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[MODELO] Retribuição acionária em contratos de participação financeira: violação à lei das Sociedades Anônimas

» sociedade anônima

Retribuição acionária em contratos de participação financeira. Sociedade de economia mista concessionária de serviços de telecomunicações

Empresas firmaram contrato de participação financeira com empresa de telecomunicações (então sociedade de economia mista), com vistas a obter retribuição na forma de participação acionária, mas que não foi cumprido integralmente.

EMENTA: SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO DE TELECOMUNICAÇÕES. CONTRATOS DE PARTICIPAÇÃO FINANCEIRA. Obrigação do particular em integralizar capital na companhia como condição legal e estatutariamente imposta para habilitar-se à prestação do serviço de telefonia fixa em caráter individualizado. Contrato autorizado e regulamentado pela Administração, vinculando órgão da administração indireta e particulares, sofrendo influxo das regras de direito privado (CF/88, art. 173, parágrafo 3º) e também submissão aos princípios constitucionais que regem a Administração Pública (CF/88, art. 37). Inobservância dos critérios impostos pela lei societária, pela concessionária, ao proceder a capitalização dos aportes financeiros, alterando, em grande parte dos casos, o regime de competência e, consequentemente, retribuindo, para particulares que integralizaram iguais quantias no mesmo exercício social, diferentes lotes de ações, capitalizando, emitindo e subscrevendo, em exercício posterior, lotes a menor de ações cuja capitalização ocorrera no exercício anterior. Agressão abusiva à isonomia, ao direito adquirido, ao ato jurídico perfeito e ao direito de propriedade, além de infringência à Lei das Sociedades Anônimas. Portaria Ministerial. Distinção entre Ordem e Autorização. Ao permitir a subscrição das ações integralizadas em período de até 12 meses, a Portaria Ministerial, com vistas a tornar operacionável a emissão e subscrição de ações que eram integralizadas diariamente aos milhares, conferiu mera autorização – atendendo ao interesse público de tornar exeqüível para a concessionária o atendimento à legislação societária, permitindo seu funcionamento -, flexibilizando prazos de atos que deveriam ser instantâneos e concomitantes. Diferindo no tempo os atos de integralização, emissão e subscrição das ações, não foi derrogado e nem alterado o critério de escrituração da lei societária (art. 177 da lei 6.404/76) e nem as regras gerais de contabilidade, que impõem o registro das mutações patrimoniais segundo o regime de competência. Atos autorizados permanecem vinculados à lei e aos princípios constitucionalmente positivados, devendo ser exercitados, também, com razoabilidade. Dever da concessionária de perseguir o interesse público efetivando os princípios constitucionais e respeitando aos direitos e garantias individuais. Legitimidade da Portaria que não implica legitimação de atos praticados com base em interpretação equivocada da mesma. Hermenêutica. Interpretação do negócio jurídico na integralidade de seu contexto. Direito dos particulares à obter, por via judicial, o adimplemento completo da obrigação a que furtou-se a concessionária.

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PARECER

SUMÁRIO: I – Introdução; II – A análise da questão; III – Eficácia e vinculação dos princípios constitucionais; IV – Legalidade e isonomia; V – Alguns aspectos de hermenêutica; VI – A questão controvertida; VII – A práxis da capitalização na Lei das Sociedades Anônimas; VIII – Conclusões;

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I – Introdução

1.- A consulta em questão origina-se de inconciliáveis dissídios jurisprudenciais (1) entre várias Câmaras do TJRS, envolvendo a conceituação e os reflexos de negócios jurídicos praticados entre Sociedade de Economia Mista Concessionária de Serviço Público de Telecomunicações e particulares, que aportavam capital àquela no intuito de tornarem-se aptos à obtenção de serviço público de telecomunicações de forma individualizada.

2.- O ponto controvertido centra-se na incorreta retribuição acionária efetuada pela concessionária. Os particulares entendem que a retribuição deveria ter sido feita em conformidade com a legislação societária, ou seja: deveria ter sido procedida a divisão do capital integralizado pelo valor patrimonial das ações da concessionária apurado no último balanço do exercício social anterior e, desta forma, seria obtido o número de ações que deveriam ser emitidas e subscritas em favor do aderente.

3.- O procedimento supra foi adotado com relação a uma parte dos acionistas; outros, porém, somente tiveram suas ações emitidas e subscritas no exercício social seguinte àquele em que procederam a integralização do capital. Apurado, no final daquele exercício, um valor patrimonial maior do que o vigente no exercício em que deu-se a capitalização, ao efetuar-se o cálculo da retribuição acionária, foram emitidas e subscritas menos ações do que teriam sido se procedida a emissão e subscrição na mesma competência.

4.- A concessionária justifica seu proceder com base em Portaria Ministerial, que lhe autorizaria a proceder as capitalizações em um período de até 12 meses. Derivando o procedimento de norma impositiva para a concessionária, seu proceder seria legítimo, não merecendo prosperar as pretensões dos acionistas que receberam lotes de ações a menor.

