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[MODELO] Sistema recursal da Lei 9099/95: estudo sobre princípios, requisitos e espécies de recursos

O SISTEMA RECURSAL DA LEI 9099/95

I – OBJETIVOS DO TRABALHO

II – METODOLOGIA, TÉCNICA E FONTES UTILIZADAS

III – A IMPORTÂNCIA DA LEI 9099/95 NA CONCRETIZAÇÃO DO EFETIVO
ACESO À JUSTIÇA

IV – RECURSO – ETIMOLOGIA E DEFINIÇÃO DO VOCÁBULO

V – O RECURSO COMO GARANTIA DE UMA DECISÃO JUSTA

VI – BREVE SÍNTESE HISTÓRICA

VII- O SISTEMA RECURSAL DA LEI 9099/95

A – PRINCÍPIOS QUE INFORMAM OS RECURSOS NA LEI ESPECIAL

a.1. efetividade da prestação jurisdicional

a.2. economia processual

a.3. oralidade

a.4. simplicidade e informalidade

a.5. celeridade

a.6. concentração

a.7. identidade física do Juiz

a.8. irrecorribilidade das decisões interlocutórias

B – REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE DOS RECURSOS

– tempestividade

– preparo

– interesse

– legitimidade

– cabimento

C – EFEITOS DO RECURSO INOMINADO

– devolutivo

– suspensivo

D – ESPÉCIES DE RECURSOS

d.1. recurso inominado

d.2. embargos de declaração

d.3. mandado de segurança

d.4. recurso extraordinário

VIII –QUESTÕES CONTROVERTIDAS

A – É cabível o Agravo de Instrumento em sede de Juizados Especiais Cíveis?

B – Autoriza a Lei Especial a interposição de Recurso Adesivo ?

C – Há previsão na Lei 9099/95 para a interposição de Recurso Especial?

D – É possível o oferecimento de embargos infringentes contra decisão da Turma Recursal?

E – É cabível a interposição de Agravo Regimental contra decisão proferida pelo Conselho Recursal dos Juizados Especiais Cíveis?

F – É admissível a ação rescisória ao procedimento previsto na Lei 9099/95?

G – É competente a Turma Recursal para apreciar Mandado de Segurança impetrado contra decisão interlocutória proferida pelo Juízo monocrático ou contra acórdão exarado pelo órgão recursal? Ou a competência é de uma das Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça ou do Superior Tribunal de Justiça?

H – É cabível a aplicação do artigo 511, § 2º, do CPC ao sistema da Lei 9099/95?

IX – CONCLUSÃO

X – BIBLIOGRAFIA

XI – REPERTÓRIO JURISPRUDENCIAL

  • Supremo Tribunal Federal
  • Superior Tribunal de Justiça
  • 3ª Vice-Presidência do Estado do Rio de Janeiro
  • Turmas Recursais:

Bahia

Mato Grosso do Sul

Minas Gerais

Rio de Janeiro

Rio Grande do Sul

Santa Catarina

São Paulo

ANEXO I RECURSO EXTRAORDINÁRIO

ANEXO II MANDADO DE SEGURANÇA

ANEXO III AGRAVO DE INSTRUMENTO

ANEXO IV RECURSO ADESIVO

ANEXO V RECURSO ESPECIAL

ANEXO VI EMBARGOS INFRINGENTES

ANEXO VII AGRAVO REGIMENTAL

ANEXO VIII COMPETÊNCIA DA TURMA RECURSAL

ANEXO IX APLICABILIDADE DO ARTIGO 511, § 2º, DO CPC

I – OBJETIVOS DO TRABALHO

Este trabalho visa estudar, de forma sistemática, a transição do Direito na busca do estabelecimento de novos rumos, consubstanciados pela inserção em seu contexto dos “direitos substantivos da pessoa comum”[1]; delinear a importância dos recursos como garantia de uma decisão justa; traçar uma breve síntese histórica dos meios de impugnação; destacar o novo sistema processual – Lei 9.099/95 – como mola propulsora de inovações, oxigenando a aplicação do Direito no Brasil, para permitir uma célere e efetiva prestação jurisdicional, sem as amarras clássicas, fazendo valer direitos, até então tratados como meros chavões em discursos de efeito; analisar a teoria dos recursos no âmbito da Lei Especial, identificando os princípios, o conceito, o cabimento, os pressupostos de admissibilidade e os efeitos dos meios de impugnação; apontar as principais questões controvertidas, com a análise de repertório jurisprudencial.

Não analisará a exposição cada recurso do CPC per se ou sua evolução histórica, fazendo-se, entretanto, quando necessária, a interligação entre os institutos para uma melhor compreensão do tema.

O trabalho tem como estrutura básica seis seções.

Na primeira parte, procura-se situar o avanço do pensamento jurídico, em matéria processual cível, como resposta aos anseios sociais contemporâneos, no sentido da facilitação do acesso de todos à Justiça, questão que encontrou resposta na Lei nº 9099/95.

Na segunda parte, será enfocada a importância dos recursos como mecanismo de defesa na busca de uma solução mais adequada.

Na terceira parte, será traçada uma breve síntese histórica para situar o surgimento das principais formas de impugnação.

Na quarta parte, será tratado especificamente o inovador sistema recursal da Lei 9099/95, destacadas suas peculiaridades.

Na quinta parte, serão abordadas as principais questões controvertidas, colacionadas decisões jurisprudenciais como fonte para a interpretação da matéria, procurando-se extrair dos textos o seu sentido e alcance, delineando-se a posição majoritária.

Assinale-se que é na decisão judicial que se dá a possibilidade de em um determinado momento histórico, a mesma regra de Direito receber tratamento diferenciado, podendo incidir no caso concreto, teses jurídicas diversas ou, até mesmo, opostas.

José Carlos Barbosa Moreira[2] destacando a importância do repertório jurisprudencial como fonte de atualização do Direito, cita Calamandrei:

“seria absurdo desejar que a jurisprudência, que por sua mutabilidade no tempo é a mais sensível e mais preciosa registradora das oscilações mesmo leves da consciência jurídica nacional, fosse cristalizada e contida em sua liberdade de movimento e de expansão”.

A sexta parte conterá a conclusão do trabalho.

II – METODOLOGIA, TÉCNICA E FONTES UTILIZADAS

Trata-se de pesquisa de natureza exploratória em que foram examinadas a legislação vigente, as principais posições doutrinárias e a jurisprudência publicada em repertórios autorizados como forma de encaminhar e sedimentar as conclusões extraídas.

O estudo está apoiado na Constituição da República de 1988, no Código de Processo Civil de 1973 e suas alterações, na Lei n 7244/84 e na Lei n 9099/95.

A pesquisa jurisprudencial elaborada firmou-se na consulta da íntegra das decisões proferidas nos últimos cinco anos pelo Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça, 3ª Vice-Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Tribunais Estaduais e Conselhos Recursais dos Estados da Bahia, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, do Rio de Janeiro, Santa Catarina e São Paulo.

III – A IMPORTÂNCIA DA LEI 9099/95 NA CONCRETIZAÇÃO DO
EFETIVO ACESSO À JUSTIÇA

“a necessidade urgente é de centrar o foco da atenção no homem comum – poder-se-ia dizer no homem pequeno – e criar um sistema que atenda suas necessidades…” (T. Kojima) [3]

Para a análise do tema proposto – o sistema recursal da Lei 9099/95 – é imprescindível que se enfoque, o grande valor que comporta o novo diploma legal ao inserir no mundo jurídico nacional um procedimento voltado a atender os reais anseios da sociedade, em especial da “pessoa comum”, dos doutrinadores e dos operadores do Direito, viabilizando uma resposta judicial acessível a todos, rápida e definitiva, em razão de seu restrito sistema recursal.

O debate sobre o acesso à Justiça tem representado, na contemporaneidade, tema central da democracia participativa, despertando os espíritos mais sensíveis, ocupando a atenção dos estudiosos, provocando a reflexão no homem comum.

O desafio referente à tarefa de suprimir o enorme fosso existente entre a promessa de direitos, inscrita em diversas Cartas constitucionais e na legislação ordinária, e o efetivo exercício dos direitos, em um mundo cada vez mais marcado pela desigualdade social – provocada pela globalização e exclusão de extensos contingentes humanos – não mais admite que se desperdice tempo na adoção de medidas que promovam melhores condições de vida para todos.

Sem dúvida, é impostergável a efetivação imediata de providências variadas de ordem política, econômica e social para garantir a apropriação do mundo dos direitos, indistintamente, com vistas ao estabelecimento da paz social, da Justiça e da fraternidade.

Sabe-se que o homem, vivendo em grupos sociais, no afã de garantir os bens da vida, de atingir a fama e a riqueza ou manter sua sobrevivência, envolve-se em uma série de conflitos, verdadeiros quistos geradores de gravíssima desestabilidade que se não apaziguados levam à conturbação social.

Em épocas remotas os homens resolviam suas querelas pela autotutela, praticando justiça pelas próprias mãos, entretanto, alcançando as sociedades níveis mais complexos de convivência firmou-se a jurisdição como a forma mais conveniente de composição dos litígios.

Como mencionado por diversos doutrinadores, segundo Calamandrei[4], caracteriza-se a história da civilização com a própria história da luta contra a autotutela.

Nos Estados modernos, adotada a tripartição dos poderes, concebida por Montesquieu, o Poder Judiciário passou a deter a função específica de dizer o Direito, submetidos ao crivo judicial todos os conflitos. O Juiz, na concepção da época, como resquício da aversão contra o poder absoluto dos reis, deveria estar sob estreito controle, para não extrapolar no seu ofício, representando apenas “a boca da lei”, seguindo de forma rígida o desenrolar processual, vedada a interpretação do texto legal. A edição de leis, pelo Estado, afastou, de forma definitiva, a possibilidade do exercício da autotutela do interesse.

A sacralidade das formas, impondo o desenvolvimento emperrado do processo demonstra, com certeza, a exacerbada preocupação do legislador em proteger o demandado contra excessos do Juiz, descurando-se, em contrapartida, de prestar uma resposta, em tempo hábil, ao autor/lesado que busca o reconhecimento do seu direito, fundamento tão legítimo quanto o da salvaguarda do réu. Em suma, o processo não se mostrava útil ao fim a que se destinava, vale dizer, à prestação eficiente da jurisdição.

A par da morosidade do processo, técnica que se manteve por séculos, outro aspecto, de igual relevância comprometia o acesso à Justiça – a questão das despesas judiciais – dado extremamente penoso e cruel àquele que já se encontrava lesado em seu direito. Conhece-se que para a movimentação da máquina judiciária se faz necessário o desembolso de verba pelo demandante para fazer frente às custas iniciais, a emolumentos, taxas e consulta com advogado, salvo os casos de assistência judiciária.

Destaque-se, pelo brilho, ensinamentos de Mauro Capelletti e Bryant Garth[5] que ressaltam que o acesso à Justiça no sistema do laissez – faire, laissez – passer era acessível apenas àquelas pessoas que podiam suportar os custos do processo, o que vale dizer, o acesso era formal e não efetivo. A “Justiça” representava, em essência, a aplicação de regras de Direito ao caso concreto, com correção. Distinguem que, na trilha do estabelecimento de sociedades mais igualitárias, o foco das atenções lançou-se sobre as pessoas comuns, que, em regra, integram o contingente maior nas diferentes sociedades. Com o reconhecimento de novos direitos individuais e sociais houve a necessidade de ampliação do acesso ao Poder Judiciário, acesso que passou a representar um direito básico do indivíduo em um sistema jurídico que não aspire, tão somente, a proclamar direitos, mas sim, a garanti-los. Os autores denominaram de “terceira onda” o movimento de amplo acesso à Justiça, com a reformulação dos mecanismos de defesa de “interesses que por muito tempo foram deixados ao desabrigo”[6], interesses dos menos favorecidos, dos consumidores, dos empregados, interesses coletivos, difusos e públicos.

A agravar o panorama descrito, pontue-se, o desenvolvimento industrial deflagrado no século XIX, caracterizado pela fixação da população em grandes centros urbanos, pelo desenvolvimento do capitalismo e pela concentração da riqueza, fatores que favoreceram a expansão, em larga escala, dos contatos pessoais e negociais, massificando-os, envolvendo em suas teias fornecedores e consumidores, locadores e locatários, empregados, condôminos, prestadores de serviços e usuários, acirrando as relações que se tornaram cada vez mais frias, distantes, impessoais e complexas.

Essa dinamização social e econômica com tão extensa gama de interesses em confronto, fez crescer a demanda pela atuação do Estado-Juiz para a composição das lides, impondo a existência de um aparato estatal capaz de enfrentar a avalanche de causas que são aforadas a cada dia.

Frente à pressão dos ingredientes – volume de processos + tempo + gastos – dados complicadores de extrema potencialidade elevou–se o nível de insatisfação pelas formas usuais de tutela jurisdicional, surgindo uma questão:

Para que fórum estão sendo encaminhadas as pretensões resistidas?

Tem-se por certo que a quase totalidade dos casos é objeto de renúncia ou desistência pelos indivíduos de menor capacidade econômico-financeira ou por aqueles que se sentem desencorajados de submeter suas querelas ao Poder Judiciário.

Perpetuada essa situação se estabelecerá um contexto social conturbado, com um manancial de insatisfações latente, pronto a eclodir em violentas reações sociais, com o comprometimento da ordem jurídica.

Anote-se que o percentual de conflitos trazidos ao Poder Judiciário não é significativo frente às inúmeras ofensas ao direito do indivíduo, perpetradas diuturnamente, o que leva a concluir que, além das desistências e renúncias, como acima apontado, inúmeros casos são resolvidos através da autotutela ou por formas alternativas de “justiça”, o que demonstra de forma cabal o afastamento da sociedade do Poder Judiciário.

Kazuo Watanabe[7], analisando a questão, adverte que o afastamento forçado dos conflitos do Poder Judiciário, cria a “litigiosidade contida” o que representa “um ingrediente a mais na panela de pressão social.” . Enfatiza: “Quantos de nós não conhecemos casos de parentes, amigos, conhecidos, e de nós mesmos, em que direitos foram simplesmente renunciados?”

Impõe-se a reversão do quadro.

Com efeito, depreende-se, como essência do problema, na atualidade, que o fenômeno processual clássico, como instrumento de realização da Justiça, marcado por inúmeros rituais e solenidades, lento, oneroso, se apresenta insuficiente e inoperante para fazer face aos anseios da população, suportando o processo um notável desprestígio.

Kazuo Watanabe[8] leciona que, nos países em que há fácil acesso à Justiça, a expressão “eu te processo” tem efeito imediato, vez que repercutirá na esfera do ofensor, ao contrário, dos países, como o Brasil, em que é afunilado o acesso ao Judiciário, em que na presença de conflito o ofensor, ou o devedor proclama em tom de desprezo “vai procurar seus direitos”, na certeza de que o lesado, em razão das inúmeras dificuldades que enfrentará, não reunirá forças para sequer iniciar a batalha.

Nessa esteira de pensamentos, os ordenamentos jurídicos dentro de uma visão progressista se empenham em atender às finalidades do processo, a saber: dar razão a quem tem, retornando o lesado, ao statu quo ante, com a composição do seu patrimônio. Mas, para que tal se dê, com proveito para o lesado, é necessário que a prestação jurisdicional seja provida em tempo hábil, o que significa dizer que seja proferida com celeridade para que seja efetiva.

Sublinhe-se que, sobre o tema, a Convenção Européia de Proteção das Liberdades Fundamentais pontuou que o Estado que não presta uma resposta jurisdicional em tempo útil ao interesse do postulante, na verdade, mantém uma justiça inacessível.

Lecionam, ainda, Cappelletti e Garth[9]:

“A nova atitude em relação à justiça reflete o que o Professor Adolf Homburger chamou de ´uma mudança radical na hierarquia de valores servida pelo processo civil`

A preocupação fundamental é, cada vez mais, com a ´justiça social`, isto é, com a busca de procedimentos que sejam conducentes à proteção dos direitos das pessoas comuns…

Um sistema destinado a servir às pessoas comuns, tanto como autores, quanto como réus, deve ser caracterizado pelos baixos custos, informalidade e rapidez, por julgadores ativos e pela utilização de conhecimentos técnicos bem como jurídicos. Ele deve ter, ademais, a capacidade de lidar com litígios que envolvam relacionamentos permanentes e complexos, como entre locadores e locatários…

(…)

O que é novo no esforço recente, no entanto, é a tentativa, em larga escala, de dar direitos efetivos aos despossuídos contra os economicamente poderosos: a pressão, sem precedentes, para confrontar e atacar as barreiras reais enfrentadas pelos indivíduos. Verificou-se ser necessário mais do que a criação de cortes especializadas: É preciso também cogitar de novos enfoques do processo civil”.

O debate que se travou, em esfera mundial, sobre a morosidade e os desvirtuamentos causados pela decisão tardia, impôs o surgimento e a adoção de um novo princípio processual – a efetividade – voltado ao cumprimento da jurisdição por meio do processo, com uma resposta tempestiva, adequada e justa.

Dentro desse enfoque o Brasil, ao lado de outros países, buscou formas para solucionar o impasse criando estratégias para minorá-lo, reduzi-lo, adotando tutelas diferenciadas para escapar ao modelo clássico tal qual fora instituído. O procedimento cautelar, a antecipação da tutela e o aumento do rol dos títulos executivos, técnicas de sumarização do processo, entretanto, não se mostraram capazes de ultrapassar os obstáculos do acesso à Justiça, que continuava entravado.

Weber M. Batista e Luiz Fux[10], lecionando sobre a matéria, apontam que a utilização da tutela diferenciada não atacava o cerne da questão. Destacam:

“Informado pelo princípio moderno da “efetividade”, impunha-se ao processo desembaraçar-se de suas amarras, apertadas pelo liberalismo do século das luzes que entrevia o Estado- juiz como um fragmento do Estado- absolutista e, por isso, também deveria integrar com nova feição, o laissez faire. Observou-se, assim, que o ritualismo processual, antes de ser uma garantia para as partes, visava ao ‘engessamento’ do Poder Judiciário com o escopo de limitá-lo ao seu atuar; técnica político-jurídica responsável pela valorização do elemento ‘declaratório’ da sentença como forma única de jurisdição e da impossibilidade de o próprio juiz da cognição executar as suas decisões na mesma relação processual. Os magistrados deveriam representar apenas ‘a boca da lei’ segundo um dos mais célebres filósofos do Iluminismo (…)

Destarte, prosperam, sob a inspiração da efetividade, movimentos de deformalização do direito e do processo em geral, extirpando-lhe solenidades e tecnicismos obstativos do acesso à justiça…

Sob essa última ótica, desenvolveu-se aqui e alhures uma nova percepção desse comando constitucional, segundo o qual o monopólio da jurisdição implica criar condições efetivas de um acesso ao Judiciário, onde a garantia maior não seduza apenas enquanto letra morta e fria, relaxada no texto constitucional.”

A desatenção estatal para as causas de pequeno porte fez com que um grande contingente de consumidores, profissionais liberais e locatários, como nós, dentre outros, ficasse à margem e à míngua da proteção jurídica necessária, subjugados a relegar e a sufocar direitos legítimos.

Dentro desse contexto de expectativas, de carências e de dificuldades, em consonância com as aspirações modernas de persecução da igualdade social, de proteção dos direitos coletivos, difusos e dos consumidores, o legislador, em nosso Estado, introduziu no ordenamento jurídico brasileiro, o sistema dos Juizados Especiais de Pequenas Causas, integrante da Justiça Ordinária, com a edição da Lei Federal nº 7244 de 7.11.1984, tendo por finalidade a solução dos conflitos de reduzido valor material, em matéria cível.

A Lei nº 7244/84 criou condições básicas para o efetivo exercício do direito de postular em Juízo, em observância a um dos pilares básicos da democracia – a proteção judiciária dos direitos individuais. O legislador, com a medida, deu um passo decisivo para a profunda modificação na sistemática processual adotada até então, possibilitando a introdução no sistema jurídico brasileiro de um procedimento simplificado, gratuito.

Com uma legislação na defesa da sociedade, o causador do dano passará a cumprir, de forma espontânea, as obrigações assumidas, uma vez que, em mora ou inadimplente, responderá judicialmente.

Discorre Wander Paulo Marotta Moreira[11] sobre a Lei do Juizado Especial de Pequenas Causas:

“Anteriormente à edição da Constituição de 1988, a Lei nº 7244/84 disciplinava, com inegável êxito e notórias deficiências, o Juizado Especial de Pequenas Causas, que foi um instrumento de vanguarda no novo relacionamento entre o Judiciário e a sociedade, tão eficiente e de tal monta que ousamos afirmar que essa lei quebrou o caráter aristocrático do Judiciário. Quebrou o ritual, quebrou as solenidades, permitiu o ingresso, no “ templo”, dos excluídos e dos marginalizados. E o que é melhor: fora do âmbito criminal, onde sempre tiveram lugar assegurado”.

Ressalta o autor como ponto de deficiência do diploma legal a execução do julgado que era remetida ao juízo comum.

Destaque-se que os Juizados Especiais têm sua origem nos países da comom law como reflexo da premência em dar uma maior agilidade aos procedimentos judiciais.

Diz Piquet Carneiro[12] que os Juizados Especiais de Pequenas Causas, no Brasil, não serão “a panacéia que resolverá os problemas de acesso ao judiciário. Há muito mais para ser feito. O Código de Processo Civil necessita ser escoimado de vários anacronismos, a ação sumaríssima pode ser agilizada e deve-se cogitar de previsão legal para a postulação coletiva.”

Na mesma rota de análise levanta-se Calmon de Passos apontando que, na verdade, o problema do acesso à Justiça é uma ponta do iceberg que aparece na superfície.

A desigualdade social, a concentração de renda, a economia de mercado, o desemprego, a fome, a injusta divisão de terras, os altos impostos, o achatamento salarial, frutos do liberalismo econômico implantado, são, na realidade, o pano de fundo da grave conjuntura que enfrenta o Brasil.

Recorto lição de J.J. Calmon de Passos[13]:

“ no bojo dessas lutas, a luta por uma melhor justiça se faz presente, mas a luta maior, a grande luta é antes por um estado de coisas que possibilite a própria Justiça. Sem esta a outra é uma superfluidade, porque se resumirá sempre a um mero instrumento custoso de quizilas dos que podem tentar resolver seus desentendimentos de superfície, em meio ao grande conflito social ainda não solucionado”.

