[MODELO] Réplica – Pedido de Antecipação de Tutela – Obrigação de Fazer – Repetição de Indébito – Danos Materiais e Morais – Fornecimento Contínuo do Serviço de Telefonia
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA 19a VARA CÍVEL DA COMARCA DA CAPITAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
Processo N. 2003.001.010517-1
FERNANDO MOURA BRASIL, já qualificada nos autos da AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS E MORAIS COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA, que move em face de TELERJ CELULAR S.A (TELEFÔNICA CELULAR), vem, por intermédio da Defensoria Pública, apresentar à V. Exa. a sua
RÉPLICA
nos termos que se seguem:
Inicialmente, cumpre asseverar que não abalam a pretensão autoral as razões de fato e de direito apresentadas pela Ré às fls. 40/50, por não constituírem fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do Autor.
DO CABIMENTO DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA
Constitui tal tutela uma providência do processo de conhecimento, a qual se destina a antecipar efeitos da sentença final, baseando-se na relevância do direito para a Ordem Jurídica, no caso de haver fundado receio desses direitos estarem sujeitos a dano irreparável, ou de difícil reparação. A providência pleiteada tem por fim evitar dano moral irreparável, situação vexatória a qual não poderia ser desfeita plenamente, gozando o autor apenas da possibilidade de reparação através de sucedâneo recursal.
É dever do Estado assegurar a eficácia concreta dos direitos do cidadão durante o máximo de tempo possível de duração desses direitos. Nosso conceito de cidadania não mais se contenta com uma proteção ao direito violado apenas no final do processo.
A providência requerida pela autora encontra eco na Jurisprudência de nossos Tribunais:
Antecipação da tutela que tem por objeto questão acessória de exclusão do nome do Agravante do cadastro do SERASA…Reforma da decisão guerreada, para concessão de Tutela Antecipada. Provido o recurso.”
(Ag. de instrumento, Unân. de 11/02/99 – 8.561/98 —Des. Célia Meliga Pessoa).
Face a todo o exposto, observa-se que não há que se proceder os argumentos da parte ré, visto estarem em desacordo com os princípios de defesa do consumidor, da boa-fé e da ética contratual, motivo pelo qual se requer a V. Exa. o desacolhimento dos argumentos e pedidos da peça contestatória, julgando procedente o pedido autoral, nos termos da inicial, REITERANDO O PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA, de forma a suspender todo e qualquer pagamento, até o deslinde da causa e apuração do realmente devido, bem como suspendendo toda e qualquer medida extrajudicial coercitiva, principalmente a abstenção, ou a exclusão, no lançamento do nome do demandante do cadastro de devedores( SERASA).
DO FORNECIMENTO CONTÍNUO DO SERVIÇO ESSENCIAL DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS TELEFÔNICOS
Nos dias de hoje, é inegável que ter à sua disposição um telefone é essencial para a existência digna do ser humano.
Sendo serviço essencial, as concessionárias que fornecem tais serviços públicos, conforme diz o art. 22 do CDC, são obrigadas a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e CONTÍNUOS.
Desse modo, inadmissível é a sua interrupção, seja por qualquer motivo, visto que o CDC não impõe qualquer limite a tal comando normativo.
Apesar disso, afirmou a ré que a interrupção do fornecimento de serviços telefônicos é lícita, quando fundada em “inadimplemento do usuário considerado o interesse da coletividade” (art. 6o, parágrafo 3o , II da Lei 8987/95 e art. 67 da Resolução 85/98 da ANATEL).
Ocorre que não há inadimplemento, pois a dívida na qual se funda não existe, por ter sido calculada com base em consumo que não ocorreu.
Mesmo que se preenchessem os requisitos para a aplicação dos dispositivos expostos, eles não poderiam ser levados em consideração para efeitos de corte de fornecimento do serviço.
A uma, porque a Resolução 85/98 da ANATEL é norma hierarquicamente inferior à lei 8078/90, que estabelece o princípio da continuidade dos serviços públicos essenciais. Aquela não pode limitar o alcance desta.