5.- Nas próximas páginas, trataremos de traçar as características jurídicas dos negócios pactuados, as hipóteses e os limites da interferência do Estado na economia e nos pactos, os reflexos da submissão da concessionária aos princípios que regem a administração pública e às leis societárias, o interesse público e a constituição como norte da legalidade e legitimidade dos atos normativos e administrativos, amparados em sólida base hermenêutica. Ao fim, restará demonstrado que a incidência das normas de direito público, antes de afastar a pretensão dos acionistas, lhes ampara de forma conclusiva e definitiva.

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II – A análise da questão

6.- Através de adesão aos chamados Contratos de Participação Financeira, todo o cidadão que pretendesse acesso a uma linha telefônica, bem de interesse social, vinculava-se com as empresas de Economia Mista Concessionárias de Serviço Público de Telecomunicações. Paralelamente ao acesso ao serviço público de telefonia, via adesão a contrato autorizado e regulamentado pela Administração, o aderente era compelido a subscrever aumento de capital da concessionária, sendo contratualmente cominada uma retribuição acionária.

7.- Os contratos pactuados pelas concessionárias de serviços públicos sofrem limites, cláusulas e condições impostas pelo Poder Público, o qual disciplina os pactos e limita a autonomia das partes vinculadas. (2) Há uma clara intervenção constitutiva por parte da Administração, do qual deflui que para a própria validade do vínculo, exige-se que o ajuste seja formalizado dentro das exigências legais, devendo também o adimplemento do pacto ser feito com estrita observância daquelas exigências. (3)

8.- A concessão, exploração e expansão das atividades de telefonia, como visto, não estão submetidas a interesses meramente privados, ou seja, as disposições inerentes a estes assuntos refogem ao disciplinamento pela simples via volitiva, harmonizando-se com o interesse público que se sobressai pela regulamentação.

000.- MARCELLO CAETANO (4) enfatiza que, apesar de nos contratos administrativos ocorrer a sujeição de ambas as partes ao interesse público: contratante particular e público, "a vinculação característica do contrato existe nas cláusulas que determinam o objecto e se destinam a preservar e remunerar o interesse privado chamado a colaborar na realização do fim administrativo, e que criam para o contraente público o dever de assegurar o equilíbrio financeiro inicial nas condições estipuladas, ou nas novas condições criadas por actos do Poder".

10.- Insinuando o princípio da proporcionalidade como critério de aferição da validade do ato administrativo, aduz o autor que é da índole da atividade administrativa o adaptar-se às exigências do interesse público, sujeitando os contratantes ao "poder conferido à Administração de fazer nas prestações contratuais as modificações estritamente exigidas pelo interesse público."

11.- JUAREZ FREITAS (5) leciona que o administrador, ao praticar Ato Vinculado, fica totalmente adstrito à letra da lei e que, mesmo nos campos em que lhe é permitida Discricionariedade, fica o administrador obrigado à motivação do ato, em conformidade com os Princípios que regem a Administração e, se for o caso, com as leis e regulamentos que disciplinam a matéria.

12.- Inegável a lógica do raciocínio, uma vez que tais limites são essenciais para caracterização do Regime Democrático sob império da lei, que encontra negação no arbítrio. Partindo-se da idéia de supremacia e unidade da Constituição, do Ordenamento Jurídico como um sistema coerente e hierarquicamente estruturado; de que os Poderes encontram-se divididos, com competências distintas, havendo vinculação de todos, no Estado Democrático de Direito, à efetivação e concretização dos princípios e valores maiores insculpidos na Constituição (6), norteados pelos Direitos e Garantias Individuais e Coletivos, não é razoável visualizar a existência de Interesse Público fora dos limites legalmente estabelecidos, ou que implique sacrifícios desproporcionais e sem razoável justificativa. (7)

13.- Neste sentido, o professor FÁBIO KONDER COMPARATO (8), ao dissertar acerca do Princípio da Proporcionalidade, citando HARTMUNT MAURER, ensina que as medidas restritivas das liberdades, devem ser substancialmente apropriadas, ou seja, proporcionais aos fins visados. O jurista informa que na doutrina administrativa alemã foram explicitados três critérios cumulativos para o reconhecimento da proporcionalidade no exercício do poder:

a)"A medida somente é apropriada, quando ela pode, em regra, alcançar o resultado visado";

b)"A medida apropriada somente é necessária, quando não existe outro meio adequado à disposição, o qual seja menos prejudicial aos atingidos e à coletividade em geral";

c)"A medida necessária somente é proporcional quando não tenha nenhuma outra relação com o resultado visado";

14.- GILMAR FERREIRA MENDES (000), refere que um juízo definitivo sobre a proporcionalidade ou razoabilidade da medida há de resultar da rigorosa ponderação entre o significado da intervenção para o atingido e os objetivos perseguidos pelo legislador (proporcionalidade ou razoabilidade em sentido estrito). O pressuposto da adequação (geeignetheit) exige que as medidas interventivas adotadas mostrem-se aptas a atingir os objetivos pretendidos. O requisito da necessidade ou da exigibilidade (Notwendigkeit oder Erforderlichkeit) significa que nenhum meio menos gravoso para o indivíduo revelar-se-ia igualmente eficaz na consecução dos objetivos pretendidos. (10)

15.- CAIO TÁCITO (11) acrescenta que o S.T.F. tem reiteradamente acolhido os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, repelindo a ilegalidade de atos nos quais a discrepância entre o motivo e o fim evidencia a falta de congruência ou adequação, tornando excessivo e desarrazoado o objeto da manifestação do legislador ou do administrador, em detrimento de direito ou liberdade.