A Constituição Federal de 05.10.1988, na garantia do acesso à Justiça, instituiu os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, (art. 98, I), determinando sua criação pelo Distrito Federal e pelos Estados, em seis meses, providos de Juízes togados e leigos. À legislação estadual fica reservada a formulação dos procedimentos a serem adotados de acordo com a especificidade de cada região territorial, no âmbito da legislação concorrente (art. 24, XI, § § 1º e 2º, da Constituição Federal).

A Lei Federal nº 9099, de 26.09.1995, que disciplina o procedimento em sede de Juizados Especiais Cíveis e Criminais, por seu art 97, revogou expressamente a Lei nº 7244/84.

O novo diploma legal traz um procedimento inspirado pelos princípios da oralidade, simplicidade, informalidade e economia processual (art. 2º); prioriza a conciliação das partes (art. 2º, in fine); evita a nulidade de atos processuais que não induzam prejuízo às partes (art. 13 § 1º); aproxima as partes do julgador (art 9º}; amplia os poderes do Juiz que deixa de ser mero espectador, repetidor de regras, para assumir uma posição ativa na condução do processo, na busca de provas, suprindo as carências das partes hipossuficientes (art. 5º), autor ou réu; possibilita a presença do postulante em Juízo sem assistência de advogado, nas causas que não excedam a 20 ( vinte) salários mínimos; adota técnica de desestímulo às impugnações judiciais com a dispensa do pagamento das despesas do processo quando não se insurgir a parte contra a decisão terminativa, exoneração que alcança a todos os postulantes, beneficiários da justiça gratuita ou não.

Exaltam Joel Dias Figueira Júnior e Maurício Antônio Ribeiro Lopes[14] :

“Estamos diante não apenas de um novo sistema apresentado ao mundo jurídico. Esta Lei representa muito mais do que isso, à medida que significa o revigoramento da legitimação do Poder Judiciário perante o povo brasileiro e a reestruturação (ou verdadeira revolução) de nossa cultura jurídica, porquanto saímos de um mecanismo (entravado em seu funcionamento mais elementar e desacreditado pelo cidadão) de soluções autoritárias dos conflitos intersubjetivos (decisão judicial da lide) para adentrar a órbita da composição amigável, como forma alternativa de prestação da tutela pelo Estado-Juiz”.

No Estado do Rio de Janeiro, foram criados os Juizados Especiais Cíveis e Criminais pela Lei nº 2556/96, implantados os novos órgãos como unidades jurisdicionais autônomas, dotadas de serventias próprias e dos respectivos cargos de Juízes de Direito e demais auxiliares da Justiça, com competência para conhecer e julgar, em matéria cível, todas as espécies de ação, vale dizer, condenatórias, constitutivas, declaratórias, possessórias (até o valor máximo de quarenta salários mínimos), executivas, mandamentais sem prejuízo da concessão de antecipação da tutela de natureza cautelar ou satisfativa e em sede criminal, das infrações penais de menor potencial ofensivo.

Na Capital do Estado foram criados 30 (trinta) Juizados Especiais Cíveis e 30 (trinta) Juizados Especiais Criminais, vinculados, cada um, às respectivas Regiões Administrativas; criados, ainda, 32 (trinta e dois) Juizados Especiais Cíveis e Criminais nas Comarcas de 2 ª entrância do Estado e Juizados Especiais Adjuntos Cíveis e Criminais de modo a abranger todo o Estado do Rio de Janeiro.

Destaque-se que, para atender à demanda reprimida, foram transformadas dez Varas Criminais em Juizados Especiais, com competência exclusiva para feitos referentes a infrações de menor potencial ofensivo.

Para atuar como órgão de revisão foram instituídas pela Resolução 06/99, de 29.04.2012, publicada no DORJ de 04.05.2012, originária do Conselho da Magistratura, duas Turmas Recursais, uma cível e outra criminal, com competência para julgamento dos mandados de segurança, habeas corpus e dos recursos das decisões proferidas pelos Juizados Especiais de todas as Comarcas, à exceção daquelas mencionadas no art. 2º da Resolução, com atuação nas Comarcas da Capital, de Campos e de Volta Redonda, integradas por quatro Juízes togados titulares, de primeiro grau de jurisdição, preferencialmente em exercício nos Juizados Especiais.

A Lei Estadual nº 3812, de 16.04.02, alterou a Lei 2556, de 21.05.96, que instituiu os Juizados Especiais Cíveis e Criminais em nosso Estado e dispôs sobre sua organização, composição e competência, além de criar 13 (treze) Juizados Especiais Cíveis e 7 (sete) Juizados Especiais Criminais na Comarca da Capital. (em anexo).

Explana Ricardo Cunha Chimenti[15] que no Estado de São Paulo os órgãos recursais foram disciplinados nos arts. 84 da Constituição Estadual, 1º da Lei Estadual nº 5143/86 e no Provimento nº 511/94. O Projeto de Lei Complementar nº 27/97 que trata das Turmas Recursais, no Capítulo IV, dita que serão compostas por três Juízes vitalícios de primeiro grau de jurisdição, ocorrendo as Sessões nas Comarcas sede de cada circunscrição.

IV – RECURSO – ETIMOLOGIA E DEFINIÇÃO

A palavra recurso origina-se do termo latino – recursus – que contém a idéia de voltar atrás, de retroagir. Encontra-se, na gênese do vocábulo, a essência do instituto como via impugnativa para tornar sem efeito uma decisão que, por estar em desacordo com o interesse de uma ou de ambas as partes, enseja uma nova investida para alcançar outra resposta que se apresente mais coerente com o objetivo do recorrente que pode ser integrante da relação processual ou um terceiro, estranho à relação de direito material, no caso de substituição processual.

Na linguagem processual, recorrer significa comunicar a vontade de que a questão discutida, no todo, ou em parte, continue em exame, não possibilitando o passar em julgado. O direito de recorrer é subjetivo, é uma faculdade.

O Código de Processo Civil não define o termo “recurso”, mas, examinando-se suas espécies, extrai-se que o seu uso não dá margem à instauração de novo processo, senão que produz a extensão do processo já fluente.

Para Mendonça Lima[16], pode se classificar o recurso em sentido amplo e restrito:

“recurso é o meio, dentro da mesma relação processual, de que se pode servir a parte vencida em sua pretensão ou quem se julgue prejudicado, para obter a anulação ou reforma, parcial ou total, de uma decisão”.

(…)

“provoque a formação de nova relação processual ou a reabertura de novo processo, a teor dos arts. 262/264 do Código de Processo Civil, como a ação rescisória, os embargos de terceiro, o mandado de segurança, o habeas corpus, e, se ainda admitida a correição parcial (esses três se bem que apenas em certos casos), aí, então, haverá recurso dentro do sentido amplo, mas não no sentido restrito”.

Define Pontes de Miranda[17]:

“em sentido lato, recorrer significa comunicar vontade de que o feito, ou parte do feito, continue conhecido, não se tendo, portanto, como definitiva a cognição incompleta, ou completa, que se opera. Não supõe devolução necessária à superior instância. Há recursos no mesmo plano funcional da organização judiciária (…) tecnicamente, o recurso apenas retira o passar em julgado, formalmente, a resolução judicial, enquanto não se procede a novo exame do negócio ou do seu tratamento: a prestação jurisdicional de que o juiz fez oblação (não entregou) admite nova comunicação de vontade da parte ou do interessado, pelo fundamento de que não satisfez e sob a alegação de ser injusta ou infratora de regras do direito processual. (…) As impugnações da sentença, ações ou recursos, no direito brasileiro, que os herdou do direito lusitano e pouco mais fez do que os retocar, contém estratificações romanas, germânicas, canônicas, a que outras, de reflexão ou recepção recente, se sobrepuserem”.

José Carlos Barbosa Moreira[18] conceitua recurso, como:


“o remédio voluntário idôneo a ensejar, dentro do mesmo processo, a reforma, a invalidação, o esclarecimento ou a integração de decisão judicial que se impugna. Atente-se, bem: dentro do mesmo processo, não necessariamente dos mesmos autos. A interposição do agravo por instrumento dá lugar à formação de autos apartados; bifurca-se o procedimento, mas o processo permanece uno, com a peculiaridade de pender, simultaneamente, no primeiro e no primeiro e no segundo grau de jurisdição”.

Destaca o eminente professor em relação à natureza jurídica do recurso que:

“a maior parte da doutrina prefere conceituar o poder de recorrer como simples aspecto, elemento, modalidade ou extensão do próprio direito de ação exercido no processo. Não obsta a esse entendimento a interponibilidade de recurso pelo réu: tenha-se em mente o caráter bilateral da ação.”.

A finalidade do recurso extrai-se, tem correspondência com o interesse das partes em ver resguardado o seu direito e com o interesse geral do Estado para que se realize o Direito e se concretize a Justiça. Vale dizer, o recurso evita a interpretação individual dos textos legais e demonstra às partes a vontade do Estado de, através de Juizes e Tribunais, regrar a sociedade com Justiça e aplicar com exatidão o Direito, expurgando, da decisão atacada, vícios e erros.

V – O RECURSO COMO GARANTIA DE UMA DECISÃO JUSTA

A propensão de buscar um segundo julgamento, consoante entendimento doutrinário unânime, se acha arraigada no espírito humano como uma idéia inata e irresistível de salvaguardar um direito ameaçado por uma decisão.

Leciona João Bonumá[19] que o sentimento de que a decisão é justa e que qualquer demonstração de inconformismo importa em menosprezo à autoridade e à justiça do julgado"preponderou na origem do processo, quando a administração da justiça era função majestática de um soberano, de um rei, de um chefe de tribo, ou quando distribuída pelo próprio povo reunido em comícios, ou, ainda, quando resultava de uma jurisdição divina. Em tais condições, era bem natural que a sentença fosse considerada, por sua própria natureza ou em razão de sua origem, inatacável e irrecorrível. Ao vencido não convencido nada mais restava do que sopitar a revolta contra a decisão que lhe era contrária. Impossível lhe era impugná-la, não só porque não havia autoridade superior a quem reclamar, como também porque uma semelhante reclamação significava rebeldia contra o soberano, traição ao povo, ou atentado contra a divindade.

Foi preciso que a administração da justiça se atribuísse a juízes agindo por delegação do soberano ou do poder público, para que se esboçasse a possibilidade de sua discussão . Quer dizer, o uso dos recursos somente se tornou factível, como um ataque à justiça ou legalidade da sentença, ou como uma queixa pessoal contra os julgadores, quando a função de julgar foi conferida a juízes integrados nos quadros da administração pública e tendo acima de si, hierarquicamente, um poder mais alto, ao qual o recurso pudesse ser endereçado".

Na França, os desmandos perpetrados pelos soberanos absolutistas mantiveram acesa a desconfiança dos ideólogos da Revolução em relação às decisões judiciais, instrumentos utilizados em larga escala pela realeza para o cometimento dos mais hediondos crimes, provocando, como conseqüência, uma grande reação negativa contra a o poder do Estado-Juiz e a dualidade de graus. Os revolucionários de 1789 buscavam extirpar qualquer resquício de autoritarismo, de arbitrariedade, o que a seu ver impunha controle rígido e contínuo da atuação do Juiz.

Montesquieu defendia que, em razão de tendência natural, o homem abusa do poder que lhe é confiado, devendo ter sua autoridade controlada e repartida o que, na prática, em relação ao Poder Judiciário, reduzia a atuação dos Magistrados a uma mera atividade de dizer a lei, aplicando uma verdade preexistente, participando das decisões de forma imparcial e distante, ao abrigo de instituições impessoais.

Os ataques contra o instituto recursório na França, visando suprimi-lo, contudo, não lograram êxito na esfera mundial, vez que representavam um retrocesso aos direitos individuais e à liberdade, dogmas defendidos e garantidos nas Cartas constitucionais, com sangue, pelo próprio povo francês.

Montesquieu, citado por Mendonça Lima[20], advertia que a possibilidade de apenas um julgamento não podia ter lugar senão no governo despótico, podendo ser extraídos da história romana os abusos cometidos pelo Juiz único.

Conforme se extrai de suas origens mais remotas, o sistema recursal pressupõe dois graus de jurisdição, consagrado universalmente, à exceção do sistema turco que acolheu o grau único de jurisdição, excluídos os recursos ordinários.

Os sistemas jurídicos mais avançados têm procurado garantir a revisão do julgado, por entenderem que uma decisão judicial poderá estampar uma maior adequação ao direito, se analisada uma segunda vez por Juízes de grau hierárquico superior, com maior experiência judicante, além de poder servir como meio inibitório do abuso de poder pelo julgador de primeira instância.

O recurso, por si só, na verdade, não assegura a solução mais justa e legal para os casos levados aos Tribunais mas, com o debate pelo Colegiado, a probabilidade de se tornar definitiva uma decisão injusta é, sabidamente, menor.

No caminhar da ciência processualística, Carneluti defende que o recurso permite um segundo julgamento devendo ser adotado como pressuposto o exame anterior, resultando a sucessão de exames num último mais preciso, posição doutrinária adotada pela maioria dos Estados modernos.

A par da certeza da decisão judicial, em conformidade com o Direito, preocupação que a todos atormenta, os ordenamentos jurídicos enfrentam, ainda, uma outra questão de difícil solução: prestar a jurisdição no menor tempo possível sem que reste prejudicada, em contrapartida, a qualidade.

Evidencia-se um antagonismo entre os dois princípios: a necessidade de justiça rápida e a necessidade de certeza. Há necessidade de compatibilizá-los.

Indaga-se:

O processo civil deve buscar a segurança e a certeza, ou deve priorizar a rapidez com probabilidade de justiça?

Tornar inexpugnáveis as decisões proferidas pelo julgador monocrático, atrai, em um primeiro momento, porque atende à segurança, entretanto, em análise mais aprofundada, verifica-se que representa um risco à Justiça, face à possibilidade de arbitrariedade ou equívoco pelo Juiz, que é falível como ser humano.

Em sentido inverso, disponibilizar às partes incontáveis meios de impugnação, da mesma forma é prejudicial, a uma, porque gera um excesso de atividade para os Tribunais; a duas, porque significa um enorme gasto de tempo e numerário para os litigantes; e a três, porque mantém indefinida a situação das partes, significando, em cômputo final, um prejuízo de mesma monta que a abolição da via recursal.

Dentro desse debate a concepção contemporânea tem buscado a limitação dos recursos sem negar o Estado moderno, contudo, a prestação jurisdicional que lhe é devida.

Os principais ordenamentos jurídicos têm aprimorado o sistema recursal estabelecendo o número de graus a ser ofertado, procurando evitar a possibilidade de manejo dos meios de impugnação ad infinitum, adotando uma posição intermediária. Em regra, são previstos remédios que atendam à contrariedade do vencido, dentro de certas hipóteses e oportunidades de uso, prodigalizados ou comprimidos em decorrência da política legislativa de cada país. Na verdade, a proliferação dos meios recursórios não se coaduna com a moderna processualística, principalmente no que se refere à interposição de recursos contra decisões interlocutórias, porque quebram o desenvolvimento processual.

No sistema brasileiro, o recurso não impõe em termos absolutos a devolução da matéria ao grau superior vez que há também a previsão de recursos no mesmo plano funcional da organização judiciária, como no caso de embargos e do agravo. Analisando o esquema recursal identificamos a existência de um procedimento de retratação, perante o mesmo órgão julgador e um procedimento de reforma, perante um órgão superior, remanescendo alguns recursos a partir do segundo grau tão somente como espaço para revisão de questões restritas.

O reexame, no Brasil, acontece somente em dois níveis, não se caracterizando o recurso extraordinário como um recurso especial, um terceiro grau de jurisdição, como pretendem alguns, uma vez que contém como campo de abrangência o exame de questões específicas, não se dando ad integrum a devolução da matéria..

Tradicionalmente, os remédios usados contra decisões judiciais dividem-se em duas classes fundamentais – a dos recursos e a das ações autônomas de impugnação – distinguindo-se por dirigirem-se os recursos contra decisões em que não tenha se formado a res iudicata, com efeito de impedi-la, e as ações autônomas de impugnação, contra decisões já transitadas em julgado.

No direito processual civil pátrio não é fator essencial que o recurso seja interposto para o mesmo ou outro juízo, importando, outrossim, a finalidade primordial do recorrente: a anulação ou a reforma da decisão, ainda que parcial.

É importante acentuar que se apresentam duas possibilidades de se discutir amplamente a decisão, nos seus aspectos de fato e de direito – apelação, agravos e embargos – e aspecto de direito – especial, extraordinário e embargos por divergências jurisprudenciais – no Supremo Tribunal Federal.

Na análise do tema, sublinhe-se os próprios adversários da existência dos recursos e, conseqüentemente, do segundo grau de jurisdição, reconhecem que a instituição foi acolhida pela maioria dos ordenamentos jurídicos contemporâneos. Mortara, autoridade que se ergueu contra a dualidade de graus, profetizando o desaparecimento da apelação, não pôde deixar de afirmar que se tornara um instituto universal.

No cenário internacional vê-se que países como a Itália, a Alemanha, a Inglaterra, a França e a Espanha, dentre outros, padecem sob a força do binômio segurança/certeza – buscando soluções para escapar ao acúmulo de recursos que representa um entrave à manutenção da qualidade do ofício nos Tribunais.

Frédérique Ferrand[21] estabelece um paralelo entre as Altas Jurisdições francesa e alemã, a partir da análise dos recursos de cassação e de revisão, apontando suas influências, semelhanças e diferenças. Destaca a autora como principal problema enfrentado pelas Altas Cortes o grande volume de processos que lhes é submetido, restringindo a Alemanha o acesso de modo mais efetivo do que a França, que prioriza, ao contrário, uma maior abrangência no conhecimento das demandas que são levadas a Juízo, com vistas a espelhar a jurisprudência a realidade jurídica do país.

Impõe-se uma questão.

É mais conveniente afunilar com rigor o acesso às Cortes, adotando critérios de valor, mesmo que em detrimento da apreciação de uma maior gama de matérias, como no caso da Alemanha, ou deve ser aberto o leque para abranger hipóteses mais variadas com vistas à jurisprudência representar o verdadeiro momento jurídico do país, favorecendo o efetivo desenvolvimento do Direito, mesmo que isso represente uma maior lentidão, como no caso da França?

É importante que se reconheça que procurar restringir o acesso do sucumbente a um outro grau de jurisdição, mantendo um controle mais rígido, pode ter como conseqüência que questões de relevância vital para a sociedade não sejam levadas às Cortes Supremas, além de possibilitar a arbitrariedade dos julgadores, semeando a insegurança nos jurisdicionados. Não podemos esquecer que o instituto recursório sempre representou um papel importante como um dos meios mais eficientes contra a tirania dos governantes.

Destarte, conclui-se que é premente estabelecer um ponto de equilíbrio entre a conveniência da rápida composição do litígio, para o pronto restabelecimento da paz social, e a possibilidade de manejo dos recursos pelos inconformados, para viabilizar a prestação da tutela jurisdicional pelo Poder Judiciário, de forma eficiente e segura.

É salutar que se trace um caminho que não priorize, além do razoável, a segurança ou a justiça.

No Brasil, a Constituição da República de 1988 estabelece os contornos e os limites do duplo grau de jurisdição, fixando parâmetros para que se efetive o binômio segurança/justiça (artigo 102, II, III e artigo 121, § 3º).

Nelson Nery Junior[22], ao discorrer sobre os recursos que não compõem o rol do CPC pontua que o artigo 22, I, da Constituição Federal, fixa a competência da União para legislar, exclusivamente, sobre direito processual, podendo complementar e alterar o sistema vigente, através de leis extravagantes, adequando-o às necessidades da sociedade. Tratando-se de matéria processual, enfatiza, somente lei federal e não estadual poderá regular a questão, vez que se trata de processo e não de procedimento, não se encartando o tema no art. 24, XI, da CF/88.

O artigo 496, do Código de Processo Civil, traz a indicação dos recursos previstos no âmbito cível, havendo, entretanto, no próprio diploma legal, outras formas diversas daquelas elencadas, citando-se, exemplificativamente, o agravo previsto no artigo 532 e o agravo disciplinado no § 1º do artigo 557 (numeração equivocada).

Existem, ainda, recursos criados por leis especiais, como a Lei de Execução Fiscal (Lei nº 6830/80); a Lei do Mandado de Segurança (Lei nº 1533/51); o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8069/90) e a Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais ( Lei 9099/95), sendo certo que os recursos instituídos integram o rol do artigo 496, do CPC, sem consignar ofensa ao princípio da taxatividade que inspira o sistema recursal do processo civil.

A Lei 9099/95, atendendo ao comando imperativo do artigo 24, X, da CF/88, instituiu um novo sistema processual para disciplinar as demandas propostas perante os Juizados Especiais Cíveis e Criminais com previsão, em sede recursal, do manejo de Recurso “Inominado” e Embargos de Declaração.

VI – BREVE SÍNTESE HISTÓRICA

Não é fácil a tarefa de apresentar um resumo histórico dos meios de impugnação, sem incorrer em falhas ou omissões face à extensão da matéria, do que desde já me penitencio. No entanto, procurarei desenvolver o intento para identificar os recursos nas sociedades que os conheceram.

Com fundamento em lições de Mendonça Lima,[23] verifica-se que o recurso tem origem em épocas remotas extraindo-se da Bíblia[24] situações que guardam semelhança com a impugnação, destacando-se, para exemplificar, a narrativa no Livro Números, capítulo 11, versículos 16 e 17:

"Junta-me setenta homens entre os anciãos de Israel, que sabes serem anciãos do povo e tenham autoridade sobre êle. Conduze-os à Tenda de Reunião, onde estarão contigo. Então descerei e ali falarei contigo. Tomarei do espírito que está em ti e o derramarei sobre eles, para que possam levar contigo a carga do povo e não estejas mais sozinho”.

Dados concretos mostram a existência de uma hierarquia judiciária entre o povo egípcio, com vários graus, previstos recursos de uns para outros Juízes, com decisão final proferida por uma Corte Suprema, ou Conselho dos Trinta, integrada por 30 membros, escolhidos pelas cidades de Mênfis, Tebas e Heliópolis, principais centros do país.

