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[MODELO] Recurso contra suspensão condicional do processo ex officio – Apelação contra decisão que concedeu a suspensão condicional do processo sem requerimento da defesa

Recurso contra suspensão condicional do processo ex officio

Razões de recurso à Turma Recursal de Juizado Especial Criminal, impetrado pelo Ministério Público contra decisão que concedeu a suspensão condicional do processo, por não ter havido requerimento da Promotoria nem manifestação da própria defesa.

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Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da Comarca de Virginópolis/MG:

O Ministério Público, por seu Promotor de Justiça, no uso de suas atribuições legais, vem, perante V. Exª, não concordando, data vênia, com a decisão que deferiu a suspensão condicional do processo ao Réu João Batista de Santa Rita, com fulcro no artigo 50003, II do CPP c/c artigo 0002 da lei nº 000.0000000/0005, interpor recurso de APELAÇÃO para o tribunal ad quem, requerendo, após o regular processamento, a remessa dos autos ao aludido tribunal.

Virginópolis, 06 de fevereiro de 10000008.

Renato Franco de Almeida

Promotor de Justiça

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PROC nº 247/0007

RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO

RECORRIDO: JOÃO BATISTA DE SANTA RITA

RECURSO: APELAÇÃO

RAZÕES DE RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

I. Procurador

E. Tribunal,

C. Câmara,

Trata-se de recurso de Apelação interposto contra decisão que concedeu a suspensão condicional do processo, sem requerimento pela d. Defesa do réu João Batista de Santa Rita, o que, data vênia entendemos, não estar tal decreto em consonância com o ordenamento jurídico vigente.

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PRELIMINARMENTE

DO CABIMENTO DO RECURSO

A decisão ora fustigada indiscutívelmente possui natureza de decisão com força de definitiva, conforme o inciso II do artigo 50003 do Estatuto Processual.

Senão vejamos.

Tal decisum não incide sobre o mérito da demanda, eis que não condena, nem tampouco absolve o Réu da imputação que lhe é feita na denúncia. Todavia, põe fim à relação processual, posto que, cumpridas as condições impostas e por força do § 5º do artigo 8000 da Lei dos Juizados Especiais, extinguir-se-á a punibilidade.

"São também apeláveis as sentenças com força de definitivas, chamadas de interlocutórias mistas, que não decidem o mérito, mas põem fim à relação processual (terminativas) ou põe termo a uma etapa do procedimento (não terminativas)."

E a jurisprudência caminha no mesmo sentido:

"Suspensão Condicional do Processo.

I – Considerando que o ato judicial em questão tem natureza de "decisão com força de definitiva", o recurso cabível é a apelação, conforme artigo 50003, II do Código de Processo Penal, aplicável ao caso, subsidiariamente, nos termos do artigo 0002 da Lei 000.0000000/0005.

2 – A suspensão condicional do processo é um instituto caracterizado pelo princípio da despenalização, sendo autônomo e independente, seja em relação à transação penal ou mesmo quanto à composição civil dos danos, previstas respectivamente nos artigos 74 e 76 da Lei 000.0000000/0005.

3 – Ao Órgão do Ministério Público é dado o direito de aferir sobre a conveniência e oportunidade de apresentação da proposta mais adequada, sob o crivo do poder discricionário do julgador, desde que se atente para o caso concreto apresentado, notadamente em relação aos motivos, circunstâncias e conseqüências do ato tido como delituoso"

(Turma Recursal de Betim-MG – AC nº 001/0006 – Rel. Juiz Agostinho Gomes de Azevedo – Julg. 12/06/0006).

Destarte, cabível o presente apelo e sendo próprio, tempestivo, processado regularmente, merece ser conhecido.

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BREVE RELATO

João Batista de Santa Rita foi denunciado como incurso nas sanções do art. 331 do CP, por ter, no dia 17.04.0007, por volta de 20:00 h, na rua Monsenhor Domingos, Divinolândia de Minas, ter descatado o Policial Militar e vítima Márcio Aurélio Pereira, no exercício da função. Conta a denúncia que a vítima, no exercício da função, deparou com o veículo Fiat Fiorino parado no meio da rua, e vendo que no interior existia uma pessoa – o acusado – bateu no vidro do carro e disse para o motorista encostar o carro direito, porque estava no meio da rua, estacionado de forma irregular, e, após tal advertência, dirigiu-se ao estabelecimento comercial de Paulo Roberto Magalhães.