16.- Não diverge o ensinamento de FÁBIO KONDER COMPARATO, (12) o qual refere que o Tribunal Constitucional Alemão referendou a exigência de proporcionalidade nas medidas de restrição das liberdades fundamentais como mero corolário do princípio do Estado de Direito, entendendo-o como elemento substancial intrínseco de controle de constitucionalidade das normas.

17.- O professor JUAREZ FREITAS (13) enfatiza que o juízo de proporcionalidade aparece, sobremodo, no debate dos direitos fundamentais, ocorrendo violação ao princípio quando, tendo dois valores legítimos a sopesar, o administrador prioriza um em detrimento ou sacrifício exagerado do outro. Realçando a técnica da ponderação de interesses (14) na aplicação do princípio da proporcionalidade, pontifica o estudioso que "mais do que a vedação de excessos, exige a ponderação e a racionalidade prudente do administrador e de quem controle os seus atos, contratos e procedimentos" ressaltando que "o administrador público (…) está obrigado a sacrificar o mínimo para preservar o máximo de direitos"

18.- Na lição de CAIO TÁCITO (15) "o diagnóstico de compatibilidade da substância dos atos administrativos, com a finalidade legal a que são adstritos, conduz a que o exame de sua validade não se contenha nos aspectos exteriores da manifestação de vontade. O controle de legalidade evoluiu para verificar a existência real dos motivos determinantes da decisão administrativa, a importar no acesso à motivação expressa ou implícita do ato administrativo. A motivação é, em certos atos, exigência legal de sua validade. Mesmo, porém, quando não exigida, cabe ao intérprete, atento aos antecedentes que condicionam a emissão do ato de vontade do administrador, verificar se os motivos são verdadeiros e aptos a produzir o resultado. E, mais ainda, o exame da motivação do ato permitirá ao controle de legalidade avalizar se o nexo causal entre os motivos e o resultado do ato administrativo atende a dois outros requisitos essenciais: o da proporcionalidade e o da razoabilidade, que são igualmente princípios fundamentais condicionantes do poder administrativo. O conceito de legalidade pressupõe, como limite à discricionariedade, que os motivos determinantes sejam razoáveis e o objeto do ato proporcional à finalidade declarada ou implícita na regra de competência. (…) Os princípios de que a ação administrativa deve conduzir a um resultado razoável e proporcional à finalidade da lei inibe o abuso de poder e o arbítrio da autoridade, permitindo ao administrado a lícita fruição de seus direitos e interesses legítimos."

1000.- As lições refletem-se nos contratos administrativos. Inobstante os amplos poderes para o contratante público alterar e extinguir o vínculo, imprescindível o total respeito ao pactuado no tangente aos interesses econômicos do contratante privado. Se, de um lado, o contrato administrativo confere prerrogativas de autoridade à Administração contratante (direta ou indireta), de outro lado, garante ao aderente pleno resguardo aos seus interesses econômicos compostos no ajuste, uma vez que, também nos contratos administrativos vigora o princípio de que o contrato harmoniza interesses das partes e impõe o recíproco acatamento dos respectivos objetivos. (16) As vantagens ofertadas que instigaram o contratado a compor-se com o contratante governamental ficam garantidos nos termos em que se tenham estabelecido no contrato. É da índole dos contratos administrativos a formação de um ajuste equilibrado, obsequioso aos interesses de ambos os contratantes, empenhados em um esforço comum, útil ao interesse público. (17)

20.- A equação econômico-financeira (18), ou equilíbrio econômico-financeiro do contrato, por envolver Ato Jurídico Perfeito, Direitos Adquiridos (1000) e Direito de Propriedade (20), é imutável pelo Poder Público, implicando dever de total resguardo dos interesses econômicos do aderente, expressos no que se ajustou por ocasião do acordo. (21) Nesta relação de igualdade, ao encargo de um, corresponde, como contrapartida, a retribuição ajustada, cujo valor não pode se corroído e cujo equilíbrio não pode ser comprometido unilateralmente.

21.- A doutrina (22) esclarece que "o respeito aos direitos adquiridos é uma necessidade imposta pelo instinto de conservação da sociedade, que não teria organização estável, nem base para o seu natural desenvolvimento, se a ordem jurídica e os direitos, que ela assegura, se dissolvessem com as sucessivas reformas da legislação," fornecendo conceito segundo o qual "direito adquirido é um bem jurídico, criado por um fato capaz de produzi-lo, segundo as prescrições da lei então vigente, e que, de acordo com os preceitos da mesma lei, entrou para o patrimônio do titular" e referindo o contrato como um dos instrumentos aptos à aquisição de direitos.