Na Grécia, em Atenas e Esparta, os cidadãos podiam apelar das sentenças proferidas pelos tribunais para a assembléia do povo.

No direito romano há divergência entre os autores sobre a presença do apelo no início da sociedade, negando uns a existência da apelação como meio impugnativo padrão, admitindo outros que eram utilizados mecanismos, com formas diferenciadas, que alcançavam efeito semelhante ao da apelação.

Defende Mendonça Lima que o processo, com seu caráter privado, era decidido em um único grau, sem previsão de recurso, não se configurando a restitutio in integrum como uma forma de impugnação, visto que somente era cabível em hipóteses excepcionais e não possibilitava a reforma da sentença, mas, sim, sua cassação, com o restabelecimento da situação anterior. Ressalta que, se ampliado o conceito de recurso, identificam-se meios que possibilitam a sustação dos efeitos da sentença: a ação de nulidade, a intercessio – admitida contra os decreta dos magistrados – que autorizava a um tribuno ou Juiz do mesmo grau ou superior àquele que proferiu a sentença, após solicitação, impedir os efeitos da decisão, e a restitutio in integrum , ainda que essa em situações restritas, como mencionado.

No período republicano, não era aconselhável voltar-se contra uma decisão, mesmo havendo previsão para o manejo da ação de nulidade com o fim de declarar a nulidade ou inexistência do decisum, representando, em última análise, que toda sentença resultava em res judicata, impondo-se como lei para as partes. Havia, contudo, a possibilidade de serem sustados os efeitos da decisão de forma transversa por intermédio de pleito formulado a um tribuno (tribunus plebis) ou a qualquer outro magistrado, (magistratus populi romani) para que usasse do direito de veto – a appellare (magistratum).

É importante destacar-se que a appellare do período republicano não se confunde com a appellatio originada no Império, em tempos posteriores, uma vez que a appellare detinha índole meramente cassatória, não visando a revisão ou a reforma da decisão impugnada. A decisão era cassada sem que outra fosse proferida.

Nesse período, era utilizada a revocatio in duplum como mecanismo de defesa do réu com fundamento em vício de forma ou de fundo, visando a declaração de nulidade do julgado, prevista pena em dobro em caso de sucumbência.

Entende Mendonça Lima que no período republicano já se encontrava delineada a possibilidade de revisão da sentença.

Na época imperial um novo instituto – a provocatio que permitia ao vencido suscitar um novo julgamento ao Imperador, possibilitada a manutenção ou a reforma da sentença.

O instituto foi posteriormente denominado de appellatio, quando do desaparecimento do instituto primitivo. A partir de então a sentença não mais representava res judicata uma vez que a appellatio permitia que nova decisão fosse proferida diferentemente da appellatio primitiva. Há notícias de que cada manifestação judicial era apelável até alcançar o Imperador, correspondendo o número de graus de jurisdição ao número de julgadores. O poder de revisão atribuído apenas ao Imperador passou a ser exercido por determinados Juízes ou autoridades administrativas, tendo sido exercitado também pelo Senado.

A appellatio impedia a imutabilidade do julgado e foi regulamentada na época de Justiniano, assumindo as características que mantém até os tempos atuais. Funcionava o recurso como mecanismo para corrigir a injustiça e a ignorância dos magistrados, como assinalado por Ulpiano, cabendo o seu conhecimento ao prefeito da cidade e posteriormente ao Imperador. O uso da appellatio foi limitado pelo Imperador Justiniano a duas oportunidades, não havendo previsão para sua utilização contra sentença manifestamente nula. Nas Institutas, no Digesto e no Código há inúmeras referências a respeito da apelação.

Aponta Mendonça Lima que a appellatio introduziu no ordenamento jurídico romano uma nova categoria – a sentença apelável – ao lado da sentença válida e da sentença inexistente, o que significa dizer que a certeza do direito que anteriormente estava estampada na sentença passou a depender do transcurso dos prazos recursais ou do esgotamento de todas as instâncias. Enfatiza que, com a appellatio e outros mecanismos que surgiram, o direito romano alçou patamares elevados na garantia da justiça.

Com a invasão bárbara desapareceu o sistema recursal até então conhecido, pois as demandas eram solucionadas pelo próprio povo reunido em assembléias populares, a quem competia apreciar o fato e dizer o direito. Eventuais erros eram sanados pelo presidente da assembléia – Richter – adotada como decisão o entendimento dos representantes da comunidade. Não havendo autoridade superior à coletividade reunida, não apresentavam finalidade as impugnações.

Na Idade Média, em razão da supremacia política dos senhores feudais em relação ao rei, detendo os suseranos o direito de vida e de morte sobre seus vassalos, ditando as regras a vigorar em sua propriedade, não havia previsão de impugnação contra suas decisões que, se tornavam definitivas e inquestionáveis. Os reis, na tentativa de sustar a força e os privilégios dos suseranos e restringir seu poder, passaram a admitir os recursos de apelação e avocação, mecanismos que possibilitaram controlar a autoridade dos senhores de terras.

No período feudal distinguem-se como recurso característicos o “ juízo dos pares” em que na se argüia a justiça da decisão, mas era atacado diretamente o julgador e o “ duelo judiciário” que representava uma luta corporal do litigante contra o Juiz.

Montesquieu, conforme menção de Mendonça Lima[25], afirma que na França não era conhecida a apelação prevista no direito romano e canônico. Cita: “Consistia a apelação – diz o autor do Espírito das Leis – em um repto a combate singular, que devia concluir em sangue, e não um convite a uma polêmica de pena, que se introduziu mais tarde”.

Em posição contrária, Boncenne menciona que a referência a clamatores e reclamatores como litigantes em primeiro e segundo graus de jurisdição (clamare – pedir justiça e reclamare – pedir de novo) demonstram a existência de recurso no direito francês.

No direito espanhol a Lex Visigothorum previa a apelação, de uso ilimitado durante o Fuero Fuzgo, sendo o recurso conhecido e julgado pelos reis ou por Juízes com delegação do soberano. A Lei de Siete Partidas limitou a impugnação a duas oportunidades.

Com a mescla dos direitos germânico e romano, somada à influência do direito canônico que surgia foi restabelecido o sistema recursal para quaisquer causas, assumindo a apelação situação de relevo. Anote-se que o sistema canônico contribuiu efetivamente para o aperfeiçoamento das instituições processuais.

No direito português, fonte primeira do ordenamento brasileiro, o recurso de apelação não é identificado nas primeiras fases da monarquia, entretanto, se entendida a apelação como a desconformidade do vencido contra uma decisão, pode-se dizer que é notada sua presença desde os períodos iniciais da nação. Trata-se das queremias ou querimonias que constam nos Forais de D. Afonso III, passando para as Ordenações Afonsinas e posteriormente para as Manuelinas e Filipinas, irradiando-se pelo ordenamento luso-brasileiro.

A apelação era o recurso previsto contra sentença definitiva e interlocutória, não conhecido o agravo por ausência de finalidade, vindo o instituto a tomar feição nítida e regular nas Ordenações Afonsinas de 1446, quando restringido o uso da apelação, face o abuso no direito de apelar. Nessas Ordenações estavam previstos a apelação e o agravo de instrumento, não possuindo os embargos caráter recursal.

Nas Ordenações Manuelinas do século XVI, o sistema recursal tomou contornos mais nítidos, mantidos a apelação e o agravo de instrumento, introduzidos o agravo de petição e o no auto do processo não se configurando ainda os embargos de declaração como via de impugnação.

Nas Ordenações Filipinas de 1603, que tiveram importância extraordinária para o nosso Direito, estavam elencados os recursos: apelação, embargos, agravos, revista, recurso extraordinário, denominado “queixa imediata ao Príncipe”.

No Brasil vigoraram as Ordenações Filipinas mesmo após a desvinculação política de Portugal, em 1822, adotadas como lei brasileira pelo Decreto de 20 de outubro de 1823.

Em 25 de novembro de 1850 foi editado o Regulamento nº 737 para disciplinar o processo comercial, continuando as Ordenações Filipinas a reger a matéria processual civil.

O Regulamento nº 737 referia-se somente às causas comerciais admitindo como recursos na Parte 3ª, Título I, Capítulos I a IV os embargos, a apelação, a revista e o agravo (artigos 639 e seguintes). Pelo Decreto nº 763, de 19 de setembro de 1890, o Regulamento nº 737 passou a ser aplicável ao processo civil, enquanto os Estados não promulgassem seus próprios Códigos Civis, revogadas em definitivo as Ordenações Filipinas.

Em 1871, o Conselheiro Ribas foi encarregado pelo governo imperial de consolidar as Ordenações e as leis extravagantes promulgadas após a independência, adotada a “Consolidação Ribas” como lei processual civil por uma Resolução de 1876.

Menciona Mendonça Lima[26] que por representar a Consolidação Ribas uma obra doutrinária, com a exposição de teses do direito brasileiro e do romano, foi mantida a aplicação do Regulamento nº 737 em matéria processual cível.

Na Consolidação foi mantida a estrutura básica recursal do Regulamento nº 737 e, conseqüentemente, das Ordenações Filipinas, previstos os embargos, a apelação e a revista.

Ao Regulamento, sucederam os Códigos de Processo editados pelos Estados-Membros, a partir de 1905, primeiramente: 1) Estado do Pará – Decreto nº 1380, de 22.05.1905 – que previa embargos; apelação; agravos: de instrumento e petição; cartas testemunháveis e recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal; 2) Rio Grande do Sul – Lei nº 65, de 16.01.1908 – Código de Processo Civil e Comercial – que permitia: agravo de petição, surgindo o de instrumento posteriormente; carta testemunhável; apelação, todos com efeito suspensivo; 3) Bahia – Lei nº71121, de 21.08.1915 – Código de Processo, tratando de matéria cível, comercial e criminal prevendo em matéria cível os recursos: embargos, em primeira e segunda instância – embargos de aresto; apelação; agravos de petição e de instrumento; carta testemunhável; recurso extraordinário, admitida a apelação ex officio em casos específicos; 4) Rio de Janeiro – Lei nº1580, de 20.01.1919, previa os recursos: apelação, agravo de petição em instrumento e embargos a sentença ou a acórdão; 5) Paraná – Lei nº915 de 23.02.1920 – Código de Processo Civil e Comercial, estatuía como recursos: embargos de declaração em primeira e segunda instância, apelação; inclusive ex officio; agravo nos autos e em separado; recurso extraordinário; 6) Minas Gerais – Lei nº 1830, de 07.07.1922 com previsão de embargos em primeira e segunda instância; apelação, também a ex officio; agravos de petição e instrumento e recurso extraordinário; 7) Distrito Federal – Lei nº 16752, de 31.12.1924 – Código de Processo Civil e Comercial – estatui os recursos: apelação, embargos, não previstos para primeira instância, agravos de petição e instrumento, carta testemunhável, revista; recurso extraordinário; 8) São Paulo – Lei nº 2421, de 14.01.1930 – Código de Processo Civil e Comercial – último diploma regional a ser editado, prevendo: agravo de instrumento e petição; revista; carta testemunhável e recurso ex officio.

Pontue-se que os Códigos Estaduais mantiveram-se, na quase totalidade, fiéis ao Regulamento n º 737, não progredindo o direito processual brasileiro. Ressalte-se a uniformidade dos Códigos Estaduais em vários pontos, no entanto, extrai-se que somente a apelação e os agravos estavam presentes em todos os diplomas.

Anote-se que em 1891 foi promulgada a Constituição da República, inspirada na Carta norte-americana.

Pela Constituição de 1934 foi determinada a unificação processual, reafirmada na Carta de 1937, promulgado o Código de Processo Civil de 1939.

O Código de 1939 admitia no art. 808 os recursos: apelação, também a ex officio, embargos de nulidade e infringentes; agravos de instrumento, de petição e no auto do processo, revista e extraordinário.

No governo Jânio Quadros, foi iniciado um trabalho de reformulação da legislação processual civil com a elaboração do Anteprojeto de Alfredo Buzaid em 1964, que serviu por vários anos como obra doutrinária. O Projeto foi aprovado nas duas Casas Legislativas e sancionado pelo Presidente da República, em 11 de janeiro de 1973, tornando-se a Lei nº 5869.

Arruda Alvim[27] diz que o Código de Processo Cível de 1973 traz as principais mudanças no sistema recursal, mantidos os recursos regulados em leis especiais, subsistindo a legislação dos Estados nas lacunas da legislação federal, adaptada ao diploma processual. Aponta que “a legislação dos Estados diz respeito às leis de organização judiciária e aos Regimentos Internos dos Tribunais”. Salienta que a Lei nº 6314, de 16 de dezembro de 1975 unificou os prazos recursais para o procedimento sumaríssimo, tendo em vista o procedimento ordinário.

O Código de Processo Civil de 1973, no art. 496, elenca os recursos: apelação; agravo retido nos autos ou por instrumento (art. 522); embargos infringentes; embargos de declaração; recurso ordinário; recurso especial; recurso extraordinário; embargos de divergência em recurso especial e em recurso extraordinário.

VII – O SISTEMA RECURSAL DA LEI 9099/95

A Lei 9099/95 ao instituir o procedimento deformalizado dos Juizados Especiais Cíveis não lavrou capítulo próprio para os recursos obedecendo à diretriz de tornar as decisões, nesse modelo judicial, imunes ao sistema de impugnações desenhado no CPC.

Analisando a Lei 9099/95 em confronto com a legislação pátria anterior, comentada na exposição, verificamos que o legislador infraconstitucional restringiu visivelmente o rol recursal da Lei dos Juizados, em nome dos princípios que a iluminam, com destaque para o princípio da celeridade, mandamento nuclear da Lei. Vale-se o novo diploma da técnica da limitação recursal tornando as decisões judiciais impugnáveis somente uma única vez, consoante nova tendência processual de tornar o Juiz o centro do processo admitida como exceção, a via recursal.

Entretanto, o legislador não negou à parte o direito de reafirmar sua tese em outra instância, não se curvando ao argumento da rapidez da prestação jurisdicional, restando, assim, observado o princípio do duplo grau de jurisdição

Pela Lei 9099/95, o vencido pode buscar a adequação do julgado, através da anulação, reforma ou integração da sentença, na hipótese de error in procedendo, error in judicando, omissão, obscuridade ou contradição, disciplinando os artigos 41 a 46 o recurso para atacar a sentença e os artigos 48 a 50 os embargos de declaração.

Joel Dias Figueira Júnior e Maurício Antônio Ribeiro Lopes[28] lecionam:

“em sede principiológica, poderíamos afirmar que o sistema prevê apenas dois tipos de recursos: o inominado (o qual achamos por bem chamar de apelação) e o de embargos de declaração, sem considerar que este último não contém natureza propriamente recursal, sendo uma espécie de incidente de complementação do julgado. Porém, a matéria está a exigir que façamos uma análise do fenômeno por um prisma mais amplo, isto é, considerando-os como meios de impugnação”.

Para apreciar e julgar as impugnações o art. 98, I, da Constituição Federal/88 instituiu o dever para os Estados de criar Turmas Recursais, integradas por Juizes de primeiro grau e o art 102, III, “a”, atribuiu competência ao Supremo Tribunal Federal para julgar recurso extraordinário, interposto contra decisão proferida pelo órgão revisor.

A – PRINCÍPIOS QUE INFORMAM OS RECURSOS

Não tem o trabalho, por objeto, enfocar os princípios referentes à teoria geral dos recursos atendo-se a análise àqueles inscritos na Lei 9099/95 visando a identificar a linha adotada pelo sistema, sendo feita menção aos princípios gerais quando houver correlação.

Um sistema processual apresenta princípios que lhe são específicos e outros que se refletem do ordenamento jurídico.

Joel Dias Figueira Junior e Maurício Antônio Ribeiro Lopes[29] conceituam os princípios processuais como o corpo de preceitos que dá legalidade ao processo, dividindo-os em fundamentais ou gerais e informativos, esses, a saber: o lógico, o jurídico, o político e o econômico, com conteúdo ideológico e nítida influência jurídica, social e econômica, por ultrapassarem a norma e encaminhar o processo para o seu escopo- a estabilidade das relações jurídicas. Os princípios gerais ou fundamentais lecionam, estão inscritos na Constituição de forma explícita ou não e na legislação infraconstitucional, servindo como parâmetro para as partes, o Juiz, o Ministério Público, os auxiliares da Justiça, a ação, o processo e o procedimento. Como princípios informativos, o lógico diz respeito à escolha de mecanismos eficientes que possibilitem a busca e a identificação da verdade, afastando equívocos; o princípio jurídico se refere “ à igualdade no processo e justiça na decisão”; o princípio político atua como diretriz para que o processo atinja o seu fim precípuo- a paz social- com o menor comprometimento dos litigantes e o princípio econômico visa tornar o processo acessível a todos.

Arruda Alvim[30] e Nelson Nery Júnior[31], comentando os princípios do direito processual civil, apresentam classificação diversa. Para os autores, os princípios informativos são verdades incontestes, de caráter estritamente técnico e lógico, sem conteúdo ideológico. O princípio lógico diz respeito à estrutura do processo, ao seu encadeamento, iniciando com a petição inicial, indicados fatos e fundamentos da pretensão, seguindo-se a resposta que expõe a tese do demandado, observado o art. 301, a audiência de instrução e julgamento, ato em que são colhidas as provas; o princípio jurídico impõe que o processo se submeta a um ordenamento jurídico pré-existente a validá-lo e, se alterado, quando em curso o processo, são respeitados os atos realizados; o princípio político guarda pertinência com as regras processuais tal como a que impõe ao Juiz exercer o seu ofício sem escusar-se de prover a tutela jurisdicional, mesmo perante a lacuna da lei. (art. 126 do CPC) e o princípio econômico visa desenvolver o processo no menor tempo com o maior rendimento dos atos, preservado o direito das partes, citando-se como exemplos a revelia e o julgamento antecipado da lide (arts. 319 e 330, II, do CPC). Quanto aos princípios fundamentais ou princípios gerais dos recursos, expõem que também são axiomas, no entanto, por deterem aspectos político/ideológico, são antagônicos, suscitando controvérsias na doutrina e na jurisprudência.

Ressalta Nelson Nery, citando o Prof. Baur, que a influência e a alteração sofridas pelos princípios, em razão da construção doutrinária e jurisprudencial, exigem sua dogmatização e preservação.

A Lei 9099/95, em observância ao texto constitucional de 1988, imprime um procedimento informado pelos princípios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, tendo como meta a abertura do Poder Judiciário à sociedade. Consubstanciam-se os princípios na postulação oral deduzida em Cartório diretamente pelo interessado, sem a assistência de advogado; na conciliação como forma prioritária de solução dos litígios; na apresentação de pedido contraposto pelo réu, na ocasião da resposta; na concentração dos atos em audiência una, momento em que serão decididas todas as questões discutidas e proferida a decisão, que apontará, de forma sucinta, os fatos relevantes, dispensado o relatório (art. 2º c/c art. 5º, XXXV, da CF).

É importante que se sublinhe que os princípios insculpidos na Lei Especial atuam como farol, refletindo-se sobre todo o procedimento, sobre a interpretação das normas processuais e a solução dos temas controvertidos, não afastando, entretanto, a incidência dos princípios fundamentais ou gerais do processo civil, quando em sintonia com o microssistema, vale dizer, o contraditório, a ampla defesa, a igualdade das partes, a congruência do pedido à resposta – o due process of law.

a.1. PRINCÍPIO DO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO

O princípio do duplo grau de jurisdição significa a possibilidade do reexame do julgamento garantido nos ordenamentos jurídicos em razão do inconformismo do vencido.

Corrente doutrinária minoritária defende que um julgamento em segundo grau pode, da mesma forma, conter erros ou injustiças, configurando-se a providência como inútil, em evidente contraposição ao princípio da economia processual. Ressalta que a reforma ou anulação de uma decisão gera dúvidas quanto à correta aplicação do Direito, criando incerteza nas relações jurídicas e desprestígio para o Poder Judiciário.

Nelson Nery Junior[32] discorrendo sobre a oposição francesa ao duplo grau de jurisdição com a adoção de Juiz único, cita :

“Na Itália encontramos a firme e decidida opinião de Cappelletti, defensor da abolição quase que radical da apelação, apontando o excesso de órgãos colegiados, a excessiva duração do recurso de cassação, a idolatria do direito à impugnação entre outros defeitos que maculariam, por assim dizer, o princípio do grau de jurisdição. Com análise sobre outro ponto de vista, observando serem mais consentâneas com a realidade universal do processo civil, as posições de Pizzorusso e Ricci, referidas na nota 19, secundadas por Allodio, que se socorre dos ensinamentos principalmente de Mortara, para defender o direito à impugnação, como consectário do devido processo legal”.

No Brasil, não há previsão constitucional do duplo grau de jurisdição, no entanto, o princípio se evidencia na Lei Maior que atribui competência recursal a órgãos judiciários de segundo grau, não estipulando valor mínimo em matéria cível (art. 102, II; 105, II; 108, II), fazendo referência a tribunal de segundo grau no art. 93, III.

Nelson Nery Júnior sustenta que o princípio do duplo grau de jurisdição sendo adotado pela Lei Maior torna-se matéria de ordem pública, inafastável do ordenamento jurídico pátrio, não podendo ser suprimido pelo legislador infraconstitucional, que ao contrário, deve operar para a sua efetivação. Pontua o autor que leis ordinárias podem restringir o princípio do duplo grau, como por exemplo, a Lei de Execução Fiscal, que limita a interposição da apelação ao valor da causa, quando inferior a 50 OTNs ( art 34, caput), entendendo o autor que não se configura ofensa à Carta Magna.

Verifica-se que leis extravagantes podem prever recursos que passam a integrar o rol do CPC, como a Lei nº 9099/95, nos artigos arts. 41 e 48. No microssistema, a duplainstância exige provocação pelo desfavorecido, havendo, no CPC, previsão de intervenção, por força de lei, em casos expressos em razão de interesses públicos relevantes (art. 475, do CPC).

Sobre o princípio do duplo grau de jurisdição, manifesta-se Carlos Padilha Cercato[33]:

“Primeiramente, recorde-se que, somente na Constituição do Império, de 1824, em seu artigo 158, havia disposição expressa acerca da garantia do duplo grau de jurisdição, permitindo-se a apreciação da causa, sempre que a parte o quisesse, pelo então Tribunal de Relação (depois de apelação e, hoje de justiça). Naquele texto constitucional, sim, estava inscrita a regra da garantia absoluta da dupla instância.