Neste momento, o denunciado parou o referido carro em frente ao estabelecimento comercial, e abrindo a porta, começou a xingar a vítima dizendo que a mesma estava pegando no seu pé, bem como afirmando que: "você conhece minha família?", "Nós dois não cabemos nessa cidade".

Por fim requer a condenação do acusado nas sanções do artigo 331 do CP.

Ao fundamentar a negativa de proposta de suspensão do processo, este subscritor asseverou que:

"Possuindo o denunciado antecedentes, conforme se extrai da FAC de fls. 2000/31, crime hediondo, deixo de propor a suspensão condicional do processo."

A denúncia não foi recebida ante o deferimento da suspensão condicional do processo ex officio (fls. 40).

O Réu foi intimado para audiência admonitória às fls. 42.

Aberta vista ao Ministério Público (fls. 40v).

É, em síntese, o relatório.

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DO MÉRITO

Como dito anteriormente, a presente irresignação tem como objeto desafiar decisão que concedeu a suspensão condicional do processo prevista na lei nº 000.0000000/0005 ex officio sem a necessária proposta do Órgão do Ministério Público, bem como sem requerimento da Defesa.

A par da inteligência, percuciência e lucidez que são características do seu trabalho como magistrado, ousamos discordar do eminente membro do Poder Judiciário, Dr. José Geraldo Braga da Rocha, no tocante aos pontos enfocados em sua r. decisão.

O ínclito magistrado enfatiza, de maneira escorreita, o puctuns dolens que são objetos do presente apelo.

Assim, assevera:

"Por outro lado, recente entendimento jurisprudencial comete ao juízo a concessão da suspensão do processo, presentes seus requisitos.

………………………………………

‘Por ser o instituto da suspensão do processo um direito público subjetivo do réu, e se o membro do Parquet se nega a fazer a proposta, pode o juiz conceder o benefício, acolhendo pedido da defesa, desde que preenchidos os pressupostos necessários.’

………………………………………

Apelação Criminal n. 101.334/1 – TJMG – Comarca de Belo Horizonte – Rel. Des. Sérgio Resende – in Diário do Judiciário de 17 de dezembro de 10000007." (fls. 40).

Dessarte, expostos estão os pontos controvertidos que dão supedâneo ao recurso ora interposto.

Enfrentemo-nos.

SUSPENSÃO DO PROCESSO: PROPOSTA PRIVATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO

A vexata quaestio de maior celeuma, sem dúvida, concerne a natureza jurídica dos institutos criados pela lei nº 000.0000000/0005, não quanto à sua aplicabilidade no tempo, porém se constituem ou não direitos subjetivos do réu.

Antes de entrarmos propriamente no assunto, temos que obtemperar com as razões históricas de tais institutos, mormente a transação penal e a suspensão condicional do processo.

Não restam dúvidas que tais institutos foram trazidos pelo legislador ordinário brasileiro do direito alienígena. Até mesmo o legislador constituinte de 10000008 inspirou-se no direito estrangeiro para trazer ao texto da Carta Magna o instituto norte-americano da bargaining, sob o qual se fundamenta a lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais (art. 0008, I, da CF/88).

Destarte, há muito tempo, no exterior, são utilizados determinados institutos jurídicos que, ao revés do que pensam alguns doutrinadores pátrios, não são despenalizadores, ao contrário, são minimizadores da reprimenda, eis que não deixam de aplicar um determinado tipo de pena (no caso da transação penal – art. 76 da lei nº 000.0000000/0005). No entanto, em virtude de o delito praticado pelo agente ser de pouca monta, de somenos importância, o legislador defere a possibilidade de a sociedade, através de seu representante, transacionar uma espécie de reprimenda, de regra pecuniária, que poderá ser aceita ou não pelo acusado.

O que há, na realidade, nestes institutos (incluindo-se aí a suspensão condicional do processo), é uma mitigação dos princípios da indisponibilidade e da obrigatoriedade da ação penal, bem como uma transação processual, em virtude do menor potencial lesivo que a conduta do agente possa causar a sociedade.

No mesmo sentido, o magistério de Afrânio Silva Jardim:

"Já a suspensão condicional processo seria uma mitigação do Princípio da Indisponibilidade da ação penal. O art. 42 do Código de Processo Penal diz que o Ministério Público não pode desistir da ação que tenha exercitado. A Lei n. 000.0000000/0005 diz que, naqueles casos, presentes determinados requisitos, o Ministério Público pode propor ao réu a suspensão condicional do processo, após o que, cumpridos aqueles requisitos que a Lei prevê e que o Juiz pode estipular, está extinta a punibilidade do réu, está extinta através desse instituto: suspensão condicional do processo.

