificativa plausível.
Considerando-se estes elementos, passa-se a sua quantificação.
A reparação moral vem informada pela idéia compensatória e punitiva. A primeira traduzida pela tentativa de substituição da dor e do sofrimento, por uma compensação financeira. A segunda, significando uma sanção com caráter educativo, para estabelecer um temor e, por isso, trazer uma maior responsabilidade.
Na busca de uma gradação adequada para a reparação moral, o legislação não vinculou o XXXXXXXXXXXX a uma regra, de forma a permitir uma discricionariedade que se faz presente dentro daquilo que se convencionou chamar de critério do “lógico-razoável”.
Na hipótese, diante das circunstâncias do dano ocasionado aos autores, tem-se por adequado impor uma reparação moral no equivalente a R$ 20.000,00 (vinte mil reais).
III
Ante o exposto JULGO PROCEDENTE em parte o pedido, para condenar o réu ao pagamento das seguintes verbas:
A)1 (um) salário mínimo, para efeitos de compensar gastos com funeral, cujo valor a ser adotado deve ser aquele da data do efetivo pagamento; e
B) R$ 20.000,00 (vinte mil reais) a título de salários mínimos, devidamente atualizado a partir da presente data e acrescido dos juros legais, a contar da citação.
Imponho ao réu os ônus sucumbenciais, fixando os honorários advocatícios em 10% do valor da condenação.
P.R.I.
Rio de Janeiro, 28 de outubro de 2012.
RICARDO COUTO DE CASTRO
XXXXXXXXXXXX DE DIREITO