22.- Oportuna a lição do S.T.F. em declaração de voto do Ministro CELSO MELLO (23), segundo a qual:

"(…) razões de Estado não podem ser invocadas para justificar o descumprimento da Constituição. Esse fundamento, quando invocado para dar suporte a pretensões governamentais, além de mostrar-se inaceitável, revela-se incompatível com a própria essência de que se acha impregnada a noção de Estado Democrático de Direito, conforme tem reiteradamente proclamado a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (AG 234.163/MA (AgRg), Rel. Min. Celso de Mello, v.g.).

"Impõe-se advertir, por isso mesmo, com apoio em autorizado magistério doutrinário (ENTERRÍA, Eduardo García de. La lucha contra las inmunidades del poder. 3. ed., Madrid: Editorial Civitas, 100083), que as razões de Estado – quando invocadas como argumento de sustentação da pretensão jurídica do Poder Público ou de qualquer outra instituição – representam expressão de um perigoso ensaio destinado a submeter, à vontade do Príncipe (situação que se mostra absolutamente intolerável), a autoridade hierárquico-normativa da própria Constituição da República, comprometendo, desse modo, a idéia de que o exercício do poder estatal, quando praticado sob a égide de um regime democrático, está permanentemente exposto ao controle social dos cidadãos e à fiscalização de ordem jurídico-constitucional dos magistrados e Tribunais.

"O Supremo Tribunal Federal, por mais de uma vez, teve o ensejo de repelir esse argumento de ordem política (RTJ 164/1.145-1.146, Rel. Min. Celso de Mello) por entender que a invocação das razões de Estado – além de deslegitimar-se como fundamento idôneo de impugnação judicial – representaria, por efeito das gravíssimas conseqüências provocadas por seu eventual reconhecimento, uma ameaça inadmissível às liberdades públicas, à supremacia da ordem constitucional e aos valores democráticos que a informam, culminando por introduzir, no sistema de direito positivo, um preocupante fator de ruptura e de desestabilização:

"Motivos de ordem pública ou razões de Estado – que muitas vezes configuram fundamentos políticos destinados a justificar, pragmaticamente, ex parte principis, a inaceitável adoção de medidas que frustram a plena eficácia da ordem constitucional, comprometendo-a em sua integridade e desrespeitando-a em sua autoridade – não podem ser invocados para viabilizar o descumprimento da própria Constituição (…)." (AG 244.578/RS, Rel. Min. Celso de Mello)

23.- Neste tópico, soma a lembrança do jurista MIGUEL REALE (24), quando refere que "foi judiciosamente ponderado pelo eminente Ministro MOREIRA ALVES que jamais poderia deixar de ser considerada também de ordem pública a norma constitucional que preserva os direitos individuais caracterizadores do Estado de Direito."

24.- O ato normativo ou administrativo, como visto, somente identifica-se com o Interesse Público quando não afronta a ordem jurídica e seus princípios informativos, que não subordinam-se às Conveniências da Administração. É dever desta realizar suas funções com observância da Legalidade, não agindo arbitrariamente e tendo o dever de, ao escolher entre os meios e alternativas disponíveis à realização do Interesse Público, aqueles que mostrarem-se mais harmonizados com os princípios mais elevados da ordem jurídica e que otimizem resultados, de modo a que obtenha-se o máximo de proveito com o mínimo de agressão. (25)

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III – Eficácia e vinculação dos princípios constitucionais

25.- Os princípios possuem essencial importância no sistema jurídico (26), uma vez que constituem-se na gênese e no espírito da construção legislativa. A esse respeito, observa o ilustre Professor CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO (27): "(…) violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegitimidade porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, costumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra."

26.- Assinala-se, ainda, que Princípios como os da Isonomia e da Legalidade encontram-se Constitucionalmente positivados (28), sendo inegável a exigibilidade de sua observância e aplicação, em face à sua eficácia vinculativa, (2000) tanto para o intérprete quanto para o administrador. A Sociedade de Economia Mista, Concessionária de Serviço Público, vincula-se não só ao estrito cumprimento das disposições legais, como ao seu cumprimento de modo a não agredir os direitos e garantias individuais, ou seja: agindo de modo a aplicar a dar vigência à legislação a que encontra-se adstrita e, ao aplicá-la, agir de modo a não ferir preceitos constitucionais (30), principalmente os que dizem respeito aos direitos e garantias individuais, harmonizados com aqueles que regem a Administração Pública. (31)

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IV – Legalidade e isonomia

27.- O chamado Princípio da Legalidade, na Administração Pública, tem o significado de vinculação à letra da lei, que condiciona todo procedimento, o sucessivo desencadeamento de atos e seus reflexos. "O princípio da legalidade, no âmbito do direito administrativo, foi desdobrado pela doutrina germânica, desde OTTO MAYER, na dupla idéia de supremacia da lei (Vorrang des Gesetzes) e de reserva de lei (Vorbestand des Gesetzes). (…) Em toda relação administrativa, a liberdade de ação do administrador acha-se vinculada: (…) não pela vontade do administrador estatal, mas pelo disposto em lei. A discricionariedade decisória ou estipulativa do administrador público somente existe, quando e onde a lei assim o determina. Daí porque não se admite nunca a interpretação analógica da lei administrativa nem, a fortiori, criação normativa pela administração Pública, fora dos casos especificamente autorizados por lei." (32)