"O réu teria direito à suspensão condicional do processo ou é uma mitigação ao Princípio da Indisponibilidade? É uma faculdade jurídica do Ministério Público? Parece-me que é uma faculdade jurídica do Ministério Público.

"Lembramo-nos de que, quando da defesa de minha tese na Universidade do Rio de Janeiro, A Ação Penal Pública – Princípio da Obrigatoriedade -, professores foram muito contundentes, dizendo: ‘Mas seu trabalho é muito antigo, seu trabalho é velho. Porque hoje, no Direito comparado, já não se trabalha o Princípio da Obrigatoriedade com relação às infrações de pequeno potencial ofensivo, crimes de bagatela. Tem-se que se dar ao Ministério Público maior poder de discricionariedade. Ele, como órgão do Estado, com garantias constitucionais de magistrado, pode abrir mão da instaraução do processo no interesse da política criminal, da sociedade’… Pugnavam, dessa forma, pela mitigação do Princípio da Obrigatoriedade, pela discricionariedade para algumas infrações, é lógico.

"A tanto não foi o legislador, porque, quando o Ministério Público deixa de oferecer a denúncia e faz a transação penal, há uma pena.

"A Lei nº 000.0000000/0005 dá a discricionariedade ao Ministério Público. Mas indaga-se se o Ministério Público tem esse poder de discricionariedade ilimitado, absurdo, absoluto, se tudo irá depender de cada Promotor de Justiça. Repetimos, a discricionariedade é isso. Como existe em alguns países, por motivo de política criminal, o Ministério Público pode deixar de exercitar a ação penal pública. Esse Promotor tem um entendimento e não o exercita; o outro Promotor tem outro entendimento e o exercita. De qualquer maneira, em termos de defesa, a mitigação do Princípio da Obrigatoriedade é melhor porque, em alguns casos, pelo menos, não será exercitada a ação ou o processo pode vir a ser suspenso, extinguindo-se a punibilidade sem a aplicação da pena.

"Deseja-se a discricionariedade, mas, quando ela vem, querem tirar a discricionariedade do Ministério Público e o Juiz passaria a ter a iniciativa da transação penal, a iniciativa da suspensão condicional do processo, o que não é papel do Juiz no sistema acusatório. Achamos até, dentro dessa perspectiva mais sistemática, que, ao propor a transação penal, o Ministério Público, de certa maneira, está exercitando um tipo de ação diferente. Porque, quando propõe a transação penal, ele tem que fazer uma imputação. Tem que atribuir ao autor do fato, para usar a expressão da Lei, ao réu, uma conduta; fazer umjuízo de tipicidade, até para saber se é uma infração de menor potencial ofensivo, e sugerir a aplicação de uma pena. De certa forma, é uma ação penal."

(in Juizados Especiais, Departamento Cultural da Associação Mineira do Ministério Público (AMMP), p. 84).

Dessarte, com o advento da lei dos Juizados Especiais houve, repetimos, uma mitigação dos princípios que regem a ação penal pública, deferindo o legislador poderes discricionários ao Ministério Público para que este possa aferir as circunstâncias de propor ou não a ação penal.

Com efeito, sob o aspecto histórico, a interpretação que leva ao raciocínio de que tais institutos (transação penal e suspensão condicional do processo) são um direito subjetivo do réu divorcia o pensamento jurídico pátrio do que ocorre com a inteligência jurídica internacional, posto que, não é de hoje, tal mitigação dos princípios norteadores da ação penal pública é usada sem maiores problemas, sendo privativa do Órgão ministerial tal discricionariedade.

Ora, o que era almejado pela quase unânimidade dos juristas pátrios tornou-se direito positivo. Por que se dar uma interpretação, que veremos adiante, inconstitucional, que está isolada no mundo jurídico?

Não faz sentido.

Sob outro enfoque, se nos apegarmos tão-somente a literalidade da lei, observaremos que os institutos ora em comento são de iniciativa privativa do Ministério Público.

Art. 8000 – Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (art.77 do Código Penal). (g.n.).

Ora, o verbo em evidência (poderá) dá o sentido de faculdade ao órgão ministerial de propor ou não a suspensão do processo.

A par de a interpretação literal ser de fragilidade notória, constitui subsídio inafastável para o exegeta na labuta da hermenêutica.