As Constituições que lhe sucederam, no entanto, limitaram-se somente a mencionar a existência de tribunais, conferindo-lhes competência recursal. De forma implícita, portanto, havia previsão do duplo grau de jurisdição. Mas, frise-se, não garantia absoluta da existência de recurso.

A diferença é tênue, reconheça-se, mas, na prática, é de grande relevância. Com isso, diga-se, inexistindo garantia constitucional do duplo grau, mas mera previsão, é facultado ao legislador infra-constitucional limitar o direito de recurso”.

Sobre a existência de um terceiro grau de jurisdição, no sistema jurídico do País, discorrem Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido R. Dinamarco[34]:

“O direito brasileiro, na esteira do direito norte americano, atribui ao órgão de cúpula da jurisdição – O Supremo Tribunal Federal – certas atribuições que o colocam como órgão de superposição de terceiro ou até de quarto grau (art. 102, inc. III). Por sua vez, o Superior Tribunal de Justiça, o Tribunal Superior Eleitoral e o Tribunal Superior do Trabalho podem funcionar como órgãos de terceiro grau (arts. 105, inc. III, 111, inc. I e 118, inc. I)”.

a.2. PRINCÍPIO DA EFETIVIDADE

O princípio tem relação direta com a capacidade do processo em atingir os fins para os quais foi instituído, a saber, compor litígios e restabelecer a paz social.

O princípio da efetividade está intimamente ligado ao princípio da celeridade, podendo serem destacados, dentre outros aspectos, a designação de Sessão de Conciliação, no momento do ajuizamento da ação (art. 1º); a impossibilidade de convocação por edital (art. 18, p.u.); a condução da testemunha sem o adiamento da audiência (art. 34, § 2º); a concentração dos atos processuais (art 28); a realização de inspeção pessoal durante a audiência; a satisfação do credor, na execução, por variadas formas (art. 53, § 2º); a fixação de astreintes para compelir o devedor ao efetivo cumprimento da obrigação.

a.3. PRINCÍPIO DA IGUALDADE

O princípio da igualdade está afirmado no art. 5º, caput, da CF/88 e registrado no art. 125, I, do CPC, assegurando às partes e aos advogados o mesmo tratamento, as mesmas oportunidades para a exposição de suas teses e apresentação de suas provas.

É importante salientar que o princípio da igualdade jurídica não afasta a desigualdade econômica, razão por que deve ser dado tratamento desigual aos desiguais, na relação processual, para que, supridas as diferenças, se alcance a igualdade substancial, tarefa que não se apresenta fácil ao julgador que deve estabelecer o equilíbrio entre os litigantes.

Como exemplos de exceção ao princípio citem-se as prerrogativas concedidas à Defensoria Pública, à Fazenda Pública e ao Ministério Público (Lei nº 1060/50 e art. 188 do CPC), havendo corrente doutrinária que entende como inconstitucional o privilégio concedido aos órgãos de atuação .

a.4. PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL.

O princípio insculpido no inciso LIV, do artigo 5º, da CF/88, dita que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.

Explana José Afonso da Silva[35]:

“O princípio do devido processo legal entra agora no direito constitucional positivo com um enunciado que vem da Carta Magna inglesa: ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal (art. 5º, LIV). Combinado com o direito de acesso à Justiça (art. 5º, XXXV) e o contraditório e a plenitude de defesa (art. 5º, LV), fecha-se o ciclo das garantias processuais. Citando Frederico Marques prossegue o autor : Garante-se o processo, e ‘quando se fala em processo’, e não em simples procedimento, alude-se, sem dúvida, a formas instrumentais adequadas, a fim de que a prestação jurisdicional, quando entregue pelo Estado, dê a cada um o que é seu, segundo os imperativos da ordem jurídica. E isso envolve a garantia do contraditório, a plenitude do direito de defesa, a isonomia processual e a bilateralidade dos atos procedimentais”.

O cumprimento do devido processo legal, como comando constitucional, exclui a autotutela para a composição de litígios, revelando a importância desse poder/dever. Visa prover uma justiça efetiva e adequada através do processo justo, entendido como aquele correspondente à realização do direito lesado. A satisfação tardia do interesse da parte representa violação do direito de acesso à Justiça e, via de conseqüência, ao devido processo legal.

A Lei nº 9099/95 adequou o rito ao direito material perseguido, dispondo maior informalidade às causas com valor inferior a vinte salários mínimos.

Sobre o devido processo legal, manifesta-se Carlos Padilha Cercato[36]:

Porém, tal não é o caso da Lei nº 9.099/95, muito pelo contrário! Está, sim, a lei dos Juizados Especiais a exatamente garantir o devido processo legal, abrindo as vias jurisdicionais aos menos favorecidos, buscando eliminar aquelas desigualdades sobre as quais já se discorreu supra, pois ‘de nada adiantaria garantir-se no texto constitucional o direito à jurisdição com a característica que lhe é inerente, de ser inafastável e indeclinável, e não se propiciarem condições perfeitas a seu aperfeiçoamento ágil e conforme seus fins”.

a.5. PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA.

As diretrizes fazem-se presentes em todos os procedimentos modernos, estando ligadas à história do Direito Processual Civil. São conseqüência do Estado Democrático de Direito, reflexo do devido processo legal, inscritos no art. 5º, inciso LV, da CF/88 que assegura aos litigantes “o contraditório, a ampla defesa com todos os meios e recursos a ela inerentes”, comando de observância obrigatória sob pena de inquinar de nulidade todo o processo.

Por esses princípios as partes têm garantida a sua defesa, podendo trazer a Juízo todas as provas que entenderem necessárias, colaborando com o julgador, que, em razão de sua imparcialidade, coloca-se entre os litigantes, ouvindo seus argumentos – tese e antítese – apreciando as provas que formarão o seu convencimento – síntese.

A bilateralidade da ação ocasiona a bilateralidade do processo: é indispensável que seja dada ciência às partes sobre todos os atos praticados, para que se torne efetivo e equilibrado o contraditório, promovendo-se a citação, a intimação e a notificação.

No procedimento dos Juizados Especiais Cíveis, não resta minorada a importância do contraditório, em nome do princípio da celeridade, não infirmado também o princípio pela previsão legal de antecipação de tutela satisfativa ou cautelar, visto que pode o demandado promover a atividade processual plena antes de tornar-se definitivo o provimento.

Demonstram a presença do contraditório no procedimento especial a contestação, a contradita de testemunhas, o oferecimento de embargos à execução, as contra-razões.

a.6. PRINCÍPIO DA ORALIDADE

O principio da oralidade está presente no processo civil, com maior ou menor intensidade, refletindo-se com grande destaque na Lei Especial (arts. 14, 17 pu, 31 pu, 36, 38, 49, etc).

A Lei nº 90999/95 estabeleceu critérios novos para o processo, ao adotar a oralidade explícita, com o diálogo direto entre as partes, as testemunhas e o Juiz e atos processuais simplificados, informais e céleres (art. 36).

Na verdade, as formas oral e escrita complementam-se pela necessidade do manuseio de documentos e registro de anotações imprescindíveis, sempre prevalente aquela forma a essa (art. 38).

O princípio tem referência direta com os princípios do imediatismo, da concentração dos atos, da imutabilidade do Juiz e da irrecorribilidade das decisões interlocutórias.

O princípio do imediatismo, da imediação ou da imediatidade, orienta que o julgador deve presidir a instrução, em contato direto com as partes, sem intermediários, utilizando-se das provas colhidas no mesmo momento de sua apresentação, podendo melhor sentir, observar, analisar, intervir e provocar o debate oral; extraindo os dados psíquicos e objetivos, fruto de sua impressão pessoal, que servirão de suporte à sua decisão (art. 33).

Leciona Pontes de Miranda[37]:

“Imediatizando o juiz, a lei espera salvar o máximo do valor objetivo das provas e da percepção delas pelo Juiz, das suas intuições, dos sentimentos experimentados durante a sessão, da sua reflexão fresca. O Juiz tem melhor visão da sinceridade das partes, da atendibilidade dos depoimentos das testemunhas, das relações entre as partes e testemunhas. Quem vai julgar deve conhecer o procedimento e a substanciação”.

Arruda Alvim[38] sublinha que a doutrina alemã, em particular, faz diferenciação entre o princípio da imediação e o da oralidade, pois o primeiro diz respeito ao processo escrito com o contato efetivo entre partes e o Juiz, mesmo através de petições.

O princípio da concentração orienta a realização dos atos processuais com proximidade, em especial os instrutórios, debate e julgamento – que devem se dar em uma única oportunidade, na audiência de instrução e julgamento ou, se cindida essa em audiência próxima (arts. 27/29, 33 e 34).

O princípio da imutabilidade do Juiz objetiva a que o julgador acompanhe a causa desde seu ajuizamento. O princípio foi atenuado no CPC de 1973 uma vez há previsão de que o Juiz que inicia a instrução, mas não a termina, não julgará necessariamente a lide como na hipótese de remoção, promoção e aposentadoria (artigo 132 do CPC), cabendo a seu sucessor repetir as provas, se entender necessário.

O princípio da irrecorribilidade das decisões interlocutórias diz respeito à agilidade do processo, à sua celeridade, a concentração dos atos que determinam a solução de todos os incidentes no curso da audiência ou na própria sentença, impedindo que contra as decisões proferidas no curso processual, mais especificamente, na instrução oral, sejam interpostos recursos que retardariam a decisão.

Joel Dias Figueira Júnior e Maurício Antônio Ribeiro Lopes[39] destacam que a adoção do princípio pelo microssistema não pode levar à sua aplicação em termos extremos sob pena de ofensa a princípios de igual importância: princípio do duplo grau de jurisdição, do contraditório, da eventualidade, da ampla defesa, devendo ser compatibilizados os princípios para evitar prejuízo às partes. Entendem que é cabível a interposição de agravo retido e de instrumento, esse em casos específicos, para afastar a preclusão, princípio que não foi excluído expressamente pela Lei 9099/95. Apontam que alguns doutrinadores acolhem o manejo do mandado de segurança como meio de impugnar decisão que traga gravame às partes.

Ressaltam os autores que Rogério Lauria Tucci, em sentido contrário, defende a irrecorribilidade das decisões interlocutórias, como decorrente do art. 41, da Lei 7244/84, que prevê somente o recurso inominado para atacar sentença.

A prática tem mostrado que a agilidade do processo resta maculada, quando a parte busca, através de inúmeros artifícios, fugir ao cumprimento de sua obrigação, retardando a prestação da tutela jurisdicional à demasia.

Conclui-se que o legislador, ao adotar o princípio da irrecorribilidade das decisões interlocutórias, tentou evitar os óbices procrastinatórios, não objetivando, sem dúvida, que seja preterida questão prejudicial à parte.

Saliente-se que, em caso de ofensa a direito líquido e certo, é cabível a interposição de mandado de segurança, entendimento adotado, por unanimidade, pela Primeira Turma Recursal Cível da Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro.

A irrecorribilidade das decisões interlocutórias é matéria controvertida e será enfocada quando do exame do cabimento do agravo.

O princípio da oralidade, mola mestra do procedimento especial, está evidenciado na Lei nº 9099/95, nos artigos 2º, 13 § 3º, 14, 17 e p.u., 19, 21, 28, 29, 30, 31 p.u., 36, 38, 46, 49, 62,etc.

Ensina João Carlos Pestana de Aguiar Silva[40], comentando a Lei Especial, que os princípios consignados nos arts. 2º e 62 já haviam sido enunciados no art. 2º da Lei nº 7244/84 como reflexo do pensamento reformista mundial que perseguia o maior acesso do indivíduo à Justiça para o exercício pleno da cidadania, propiciando a simplificação e a celeridade do feito, contudo, sem relegar as formalidades necessárias. Destaca que o CPC de 1973 também trazia em seu contexto os mesmos ideais concretizados no procedimento sumaríssimo, da mesma forma, dito como simples, célere, econômico e concentrado, assim como, já fora perseguido o ideal no procedimento sumário nas Ordenações Filipinas (Livro I, Título 65, § 7º), nos procedimentos sumários do direito canônico medieval ( séc. XIV) e nas tentativas de simplificação do direito romano.

Para Pontes de Miranda[41], o processo oral tem vantagens e desvantagens por não possuir a fixação da escrita e as palavras poderem se perder no tempo, exigindo do julgador um esforço redobrado de atenção e memória para fixar a argumentação e os debates proferidos. Por outro lado, aponta, é despendido menor tempo considerando-se que o Juiz tem a impressão direta do caso, denunciando os pontos duvidosos, desarmando eventuais tentativas de burla. Ressalta que o processo escrito apresenta, em contrapartida, a imposição de uma leitura extensa e minuciosa, a causar cansaço. Conclui o autor que, de qualquer forma, “o princípio da escrita nunca é excluído de todo.”

Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido R. Dinamarco[42] sobre a matéria expõem:

“Exclusivamente oral era, entre os romanos, o procedimento no período das ações da lei. A oralidade perdurou no período clássico, mas já então a fórmula se revestia de forma escrita. Na extraordinaria cognitio o procedimento transformou-se em escrito no tocante a vários atos, permanecendo os debates orais. Inteiramente oral era o procedimento entre os germanos invasores, o que veio a influir no do povo conquistado. Predominou, assim, por longo tempo, a palavra falada, permanecendo a escrita apenas como documentação.

Mas o direito canônico reagiu contra o sistema e no direito comum generalizou-se o procedimento escrito. A mesma tendência nota-se no procedimento reinol português, assim como no Regulamento 737 e na maioria dos códigos brasileiros estaduais.

Na França, porém, o código de processo napoleônico acentuou o traço oral do procedimento, que não fora jamais abandonado; a influência fez-se sentir na Alemanha, como conseqüência da invasão napoleônica, espraiando-se para outros países da Europa, como a Itália, e daí par o Brasil”.

Assinalam, ainda, os autores que o Código de Processo Civil de 1939 adotou o procedimento oral, mas que, na verdade, no País, é utilizada a combinação dos procedimentos oral e escrito, com predominância para a última forma. Destacam que a impossibilidade de adoção em termos absolutos dos precipícios da identidade física do Juiz e da irrecorribilidade das interlocutórias ensejou a atenuação do princípio da oralidade no CPC de 1973 (arts. 132, 330 e 522).

a.7. PRINCÍPIOS DA SIMPLICIDADE, INFORMALIDADE, ECONOMIA PROCESSUAL E CELERIDADE

Os princípios representam regras de orientação já previstas na Lei nº 7244/84 (art. 2º), tendo por objeto a instrumentalidade e a efetividade do processo, afastadas as férias forenses e as formalidade dos atos.

Em decorrência do texto constitucional (inciso I, do art. 98) foram criados os Juizados Especiais Cíveis, com princípios e objetivos específicos, com regras em muito diferenciadas do procedimento sumário, previsto no art. 272 c/c 275, ambos do CPC, com redação dada pela Lei nº 8952/94.

O procedimento da Lei nº 9099/95, destaque-se, é flexível, não está preso à rigidez das formas, mas sim, à sua meta – a concretização e a efetivação do direito do jurisdicionado – obter uma resposta com o menor tempo e gasto possíveis.

Observe-se que ao julgador é dado criar soluções para o melhor andamento processual devendo, entretanto, estarem atentos os operadores do Direito às investidas de integralização do rito com fases processuais do CPC, o que, além de descaracterizar o procedimento especial afastará o indivíduo da Justiça.

O princípio da economia processual se reflete sobre todo o sistema processual civil, exigindo que o Juiz ofereça às partes o melhor resultado com o mínimo de atividades e dispêndio de forças; observando formas seguras no sentido da agilização processual; afastando a possibilidade de argüição de questões incidentes, que provocam o retardamento do desenrolar processual; consagrando na decisão definitiva todos os aspectos controvertidos.

Como exemplos característicos do princípio da economia processual, citem-se a reunião de processos em casos de conexão e continência (art. 105 do CPC), a reconvenção, a ação declaratória incidente, o litisconsórcio.

O princípio da instrumentalidade das formas tem correspondência com os princípios da informalidade e da simplicidade, exigindo que sejam anulados somente os atos imperfeitos, por não ter sido atingido o seu objetivo, coincidindo o princípio com o brocardo pas de nulité sans grief (arts. 13 § 1º e 65, da Lei nº 9099/95 e art. 250 do CPC, com incidência no Processo Penal, art. 275 e 550).

Reforce-se, ainda, dentro da informalidade e da simplicidade do procedimento, que o pedido inicial pode ser formulado de maneira simples, de forma oral por leigo; a citação pode ser realizada por qualquer meio idôneo, dispensada a precatória; as testemunhas podem comparecer independentemente de intimação; o julgamento em segunda instância constará resumidamente em ata, com fundamentação sucinta, quando confirmada a sentença; a execução pode iniciar-se por mero requerimento oral da parte.

O princípio da celeridade traz a idéia de concentração dos atos para uma maior rapidez na prestação da tutela jurisdicional.

A celeridade, aliada à economia processual autoriza que a sentença do Juízo seja concisa. Permite, ainda, a cumulação de pedidos conexos (art. 15); a apresentação do pedido contraposto dispensando a contestação formal; a apreciação dos pleitos das partes na sentença (art. 17 p.u); a deformalização da citação e da intimação; a possibilidade de pagamento do débito exeqüendo, em parcelas, por adjudicação ou dação em pagamento, quando se tratar de execução por quantia certa.

a.8. PRINCÍPIO DA LEALDADE PROCESSUAL

Este princípio é incito a todo o sistema processual.

Considerando ser o processo um desenrolar de atos eminentemente dialético, devem aqueles que dele participam adotar comportamento ético, agindo com transparência e correção, atendendo ao objetivo precípuo do processo que é dar uma resposta justa à causa em exame.

Como consectários do princípio da lealdade processual decorrem os deveres de moralidade e de probidade, deveres de observância obrigatória pelas partes, advogados, auxiliares da justiça, órgãos da Defensoria Pública, do Ministério Público e Juiz, não podendo ser preteridos ainda que sob o fundamento de estarem as partes defendendo um direito.

Por óbvio, há um limite aceitável para o proceder dos litigantes que não pode ser ultrapassado mesmo que estejam as partes buscando o reconhecimento de sua pretensão.

A inobservância do dever de lealdade constitui ilícito processual sujeito a sanções (arts. 55 da Lei nº 9099/95 e 14 a 18, 31, 133, 135, 144, 147, 153, 193 a 199 e 601, todos do CPC).

a.9. PRINCÍPIO DA EQUIDADE

Contra o princípio da equidade lançam-se muitas vozes avessas à ampliação dos poderes do julgador, que está autorizado, pela Lei Especial, a apreciar livremente as provas; a adotar regras de experiência comum, a aplicar em cada caso a decisão que entender mais justa e equânime, consideradas as exigências do bem comum e os fins sociais a que a lei se dirige (arts. 5º e 6º, ambos da Lei nº 9099/95 c/c art. 5º da LICC).

Com efeito, ao Juiz foi dado um maior âmbito de atuação pela Lei 9099/95, cabendo-lhe, inclusive, interpretar o texto legal para adaptá-lo à realidade social.

Pela moderna concepção filosófica do Direito, sem dúvida, foi colocada sobre os ombros do julgador uma grande responsabilidade no exercício de seu mister, devendo o Juiz moderno, em sua função de intérprete, buscar a decisão mais justa à causa em análise, mesmo que a sentença proferida não seja a mais correta, tecnicamente.

Lembre-se que o Direito, principal elemento disciplinador da atividade humana, como instrumento social que é, não se apresenta como uma fórmula matemática, exata, a permitir resultados previsíveis. Como se sabe a norma geral é elaborada abstratamente, por não poder abranger todas as situações possíveis. A norma tem um significado, um dizer, um princípio, um valor que deverá ser auscultado pelo Magistrado. Interpretar é buscar o sentido da regra, é particularizá-la, é construir um pensamento.

E como deve se orientar o Juiz na interpretação da norma?

Para Larenz[43] o julgador deve se pautar nos princípios que são preexistentes à norma jurídica. Cria a concepção de que o correto é que as decisões estejam embasadas em princípios ético-jurídicos, que trazem subjacentes os valores, berço do direito justo.

Hans-Gorg Gadamer, Robert Alexy, Chaim Perelman e L. Olbrechts-Tyteca e Ronald Dworkin, em que pese adotarem diferentes concepções, defendem a observância dos princípios e valores no Direito, entendendo o intérprete como alguém inserido em seu contexto histórico e social e que, por tal, deve fazer uma leitura do texto legal estabelecendo sua relação com o presente.

Margarida Maria Lacombe Camargo[44], em consonância com o novo pensar jurídico, pontua que o Juiz não é mais um mero repetidor do texto legal, mas sim, um intérprete das normas, devendo trabalhar com a ponderação, a dialética e a argumentação, sopesando interesses e valores para alcançar, no caso, "uma solução jurídica nem certa e nem errada, mas razoável".

Em posição contrária, defendem os formalistas que ao interpretar o texto legal estaria o Juiz legislando, extrapolando os limites de seu ofício. Consoante esse deve o julgador ficar cingido à letra fria e estática da lei, transformado num robô, na “boca da lei”.

A equidade, prevista no art. 6º, da Lei nº 9099/95, na verdade, não é fruto do desejo do julgador, mas sim, representa o esforço do legislador em propiciar ao Juiz meios que lhe permitam interpretar a norma, com postura equilibrada e imparcial, no caminho da decisão justa.

a.10. PRINCÍPIO DA CONGRUÊNCIA DO PEDIDO À RESPOSTA.

O princípio se refere à exata correlação entre a decisão judicial e o pedido formulado. O autor fixa os limites da lide (art. 128, do CPC) e o réu, debate as questões controvertidas, podendo apresentar pedido contraposto (art. 31 da Lei nº 9099/95), restando vinculado o Juiz aos limites das teses defendidas (art. 460, do CPC).

Nesse sentido, o julgador não poderá conceder ao autor ou ao réu mais do que lhe foi requerido, ou solucionar questões não trazidas no bojo da lide, devendo considerar as alegações das partes e as provas apresentadas, conditio sine qua non para que possa sentenciar com acerto.