A duas, porque a lei 8987/95, apesar de lei ordinária, não prevalece em relação a este, em se tratando de relações de consumo. Isto ocorre porque o CDC, nestes casos, é a lei própria, específica e exclusiva.
Ademais, por uma questão de lógica e bom senso, não se pode prevalecer o entendimento que a chamada “lei das concessões”, crie fatos que efetivamente não existem, verdadeiros absurdos, tal como dizer que a mata do Brasil é azul e não verde, ou que não ocorre interrupção quando há o corte do fornecimento de energia; houve o que então?
Decorre daí o fato de que só o CDC ou a Constituição Federal (por ser diploma máximo do nosso ordenamento jurídico) podem estabelecer limites aos direitos do consumidor. Outras leis que tratem do assunto só podem prevalecer se forem mais benéficas ao consumidor, conforme se pode depreender dos artigos 5o , XXXII e 170 da CF.
Ademais, há expressiva corrente doutrinária entendendo que o CDC é, na sua natureza jurídica, uma lei complementar.
Com isso, preserva-se a integridade do CDC.
DA EXISTÊNCIA DE DANOS MATERIAIS E MORAIS
A interrupção dos serviços pela demandada, ao contrário do que esta procura afirmar, trouxe danos de natureza material ao demandante, que se viu obrigado a adquirir outro aparelho celular, como provado às fls.31, a fim de dar continuidade a sua atividade profissional, como esta exposto às fls.03. Além dos danos materiais, também lhe foi causado danos morais pela indevida inclusão de seu nome no cadastro de inadimplentes do SERASA, como consta às fls. 34, uma vez que a dívida foi originada de cobrança indevida na conta telefônica do seu celular.
DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA
A inversão do ônus da prova é princípio valioso para a efetiva defesa do consumidor. Outrora, a diferença brutal entre o prestador de serviços e o consumidor era nítida no momento da produção da prova, onde o último, em virtude de sua inferioridade econômica e técnica, não lograva êxito em provar fato constitutivo de seu direito. Destarte, buscou o Código de Defesa do Consumidor a técnica da inversão do onus probandi para amenizar tal desigualdade, encontrando guarida no princípio da vulnerabilidade do consumidor. Assim, na hipótese do art. 6o, VIII, do CDC, caberá ao juiz decidir pela inversão do ônus da prova se for verossímil a alegação ou hipossuficiente o consumidor.
Quanto à verossimilhança das alegações, nota-se que da simples leitura da narrativa inicial dos fatos pode-se aferir forte conteúdo persuasivo, sendo críveis e aceitáveis perante a realidade fática.
Em relação a hipossuficiência, resulta claro que a consumidora se encontra em patamares técnicos e econômicos flagrantemente inferiores ao da empresa demandada, ensejando, portanto, a inversão do ônus de provar, afim de que não reste prejudicada a defesa de seus interesses em juízo.
O objetivo do Código de Defesa do Consumidor não é outro senão o de conferir aos economicamente desfavorecidos uma posição jurídica que lhes permitam o acesso eficaz à tutela jurisdicional adequada e, para tal, criou regras como a inversão do ônus da prova (artigo 6o. VIII), a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica (artigo 28) etc. Se a Ré entende ser difícil para ela suportar o ônus da prova, evidente que, a fortiori, o será ainda mais para o Consumidor.
CONCLUSÃO
Após o exposto, constata-se que não procedem as alegações da parte ré. Fica claro que sua argumentação implica no desabono de princípios tão custosos ao povo brasileiro como os da defesa do consumidor, da boa-fé e da ética contratual. Desta forma, requer a V. Exa. que sejam desacolhidos os argumentos e pedidos da peça contestatória, julgando procedente o pedido autoral, nos termos da inicial e que seja deferida a concessão da antecipação parcial dos efeitos práticos da tutela, a fim de determinar a exclusão do nome do autor dos cadastros de devedores ( SERASA ).
Nestes Termos,
Pede Deferimento.
Rio de Janeiro, 27 de maio de 2003.