Demais disso, qualquer interpretação que queira retirar da Instituição ministerial o oferecimento privativo da suspensão do processo fere, sobremaneira, lei federal, eis que o texto legal é claro neste sentido, ensejando recurso especial para o Egrégio Superior Tribunal de Justiça, oportunidade em que se faz o necessário prequestionamento da matéria.

Não cabe argumentar, por outro lado, com a similitude existente entre a suspensão condicional do processo e a suspensão condicional da pena (sursis), mormente em virtude da literalidade do preceptivo do Estatuto Repressivo que, à simile da lei nº 000.0000000/0005, usa o verbo "poderá", conquanto doutrina e jurisprudência são assentes em que há, na realidade, um dever do juiz em conceder a suspensão da pena correlato a um direito subjetivo do réu em ver seu requerimento deferido, cumpridas as imposições legais.

Com respaldo nas mais atualizadas doutrina e jurisprudência, o sursis tem natureza de pena – restritiva de direitos.

"Miguel Reale Júnior, René Ariel Dotti, Ricardo Antunes Andreucci e Sérgio Marcos de Moraes Pitombo (Forense, 100087, p. 211 – Penas e Medidas de Segurança no Novo Código), entendem que o sursis encerrauma autêntica pena restritiva de direitos, não se tratando, assim, de mero benefício ou mesmo de um direito do réu. Dizem eles que a essência, claramente sancionatória, da suspensão condicional, como manifesta e evidente restrição de direitos, vem indicada pela Lei de Execução Penal, que a retirou dos incidentes de execução e a incluiu na parte referente à execução daspenas em espécie."

(apud Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial, Ed. Revista dos Tribunais, 10000005, p. 0004000)

"Atualmente, a suspensão condicional da pena, em face do Direito Positivo pátrio, não é, a rigor, um beneficio ou privilégio, porquanto durante o primeiro ano do prazo do período probatório o condenado deve obedecer a obrigação que constitui autêntica pena (limitação de fim de semana ou prestação de serviço à comunidade – arts. 43, I e III e 78, § 1º, do CP).

"Tão evidente é a natureza sancionatória ou punitiva do sursis que a lei expressamente determina ao juiz que, antes de invocá-lo, use, se cabível e conveniente, de outras medidas mais brandas: perdão judicial (art. 120); substituição da pena privativa de liberdade por simples multa (art. 60, § 2º) ou por penas restritivas de direitos (art. 77, III).

"0 Prof. Renê Ariel Dotti enfatiza que o sursis, como livramento condicional, é ‘reação penal de natureza peculiar com característica tipicamente sancionatória, consistente na restrição da liberdade e na satisfação de encargos e condições’ (Revista da AMAGIS III/12000).

"Outros renomados penalistas também compartilham desse entendimento, tais como Miguel Reate Júnior, Ricardo Antunes Andreucci, Sérgio Marcos de Moraes Pitombo (cf. Penas e Medidas de Segurança no Novo Código, Forense, 100085, p. 211), Júlio Fabbrini Mirabete (Execução Penal, 3ª ed., Atlas, 100087, p. 386) e Damásio Evangeiista de Jesus (Direito Penal, Parte Geral, de acordo com a Lei 7.20000 de 11.7.84, Saraiva, 11ª ed., 100086, p. 531).

"Outrossim, na atualidade, não mais se admite qualquer polêmica em torno dessa matéria, porquanto a Constituição Federal vigente é expressa no sentido de que constituem autênticas penas e por isso devem ser individualizadas no devido processo legal contraditório a privação ou restrição de liberdade, a prestação social alternativa e a suspensão ou interdição de direitos (art. 5º, XLVI, "a", "d" e "e")."

(TACRIM-SP – AC 567.043-3 – Rel. Silva Pinto).

Como visto, o sursis constitui uma espécie de pena mais branda.

Entretanto, para que fosse alcançada tal assertiva jurídica, os doutrinadores e jurisconsultos não olvidaram da relação jurídica processual finda, garantidos todos os direitos de defesa e contraditório que estão contidos no due process of law.

O mesmo não ocorre, porém, com a suspensão condicional do processo, eis que, a par de o autor dos fatos delituosos ficar condicionado a determinadas regras de conduta dentro no período de dois a quatro anos, este instituto tem como escopo final o não processamento do acusado, resultando numa espécie de barganha – transação processual – realizada entre o Órgão do Ministério Público e o autor dos fatos, que será, em sendo aceita, tão-somente homologada pelo magistrado.