28.- A impessoalidade da ação administrativa designa a igualdade de todos os administrados perante a lei. (33) Subscrevendo esta assertiva, Professor FÁBIO KONDER COMPARATTO (34), ao tratar do princípio da impessoalidade acrescenta: "exatamente porque a autoridade administrativa somente pode agir quando a lei a autoriza, e, levando-se em conta, ademais, que a única justificativa ou legitimidade da ação administrativa consiste na realização do interesse público, o administrador estatal está terminantemente proibido de fazer acepção de pessoas, entre os administrados, segundo suas preferências subjetivas. No Estado contemporâneo, a ação administrativa é um dos instrumentos de concretização da lei, como norma geral e abstrata."

2000.- O constitucionalista JOSÉ AFONSO DA SILVA (35) ressalta que, no direito pátrio, tanto a doutrina quanto a jurisprudência convergem que a expressão da igualdade perante a lei tem como destinatários tanto o legislador quanto os aplicadores da lei. Segundo observa SEABRA FAGUNDES (36) – o princípio significa para o legislador "que, ao elaborar a lei, deve reger, com iguais disposições, os mesmos ônus e as mesmas vantagens – situações idênticas, e, reciprocamente, distinguir, na repartição de encargos e benefícios, as situações que sejam entre si distintas, de sorte a quinhoá-las ou gravá-las em proporção às suas diversidades".

30.- Já foi dito que, se o legislador pudesse criar normas distintivas de pessoas, coisas ou fatos, que devessem ser tratados com igualdade, o mandamento constitucional seria inteiramente inútil. Para FRANCISCO CAMPOS (37) "nos sistemas constitucionais do tipo do nosso não cabe dúvida quanto ao principal destinatário do princípio constitucional de igualdade perante a lei. O mandamento da constituição se dirige particularmente ao legislador e, efetivamente, somente ele poderá ser o destinatário útil de tal mandamento. O executor da lei já está, necessariamente, obrigado a aplicá-la de acordo com os critérios ajustados na própria lei. Se esta, para valer, está adstrita a se conformar ao princípio da igualdade, o critério da igualdade resultará obrigatório para o executor da lei pelo simples fato de que a lei o obriga a executá-la com fidelidade ou respeito aos critérios por ela mesma estabelecidos."

31.- O STF já teve oportunidade de pronunciar-se no sentido de que são inconstitucionais as discriminações não autorizadas pela Constituição. (38) O ato discriminatório é inconstitucional. (3000)

32.- Segundo ensinamento de KONRAD HESSE (40), a igualdade jurídica "pede a realização, sem exceção, do direito existente, sem consideração da pessoa: cada um é, em forma igual, obrigado e autorizado pelas normalizações do direito, e, ao contrário, é proibido a todas as autoridades estatais, não aplicar direito existente a favor ou à custa de algumas pessoas. Nesse ponto, o mandamento da igualdade jurídica deixa-se fixar, sem dificuldades, como postulado essencial do Estado de Direito. (…) O direito existente obriga e autoriza portanto, seus destinatários, não só sem consideração da pessoa, sem que se trate de seu conteúdo; mas esse conteúdo mesmo deve corresponder ao princípio da igualdade. (…) O princípio da igualdade proíbe uma regulação desigual de fatos iguais; casos iguais devem encontrar regra igual."

33.- Nas palavras de GILMAR MENDES (41), "o princípio da isonomia pode ser visto tanto como exigência de tratamento igualitário (glichbehandlungasgebot), quanto como proibição de tratamento discriminatório (unglichbehandlungsverbot). A lesão ao princípio da isonomia oferece problemas sobretudo quando se tem a chamada exclusão de benefício incompatível com o princípio da igualdade (willkürlicher Begünstigungsausschluss). Tem-se uma exclusão de benefício incompatível com o princípio da igualdade se a norma afronta ao princípio da isonomia, concedendo vantagens ou benefícios a determinados segmentos ou grupos sem contemplar outros que se encontram em condições idênticas. Essa exclusão pode verificar-se de forma concludente ou explícita. Ela é concludente se a lei concede benefícios apenas a determinado grupo, a exclusão de benefícios é explícita se a lei geral que outorga determinados benefícios a certos grupos exclui sua aplicação a outros seguimentos. O postulado da igualdade pressupõe a existência de, pelo menos, duas situações que se encontram numa relação de comparação."