Em caso do julgador decidir aquém, além ou fora do pedido poderá ensejar a nulidade do decisum.

Em sede de Juizados Especiais Cíveis tem sido entendimento na Primeira Turma Recursal Cível da Comarca da Capital do Rio de Janeiro que, em caso de julgamento citra, extra ou ultra petita, a sentença pode ser reformada, pelo órgão revisor, na Sessão de Julgamento, afastada a nulidade do julgado em nome dos princípios da economia processual, da informalidade e da celeridade.

B – REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE DOS RECURSOS

A interposição do recurso submete ao Juiz monocrático e ao Relator, em razão do efeito devolutivo do recurso, a análise dos requisitos de admissibilidade do apelo, em situação análoga à das condições da ação. Cabe, ainda, ao órgão recursal examinar a matéria de ordem pública que não pode ser afastada sob pena de nulidade do processo Assim, o recurso ostenta duas fases distintas, uma preliminar, para verificação dos requisitos indispensáveis de admissibilidade e outra destinada à apreciação da questão de fundo.

O juízo de admissibilidade exige a presença de requisitos intrínsecos e extrínsecos ao recurso.

Os requisitos intrínsecos dizem respeito à própria decisão impugnada: a adequação do recurso, previamente estabelecida em lei, à decisão atacada – princípio da congruência ou do cabimento do recurso; o interesse em recorrer – representado por um prejuízo – isto é, a possibilidade do recorrente obter um resultado melhor ao seu interesse do que aquele contido na decisão; a legitimidade – configurada pela sucumbência da pretensão e a ausência de preclusão lógica, que deriva da transação entre as partes, da renúncia ao direito de recorrer, ou ainda, do reconhecimento do direito pelo litigante.

Os requisitos extrínsecos estão relacionados com fatores estranhos à sentença: o preparo do recurso; a tempestividade e a regularidade formal.

Em relação ao preparo, dita o art. 42, § 1º, que “será feito independentemente de intimação em 48 horas após a interposição, sob pena de deserção”. O preparo, segundo o art. 54, p.u., compreende todas as despesas processuais, inclusive as referentes ao primeiro grau de jurisdição, ressalvada a gratuidade de justiça (art. 4º, da Lei 1060/50).

O preparo é mecanismo utilizado também para desestimular as impugnações protelatórias.

A matéria é controvertida, quando ocorre a incompletude do recolhimento, havendo entendimentos doutrinários e jurisprudenciais no sentido da aplicação do art. 511, § 2º , do CPC , em confronto com corrente diversa que defende, com veemência, a inaplicabilidade do dispositivo legal, por afrontar os princípios que regem o procedimento especial, tema que será enfrentado nas questões controvertidas.

No que tange à tempestividade, dispõe o art. 42 que “o recurso será interposto no prazo de 10 dias contados da ciência da sentença”.

A regra adotada no âmbito dos JECs é de que a decisão deve ser prolatada na audiência de instrução e julgamento, em nome dos princípios da concentração dos atos processuais e da celeridade, dando-se por intimadas as partes, na oportunidade. Em caso de ser proferida a decisão, posteriormente, as partes deverão ser intimadas, de forma inequívoca, por qualquer meio idôneo, conforme preceitua o art. 19 da Lei dos JECs.

O requisito da tempestividade tem por objeto fazer com que a decisão judicial se torne definitiva.

Inicia-se a contagem do prazo recursal a partir da ciência da decisão, excluído o dia inicial, computado o último (art. 28 c/c 52, III, da Lei Especial c/c 183 do CPC.)

Na hipótese de ser decretada a revelia, os prazos correrão, em Cartório, independentemente de intimação, nos dizeres do art. 322 do CPC.

Em relação à regularidade formal, as razões de recurso deverão ser escritas, firmadas por advogado regularmente constituído, indicando com clareza o pedido e os seus fundamentos, para estabelecer o thema decidendum,, evitando-se que as partes venham a suportar algum prejuízo em face da maior complexidade ínsita à impugnação, mitigado o princípio da oralidade, nessa fase (art. 41, § 2º).

C – EFEITOS DO RECURSO INOMINADO

Para o sistema especializado a norma regra geral é o recebimento do recurso no efeito devolutivo inversamente ao que dispõe o art. 520 do CPC que prevê o recebimento da apelação nos efeitos devolutivo e suspensivo, recebida somente no efeito devolutivo nos casos excepcionais mencionados no dispositivo, na parte final.

A Lei 9099/95, em observância aos princípios que iluminam o diploma e acompanhando a tendência moderna de reformulação do processo de conhecimento adotou o efeito devolutivo para impedir que a sentença se transformasse em um ato meramente formal, sem qualquer efeito prático.

O efeito devolutivo tem como conseqüência fazer retornar ao órgão colegiado o conhecimento das matérias antes submetidas à apreciação do órgão singular (art. 515 do CPC), ainda que a sentença não as tenha julgado por inteiro, destacando-se a exceção dos embargos de declaração cujo conhecimento é devolvido ao próprio órgão prolator da decisão.

O recebimento do recurso no efeito devolutivo tem ainda por objeto reduzir os recursos infundados que visam somente a eternização dos feitos, podendo o julgador ao vislumbrar que o recurso foi interposto com objetivo meramente procrastinatório condenar o recorrente nas penas da litigância de má- fé, nos termos dos arts. 17 e 18 do CPC, por frontal contrariedade aos ditames do art. 2º da Lei Especial.

Recebido o recurso no efeito devolutivo, o recorrido desde logo poderá promover a execução do julgado (art. 521 do CPC), via carta de sentença (arts. 589 e 590 do CPC).

Em verdade, na prática, são raros os casos de execução provisória em virtude das limitações impostas pelo art. 588 do CPC e por que o julgamento do recurso se processa em tempo inferior àquele em que se daria a execução provisória.

Entretanto, podem o Juiz ou o Relator atribuir efeito suspensivo à impugnação, ex officio, ou a requerimento da parte, quando a natureza da decisão ou a execução provisória puderem trazer prejuízo à parte recorrente (art. 43).

Entende Ricardo Cunha Chimenti[45] que na hipótese do Juiz indeferir o efeito suspensivo requerido cabe a interposição de agravo de instrumento perante a Turma Recursal, podendo o relator conferir o efeito suspensivo pretendido. Ressalta o autor que a matéria é controvertida havendo entendimentos no sentido do cabimento do mandado de segurança.

Destaque-se, por oportuno, que é entendimento unânime na Primeira Turma Recursal da Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro, que não cabe agravo de instrumento contra decisão interlocutória por ofensa flagrante ao princípio da celeridade.

D – ESPÉCIES DE RECURSOS

d.1. RECURSO INOMINADO

Na Lei 9099/95 o legislador infraconstitucional optou, como já o fizera na Lei 7244/84, por não conferir nome específico à impugnação, para diferenciá-la da apelação prevista no art. 513, do Código de Processo Civil, buscando evitar comparações com a apelação regulada no CPC, o que viria a criar óbices à efetivação dos princípios da celeridade, da informalidade, da simplicidade, da oralidade e da economia processual, restando desvirtuado o microssistema.

Weber Martins Batista e Luiz Fux[46] lecionam:

“Não obstante a lei omita o nomem iuris desse meio de impugnação, prevalece a regra do art. 513 do Código de Processo Civil de que ‘da sentença cabe apelação’. O recurso cabível da decisão que julga a causa no juizado é o de apelação, com as suas características magníficas que timbram esse meio de impugnação, como o ‘recurso por excelência’, em face de sua amplíssima devolutividade”.

Para Joel Dias Figueira Junior e Maurício Antônio Ribeiro Lopes[47] o recurso regulado na Lei Especial é, em verdade, “apelação”, visto que sua forma, prazos, preparo e efeitos diferenciados não desnaturam a sua essência, de meio de impugnação hábil para atacar sentenças terminativas de processo, com ou sem exame de mérito. Destacam que no Anteprojeto da Lei 7244/84 o recurso chegou a ser denominado de apelação e que os Estados, dentro de sua competência, podem nominar o recurso de forma diversa da Lei Especial.

Paulo Lúcio Nogueira[48], no mesmo sentido entende que o recurso previsto no sistema dos Juizados Cíveis é a apelação, denominação usada em matéria criminal (art. 82). Defende que os prazos recursais deveriam ter sido reduzidos e que o legislador poderia ter conferido juízo de retratação em primeiro grau de jurisdição, em respeito aos princípios orientadores do art. 2º, adotando o mesmo tratamento dado no Estatuto da Criança e do Adolescente (art 198,VIII), medida que, sem dúvida, restringiria em muito a remessa de recursos ao órgão revisor, desafogando-o.

A apelação é o recurso cabível contra sentença proferida em primeiro grau de jurisdição, não mais cabendo a classificação em sentença terminativa e definitiva frente à sistemática processual vigente, tendo o legislador realçado como única exigência o termo do processo seja de conhecimento, execução, cautelar ou especial.

A interposição do recurso disciplinado no art. 41 e seguintes é cabível contra sentença, excluída a homologatória de acordo celebrado em Sessão de Conciliação ou de laudo arbitral, eis que espelham a vontade soberana das partes em por fim ao litígio, operando-se a preclusão lógica em nome da segurança das relações jurídicas (art. 26).

A interposição do recurso disciplinado no art. 41 e seguintes é cabível contra sentença, excluída a homologatória de acordo celebrado em Sessão de Conciliação ou de laudo arbitral, eis que espelham a vontade soberana das partes em por fim ao litígio, operando-se a preclusão lógica em nome da segurança das relações jurídicas (art. 26).

Assinale-se como única exceção prevista o processo cautelar de justificação, considerando-se que o Juiz não emite seu convencimento, mas somente verifica se foram observadas as formalidades legais (art. 865 do CPC).

A arbitragem prevista na Lei dos Juizados é fruto da opção das partes manifestada em Juízo, após a tentativa de conciliação exigindo homologação pelo Juiz togado para que tenha eficácia de título executivo judicial definitivo (art. 24).

A irrecorribilidade mencionada nos arts. 26 e 41 parece ofender, à primeira vista, o princípio do duplo grau de jurisdição, entretanto, na hipótese de vício constante do laudo arbitral, os interessados poderão buscar a nulidade do julgado, em via própria, através da ação de anulação de sentença homologatória, eis que há vedação legal, no art. 49, ao manejo da ação rescisória em sede de Juizados.

Decidindo o julgador pela não homologação de laudo arbitral face à ausência de congruência da decisão ao pedido; falta de fundamentação e de parte dispositiva do decisum; por ter sido proferido julgamento por prevaricação ou corrupção passiva; pela inobservância do prazo legal; pela desobediência do contraditório e da ampla defesa, essa decisão ensejará impugnação perante o Conselho Recursal.

O § 1º, do art 41, da Lei 9099/95, dita que o recurso será julgado por uma Turma composta por três juízes togados, em exercício no primeiro grau de jurisdição, reunidos na sede do Juizado, criada pelos Estados.

No Estado do Rio de Janeiro a criação das Turmas Recursais para funcionar nas Comarcas da Capital, de Volta Redonda e de Campos dos Goytacazes, consoante Resolução 06/99, do Conselho da Magistratura, ensejou consulta à Comissão dos Juizados Especiais Cíveis sobre a competência das Turmas para apreciar questões decididas em outros Municípios, decidindo a Comissão pela competência das Turmas Recursais instituídas, ultrapassada a questão.

Dita o artigo 42, caput, que o recurso será interposto no prazo de dez dias, contados da ciência da sentença, por petição escrita, firmada por advogado. A interposição de recurso impede que a decisão resistida transite em julgado, tornando-se imutável.

Paulo Lucio Nogueira[49] entende que, em nome dos princípios inscritos no art. 2º, “os prazos recursais deveriam ter sido menores e que alguns são mais elásticos do que na justiça penal comum em que o prazo da apelação é de cinco dias (CPP art. 593)”.

A impugnação do julgado tem como efeito a transferência ao órgão revisor do inteiro teor da demanda, podendo a impugnação referir-se à decisão, integralmente, ou à parte dela, não sendo cabível inovação de matéria em segundo grau de jurisdição, vale dizer, formular um pedido diverso ou apresentar provas pré-existentes ao julgamento, excepcionando-se fato novo que influa ou matéria de ordem pública, que por ser inafastável, deve ser apreciada a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição.

A vedação de reabertura da instrução perante o órgão revisor tem esteio nos princípios do contraditório e da ampla defesa, ressaltando-se que a instância superior é órgão essencialmente de controle, cabendo-lhe verificar a correção da decisão atacada. A revisão, com a remessa ao órgão ad quem de toda a matéria discutida e suscitada perante o julgador monocrático, com as motivações do autor e do réu– efeito devolutivo do recurso – possibilita ao Colegiado o exame da matéria in integrum favorecendo a formação do seu convencimento, como se órgão julgador originário fosse.

Explanando sobre a reabertura da instrução em segundo grau Weber Martins Batista e Luiz Fux[50] defendem, em sentido contrário, que em nome da segurança a matéria deve ser devolvida de forma ampla permitidas novas alegações e fatos não deduzidos perante o julgador monocrático:

“É conhecido o aplauso de Machado Guimarães ao sistema do nosso Código de não permitir a renovação dos debates na instância ad quem, em contraposição ao modelo do velho Direito português, germânico, italiano e francês. O ius novarum permitiria a reconstrução do edifício do processo com ‘novos materiais’ e não com o mesmo material trabalhado, para nos utilizarmos da linguagem de Carnelutti (Lezioni, vol. IV, p.233). Essa restrição, que filia o Direito brasileiro ao Direito austríaco, tem pressupostos que não se conciliam com as exigências da tutela de segurança, por isso que não teria sentido impedir-se essa tutela enérgica da forma mais escorreita possível, em razão das dificuldades práticas de se levar ao Tribunal novos fatos ou pela necessidade de lealdade e concentração das alegações e tampouco em função da imediatidade física do Juiz, como sugere Machado Guimarães (ob. cit. pg. 226). O interesse maior de segurança supera todos esses inconvenientes, além de se exteriorizar como uma faculdade processual, guardadas as limitações existentes no direito alienígena, que a obsta se revelar intuito protelatório ou negligência grave, como dispõe o § 529 da ZPO. Ao revés, em nosso de ver, essa ampliação em nome da segurança idônea é imperativo de Justiça e repisa velhos remédios jurídicos. Assim é que nas Ordenações do Reino, a devolutividade era amplíssima e dúplice; tanto o apelante como o apelado podiam renovar fatos, como se colhe do seguinte dispositivo: ‘As partes litigantes podem alegar e provar na causa da apelação, qualquer razão nova, que em outra instância não tenha alegado e fazer artigos’ (Ord., Liv. III, Tit. 83, pr). É a negação do que Goldschmidt denominou de ‘instância única para as questões de fato’ (Derecho Precesal Civil, 1936, p. 44).

Data maxima venia, permitir-se em segundo grau a alegação de fatos novos e a apresentação de provas omitidas, significaria preterir os princípios norteadores do microssistema. Outrossim, se os fatos e as provas somente foram acessíveis após o julgamento e repercutirem sobre o direito do recorrente, então, sim, deverão ser acolhidos.

Recebido o recurso no órgão revisor, pedirá o relator sua inclusão em pauta, intimadas as partes para a Sessão de Julgamento, ocasião em que, após o relatório, os litigantes poderão se manifestar em tempo assinado pela lei local, por se tratar de norma procedimental pura.

A decisão do Colegiado é registrada em Súmula de Julgamento, que deve conter os elementos relevantes do processo, fundamentação sucinta e parte dispositiva, quando confirmada a sentença por seus próprios fundamentos (art. 46), proceder simplificado que objetiva atender ao comando do art. 2º da Lei 9099/95.

Na hipótese de questão que envolva matéria controvertida, o Relator poderá, apresentar voto escrito, observado o mesmo procedimento.

É importante que se assinale a alteração sofrida pelo art. 515 do CPC, por força da Lei 10352/01, que vem de encontro aos princípios e objetivos perseguidos pela Lei 9099/95.

Dita o art. 515, caput, do CPC, que a apelação devolverá ao Tribunal o conhecimento da matéria impugnada, dispondo o parágrafo 1º, que podem ser objeto de apreciação, pelo órgão de segundo grau todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que a sentença não as tenha apreciado totalmente e, o parágrafo 2º, que acolhido apenas um fundamento do pedido ou da resposta os demais poderão ser apreciados em grau de recurso.

Em que pese a previsão expressa nos parágrafos retromencionados e no art 516, de que ao Tribunal são submetidas todas as questões não decididas na sentença, o Superior Tribunal de Justiça vem adotando entendimento no sentido de que configura supressão de instância a apreciação de matéria não abordada na sentença.

Destacam-se :

“Devolvendo a apelação ao tribunal apenas o conhecimento da matéria impugnada (‘tantum devolutum quantum appellatum’), ressalvadas as hipóteses de matéria apreciável de ofício, ofende a regra ‘ sententia debet esse conforme libello’ a decisão que faz a entrega de prestação jurisdicional em desconformidade com a postulação (STJ – 4ª Turma, Resp.4530-RS,rel. Min.Sálvio de Figueiredo, j. 23.10.90, deram provimento, v.u., DJU 19.11.90, p.13263).

“A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada, art. 515 do CPC. Ampliando o efeito devolutivo da apelação, o tribunal ‘a quo’ afrontou a regra inscrita no art. 515 do CPC” ( STJ – 2 ª Turma, Resp. 3346-0-PR, rel. Min. José de Jesus Filho, j. 24.06.92, deram provimento, v.u., DJU 10.08.92, p. 11941).

“Julgado extinto o processo, por ilegitimidade de parte, sem exame do mérito, a apelação devolve ao tribunal apenas essa matéria, a impedir que seja julgada, pelo mérito a causa, com supressão de instância”. (STJ- 3ª Turma, Resp. 11747 – SP, rel. Min. Dias Trindade, j. 13.08.912, p. 13484).

A Lei 10352 de 26.12.01, acrescentando o parágrafo 3º, ao art. 515, autoriza que, nos casos de extinção do processo, sem julgamento do mérito, o Tribunal julgue a demanda, quando versar sobre questão exclusivamente de direito e estiver madura para julgamento.

A introdução do parágrafo 3º elimina, assim, qualquer dúvida quanto à possibilidade do exame imediato da questão de direito material, pelo órgão revisor, na hipótese de não ter sido apreciada a matéria de fundo pelo Juízo monocrático.

Dessa forma, a extinção do processo, sem exame do mérito, não mais ensejará a anulação da sentença com o retorno dos autos ao Juiz monocrático para novo julgamento.

A atualização do diploma processual civil pátrio veio a dar maior agilidade processual e presteza à tutela judicial, podendo, em sede de Juizados, a Turma Recursal de plano apreciar a matéria impugnada, integralmente.

Como já mencionado acima, quando da análise dos princípios que informam a Lei Especial, em relação ao julgamento ultra, extra ou citra petita, que levariam, invariavelmente, à nulidade do decisum, quando presentes, a Primeira Turma Recursal da Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro, vem adotando posicionamento unânime, no sentido do ajuste imediato da sentença pelo órgão revisor, sem retorno prévio ao julgador monocrático, em nome dos princípios da celeridade, informalidade e economia processual, sem que seja anulada. Sublinhe-se que a anulação do julgamento, para adequação pelo Juiz de primeiro grau, representaria um retardamento desnecessário na resposta definitiva, resguardado eventual prejuízo às partes.

No sentido de agilizar a prestação da tutela jurisdicional, com a simplificação do rito especial, opinam Joel Dias Figueria Junior e Mauricio Antonio Ribeiro Lopes[51], pela adoção do juízo de retratação:

“Para reduzir a interposição de recursos e conseqüentemente o volume de processos perante os Colégios Recursais, poderia o legislador ter conferido à apelação o regime da retratabilidade, a exemplo do que se verifica no art. 198, VIII, do Estatuto da Criança e do Adolescente, porquanto exsurge claramente da Lei 9.099/95 que a intenção do legislador foi a de reduzir o espectro recursal e limitar o acesso a todas as instâncias com o escopo de solucionar a lide em definitivo com a maior rapidez possível” .

O mesmo entendimento é esposado por Paulo Lucio Nogueira[52], que acrescenta que dever ser restringido o sistema recursal, assim como cerceado o acesso ao Supremo Tribunal Federal o que concorreria para a presteza da tutela jurisdicional.

Merece referência também a possibilidade de aplicação do art. 557, caput, do CPC, ao procedimento especial com vistas a agilizar a prestação da tutela jurisdicional, considerando-se que o dispositivo autoriza o Relator a negar seguimento aos recursos interpostos, quando evidentemente protelatórios ou na hipótese de ser o mérito do recurso manifestamente improcedente.

Em que pese, à primeira vista, poder ser benéfica a utilização da providência, em nome do princípio da celeridade, em um segundo momento verifica-se que poderá trazer prejuízos às partes, que ficarão privadas da apreciação do recurso pelo Colegiado, eis que a Lei 9.099/95 não autoriza a interposição de agravo de instrumento, em seu sistema.

Conclui-se, em nome do due process of law, pela não incidência do art. 557, caput, do CPC.

d.2. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

A decisão proferida em primeiro e segundo graus de jurisdição deve ser clara, precisa, líquida, expondo resumidamente os fatos e os fundamentos relevantes do julgado.

Esclareça-se que o legislador, ao exigir a referência dos motivos que levaram o julgador a decidir, não está impondo a apresentação de teses jurídicas extensas e cansativas, mas sim, que sejam indicadas as razões de decidir de forma simples para serem entendidas pelas partes.

No julgamento, podem ocorrer lacunas, contradição e obscuridade, prevendo a Lei 9.099/95 o oferecimento de embargos de declaração, no art. 48, para corrigir vícios antes do trânsito em julgado da sentença, no prazo de cinco contados da ciência da decisão, podendo o oferecimento dos embargos dar-se na forma escrita ou oral (art. 49). Se apresentado de forma oral, em primeiro grau de jurisdição, deve ser reduzido a termo pelo Magistrado e conhecido na própria audiência de instrução e julgamento, não sendo oportuno seu oferecimento em segundo grau por não admitir a Sessão de Julgamento tal intervenção.

Joel Dias Figueira Junior e Mauricio Antonio Ribeiro Lopes[53] entendem que os embargos de declaração podem ser oferecidos oralmente em segundo grau, na Secretaria do órgão, reduzidos a termo pelo serventuário.