Se assim não fosse, incorreríamos numa inconstitucionalidade sem precedentes do preceptivo da novel lei, posto que de acordo com a Constituição da República:

Art. 5º – …………………………………

LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

……………………………………………

No due process of law serão obedecidas regras de procedimento previstas em lei, de forma a assegurar a ampla defesa e o contraditório ao acusado, sem os quais não poderá o Estado-juiz aplicar pena alguma em razão do óbice constitucional transcrito acima, o que fica prequestionado para efeito de recurso ao E. Supremo Tribunal Federal.

É em virtude de tal comando constitucional que não podemos encarar ambos institutos (sursis e suspensão condicional do processo) como semelhantes, porquanto um é pena, o outro, não o é, por impedimento constitucional.

Caso raciocinemos diferentemente, esbarraremos, outrossim, no fato de que, segundo o recente diploma legal, o Ministério Público proporá a suspensão do processo no momento do oferecimento da denúncia, e, como tal, não há, ainda, processo.

Como, então, o Estado aplicará uma pena ao acusado que aceite a proposta de suspensão sem o devido processo legal?

Destarte, não podemos vislumbrar a natureza de pena para a suspensão consensual do processo, à simile do sursis, eis que este pressupõe um processo com instrução finda e a efetiva realização de todas as garantias constitucionais, ao passo que naquela, isto inexiste.

Eis um dos motivos – divergência de natureza entre os institutos – de ser privativa do Ministério Público a iniciativa da proposta, e, não direito subjetivo do acusado.

Por exatamente ser intuito do legislador afastar o processo em crimes taxativamente descritos, em obediência ao preceito constitucional (art. 0008, I, CF/88), é que não podemos, de forma alguma, pensar na suspensão do processo como uma espécie de pena.

Assim, repetimos, não podemos encarar o instituto da suspensão consensual do processo como direito subjetivo do réu.

No caso do instituto da lei nº 000.0000000/0005 não há processo, e, por conseguinte, não poderemos aplicar pena, por óbice constitucional. Logo, não se tratando de pena mais branda não pode o réu exigir o seu deferimento, mesmo porque a função precípua da suspensão do processo é fazer com que o réu não seja processado. O raciocínio é lógico.

E como se não bastasse, Marino Filho, Alexandre de Moraes, Gianpaolo Smanio e Luiz Fernando Vaggione:

"Vigorando o entendimento de que a suspensão condicional do processo é direito subjetivo do acusado, o art. 8000 da Lei nº 000.0000000/0005 será flagrantemente inconstitucional, uma vez que exclui do gozo deste "suposto direito" os acusados nos casos de ação penal privada, sendo, portanto, incompatível com o princípio da igualdade (art. 5º, caput).

"Na ação penal privada, também o acusado somente poderá ser dispensado do devido processo legal, desde que haja consenso com o querelante, através dos institutos da perempção e pelo perdão aceito, nos crimes de ação privada (art. 107, IV e V, do Código Penal). Sempre porém que houver consenso. Nunca poderá o Poder judiciário oferecer o perdão se não houver manifestação da acusação, na ação penal privada.

"O legislador, com a Lei nº 000.0000000/0005, igualou esta circunstância, permitindo que a sociedade, nos crimes de ação penal pública incondicionada, através do Ministério Público, dispensasse o acusado do devido processo legal, desde que houvesse consenso entre acusação e defesa."

(in Juizado Especial Criminal, Ed. Atlas, 10000006, p. 0005).

Embora a jurisprudência ainda seja vacilante a respeito, julgados existem onde se afirma ser privativo do Parquet a proposta de suspensão condicional do processo:

"A norma do art. 88 da mencionada lei é de cunho processual. As irradiações de natureza penal devem ser analisadas no âmbito próprio e no momento oportuno. Aplicação do art. 21 da Lei de Introdução ao Código Penal e do art. 0000 da nova legislação, não estando este contaminado pelo vício da inconstitucionalidade. Os arts. 76 e 8000 da lei nova não se constituem em direito público subjetivo do réu, mas apenas mitigam o princípio da obrigatoriedade da ação penal, ao adotarem o princípio da discricionariedade controlada. As propostas previstas na lei são de exclusivo e inteiro arbítrio do Ministério Público, que continua sendo, por força de norma constitucional, o dominus litis, não podendo seuqer ser substituído pelo magistrdo, em tais encaminhamentos. Embargos rejeitados."

(TARS – EI 20005063350008 – Rel. Luís Carlos Ávila de Carvalho Leite).

DIREITO SUBJETIVO DO RÉU: INCONSTITUCIONALIDADE DA INTERPRETAÇÃO

De início, cabe analisar se é possível uma mera interpretação de determinado instituto jurídico ser inconstitucional.