34.- A doutrina (42) esclarece que há duas formas de cometer uma inconstitucionalidade ferindo o princípio da isonomia, sendo também dois os possíveis desdobramentos jurídicos:

"Uma consiste em outorgar benefício legítimo a pessoas ou grupos, discriminando-os favoravelmente em detrimento de outras pessoas ou grupos em igual situação. Nesse caso, não se estendeu às pessoas ou grupos discriminados o mesmo tratamento dado aos outros. O ato é inconstitucional, sem dúvida, porque feriu o princípio da isonomia. Contudo, o ato é constitucional, é legítimo, ao outorgar o benefício a quem o fez. Declará-lo inconstitucional, eliminando-o da ordem jurídica, seria retirar direitos legitimamente conferidos, o que não é função dos tribunais. Como, então, resolver a inconstitucionalidade da discriminação? Precisamente estendendo o benefício aos discriminados que o solicitarem perante o Poder Judiciário, caso por caso. Tal ato é insuscetível de declaração genérica de inconstitucionalidade por via de ação direta.

"A outra forma de inconstitucionalidade revela-se em se impor obrigação, dever, ônus, sanção ou qualquer sacrifício a pessoas ou grupos de pessoas, discriminando-as em face de outros na mesma situação que, assim, permaneceram em condições mais favoráveis. O ato é inconstitucional por fazer discriminação não autorizada entre pessoas em situação de igualdade. Mas aqui, ao contrário, a solução da desigualdade de tratamento não está em estender a situação jurídica detrimentosa a todos, pois não é constitucionalmente admissível impor constrangimentos por essa via. Aqui a solução está na declaração de inconstitucionalidade do ato discriminatório em relação a quantos o solicitarem ao Poder Judiciário, cabendo também a ação direta de inconstitucionalidade por qualquer das pessoas indicadas no art. 103."

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V – Alguns aspectos de hermenêutica

35.- Os tópicos abordados passarão a mostrar sua importância prática para a análise da questão posta em toda a sua amplitude. Conforme ensina WALDIRIO BULGARELLI (43), a tarefa de subsunção jurídica se põe como a atividade principal do jurista. Para a tarefa interpretativa que deve ser antes de mais nada sistemática, pois o Direito, sob tal aspecto, é conjunto ordenado e estruturado de normas, a avaliação da fattispecie (terminologia de EMILIO BETTI correspondente ao alemão tatbestand, ao suporte fático de PONTES DE MIRANDA e ao fato-tipo de MIGUEL REALE) não pode prescindir do exame completo do fato como valorado pelo Direito, através de conceito, categorias e tipos. A individuação do tipo referido pela norma leva a sua qualificação, ou seja, ao ajustamento do fato à norma aplicável, ganhando relevo e delicadeza a operação em razão do axioma segundo o qual o mínimo desvio no fato leva ao máximo desvio na norma.

36.- Nas sempre lúcidas palavras de MIGUEL REALE "a visão de integralidade é da essência da teoria do conhecimento atual, infensa a todas as modalidades de setorização ou de unilateralidade" (44), lembrando RAIMUNDO BEZERRA FALCÃO (45) que "a interpretação não pode ser feita a contento se não levar em conta o todo", premissa inafastável em razão da ordem jurídica constituir-se em um sistema e, como tal, em uma unidade funcional, onde cada uma das partes ou elementos adquire sentido e função em razão do todo, sendo o sentido, função e aplicação da norma descortinados através de operação de integração, operação que leva em conta "plenitude lógica e plenitude axiológica." (46) O professor JUAREZ FREITAS (47) pontifica: "é bem de sublinhar que a hermenêutica jurídica contemporânea tem avançado a passos largos na senda de interpretar o sistema na sua dimensão de ordem axiológica ou teleológica, não se descurando, ao menos com a demasia de outrora, do nexo mais profundo que tem a ver com a relação entre compreender e aplicar".

37.- CARLOS MAXIMILIANO (48), por sua vez, cita como regras para o emprego do método teleológico de interpretação as seguintes: "a) as leis, conformes no seu fim devem ter idêntica execução e não podem ser entendidas de modo que produzam decisões diferentes sobre o mesmo objeto; b) se o fim decorre de uma série de leis, cada uma há de ser, quanto possível, compreendida de maneira que corresponda ao objetivo resultante do conjunto; c) cumpre atribuir ao texto um sentido tal que resulte haver a lei regulado a espécie a favor, e não em prejuízo de quem ela evidentemente visa a proteger e d) os títulos, as epígrafes, o preâmbulo e as exposições de motivos da lei auxiliam a reconhecer o fim primitivo da mesma" alertando que o direito deve ser interpretado inteligentemente, "não de modo que a ordem legal envolva um absurdo, prescreva inconveniências, vá ter conclusões inconsistentes ou impossíveis" (4000) evitando-se exegese que resulte um sentido contraditório para o fim colimado e, apresentado tal resultado, "deve-se presumir que foram utilizadas expressões impróprias, inadequadas, e buscar um sentido eqüitativo, lógico e acorde com o sentir geral e o bem presente e futuro da comunidade." (50)

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VI – A questão controvertida

38.- ORLANDO GOMES (51), ao dissertar acerca das características dos contratos pactuados com concessionárias de serviço público, referindo o exemplo específico das telecomunicações, diz:

"A natureza do serviço que exploram exige que estejam em permanente oferta de contratar, não tendo sequer direito a escolher a outra parte. Para as pessoas que precisam de tais serviços, geralmente prestados em regime de monopólio, também se faz sentir a necessidade de contratar, em outro sentido, porém, uma vez que não estão juridicamente obrigadas a fazê-lo. Como, entretanto, esses serviços se tornam dia a dia, indispensáveis a maior número de pessoas, a superioridade em que se encontrariam as empresas em relação aos usuários potenciais é neutralizada pelo Estado ao estabelecer as condições em que devam elas contratar, surgindo, em conseqüência, duas interessantes figuras negociais, o contrato regulamentado e o contrato de adesão. Conquanto as relações entre as empresas concessionárias de serviços públicos e os usuários não sejam consideradas contratuais por alguns, na verdade possuem essa natureza e são regidas pelas disposições concernentes aos contratos. Pouco importa que os pretendentes ao serviço se limitem a aceitar a oferta da empresa nas condições permitidas pelo regulamento inserto em seu conteúdo. Realizam contratos de adesão, mas nem por isso deixam de constituir relação contratual."

"No contrato autorizado, sua realização fica na dependência de autorização da autoridade administrativa. Em alguns, aproxima-se essa autorização da homologação porque irrecusável se as partes cumpriram estritamente as exigências legais para sua realização." (52)

3000.- Temos então que o Poder Público concedente, com vistas a atender ao interesse público em área de grande interesse social, permitiu, através de minucioso disciplinamento, contendo a integralidade dos direitos e obrigações das partes vinculadas, que consumidores e concessionária, mediante o acatamento e adimplemento das condições gerais do negócio autorizado, que a expansão dos serviços fosse feita através de Contratos de Participação Financeira. Os consumidores/aderentes adimpliram com a totalidade das suas obrigações e os contratos atingiram sua finalidade econômica, tendo ocorrido a ampliação da planta de telefonia e a instalação dos respectivos terminais individualizados, passando a concessionária a fornecer os serviços de telefonia aos novos assinantes; esta, entretanto, abusivamente, não efetuou a devida retribuição acionária, ferindo o ato jurídico perfeito, o direito adquirido, o direito de propriedade, a isonomia e a legalidade.

40.- Foi estipulada legal e contratualmente a proporcional retribuição em ações da participação financeira efetuada. Negar o direito à eqüitativa retribuição em ações àqueles que aportaram capital à concessionária representa quebra ao citado princípio da isonomia e locupletamento, uma vez que, apesar da contribuição para o aumento do patrimônio físico da concessionária e ampliação do número de consumidores/usuários, cuja retribuição pecuniária pelos serviços gera lucros, não recebem a contrapartida total do investimento – acesso ao terminal telefônico individualizado e retribuição acionária proporcional ao capital aportado. Não recebem a integralidade das ações subscritas e nem tem direito a dividendos e outros benefícios.

41.- Em contrapartida, outros consumidores/aderentes que igualmente aportaram capital à concessionária, no mesmo exercício, nos mesmos valores e nas mesmas condições, recebem seus terminais e também participação acionária maior. Como não são emitidas a totalidade das ações devidas aos aderentes, o capital social acaba dividido em menos frações, elevando o valor patrimonial das ações e concentrando, ainda, a distribuição de dividendos em mãos dos acionistas beneficiados pela arbitrariedade da concessionária. Resulta ferido, aí, o direito de Propriedade, garantia constitucional (art. 5º, XXII da CF/88), sendo abusiva a expropriação não abrigada em Lei e sem benefício público.

42.- Contrato autorizado, ou regulamentado, as obrigações dos aderentes foram integralmente adimplidas, num comportamento concludente. A concessionária, infringindo o princípio da legalidade, furtou-se às suas obrigações e, com isto, gerou prejuízo – diminuição patrimonial aos autores (dano emergente) alijando-os da distribuição de lucros via pagamento de dividendos (lucros cessantes). Deste empobrecimento, resultou o locupletamento dos demais acionistas, que detém ações com valor patrimonial maior em razão da não emissão da totalidade das ações devidas, concentrando o recebimento dos dividendos em detrimento dos contratantes discriminados.

43.- As sociedades de economia mista concessionárias de serviço público, órgãos da Administração Indireta, a exemplo dos órgãos da Administração Pública Direta, subordinam-se aos Princípios positivados no art. 37 da Constituição Federal de 100088, quais sejam: legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade. (53)

44.- Além disto, o S.T.J. já pronunciou-se no sentido de que as sociedade de economia mista subordinam-se às normas de direito privado suas atividades e formas de organização e funcionamento (54). Lê-se no corpo do acórdão:

"Ora, em nosso Direito Constitucional, "a empresa pública, a sociedade de economia mista e outras entidades que explorem atividade econômica sujeitam-se ao regime próprio das empresas privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas e tributárias" (CF, Art. 173, § 1º ).

"Na excelente monografia "Administração Indireta Brasileira", JOSÉ CRETELLA JÚNIOR comenta o preceito constitucional, referindo-se ao "empresário público", de quem diz: "Como pessoa jurídica pública que ingressa numa sociedade mercantil, o Estado não se coloca nem acima nem abaixo do direito, nem fora do direito, mas se submete às próprias regras que editou ("suporta a lei que fizeste"), tradução do princípio da legalidade, e no caso, às leis do direito público e às leis do direito privado" (Ed. Forense — 10008 — pág. 33000).