O oferecimento de embargos de declaração, dentro do prazo legal tem como efeito a suspensão do prazo recursal, e não a sua interrupção, contando-se o prazo recursal pelos dias restantes, diferentemente do disposto no art. 538 do CPC. A regra prevê efeito interruptivo aos embargos de declaração, dispositivo com redação alterada pela reforma do diploma que antes ditava a suspensividade dos declaratórios.

Paulo Lúcio Nogueira[54] festeja o legislador que na Lei 9099/95 adotou prazo uniforme para os declaratórios, tanto para os oferecidos em primeiro como em segundo graus, considerando-se que a distinção dos prazos confunde as partes.

Em relação às questões olvidadas pelo julgador na fundamentação e na parte dispositiva do decisum podem ser supridas de ofício ou por provocação do interessado, podendo o julgador atribuir efeito modificativo aos declaratórios, se acolhidos, em casos excepcionais.

Observe-se que os embargos de declaração podem ser exigidos como requisito de admissibilidade para garantir a apreciação de matéria constitucional – pré-quesionamento.

Nesse sentido, veja-se a Súmula nº 98 do Superior Tribunal de Justiça (Pré-questionamento sem caráter protelatório): “Embargos de declaração manifestados com o notório propósito de pré-questionamento não têm caráter protelatório”. No mesmo entendimento: RSJT 27/470, 29/416, 61/313, 63/291, 75/300, 100/73, 110/241, 129/355, 132/204, 139/127, STJ-RT 708/191, RTJ 113/830, 130/401, STF-RT 578/281.

A contradição no julgado é verificável quando a parte dispositiva da decisão não guarda correlação com os fundamentos da sentença ou do acórdão.

A obscuridade diz respeito a pontos duvidosos na sentença, ensejando maiores esclarecimentos, pelo julgador.

Joel Dias Figueira Júnior e Maurício Antônio Ribeiro Lopes[55], em consonância com a posição adotada por Nelson Nery Júnior[56], em análise do CPC, defendem que são cabíveis os embargos de declaração também contra decisões interlocutórias, em razão da interpretação sistemática da Lei 9.099/95, referindo-se os autores à antecipação de tutela que pode conter contradição, obscuridade ou omissão a exigir correção. Citam em defesa de sua tese decisão proferida pelo STJ Recurso Especial 37252/SP, relatado pelo Ministro Sálvio de Figueiredo, publicado no DJU de 18.02.94:

“qualquer decisão judicial comporta embargos de declaração. A interposição meramente literal dos artigos 494 e 495 do CPC atrita com a sistemática que deriva do próprio ordenamento processual”.

Os erros materiais, provenientes de equívocos ou inexatidões, que não trazem ao conteúdo do julgado qualquer efeito, podem ser corrigidos ex officio consoante previsão contida no parágrafo único, do art. 48.

Na apreciação dos embargos de declaração não deve dar o julgador uma maior abrangência ao recurso, conferindo-lhe caráter infringente, sob pena de desconfiguração do instituto, uma vez que não é de sua natureza questionar a correção do julgado com vistas a desconstituí-lo, mas sim, garantir a compreensão inequívoca da decisão.

Antonio Carlos Silva[57] destaca que a natureza dos embargos traz uma perplexidade dentro da sistemática da Lei Especial pois que considerados como recurso, pelo diploma legal, deveriam obrigatoriamente serem apreciados pela Turma Recursal, o que não ocorre, uma vez que o seu conhecimento se dá pelo próprio órgão que proferiu a decisão impugnada, em primeiro e segundo graus

Como conclusão, pode-se extrair que os embargos de declaração não têm por escopo acrescentar elementos novos à sentença, alterar seu conteúdo ultrapassando os limites da decisão embargada, mas sim, garantir a decisão clareza, certeza e facilidade em sua compreensão.

Na hipótese de serem oferecidos embargos declaratórios nitidamente protelatórios deverá o relator condenar o embargante nas penas de litigância de má-fé (art. 17 e 18 do CPC).

d.3. RECURSO EXTRAORDINÁRIO

O instituto tem por finalidade preservar a ordem jurídica nacional devendo o recurso ser interposto em 15 dias (art. 508 do CPC).

Rodolfo de Camargo Mancuso[58] ao analisar os recursos extraordinário e o especial sublinha que o segundo se apresenta como uma vertente do primeiro. Traça as características comuns aos dois institutos apontando: exigem o prévio esgotamento das instâncias ordinárias; não perseguem a correção do julgado; apresentam juízo de admissibilidade fracionado com apreciação pelo Tribunal a quo e pelo Tribunal ad quem; os fundamentos específicos de admissibilidade estão inscritos na Carta Maior e não no CPC; ensejam execução provisória.

No microssistema o acórdão exarado pela Turma Recursal não autoriza a interposição de recurso. É ato de última instância, não cabendo revisão por qualquer tribunal local.

Contudo, a doutrina e a jurisprudência são unânimes no entendimento de que é cabível a interposição de recurso extraordinário para atacar decisão proferida pela Turma Recursal quando a matéria contrariar a Carta Magna (art. 102, III, “a”).

O ato Executivo nº 10, editado pela Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro dispõe que os recursos constitucionais interpostos contra decisões das Turmas Recursais deverão ser encaminhados a 3ª Vice-Presidência do Tribunal de Justiça para análise da admissibilidade do recurso, ato publicado no DORJ de 09.02.95.

O processamento do recurso extraordinário deverá acompanhar as disposições do CPC (art. 541 e seguintes) e, não admitido o recurso, caberá a interposição de agravo de instrumento (art. 544).

Dos pronunciamentos do STF caberão embargos de declaração, embargos de divergência e agravo regimental, observadas as regras do CPC e do Regimento Interno do STF.

É importante que se registre que o sistema dos Juizados Especiais Cíveis é uma Justiça especializada totalmente desvinculada do Tribunal de Justiça, com órgãos próprios em primeiro e segundo graus de jurisdição, somente encontrando referência com a justiça comum no Supremo Tribunal Federal, via recurso extraordinário.

Decisões sobre a admissibilidade de recursos extraordinários, proferidas pela 3ª Vice-Presidência do TJRJ: RE nº 2012.134.3085; RE nº 2012.134.1269; RE nº 2012.134.16812534; RE nº 2012.134.01052; RE nº 2012.134.02855; RE nº 2012.134.2489; RE nº 2012.134.1752; RE nº 2012.134; RE nº 2012.134.02339 (Anexo I).

d. 4 – MANDADO DE SEGURANÇA

Os ordenamentos jurídicos garantem, atualmente, ao indivíduo um remédio contra os atos da administração que lhe ofendam direito líquido e certo.

Define Hely Lopes Meirelles[59] o instituto como “meio constitucional posto à disposição de toda pessoa física ou jurídica, órgão com capacidade processual ou universalidade reconhecida por lei para a proteção de direito individual ou coletivo, líquido e certo não amparado por habeas corpus ou habeas data lesado ou ameaçado de lesão por ato de autoridade, seja de que categoria for, e sejam quais forem as funções que exerça (CF, art. 5º, LXIX e LXX; Lei 1533/51, art. 1)”.

O Mandado de Segurança tem acento constitucional recepcionado na Carta de 1934, excluído da Constituição de 1937, presente na Carta de 1946, regulamentado pela Lei 1.533 de 13.01.51, com as alterações as Leis 2.770/56, 4.166/62, 4.3448/64 e 4.862/65.

Vedando a Lei 9.099/95 a utilização do agravo de instrumento, como meio de impugnação das decisões interlocutórias, admite parte da doutrina e da jurisprudência o manejo do writ para atacar ato judicial praticado por Juiz singular, tais como, decisão que deixa de receber o apelo – por incabível, intempestivo ou deserto; decisão que não concede efeito suspensivo ao recurso; decisão que defere ou não a tutela antecipada pleiteada; decisão que determina a penhora, a adjudicação ou a alienação de bens, no processo de execução, com vistas a garantir direito líquido e certo da parte ameaçado de lesão ou lesionado.

Decisão proferida em São Paulo acolheu o mandado de segurança para dar efeito suspensivo a agravo de instrumento, recurso cabível naquele Estado segundo entendimento majoritário, face à presença do fumus boni iuris e do dano irreparável ou de difícil reparação, consoante Mandado de Segurança nº 08, RJE 01/217-218 (anexo II).

Wander Paulo Marotta Moreira[60] defende o cabimento do mandamus contra decisões interlocutórias quando ocorrer vicio de forma no processo ou inobservância aos princípios do contraditório e da ampla defesa

VIII –QUESTÕES CONTROVERTIDAS

A – É cabível o Agravo de Instrumento em sede de Juizados Especiais Cíveis?

Na Lei Especial as decisões interlocutórias, de conteúdo decisório, não são atacáveis por agravo, regra ditada em prol dos princípios que informam a Lei, em especial o da celeridade, limitando-se o diploma a prever uma única impugnação ao ato final da audiência, ficando as decisões interlocutórias proferidas sujeitas ao exame final onde figuram como preliminares.

Ricardo Cunha Chimenti[61] destaca que quase a totalidade da doutrina defende a irrecorribilidade das decisões interlocutórias proferidas no processo de conhecimento sob o fundamento de que tais questões não precluem, podendo ser apreciadas em grau recursal, não sendo cabível o agravo de instrumento. Aponta nesse sentido manifestações de Cândido Rangel Dinamarco, Theotônio Negrão, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade, dentre outros.

Em sentido contrário, cita posição de Humberto Theodoro Júnior :

“A propósito das decisões interlocutórias, a Lei 9099/95 silenciou. Isto não que dizer que o agravo seja de todo incompatível com o Juizado Especial Cível. Em princípio, devendo o procedimento concentrar-se numa só audiência, todos os incidentes nela verificados e decididos poderiam ser revistos no recurso inominado ao final interposto. Mas nem sempre isso se dará de maneira tão singela. Questões preliminares poderão ser dirimidas antes da audiência ou no intervalo entre a conciliação e a de e a de instrução e julgamento. Havendo risco de configurar-se a preclusão em prejuízo de uma das partes, caberá o recurso de agravo, por invocação supletiva do Código de Processo Civil”.

Ricardo Cunha Chimenti[62], Joel D. Figueira Júnior e Maurício Antonio R. Lopes[63], filiando-se à corrente doutrinária de Humberto Theodoro Júnior, sustentam que é cabível o agravo de instrumento no procedimento da Lei 9099/95, em que pese não haver previsão legal, para não afastar totalmente o direito das partes de verem resolvidas questões incidentes, tais como, tutelas antecipadas ou concessão de medidas cautelares que, por serem importantes, não podem ser postergadas para a audiência de instrução e julgamento, momento em que deverá ser proferida a decisão e apreciado a matéria. Evita-se, assim, eventual prejuízo às partes.

Paulo Lúcio Nogueira[64] entende que, mesmo não havendo previsão na Lei, o agravo retido é cabível requerendo o inconformado que o Conselho Revisor tome conhecimento preliminar da matéria.

Na jurisprudência, destaque-se, é posição unânime na Primeira Turma Recursal da Comarca da Capital no sentido de que não há cabimento para o agravo no sistema da Lei 9.099/95, tanto em processo de conhecimento, como em processo de execução, eis que confronta com os princípios que regem o diploma. Se a legislação especial previu via recursal taxativa não podem ser admitidos meios de impugnação que, em verdade, viriam a cindir o procedimento, retardando o seu termo, provocando o desnaturamento da Lei dos Juizados.

O Enunciado nº 11. 5, da Consolidação dos Enunciados Jurídicos Cíveis e Administrativos em vigor, resultante das discussões dos Encontros de Juízes de Juizados Especiais Cíveis e Turmas Recursais do Estado do Rio de Janeiro, publicado no DORJ de 21.09.2012, dispõe:

“ AGRAVO DE INSTRUMENTO – INADMISSIBILIDADE . No sistema dos Juizados Especiais Cíveis , é inadmissível a interposição de agravo contra decisão interlocutória, anterior ou posterior à sentença”.

E, ainda, em âmbito nacional:

Conclusão nº 15, do I Encontro Nacional de Coordenadores de Juizados Especiais Cíveis e Criminais em Natal, RGN, em maio de 1997: “ Nos Juizados Especiais não é cabível o Recurso de agravo” ( unânime)

Enunciado nº 10 do 1º Colégio Recursal de Pernambuco: “ Das decisões proferidas pelo Juizados Especial somente são cabíveis os recursos previsto nos arts. 41 e 48 da Lei nº 9099/95 ( recurso inominado e embargos de declaração), não se admitindo o recurso de agravo, instrumentalização ou retido”.

I Encontro Regional de Turmas Recursais – Juizados Especiais – Foz do Iguaçu – PR, 27 e 28 de março de 1998: “ No Juizado Especial é incabível o recurso de Agravo e as decisões interlocutórias não precluem” – unânime

Repertório jurisprudencial espelha posições divergentes sobre a admissibilidade do agravo em sede de Juizados Especiais Cíveis (Anexo III):

Rio de Janeiro – entendimento unânime no sentido da inadmissibilidade:

Recurso nº 2012.700.003.403-0, j. 19.04.01, publicado no DORJ de 24.04.01, pg. 27;

Recurso nº 2012.700.005.344-7, j. 22.02.00, publicado no DORJ de 24.02.00, pg. 51;

Recurso nº 2012.700.002.333-0, j. 13.06.01, publicado em 27.06.01, pg. 62.

São Paulo – controvérsias sobre a questão:

a ) pela admissibilidade:

Agravo de Instrumento nº 1067 – RJE 15/155-157;

Mandado de Segurança nº 92 – RJE 16/77-79,

Recurso nº 44 – RJE 10/94-96;

Mandado de Segurança nº 76, RJE 13/97-99, decidindo pela carência da impetração de segurança em substituição ao agravo de instrumento;

Recurso nº 1995 – RJE 1/34-36, entendendo que cabe a aplicação subsidiária do CPC;

Recurso nº 2931 – RJE 5/114-116, apontando a competência do Colegiado e não do Tribunal de Justiça para apreciar o agravo;

Recurso nº 2561 – RJE 5/123-125, destacando que, tratando-se de recurso em processo de execução, devem ser observados os preceitos do CPC, cabendo a interposição do recurso perante o órgão revisor;

Recurso nº 254 – RJE 2/178-180, inadmitido o agravo de instrumento, vez que o agravante, terceiro interessado, não demonstrou tal condição.

Recurso nº 943 RJE 16/188-189;

Recurso nº 012/98 – RJE 9/360-361.

Agravo de Instrumento nº 3918 – RJE 10/103-104, destacando a competência da Turma Recursal e não do Primeiro Tribunal de Alçada Cível da Capital

Mandado de Segurança nº 61 – RJE 11/114-115

b) pela inadmissiblidade:

Recurso nº 1946 – RJE 1/346-343

Recuso nº 2926-A – RJE 19/89-90, indicando decisões no sentido de não caber “qualquer recurso das decisões interlocutórias proferidas em processo de conhecimento, inocorrendo preclusão” : Rec. n 1241 – A, j. 01.07.98; Rec. nº 1368 – A; Rec. 1946, j. 30.04.96, RJE 1/346; Rec. nº 071, j. 25.02.97, RJE 5/348.

Rio Grande do Sul – entendimento pela inadimissibilidade

Recurso nº 0119686159-3, 1ª Turma, j. 12.06.96, unânime – RJE/RS – 17/44-45;

Recurso nº 01596930667, j. 27.11.96, unânime – RJE/RS 18/86-87.

Minas Gerais – entendimento pela inadimissibilidade:

Recurso nº 30/96 – RJE 8/251-256, destacando que conforme já julgado pela Turma em 13.08.96, no Recurso nº 4/96, foi decidido que é inviável a interposição de agravo no Juizado Especial, nos termos do art. 29, caput, da Lei 9.099/95. Ressalta que “O art. 29 determina que serão decididos de plano todos os incidentes que possam interferir no regular prosseguimento da audiência, sendo as demais questões decididas na sentença.. O dispositivo exclui, em conseqüência, a possibilidade de agravo, sendo todas as questões decididas em sentença, contra a qual cabe recurso inominado, comparável à apelação”. Acrescenta que não cabe a incidência da regra geral do art. 522 do CPC, subsidiariamente, se a norma especial dispõe expressamente sobre o assunto.

Santa Catarina – entendimento pela inadimissiblidade

Agravo de Instrumento nº 071 – RJE 5/348-350, destacando que “as questões impugnáveis por agravo de instrumento devem ser rebatidas no recurso específico posto que, na hipótese, inocorre a preclusão”. Indica precedente em Agravo de Instrumento nº 69 e JTAERGS 78/115.

B – Autoriza a Lei Especial a interposição de Recurso Adesivo ?

Do exame da Lei 9099/95 verifica-se que não há previsão para o uso de recurso adesivo em nome dos princípios que regem o sistema, impondo-se o não conhecimento do recurso, de plano, entendimento adotado, por unanimidade, pela Primeira Turma Recursal Cível da Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro.

Não há como se admitir a aplicação subsidiária do art. 500 do CPC eis que a Lei Especial, por sua natureza deve ser interpretada de maneira restrita evitando-se impugnações não pensadas pelo legislador.

Destaque-se o Enunciado nº 11. 4, da Consolidação dos Enunciados Jurídicos Cíveis e Administrativos, em vigor, resultante das discussões dos Encontros de Juízes de Juizados Especiais Cíveis e Turmas Recursais do Estado do Rio de Janeiro, publicado no DORJ de 21.09.2012, que dispõe:

“RECURSO ADESIVO- INADMISSIBILIDADE . Não cabe recurso adesivo em sede de Juizados Especiais, por falta de expressa previsão legal”.

Nesse sentido, decidiu o I Encontro Regional de Turmas Recursais dos Juizados Especiais, realizado em Foz do Iguaçu, Paraná, em março de 1998:

“ O recurso adesivo é incompatível com a celeridade, princípio informativo dos Juizados Especiais”. ( unânime)

A matéria não apresenta controvérsia na doutrina e na jurisprudência consultadas, podendo ser conferida no Recurso nº 199700006320-9 (RJ) – RJERJ 2/69-71; no Mandado de Segurança nº 934 (SP) – RJE 15/210-211; no Recurso nº 3364 (SP) – RJE 9/133-138; no Recurso nº 2775 (SP) – RJE 5/43-45; no Recurso nº 2091 (SP) – RJE 2/120-125; no Recurso 3891 (SP) RJE 11/117-120; e Processo nº 011968890299 (RS) – RJE/RS 19/96-97 (Anexo IV) .

C – Há previsão na Lei 9099/95 para a interposição de Recurso Especial?

É entendimento unânime na jurisprudência que não cabe a interposição de recurso especial no procedimento dos Juizados Especiais uma vez que o art. 105, III, da Carta Magna de 1988, ao tratar da competência do Superior Tribunal de Justiça, impõe que a causa tenha sido decidida em única ou última instância por Tribunal, o que, na verdade, não se verifica no âmbito da Lei 9.099/95 em que os recursos são apreciados por uma Turma composta por Juízes de primeiro grau, órgão que não se confunde com o Tribunal Estadual, restando, assim, afastada a possibilidade do manejo do recurso.

Nesse sentido, decidiu o STJ em relação à Lei 7244/84, que o Tribunal Estadual não tem competência originária nem recursal para o reexame das decisões proferidas pela Turma Recursal, em sede de Juizados Especiais Cíveis, decisão que também guarda pertinência com o art. 41 da Lei 9.099/95 (STJ, 4º Turma, RMS 2906-2 – SP rel. Min. Barros Monteiro, j. 18.05.1993, v.u. DJU 21.06.93, p. 12369). Ainda, da mesma forma, confira-se RT 708/ 216 e 711/ 219.

A matéria é controvertida na doutrina.

Pelo acolhimento de recuso especial interposto contra acórdão exarado pelo órgão revisor em sede de JECs, manifestou-se, em voto vencido, o Ministro Athos Gusmão Carneiro[65], no REsp nº 23548-4, para evitar que, em casos excepcionais, matérias não constitucionais que trouxessem evidentes prejuízos às partes ficassem sem apreciação:

“Perfeitamente razoável, portanto, entender que do ponto de vista funcional as Turmas Recursais, atuando como multiplicados pequenos Tribunais de Alçada, se me permitem a expressão, são em tudo equiparáveis a um tribunal do Estado, são tribunais dos Estados, cabendo pois admitir o recurso especial de suas decisões, nos casos previstos nos incisos do art. 105, III, da Lei Maior.

De um ângulo mais pragmático do que propriamente jurídico, poder-se-ia alegar que esta Corte correria o risco de ficar absolutamente sobrecarregada, com um desmesurado número de processos, desproporcional à capacidade do limitado número de Ministros do STJ. O argumento é, do ponto de vista prático, ponderável. Esta Corte já está, diga-se, sobrecarregada de processos, mais do que qualquer de suas congêneres, em termos de estatísticas dos altos tribunais de cassação ou de revisão de outros países.

Mas, de outra parte, impende ponderar que pelo menos na maior parte das vezes ocorrerá simplesmente, como no caso presente, o deslocamento de uma causa, é portanto do respectivo recurso, da jurisdição das varas comuns e Tribunal de Alçada ou de Justiça, para jurisdição exercida pelo Juizado Especial e suas Respectivas Turmas Recursais.

Além disso, e eis argumento de máxima relevância em pais federativo em que direito material civil, penal e comercial é o mesmo para todo o território nacional, não parece cabível deixar fora de controle de legalidade uma ampla gama de leis federais. E até pior: a matéria, v.g., da importante ação adjudicatória, com toda uma série de variadas questões controversas ficará sujeita ao controle de legalidade relativamente aos arestos proferidos nos Estados onde tais causas estejam sujeitas aos Tribunais de Justiça ou Alçada mas alheia a tal controle nos Estados, como por exemplo, em Santa Catarina, onde estas demandas são ajuizadas perante os Juizados Especiais …. Em alguns Estados, este STJ poderá corrigir as ofensas à lei federal, mas noutros não? Se divergirem, a respeito da Lei do Inquilinato, dois Tribunais Estaduais, caberá ao STJ a tarefa uniformizadora mas se o dissídio ocorrer entre Turmas Recursais, será, no plano infraconstitucioanal, totalmente irremediável?