Para o deslinde da dúvida, sempre o notável Carlos Maximiliano:

"Forte é a presunção da constitucionalidade de um ato ou de uma interpretação,…"

(ob. cit., p. 307) (g.n.).

Ora, de acordo com tais escólios não só uma norma, porém a própria interpretação de determinada norma pode possuir a eiva de inconstitucionalidade.

E é, data vênia dos sempre autorizados entendimentos em contrário, de flagrante inconstitucionalidade a interpretação que se tem dado aos dispositivos da lei nº 000.0000000/0005 no que concerne ser um direito subjetivo do réu os institutos ali insculpidos, mormente no tocante à suspensão condicional do processo.

De acordo com o que preceitua a Carta Magna:

Art. 12000. São funções institucionais do Ministério Público:

I – promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;

II – zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia;

III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;

IV – promover a ação de inconstitucionalidade ou representação para fins de intervenção da União e dos Estados, nos casos previstos nesta Constituição;

V – defender judicialmente os direitos e interesses das populações indígenas;

VI – expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva;

VII – exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar mencionada no artigo anterior;

VIII – requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais;

IX – exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas.

§ 1º – A legitimação do Ministério Público para as ações civis previstas neste artigo não impede a de terceiros, nas mesmas hipóteses, segundo o disposto nesta Constituição e na lei.

§ 2º – As funções de Ministério Público só podem ser exercidas por integrantes da carreira, que deverão residir na comarca da respectiva lotação.

§ 3º – O ingresso na carreira far-se-á mediante concurso público de provas e títulos, assegurada participação da Ordem dos Advogados do Brasil em sua realização, e observada, nas nomeações, a ordem de classificação.

§ 4º – Aplica-se ao Ministério Público, no que couber, o disposto no Art. 0003, II e VI. (g.n.).

Em consonância com o cristalino preceptivo constitucional, cabe, privativamente, ao Órgão do Ministério Público a promoção da ação penal pública, nos termos da lei.

Destarte, cabe também ao Parquet todas as variantes da ação penal pública.

Cabe perquirir, então, se constituem ou não variações da ação penal os institutos da transação penal e suspensão condicional do processo.

E afirmamos que sim.

Raciocinemos.

De acordo com o art. 74 e parágrafo único da lei dos Juizados Especiais:

Art. 74 – A composição dos danos civis será reduzida a escrito e, homologada pelo Juiz mediante sentença irrecorrível, terá eficácia de título a ser executado no juízo civil competente.

Parágrafo único – Tratando-se de ação penal de iniciativa privada ou de ação penal pública condicionada à representação, o acordo homologado acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação. (g.n.)

No tocante à transação penal, o acordo quanto à composição dos danos civis acarreta a renúncia ao direito de representação.

Ora, é indiscutível a natureza de condição de procedibilidade da representação, conditio sine qua non para a deflagração da ação penal pública condicionada.

Havendo tal renúncia, fica obstacularizada a transação penal, assim, este instituto é variante da ação penal, posto que fica condicionado, nos crimes cuja ação penal é da mesma natureza, a tal requisito processual.

Destarte, e como tanto a ação penal pública incondicionada e a condicionada são privativas do Ministério Público, a proposta de aplicação imediata da pena de multa ou restritiva de direito também o são, eis que necessitam da apresentação de representação por parte do ofendido para que se efetive (art. 12000, I, da CF/88).

No concernente à suspensão condicional do processo ocorre o mesmo.

Vimos anteriormente que a função precípua de tal suspensão é evitar que o acusado seja processado.

Pois bem.

De acordo com o parágrafo 6º do art. 8000 da lei nº 000.0000000/0005:

Art. 8000 – ……………………………………

………………………………………………..

§ 6º – Não correrá a prescrição durante o prazo de suspensão do processo.

De acordo com tal preceptivo, a prescrição da pretensão punitiva ficará suspensa durante o período de prova do acusado.

Ora, se a prescrição ficará suspensa dentro neste período tem-se como fundamento de tal cancelamento temporário o fato de obstada também ficar a ação penal que foi interrompida, a priori, pela apresentação da proposta de suspensão do processo, posto que, se assim não fosse, quando a sociedade, através da Instituição própria, desse continuidade à ação, o delito estaria, na maioria dos casos, prescrito, sucateando o jus puniendi estatal.