"JOSÉ AFONSO DA SILVA, em seu precioso "Curso de Direito Constitucional Positivo" (Ed. RT, 4ª Ed., pág. 51000) invoca HELY LOPES MEIRELLES, para afirmar: "o que a Constituição submete às normas do direito privado, não é, portanto, a instituição e a organização da empresa ou sociedade; é a sua atividade empresarial. Esta, sim, não pode afastar-se das normas civis, comerciais e tributárias pertinentes, para que não se faça concorrência desleal à iniciativa privada".

"Não se deve esquecer que o § 1º, quase incidindo em redundância, adverte que a empresa pública e a sociedade de economia mista sujeitam-se "ao regime jurídico das empresas privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas e tributárias". O busílis encontra-se na palavra "inclusive". Inclusive, significa: "de modo inclusivo; com inclusão; até, até mesmo" (Novo Dicionário Aurélio — 1ª Ed., pág. 758). Pode-se, assim, dizer que as sociedades de economia mista devem observar, por inteiro, o regime a que estão submetidas as empresas privadas.

"Ainda que existisse preceito infraconstitucional dizendo o contrário, ele seria ineficaz. É que, no Estado de Direito, o ordenamento jurídico parte da Constituição. Assim, qualquer norma que fuja aos ditames da Constituição é ineficaz. Se a norma contrária à Constituição é anterior à vigência desta, ela desaparece, por efeito de revogação. Não cabe, no Estado de Direito em que nos encontramos, interpretação no sentido de enxergar nas empresas estatais, entidades anfíbias, capazes de viver, tanto na seara do direito público, quanto nos limites do direito privado. É a velha questão hamletiana: ser ou não ser.

"Ou a entidade é sociedade de economia mista e se subordina ao direito privado, ou não o é. A segurança do Estado de Direito é avessa ao hibridismo. Quando o Estado cria uma sociedade de economia mista (ou empresa pública), ele o faz, no propósito de a lançar no livre jogo do Direito privado, após avaliar as vantagens e desvantagens que isto representa. Não quisesse enfrentar tais agruras, o Estado teria criado uma autarquia. Pelo Art. 20 do Código Civil, as pessoas jurídicas se diferenciam de forma absoluta de seus sócios.

"O Art. 173 da Constituição, em seu § 1º, diz: "A empresa pública, a sociedade de economia mista e outras entidades que explorem atividade econômica sujeitam-se ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas e tributárias."

"Favorecer empresa pública, dando-lhe acesso à prescrição qüinqüenal é subtraí-la ao regime do direito privado, em desrespeito ao Art. 173, § 1º, da Constituição Federal. Por isto, data vênia, dou provimento ao recurso para, homenageando a Constituição e a Súmula nº 3000 desta Corte, reformar o acórdão recorrido e negar provimento ao agravo."

45.- Toda a justificativa da desproporcional – e ilegal – retribuição acionária aos assinantes/aderentes, devida e inadimplida pela concessionária, centrou-se na AUTORIZAÇÃO concedida através de Portaria Ministerial no sentido de que a capitalização e subscrição poderia ser efetuada em um prazo de até 12 (doze meses).

46.- Note-se: a Portaria Ministerial referida pela concessionária, não era IMPOSITIVA de um dado procedimento, mas sim AUTORIZAVA um dado proceder. A Portaria não era, em si, discriminatória entre os aderentes aos contratos. O que gerou discriminações e concretizou ofensa à isonomia entre os assinantes foi o procedimento abusivo da concessionária.

47.- Ao conceder o prazo de 12 (doze) meses para a capitalização, a Portaria não afastou a incidência das regras da Lei da Sociedades Anônimas para emissão e subscrição das ações, nem a fórmula de cálculo das ações devidas. Apenas permitiu que o procedimento não fosse instantâneo, sem todavia, alterar ou afastar os critérios legais (até porque, indubitavelmente, a autoridade administrativa não detinha poderes, competência ou legitimidade para tanto).

48.- O prazo deferido deve ser interpretado como os 12 (doze) meses em que tem validade o balanço anual apurado no fim do exercício anterior ao que se deu a capitalização. A prática dos atos, que deveriam ser instantâneos e concomitantes, foi diferida no tempo, mantendo-se, porém, os critérios legais. (55) Esta interpretação é a única que coaduna-se com os princípios da hierarquia das normas, da legalidade, da reserva legal, da impessoalidade, da vinculação do administrador à lei, do direito de propriedade, do direito adquirido e do ato jurídico perfeito. Quando a administração emite regulamento, este não revoga e nem afasta a legislação ordinária, devendo ser, obviamente, compatibilizado e harmonizado com a legislação vigente. E a Portaria, como já dito, não era, em si, discriminatória; porém o procedimento da concessionária, embasado em interpretação equivocada daquela, indubitavelmente o foi, resultando em lesões indevidas a direitos e garantias individuais.

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