Devo, portanto, reconsiderar meu anterior entendimento sobre o tema e declarar, em princípio, como admissível o recurso especial contra decisões das Turmas Recursais dos Juizados Especiais, quando fundadamente invocada contrariedade à lei federal, ou quiçá até à jurisprudência sumulada desta Corte”.

Paulo Lucio Nogueira[66], em sentido inverso defende a inadmissibilidade do recurso especial em sede de Juizados.

Com efeito, alargar-se o rol recursal da Lei 9.099/95 para incluir impugnações não previstas no sistema dos JECs possibilitaria a procrastinação das demandas, em flagrante contraposição com os ideais do legislador infraconstitucional que, em perseguição à célere prestação da tutela jurisdicional, inscreveu no art. 2º os princípios norteadores do microssistema, linha mestra da qual não podemos nos desviar.

Na mesma esteira, Recurso Especial nº 38519-9 – BA – 3ª T., j. 11.04.94, rel. Min. Nilson Naves, DJU 2064 (Anexo V).

D – É possível o oferecimento de embargos infringentes contra decisão da Turma Recursal?

Visam os embargos infringentes fazer prevalecer o voto vencido.

Entendem Weber Martins Batista e Luiz Fux[67] que não cabem embargos infringentes contra as decisões exaradas, por maioria, pela Turma Recursal, a uma porque inexiste previsão na Lei Especial; a duas, por que não há órgão com competência para apreciar o recurso. Ressaltam que a aceitação dos embargos contraria o princípio da celeridade priorizado pelo legislador.

Os embargos infringentes são admissíveis somente nas hipóteses previstas taxativamente no art. 530 do CPC não se referindo o dispositivo legal a acórdão exarado por Turma Recursal.

Theotônio Negrão[68] em comentários sobre o art. 46 da Lei 9099/95 diz que “o acórdão do colegiado não comporta embargos infringentes”.

Nesse sentido, o Recurso nº 30/96 – RJE 8/251-256 (Anexo VI).

E – É cabível a interposição de Agravo Regimental contra decisão proferida pelo Conselho Recursal dos Juizados Especiais Cíveis?

Tem sido entendimento unânime na Primeira Turma Recursal Cível da Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro quanto ao descabimento do Agravo Regimental em sede de JECs.

No mesmo sentido, decisão proferida pela 4ª Turma do STJ, no AgRg em AI 43461-3 – SP, j. 14.11.93, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJU 28.02.94 – RT 708/218

Em sentido contrário, decisão proferida no Recurso nº 5994 – REJ 15/28-30 (Anexo VII)

F – É admissível a ação rescisória ao procedimento previsto na Lei 9099/95?

Leciona Wander Paulo Marotta Moreira[69] que a Lei Especial, em prol do princípio da celeridade, veda a ação rescisória por que a revisão do julgado permite apenas um único recurso. Pontua que deve ser priorizada a nova mentalidade introduzida pela Lei abstendo-se os operadores do direito de aplicar modelos antigos ao procedimento simplificado.

Cita comentário de Theotônio Negrão sobre a vedação da ação rescisória:

“É princípio de direito, não excepcionado em caso algum, que aquilo que não pode ser feito de maneira direta, menos ainda poderá ser feito de forma indireta. Se a lei, às expressas, não permite a ação rescisória contra sentença transitada em julgado, como será possível invocar o sucedâneo anômalo do mandado de segurança para desconstituir ditas sentenças?”

Ricardo Cunha Chimenti[70] sobre o tema destaca que na hipótese de vícios na citação a matéria poderá ser suscitada nos embargos à execução e que havendo incompetência absoluta da Turma Recursal para apreciar a questão restará ao inconformado a utilização da reclamação que é proposta diretamente perante o STJ ou o STF.

Leciona que a reclamação tem natureza disciplinar e que o seu uso pressupõe a existência de uma relação processual em curso e uma ação ou omissão que direta ou indiretamente afaste a competência do STJ ou do STF ou contrarie a decisão desses Tribunais, sendo partes legítimas para propor a reclamação o procurador-geral da República e o interessado na relação processual em que foi violado o direito.

Aponta que a matéria é controvertida no Estado de São Paulo que já reconheceu a admissibilidade do recurso para preservar a competência do Tribunal estadual e garantir a

autoridade de suas decisões.

Destaquem-se decisões jurisprudenciais sobre a questão:

“Reclamação: procedência contra decisão de Juiz Presidente de Colégio Recursal de Juizado Especial Cível que negou processamento e conseqüente remessa de agravo de instrumento que interposto da denegação de recurso extraordinário no juízo a quo é da competência privativa do STF” ( RTJ 171/85).

“Não possui o Tribunal Estadual competência originária, nem recursal, para rever as decisões do Colégio Recursal do Juizado Especial de Pequenas Causas” (STJ – 4ª Turma, RMS 2906-2,SP, rel. . Barros Monteiro, j. 18.05.93, negaram provimento,v.u., DJU 21.06.93, p. 12369)

G – É competente a Turma Recursal para apreciar Mandado de Segurança impetrado contra decisão interlocutória proferida pelo Juízo monocrático ou contra acórdão exarado pelo órgão recursal? Ou a competência é de uma das Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça ou do Superior Tribunal de Justiça?

Primeiramente, anote-se que no Estado do Rio de Janeiro as Turmas Recursais foram instituídas pela Resolução nº 06/99, oriunda do Conselho da Magistratura, publicada no DORJ de 04.05.99.

Tem sido entendimento unânime em nosso Estado que, por constituir o procedimento da Lei 9099/95, um procedimento especial, com características, objetivos, rito e sistema recursal próprios não está essa Justiça especializada vinculada à competência do Tribunal de Justiça sendo competente a Turma Recursal para a análise e o julgamento das impugnações interpostas contra atos de Juiz de primeiro grau, assim como, contra acórdãos proferidos pelo órgão revisor.

A questão é relevante e tem gerado opiniões opostas.

Sobre a matéria, decidiu a Primeira Turma Recursal Cível da Comarca da Capital para espancar dúvida suscitada pelo órgão do Ministério Público, cuja íntegra consta do repertório jurisprudencial, em anexo, nos Recursos nº 2012.700.002.165-3 e nº 2012.700.001.953-1 – RJERJ 2/80-82 (Anexo IX).

No Estado de São Paulo a competência para o julgamento do mandado de segurança e do habeas corpus contra ato de Juiz de primeiro grau é do órgão revisor do Juizado, consoante art. 14 do Projeto paulista de Lei Complementar 27/97, verifique-se Mandado de Segurança nº 30/98, RJE 12/262-268 e 33/98, RJE 02/112-114

No mesmo sentido, decidiu a Primeira Turma de Recursos de Florianópolis pela competência do órgão no Mandado de Segurança nº 120, RJE 05/343-348.

O Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul, em decisão proferida no Mandado de Segurança nº 196265458, declinou de sua competência para a Turma Recursal dos Juizados, afastada a competência do Tribunal de Alçada sob o fundamento de que o órgão não exerce qualquer tipo de gerência no sistema especial dos Juizados (art. 98, inciso I, da CF 88, arts. 41, § 1º e 52 da Lei 9.099/95 e art. 4º da Lei Estadual nº 10675, de 02.01.96), consoante RJE/RS 22/67-73 e Recurso nº 196096549, 6ª Câmara Cível do TARGS, j. 12.09.96, unânime.

A matéria apresenta controvérsia jurisprudencial no Estado de Minas Gerais.

Acordou a Corte Superior do Tribunal de Justiça do Estado, em Dúvida de Competência, à unanimidade, em reconhecer a competência do Tribunal de Alçada, em razão do que dita o art. 108, II, da CF, enquadrando-se no dispositivo o mandado de segurança impetrado contra ato ou decisão de Juizado Especial, por tratar-se de norma genérica. Esclarece a decisão que a Turma Recursal não reúne competência para julgar mandado de segurança originário, visto tê-la unicamente para julgar recurso, nunca ação mandamental, consoante Dúvida de Competência nº 171.887-3-00 e nº 153355-300 e Jurisprudência Mineira 152/75-80.

Em sentido contrário, em Conflito de Competência Cível nº 00227522-0/00, decidiu a Corte Superior do Tribunal de Justiça do Estado de Minas, pela competência da Turma Recursal do Juizado Especial Cível, afastada o exame pelo Tribunal de Alçada, fundamentado o acórdão em decisões do STJ que expressam o entendimento de que “o que define a competência para processo e julgamento do mandado de segurança é a sede e a categoria da autoridade coatora, sendo irrelevante a matéria a ser dirimida”, conferindo-se em Conflito de Competência nº 27193-GO, STJ, rel. Min. Garcia Vieira, DJ de 14.02.2000; ROMS nº 6710 – SC, rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJ 25.11.96, pg. 46201 (Juis 22)

Situação peculiar verifica-se no Estado da Bahia em que o Conselho Recursal, denominado de Conselho dos Juizados de Defesa do Consumidor é integrado por 3 (três) Desembargadores indicados pelo Tribunal Pleno (art. 12 da Lei Estadual 6371), o que se configuraria como um Tribunal de segunda instância.

No entanto, entendeu o STJ, em decisão unânime, ser competente o Conselho dos Juizados de Defesa do Consumidor para apreciar os recursos e mandados de segurança impetrados em sede de JECs, destacando que há previsão na Lei Estadual nº 6371, de 18.03.92, que instituiu os Juizados Especiais de Pequenas Causas e os Juizados Especiais de Defesa do Consumidor, não afastada a competência em razão de ser integrado o Conselho por Desembargadores, consoante Reclamação nº 383 – BA– 2a. Seç. – j. 28.08.1996 – rel. Min. Rui Rosado de Aguiar – DJU 30.09.1996.

A competência para julgamento dos recursos decorrentes das ações que tramitam nos Juizados Especiais Cíveis é das Turmas Recursais e não das Câmaras Cíveis, conferindo-se Ap. 35.151-1, 1ª Câm. J. 06.05.1997, rel. Des. Raimundo de Souza Carvalho (RT 745/316).

Em relação à impetração do writ contra decisão da Turma Recursal tem sido adotado o entendimento pela Primeira Turma Recursal Cível do Estado do Rio de Janeiro de que não há cabimento para o remédio, por ausência de previsão legal, indeferida a inicial, de plano, confira-se nos Mandados de Segurança nº. 2000.700.006246-0, julgado em 05.10.00, v.u., publicado no DORJ de 09.10.00, pg. 44/47 e nº 2012.004.360-1, publicado no DORJ de 28.05.01, pg. 67. (Anexo VIII)

H – É cabível a aplicação do artigo 511, § 2º, do CPC ao sistema da Lei 9099/95?

É entendimento pacífico na Primeira Turma Recursal Cível da Comarca da Capital do Rio de Janeiro que é inaplicável o art 511, §2º, do CPC, ao sistema especializado uma vez que restariam prejudicados os princípios que informam o diploma legal.

Ademais, saliente-se, o legislador assinou ao recorrente, no § 1º, do art. 42, da Lei Especial, o prazo de 48 horas para que pudesse averiguar, com exatidão, o valor correto das diversas rubricas, prazo que se afigura razoável para serem dirimidas eventuais dúvidas junto ao Cartório ou à Corregedoria Geral da Justiça, razão por que se mostra incabível a intimação para a complementação, nos termos do art. 511, § 2º.

Destaque-se Enunciado regulando a matéria[71], que dita :

“Enunciado 11. 3 : Não se aplica o § 2º do artigo 511, do CPC, ao sistema dos Juizados Especiais”.

Nesse sentido, Recurso nº 2012.700.007.70-3 – RJERJ – 2, pg. 105/105; Ementa nº 336 – RJERJ 1/70-71; Recurso nº 2012.700.002.333-0 (RJ), julgado em 13.06.01, publicado no DORJ de 27.06.01, pg. 62; Mandado de Segurança nº 2002.700.005.738-9, julgado em 22.04.02, publicado no DORJ de 02.05.02, pg. 68;

Em sentido contrário, destaque-se que há julgamentos de primeiro grau que entendem pelo cabimento da complementação do preparo, reconsiderando a deserção do recurso, se decretada, com remessa dos autos ao órgão colegiado. Nessa posição, confira-se o Mandado de Segurança 3000/99 RJERJ 3/145-147.

No Estado de São Paulo encontram-se decisões divergentes:

a ) pela inaplicabilidade do art. 511, § 2º, destacando que o preparo é diligência direta da parte recorrente, independentemente de qualquer intimação, podendo a conferência do preparo ser feita a qualquer tempo, por provocação ou ex officio:

Mandado de Segurança nº 69 – RJE 12/90-93

Recurso nº 1378 – RJE 17/ 358-361

Recurso nº 2516 – RJE 4/132-135;

Agravo de Instrumento nº 2613 – RJE 4/119-121

Recurso nº 2805 – RJE 5/119-120 e Agravo de Instrumento nº 2703, pg. 120/122, citando Recurso 1019 (RJE 2/348)

Recurso nº 3182 – RJE 18/105-107 – A, entendendo que a contagem do prazo se processa minuto a minuto;

Recurso nº 3666 – RJE 8/117-119, destacando que o preparo é condição de procedibilidade do recurso, não ficando o órgão ad quem impedido do reexame, em que pese despacho de recebimento do recurso, consoante lição de Nelson Nery Junior.

Recurso nº 4997 – RJE 6/185-189;

Recurso nº 456 – RJE 12/163-168;

b ) pela aplicabilidade do art. do art. 511, § 2º, possibilitada a complementação posterior em razão da insignificância da quantia não recolhida, verifique-se o Recurso nº 780 – RJE 4/204-206

Em Minas Gerais, o Recurso nº 827 – RJE 9/254-257 reconheceu a deserção, eis que as custas englobam a taxa judiciária, não observado o valor correto pelo recorrente.

No Estado de Mato Grosso do Sul, confira-se na Apelação Cível nº 96108044-6 – RJE- 3/313-315, o art. 50, § 1º da Lei Estadual 1.071/90 dita expressamente que o preparo, nos JECs, deve ser efetuado em 48 horas após a interposição do apelo, independentemente de intimação, sob pena de deserção, restando afastada a incidência do art. 511, § 2º (ANEXO X).

Por óbvio, frente à justificativa relevante apresentada pelo recorrente sobre a incompletude do preparo, o julgador, dentro de seu convencimento poderá relevar a deserção .

XII – CONCLUSÃO

O legislador, para franquear a todos o acesso à Justiça e garantir que os direitos dos indivíduos não permanecessem como meras frases de efeito, inscritas simbolicamente em textos constitucionais, sem efetividade, instituiu o procedimento simplificado da Lei 9099/95. O objetivo primeiro da Lei é viabilizar uma resposta jurisdicional justa em tempo e custo reduzidos. Sabe-se que uma resposta tardia significa uma Justiça inoperante.

Trata o diploma legal de conflitos sem expressão econômica, mas que, em contrapartida, detém relevante conteúdo social na medida em que não resolvidas as pendengas, o descontentamento dos envolvidos, mantém a sociedade em latente ebulição, impedindo o estabelecimento da paz social.

A desatenção estatal para causas de pequeno porte fez com que um grande contingente de consumidores, profissionais liberais e locatários, como nós, dentre outros, ficassem à margem e à mingua da proteção jurídica necessária, subjugados a sufocar direitos legítimos, relegando-os.

Extrai-se da exposição que a Lei dos Juizados Especiais Cíveis rompe radicalmente com o esquema formal do rito clássico, aproximando o Poder Judiciário da população através do Juizados Especiais, garantindo o amplo e livre acesso à Justiça, ponto nodal da moderna processualística, possibilitando uma resposta célere e efetiva sobre o direito postulado.

Representam os Juizados Especiais a grande esperança da população para a solução dos conflitos que a aflige, resposta que poderá ser obtida de forma gratuita, descomplicada e acelerada. Destaque-se que somente serão impostos os ônus sucumbenciais nas hipóteses de litigância de má-fé e de interposição de recurso inominado (art.55, caput da Lei 9099/95).

Em verdade, vislumbra-se um novo meio de garantia dos direitos do indivíduo, ressaltando-se que, em que pese o pequeno valor, as demandas levadas à apreciação nos Juizados Especiais Cíveis abrangem questões de grande relevância para a sociedade na defesa de sua dignidade e cidadania, citando-se como exemplos, dentre outros tantos, as lides que visam a redução de juros bancários a patamares constitucionais, as que visam a prestação de serviços públicos com segurança eficiência e qualidade, as que se insurgem contra cobranças de impostos e taxas sem respaldo legal e as que defendem o direito à honra, à imagem e ao bom nome do indivíduo.

Norberto Bobbio[72] referindo aos direitos do homem, afirma:

“Finalmente, descendo do plano ideal ao plano real, uma coisa é falar dos direitos do homem, direitos sempre novos e cada vez mais extensos, e justificá-los com argumentos convincentes; outra coisa é garantir-lhes uma proteção efetiva”.

XIII – BIBLIOGRAFIA

ARRUDA ALVIM Manual de Direito Processual Civil. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 1986-1990

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FERRAND, Frédérique . Cassation Française et Révisión Allemande. 1 ed . Paris: Presses Universitaires de France., 1993.

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PONTES DE MIRANDA . Comentários ao Código de Processo Civil – Tomo VII (arts. 496 a 538). 3 ed. rev. e aumentada. Rio de Janeiro : Forense, 2012

_____________________ Comentários ao Código de Processo Civil – Tomo I – arts. 1º a 45. Atualização Legislativa de Sérgio Bermudes. 5 ed, rev, aumentada. Rio de Janeiro: Forense, 1996

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SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 18 ed, rev. e atual. nos termos da Reforma Constitucional (até a Emenda Constitucional nº 27, de 21.3.2000), São Paulo: Malheiros, 2000 .

WATANEBE, Kazuo. Juizado Especial de Pequenas Causas: Filosofia e Características Básicas. São Paulo : Revista dos Tribunais, vol. 600

XI – ANEXO –REPERTÓRIO JURISPRUDENCIAL

LIXEIRA

Na finalidade do recurso identifica-se o interesse das partes e o interesse geral do Estado no sentido de que se realize o direito e se concretize a justiça. O recurso possibilita uma melhor compreensão das leis, evitando a interpretação individual dos textos e, ainda, demonstra às partes que o Estado busca através de Juízes e Tribunais regrar com justiça e aplicar com exatidão o direito.

Do ponto de vista filosófico o processo é o instrumento para que se tenha sempre, na medida do possível, a preservação da eficácia do ordenamento jurídico, pressupondo decisões adequadas aos fatos e, em especial, ao próprio direito.???????????? CORTAR

de ser compreendido destacando que a lei ventila a possibilidade de incidentes processuais e não conclusão da audiência em um único ato, em contraposição às características do princípio da oralidade, imediação e concentração.

Ressalte-se que as questões incidentes poderão ser apreciadas quando proferida a decisão definitiva.

Se a norma geral – de competência da União – optou pela simplificaçãao do procedimento COM UMA ÚNICA VIA RECURSAL, ALEI ESTADUAL QUE CRIE OUTRAS VIAS E, DE RESTO ÀS REMETA A COMPETÊNCIA DOS TRIBUNAIS, NÃO COMPLEMENTA, MAS DESNATURA A LEI FEDERAL – ACÓRDÃO DO STF – RE 273899-9 – INTERNET

O julgamento do recurso far-se-á por três Juízes togados , da mesma hierarquia do prolator da decisão atacada, o que não afeta ao duplo grau de jurisdição.

O legislador obediente ao comando do art. 98,I da CF/88, quando entendeu necessária a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil fez referência expressa ao diploma legal como se observa na execução (art. 52, caput), não podendo serem inseridos no rito especial fases e atos processuais não mencionados na Lei.

Alexy[73] defende que os princípios fundamentais devem ser positivados nas Constituições, para que não sejam compreendidos como meramente programáticos – Justicialização dos Princípios.

Em razão dessa tendência natural do homem em abusar do poder que lhe é confiado sempre se procurou estabelecer controle para a sua autoridade.

Os desmandos perpetrados pelos soberanos absolutistas mantiveram acesa a desconfiança dos ideólogos da Revolução Francesa no referente às decisões judiciais, instrumentos utilizados em larga pela realeza para o cometimento dos mais hediondos crimes. Montesquieu entendia que, em razão da tendência natural do homem abusar do poder que lhe é confiado, deve ter sua autoridade controlada e repartida.

Com a separação dos poderes, a atuação dos juizes foi reduzida para uma mera atividade de dizer a lei, sem qualquer possibilidade de interpretação , encarado o juiz como "a boca da lei", aplicando uma verdade preexistente sendo dado ao juiz participar das decisões de forma imparcial e distante, ao abrigo de instituições impessoais.

**** VER REFERÊNCIA)

No direito romano, nos primeiros tempos, das sentenças não cabia recurso. Entretanto, no período imperial, com a evolução da sociedade o direito foi-se firmando vindo a consagrar a idéia de recurso e de impugnação da sentença, tanto em matéria criminal como civil, por vício de ilegalidade ou injustiça, vindo a desaparecerem com a queda do Império, sob a dominação das sociedades chamadas "bárbaras" em que a forma de administrar a justiça não previa uma autoridade superior que possibilitasse o reexame dos julgados.

Recorrer significa comunicar a vontade de que a questão discutida, no todo ou em parte, continue em exame não permitindo o passar em julgado. Ensina Amaral Santos que "a possibilidade do reexame recomenda ao juiz inferior maior cuidado na elaboração da sentença e o estímulo ao aprimoramento de suas aptidões funcionais, como título para uma ascensão nos quadros da magistratura. O órgão e grau superior, pela sua maior experiência, se acha mais habilitado para reexaminar a causa e apreciar a sentença anterior, a qual por sua vez, funciona como elemento de freio à nova decisão que se vier a proferir" ( Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, 4ª ed. III, nº 696 ****** VER Editora ).

Na finalidade do recurso identifica-se o interesse das partes e o interesse geral do Estado no sentido de que se realize o direito e se concretize a justiça. O recurso possibilita uma melhor compreensão das leis, evitando a interpretação individual dos textos legais e, ainda, demonstra às partes que o Estado busca através de juízes e tribunais regrar com justiça e aplicar com exatidão o direito.

Do ponto de vista filosófico a função do processo é o meio para que se tenha sempre, na medida do possível, a preservação da eficácia do ordenamento jurídico pressupondo decisões adequadas aos fatos e, em especial, ao próprio direito.