Há, sem menor sombra de dúvida, correlação estreita entre a suspensão do processo e a ação penal, haja vista que, a par de ser discricionariedade controlada do órgão ministerial a apresentação da proposta de suspensão do processo, quando esta ocorre, aquela – ação penal – fica a salvo das conseqüências que advirão com o decurso do tempo (prescrição).

Desta forma, sendo parte integrante do direito de ação que é deferido pelo Estado ao Representante da sociedade, é inconstitucional qualquer interpretação que não veja ser privativa do Ministério Público a proposta de suspensão condicional do processo, posto que esta Instituição possui a titularidade da ação penal pública, ferindo frontalmente o comando do art. 12000, I, da CF/88, o que, por oportuno, fica prequestionado.

À outro giro, vale lembrar a lição de Marino Filho, Alexandre de Moraes, Gianpaolo Smanio e Luiz Vaggione:

"A possibilidade de suspensão condicional do processo exige consenso entre a acusação e a defesa, dentro dos parâmetros regulados em lei. O Poder judiciário somente pode aferir a legalidade da proposta, sob pena de ferir os princípios constitucionais do contraditório e da exclusividade da ação penal pública e afastar o ius puniendi e o ius punitionis do Estado. Os Juizados Especiais Criminais, em consonância com a Constituição Federal, consagram o sistema acusatório, onde existe separação orgânica entre o órgão acusador e o órgão julgador. A possibilidade de o Poder judiciário, sem proposta do Ministério Público, conceder a suspensão estaria dando-lhe o controle sobre a ação penal pública, em clara incompatibilidade com o art. 12000, I, da Constituição Federal."

(in Juizado Especial Criminal, Ed. Atlas, 10000006, p. 0007)

No mesmo diapasão, o Procurador de Justiça do Parquet mineiro, Dr. Alberto Villas Boas:

"Importante registrar que a suspensão condicional do processo é instituto que se insere na regra da exceção da discricionariedade regulada e somente poderá ser proposta pelo Ministério Público, de vez que compete à instituição a ‘promoção privativa da ação penal pública, na forma da lei’ (CF, art. 12000, I)…

"Caso o Ministério Público entenda ser descabida a aplicação da suspensão condicional do processo, inviável cogitar da intervenção do Juiz para suprir a atuação da instituição, sob pena de violação à regra do art. 12000, I, da Constituição Federal."

(in Juizados Especiais, AMMP (Departamento Cultural), p. 48).

No mesmo sentido, Dr. Fernando Galvão da Rocha:

"A suspensão do processo é instituto que se insere no princípio de exceção da ‘discricionariedade regulada’ e somente pode ser proposta pelo Ministério Público. Não se trata de direito subjetivo do denunciado e, caso o Juiz suspenda o processo sem proposta do Ministério Público e aceitação do denunciado, cabe mandado de segurança ou correição parcial."

(in Juizados Especiais, AMMP (Departamento Cultural), p. 57).

"6.2. A suspensão do processo só pode ocorrer por proposta do Ministério Público, formulada com o oferecimento da denúncia e aceita pelo acusado e seu defensor. Tratando-se de transação processual e não de direito subjetivo do réu de obter a extinção da punibilidade sem julgamento do mérito, a sentença é meramente homologatória, podendo o Juiz apenas fixar outras condições adequadas ao fato e à situação pessoal do acusado, além das previstas no art. 8000, § 1º.

"O Juiz não poderá conceder a suspensão sem prévia proposta do Promotor de Justiça e aceitação pelo réu e seu defensor, cabendo, se isso ocorrer, correição parcial por error in procedendo, habeas corpus ou mandado de segurança."

(6ª estudo referente aos juizados especiais criminais da Procuradoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo, AMMP…, p. 61).

Até o Excelso Pretorio está sedimentando tal entendimento, segundo se infere das notas taquigráficas:

"Iniciado o julgamento de habeas corpus em que se discute a iniciativa exclusiva do Ministério Público para propor a suspensão condicional do processo prevista no art. 8000 da Lei 000.0000000/0005 (‘Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangida ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que…’). Votaram os Ministros Octavio Gallotti, relator, e Nelson Jobim, no sentido do indeferimento do pedido ao argumento de que não cabe ao magistrado, ante a recusa fundamentada do Ministério Público a requerimento de suspensão condicional do processo, o exercício de tal faculdade, visto que não se trata de direito subjetivo do réu, mas de competência do parquet. O julgamento foi suspenso em virtude do pedido de vista do Min. Marco Aurélio. HC 75.343-MG, rel. Min. Octavio Galloti, 18.6.0007."