Desde os primeiros modelos identificados de estrutura judicial, medidas autônomas foram utilizadas quando a parte se via vencida no pleito deduzido perante o Estado. Com o desenvolvimento do pensamento científico, a partir da Constituição Francesa de 1790, começou-se a identificar qual seria o mecanismo de revisão que impediria a interposição de recursos à infinitude. Com Carnelutti surgiu a idéia de que o recurso permitiria o reexame, fazendo o Estado-Juiz o primeiro julgamento e na medida em que o ordenamento de cada pais entendesse conveniente, outros exames se seguiriam sempre tendo como pressuposto o julgamento anterior, visto o exame derradeiro como o mais acertado.

CAPÍYULO I – ESBOÇO HISTÓRICO

§ 1º – GÊNESE E EVOLUÇÃO

A – TEMPOS PRIMITIVOS

O recurso tem sua origem nas épocas mais remotas da humanidade, com referência na Bíblia ao Conselho Supremo de Anciãos, órgão instituído por Deus, para auxiliar Moisés no governo do povo com narrativa de situações que equivalem a verdadeiros recursos, , conforme se pode ler nos Números, Livro 11, vers. 16:

" Junta-me 70 homens entre os anciãos de Israel, que tu souberes serem anciãos do povo e mestres; e os conduzirás à porta do tabernáculo da aliança e ali os fará esperar contigo, para que eu desça e te fale, e tome do teu Espírito, e os darei a eles, para que sustentem contigo o peso do povo, e não sejas só tu o agravado."

Além das referências bíblicas, encontram-se também vestígios concretos entre os povos mais antigos, havendo entre os egípcios uma hierarquia judiciária, com diversidade de graus e de recursos de uns para outros juízes, encontrando-se no ápice, uma corte suprema, constituída de 30 membros, escolhidos pelas cidades de Mênfis, Tebas e Heliópolis, principais centros em que se dividia o país, ao qual competia o julgamento dos recursos em geral.

Em Atenas e em Esparta, os cidadãos podiam apelar das sentenças proferidas pelos tribunais para a assembléia do povo.

Percebe-se, que, em essência, a idéia de recurso se acha arraigada no espírito humano, como uma tendência inata e irresistível, como decorrência lógica do próprio sentimento de salvaguarda a um direito já ameaçado ou violado por uma decisão.

Do ponto de vista jurídico-processual o recurso somente se apresentaria como um instituto organizado com o desenvolvimento natural da civilização.

B – DIREITO ROMANO

A respeito da existência do recurso, nos primórdios da sociedade romana, há divergência entre os autores. Uns negam a ocorrência de meios de impugnação, como um recurso propriamente dito, porém, outros admitem que havia a possibilidade de serem utilizados remédios com outra forma, que até certo ponto, produziam também um efeito similar ao da apelação.

Na verdade, durante essa fase, o processo com sua tipicidade privada, se decidia em grau único, não se admitindo contra sentença nenhum recurso ordinário.A restitutio in integrum não era um recurso, a rigor, sendo concedida em hipóteses particulares e, se também era aplicada à sentença, não a reformava, mas a cassava.

Os que negam a admissibilidade do recurso, nessa época, se apegam à inexistência da apelação como meio impugnativo padrão.

Entretanto, generalizando-se o conceito de recurso, não restringindo-o apenas à apelação, não é difícil admitir a possibilidade da utilização de um remédio que obstasse os efeitos da sentença, quer por via de declaração de sua nulidade, quer por intermédio da intercessio ou da restitutio in integrumainda que a última fosse autorizada em casos excepcionais.

No período republicano, entendia-se impolítico e, até mesmo, desrespeitoso atacar uma decisão, em que pese ser autorizada a impugnação mediante o exercício de uma ação de nulidade cujo fim era a declaração da nulidade ou inexistência da sentença.

Portanto, originariamente, de toda sentença resultava a res judicata, valendo como verdade imutável entre as partes. Normalmente, seus efeitos tinham de produzir-se, podendo ser impedidos de forma indireta: se fosse solicitado a um tribuno ( tribunus plebis) ou a qualquer outro magistrado ( magistratus populi romani) que usasse do direito de veto. Era a appellare ( magistratum) no sentido primitivo, que não se confundia com a appellatio originada no Império, em tempos posteriores. O instituto denominava-se intercessio pois permitia que um juiz de igual categoria ou superior ( parmajoriae potestas ) àquele que proferiu a sentença, ou um tribuno, suspendessem os efeitos da decisão. Dizia-se que esta parte lesada appellat – chama- em seu socorro o magistrado que podia intercedere. A intercessio ( ou intercessio tribunicia) não possuía nenhuma eficácia contra a sentença do iudex privatus pela natureza de suas funções.




Dessa forma, não cabe agravo de instrumento, embargos de divergência,

Nessa linha de raciocínio, aponte-se, como exemplo a hipótese de recebimento de seguro de veículo pelo valor de mercado e não pelo preço estampado na apólice, cumprido o pagamento integral do prêmio, situação examinada exaustivamente na Primeira Turma Recursal da Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro, sendo posição unânime ter o segurado o direito de receber o valor integral da apólice.

Como é de conhecimento, já está pacificado no STJ o entendimento de que o segurado tem o direito de receber o valor inscrito na apólice, não podendo ser-lhe imposto recebimento a menor, mesmo frente à quitação sem ressalvas, manifestação que não impede o consumidor de perseguir o valor restante.

Neste caso, não permitido o manejo do recurso especial, julgado improcedente o pedido, não provido o apelo em grau recursal, ficaria a parte sucumbente impedida de perseguir o seu direito, em que pese encontrar amparo em numerosas decisões jurisprudências oriundas do Conselho Recursal de nosso Estado e do STJ.

Entende-se que o fundamento de estar o SIJ assoberbado de demandas não pode preterir o direito do indivíduo de receber o que lhe é devido.

PRIMEIRA TURMA RECURSAL CÍVEL DA CAPITAL

Recurso n° 2012.700.2165-3 ( VII JEC)

Impetrante: LUCIANA MARIA SANTOS QUEIROZ

Impetrado : MM. JUÍZO DO VII JEC.

EMENTA

Mandado de Segurança. Competência. Cabimento, em não havendo recurso próprio, para assegurar direito líquido e certo. Competência da Turma Recursal, na forma da legislação estadual, que se harmoniza com o artigo 98, i, da Constituição Federal, assim como com o artigo 41, § 1.º, da lei n.º 9.099/95 e com o artigo 164 da Constituição Estadual. Quando a lei alude a direito líquido e certo está exigindo que esse direito se manifeste na sua existência com todos os requisitos para o seu reconhecimento e exercício no momento da impetração. O direito invocado deve prescindir de comprovação. Impetrante que não obtém êxito em demonstrar o direito líquido e certo invocado. Segurança denegada.

Insurge-se a impetrante contra decisão proferida em Exceção de pré-executividade, em que discute a validade de cheque emitido, afirmando ter sido aposta data, pelo beneficiário, diferente da convencionada, vez que se aposta a data avençada, haveria provisão de fundos, sendo que tal título está prescrito.

A decisão de fls. 23/24 rejeitou a Exceção, não reconhecendo a prescrição do título e, condenou a impetrante ao pagamento das custas por considerá-la litigante de má-fé.

Sustenta a impetrante que o Exeqüente de má-fé, apôs data em cheque em desacordo com o avençado, vez que prestado o serviço médico em 1997, para desconto em um mês, apondo o favorecido data do ano posterior, qual seja, 1998, o que fez com que a impetrante não dispusesse de provisão de fundos. Aduz que reconhece o débito, pretendendo parcelamento. Requer seja cassada a decisão atacada.

Informações prestadas às fls. 30/31.

Manifestação do exeqüente às fls. 40/41, prestigiando a decisão.

O Ministério Público, manifestou-se às fls. 44/45, alegando a incompetência da Turma Recursal, nada dizendo sobre o mérito.

É o relatório.

VOTO

Sobre a preliminar de incompetência, rejeito-a na forma do voto proferido pelo ilustrado Juiz Cláudio Dell´Orto, acolhido unanimemente por esta Turma, o qual peço vênia para adotar, transcrevendo-o em seguida.

“O Ministério Público manifestou-se às fls.48/49, sustentando que na forma do art.101 par. 3.º da LC 35/79 – LOMAN, os mandados de segurança contra atos de Juiz de Direito somente podem ser julgados pelas Seções especializadas dos Tribunais. De acordo com este raciocínio, a Resolução 02/98 do Órgão Especial estaria em desacordo com a Lei Complementar 35/79, recepcionada pela Constituição Federal de 1988.

A disposição da LOMAN invocada pelo Ministério Público deve ser entendida como exemplificadora da competência das Seções especializadas dos Tribunais. Tanto isto é verdade que os extintos Tribunais de Alçada, em seu próprio sistema, não foram impedidos de conhecer e julgar Mandados de Segurança, do mesmo modo que as Câmaras Isoladas do Tribunal de Justiça.

A LC 35/79 deve ser interpretada em consonância com a Constituição Federal em vigor. A recepção daquele texto de Lei Complementar, obedece à nova ordem constitucional.

A criação dos Juizados Especiais e das Turmas recursais foi determinada pela Assembléia Nacional Constituinte, conforme imperativo contido no art.98, I da Carta Magna.

O art.93 da Constituição elencou os princípios que deverão ser observados na elaboração da nova Lei Orgânica da Magistratura Nacional, inexistindo qualquer restrição ao julgamento dos Mandados de Segurança. Na sistemática da Lei 1533/51 o Mandado de Segurança deve ser conhecido e julgado pela autoridade judiciária que possuir competência para conhecer da ação principal, nos casos de atos de autoridade em geral ou em caso de ato jurisdicional, aquela competente para o julgamento dos recursos interpostos contra os atos daquele julgador.

O art.98, I da CF e o art. 14 par.1.º da Lei 9099/95 estabelecem a competência da turma recursal para o julgamento dos recursos, o que acarreta a competência para o julgamento dos mandados de segurança.

Mesmo que não se elabore o pensamento com esta simplicidade, temos que o art.125 da CF garante aos Estados autonomia para organizarem sua Justiça, observados os princípios estabelecidos na Constituição Federal. Nenhum princípio foi fixado em sede constitucional que impeça o julgamento dos Mandados de Segurança contra atos de juiz dos Juizados Especiais, pela turma recursal, que possui competência para o julgamento de recursos interpostos contra decisões mais relevantes.

A Constituição do Estado do Rio de Janeiro, no seu art.148, reconhece os Juizados Especiais dentre os órgãos do Poder Judiciário e no art. 164 prevê o julgamento de recursos por turmas de juizes de primeiro grau. Além disso, no art.155, estabeleceu-se a competência privativa do Tribunal para dispor sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais.

Não existe, no sistema dos Juizados Especiais, instituído após a LOMAN em vigor, de acordo com a Constituição Federal, nenhuma restrição ao conhecimento e julgamento dos Mandados de Segurança contra atos praticados pelos Juizes em exercício nos Juizados, conforme determinado pela Resolução 02/98, que modificou o CODJERJ.

Na ausência do agravo de instrumento o Mandado de Segurança assume papel de destaque no sistema dos Juizados, e o TJRJ regulou a competência para o julgamento do remédio heróico, de acordo com a permissão constitucional (Art. 1.º da Resolução 06/99 do Conselho da Magistratura – DORJ Seção I de 04.05.2012-pg.14).”

O Mandado de Segurança é o meio constitucional para a proteção de direito líquido é certo, lesado ou ameaçado de lesão, por ato de autoridade, não amparado por habeas corpus.

Direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência e apto a ser exercitado no momento de sua impetração.

É cabível Mandado de Segurança contra ato judicial de qualquer natureza e instância, desde que ilegal e violador de direito líquido e certo do impetrante e, que não haja possibilidade de coibição eficaz e pronta pelos recursos próprios.

O direito invocado para se amparável por Mandado de Segurança, há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação.

Pela análise dos autos constata-se que a impetrante pretende ver apreciada matéria que demanda provas, o que é incabível no estrito limite do Mandado de Segurança.

Portanto, constata-se que a impetrante não logrou êxito em demonstrar o direito líquido e certo violado, inexistindo fundamento que respalde sua pretensão.

Ante as razões expostas, voto no sentido de ser DENEGADA A SEGURANÇA deste mandanus .

Rio de Janeiro, 02 de dezembro de 2012.

Gilda Maria Carrapatoso Carvalho de Oliveira

Juíza Relatora

  1. CAPPELLETTI, Mauro e BRYANT, Garth. Acesso à Justiça. Tradução de Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre : Fabris, 1988, pg. 92

  2. Apud MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. vol V. Rio de Janeiro: Forense, 2.001, pg. 04.

  3. Apud CAPPELLETTI, Mauro e BRYANT, Garth. ob. cit. pg. 92/93.

  4. CALAMANDREI, Piero. Instituciones de Derecho Processual Civil Segundo El Nuevo Código. Buenos Aires: Editorial Depalma, 1943

  5. CAPPELLETTI, Mauro e BRYANT, Garth. ob.cit. pg. 9 e 15/29.

  6. CAPPELLETTI, Mauro e BRYANT, Garth. ob. cit. pg. 67/68.

  7. WATANEBE, Kazuo. Juizado Especial de Pequenas Causas: Filosofia e Características Básicas. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1985,vol.600, pg. 274

  8. WATANEBE, Kazuo Ob. Cit. Pg. 275

  9. CAPPELLETTI, Mauro e BRYANT, Garth. ob. cit., pg. 193.

  10. BATISTA, Weber Martins e FUX, Luiz. Juizados Especiais Cíveis e Criminais e Suspensão Condicional do Processo PenalA Lei 9099/95 e Sua Doutrina Mais Recente. Rio de Janeiro : Forense, 2012, pg. 4/6.

  11. MOREIRA, Wander Paulo Marotta. Juizados especiais Cíveis. Belo Horizonte: Del Rey,1996, pg. 25.

  12. CARNEIRO, João Geraldo Piquet. A Justiça do Pobre. AJURIS nº 68/74.

  13. PASSOS, J. J. Calmon de. O Problema de Acesso à Justiça no Brasil. Revista de Processo, vol. 39, julho-setembro/1985

  14. FIGUEIRA JUNIOR, Joel Dias e LOPES, Mauricio Antonio Ribeiro. Comentários à Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais: Lei 9099 de 26.09.95. São Paulo : Revista dos Tribunais, 3. ed. rev., atual., ampl., 2000, pg.45.

  15. CHIMENTI, Ricardo Cunha. Teoria e Prática dos Juizados Especiais Cíveis . São Paulo: Saraiva, 2012, pg. 158.

  16. MENDONÇA LIMA. Introdução aos Recursos Cíveis. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1976, pg.124/126.

  17. PONTES DE MIRANDA . Comentários ao Código de Processo Civil – Tomo VII (arts. 496 a 538). 3 ed. rev. e aumentada. Rio de Janeiro : Forense, 2012, pg. 02/03.

  18. MOREIRA, José Carlos Barbosa. ob. cit. pg. 233 e 236.

  19. BONUMÁ, João. Direito Processual Civil . 3. vol. São Paulo : Saraiva e Cia, 1946, pg. 6/7.

  20. MENDONÇA LIMA ob. cit. pg. 131.

  21. FERRAND, Frédérique . Cassation Française et Révisión Allemande. 1 ed . Paris: Presses Universitaires de France., 1993.

  22. NERY JUNIOR, Nelson. Princípios Fundamentais – Teoria Geral dos Recursos. 5. ed. rev. e ampl., Revista dos Tribunais : São Paulo, 2.0001, pg. 54/56.

  23. MENDONÇA LIMA. Sistema de Normas Gerais dos Recursos Cíveis. Rio de Janeiro : Freitas Bastos, 1963, pg.13/70

  24. BÍBLIA SAGRADA Tradução dos originais mediante a versão dos Monges de Maredsous (Bélgica) pelo Centro Bíblico Católico, ed. rev. por Frei João José Pedreira de Castro, O.F.M. e pela equipe auxiliar da editora. São Paulo: ed. Parma., 1971, pg. 187.

  25. MENDONÇA LIMA. Sistema de Normas Gerais dos Recursos Cíveis. Rio de Janeiro : Freitas Bastos, 1963, pg. 23

  26. MENDONÇA LIMA. Sistema de Normas Gerais dos Recursos Cíveis. Rio de Janeiro : Freitas Bastos, 1963, pg. 41/43

  27. ARRUDA ALVIM. Manual de Direito Processual Civil. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais , 1986-1990, pg. 41

  28. FIGUEIRA JUNIOR, Joel Dias e LOPES, Mauricio Antonio Ribeiro. ob. cit., pg. 328

  29. FIGUEIRA JUNIOR, Joel Dias e LOPES, Mauricio Antonio Ribeiro. ob. cit. pg. 66.

  30. ARRUDA ALVIM ob. cit. pg. 21/30

  31. NERY JÚNIOR, Nelson. Ob. cit. pg. 34/36

  32. NERY JUNIOR, Nelson. Ob. cit. pg 44/45.

  33. PADILHA, Carlos Cercato. Recurso perante os Juizados Especiais Cíveis e Turmas de Juizes (Lei 9.099/95) Revista dos Juizados do Rio Grande do Sul , vol. 19, pg. 39.

  34. CINTRA, Antônio Carlos de Araújo, GRINOVER, Ana Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 7. ed. ampl. e atual. São Paulo: RT, 1990, pág. 73.

  35. ? SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 18 ed, rev e atual nos termos da Reforma Constitucional (até a Emenda Constitucional nº 27, de 21.3.2000), São Paulo: Malheiros, 2000, pg. 434/435.

  36. PADILHA, Carlos Cercato. ob. cit. pg. 40

  37. PONTES DE MIRANDA. Comentários ao Código de Processo Civil – Tomo I – arts. 1º a 45. Atualização Legislativa de Sérgio Bermudes. 5 ed, rev, aumentada. Rio de Janeiro: Forense, 1996, pág. 52

  38. ARRUDA ALVIM. Ob. cit. pg. 26

  39. FIGUEIRA JUNIOR, Joel Dias e LOPES, Mauricio Antonio Ribeiro. ob. cit. pg. 71.

  40. SILVA, João Carlos Pestana de Aguiar. Juizados Especiais Cíveis e Criminais: Lei nº 9.099/95, em Confronto com a Lei nº 9145, de 27de dezembro de 1995. Rio de Janeiro : Espaço Jurídico, 1997. pg. 28/29.

  41. PONTES DE MIRANDA. ob. cit, pg. 56

  42. CINTRA, Antônio Carlos de Araújo, GRINOVER, Ana Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. ob. cit. pg. 289/290

  43. LARENZ, Karl. Derecho Justo. Madrid : Civitas, 1993.

  44. CAMARGO, Maria Lacombe. Hermenêutica e Argumentação. Rio de Janeiro : Renovar, 2012

  45. CHIMENTI, Ricardo Cunha. Ob. cit.

  46. FUX, Luiz e BATISTA, Weber Martins. ob. cit., pg. 238

  47. FIGUEIRA JUNIOR, Joel Dias e LOPES, Mauricio Antonio Ribeiro. ob. cit. pg. 331

  48. NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Juizados Especiais Cíveis e Criminais – Comentários. São Paulo: Saraiva, 1996, pg. 36/37

  49. NOGUEIRA, Paulo Lúcio. ob. cit., pg. 37

  50. FUX, Luiz e BATISTA, Weber Martins. ob. cit., pg. 238

  51. FIGUEIRA JUNIOR, Joel Dias e LOPES, Mauricio Antonio Ribeiro. ob. cit. p. 332

  52. NOGUEIRA, Paulo Lucio. ob. Cit pg. 38.

  53. FIGUEIRA JUNIOR, Joel Dias e LOPES, Mauricio Antonio Ribeiro. ob. Cit pg.362

  54. NOGUEIRA, Paulo Lúcio. ob. cit. pg. 37.

  55. FIGUEIRA JUNIOR, Joel Dias e LOPES, Mauricio Antonio Ribeiro. ob. cit. pg. 357

  56. NERY JUNIOR, Nelson. ob. cit. pg. 214/215

  57. SILVA, Antonio Carlos. Embargos de Declaração no Processo Civil. Rio de Janeiro : Lúmen Iuris, 2000, 83/84.

  58. MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Recurso Extraordinário e Recurso Especial. 7ª ed rev, atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, pg. 99

  59. MEIRELES, Ely Lopes. Mandado de Segurança, 22ª ed., atualizada e complementada com as Emendas Constitucionais, a legislação vigente e a mais recente jurisprudência do STF e do STJ por Arnold Wald e Gilmar Ferreira Mendes. Malheiros : São Paulo, 2000, pg. 21.

  60. MOREIRA, Wander Paulo Marotta, ob. Cit pg. 118/119

  61. CHIMENTI, Ricardo Cunha. ob.cit. 160/162

  62. CHIMENTI, Ricardo Cunha. ob.cit. 162

  63. FIGUEIRA JUNIOR, Joel Dias e LOPES, Maurício Antonio Ribeiro. db. cit. pg. 232.

  64. NOGUEIRA, Paulo Lúcio. ob. cit. pg. 38.

  65. Revista dos Tribunais 702, pg. 198 e seguintes

  66. NOGUEIRA, Paulo Lucio. ob. cit. pg. 38

  67. FUX, Luiz e BATISTA, Weber Martins. Ob. cit. pg. 248

  68. NEGRÃO, Theotônio. Código de Processo Civil e Legislação em Vigor. 33 ed. atualizada até 16 de janeiro de 2002. São Paulo : Saraiva, 2002, pg.1514

  69. MOREIRA, Wander Paulo Marotta. ob. Cit. pg. 103/104

  70. CHIMENTI, Ricardo Cunha. Ob. Cit.

  71. Consolidação dos Enunciados Jurídicos Cíveis e Administrativos, em vigor, resultante das discussões dos Encontros de Juízes de Juizados Especiais Cíveis e Turmas Recursais do Estado do Rio de Janeiro, publicada no DORJ de 21. 09.2012, Parte III, pg 1/3

  72. BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. 7 reimpressão Rio de Janeiro : Campus, 1992.

  73. ALEXY, Robert. Teoria de Los Derechos Fundamentales. Madrid : Centro de Estúdios Constitucionales, 1993

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