E concluindo construiram o seguinte entendimento:

"Retomando o julgamento de habeas corpus (v. Informativo 76), o Tribunal, por maioria de votos, decidiu que a iniciativa para propor a suspensão condicional do processo prevista no art. 8000 da Lei 000.0000000/0005…. é uma faculdade exclusiva do Ministério Público, a quem cabe promover privativamente a ação penal pública (CF, art. 12000, I), não podendo o juiz da causa substituir-se a este."

(HC 75.343-MG, rel. originário Min. Octavio Gallotti, rel. para o acórdão, Min. Sepúlveda Pertence, 12.11.0007)

Como se vê, houve um error in procedendo por parte do juiz a quo ao conceder a suspensão do processo ex officio, carecendo de correção tal decisum, anulando-se o mesmo para que tenha prosseguimento normal o processamento do acusado.

Demais disso, perquirindo sob a ótica do sistema adotado pelo Direito pátrio no concernente ao meio de alçarmos a verdade jurídica, chegamos à conclusão que o nosso Código de Processo Penal adotou o sistema misto, concatenando o obsoleto sistema inquisitivo com o sistema acusatório, ou, para outros, tão-somente o sistema acusatório.

Assim, existirá, obrigatoriamente (art. 12000, I, CF/88), um órgão acusador distinto do órgão julgador, posto que, mesmo no âmbito penal, a jurisdição é inerte.

"O projeto atende ao princípio ne procedat judex ex officio, que, ditado pela evolução do direito judiciário penal e já consagrado pelo novo Código Penal, reclama a compelta separação entre o juiz e o órgão da acusação, devendo caber exclusivamente a este a iniciativa da ação penal."

(apud Exposição de Motivos do Código de Processo Penal, tópico A Ação Penal)

Ora, o órgão acusador constitucionalmente previsto para as ações penais públicas é o Ministério Público (art. 12000, I, da CF/88), não havendo dúvidas, nem mesmo quanto aos procedimentos instituídos pela lei nº 4.611/65, que toda disposição em contrário, se existente ao tempo da promulgação da Carta Magna, estará revogada, e, se for superveniente, será inconstitucional.

Eis a razão de o legislador ter deferido, privativamente, ao Ministério Público a proposta de transação penal e suspensão condicional do processo, porquanto qualquer atitude diversa do Poder legiferante estaria subvertendo a estrutura do moderno Direito Processual.

No mesmo sentido, Julio Fabbrini Mirabete:

"O sistema acusatório tem suas raízes na Grécia e em Roma, instalado com fundamento na acusação oficial, embora se permitisse, excepcionalmente, a iniciativa da vítima, de parentes próximos e até de qualquer do povo. No direito moderno, tal sistema implica o estabelecimento de uma verdadeira relação processual com o actum trium personarum, estando em pé de igualdade o autor e o réu, sobrepondo-se a eles, como órgão imparcial de aplicação da lei, o juiz. No piano histórico das instituições processuais, apontam-se como traços profundamente marcantes do sistema acusatório: "a) o contraditório, como garantia político-jurídica do cidadão; b) as partes acusadora e acusada, em decorrência do contraditório, encontram-se no mesmo pé de igualdade; c) o processo é público, fiscalizável pelo olho do povo; excepcionalmente permite-se uma publicidade restrita ou especial; d) as funções de acusar, defender e julgar são atribuídas a pessoas distintas e, logicamente, não é dado ao juiz iniciar o processo (ne procedat judex ex-officio); e) o processo pode ser oral ou escrito; f) existe, em decorrência do contraditório, igualdade de direitos e obrigações entre as partes, pois non debet licere actori, quod reo non permittitur; g) a iniciativa do processo cabe à parte acusadora, que poderá ser o ofendido ou seu representante legal, qualquer cidadão do povo ou um órgão do Estado". O sistema acusatário floresceu na Inglaterra e na França após a revolução, sendo hoje adotado na maioria dos países americanos e em muitos da Europa.

"O sistema misto, ou sistema acusatório formal, é constituído de uma instrução ínquisítiva ( de investigação preliminar e instrução preparatória) e de um posterior juízo contradítórío (de julgamento). Embora as primeiras regras desse processo fossem introduzidos com as reformas da Ordenança Criminal de Luiz XIX (1670), a reforma radical foi operada com o Code D´Instruction Criminelle de 1808, na época de Napoleão, espalhando-se pela Europa Continental no século XIX. É ainda o sistema utilizado em vários países da Europa e até da América Latina (Venezuela). No direito contemporâneo, o sistema misto combina elementos acusatórios e inquisitivos em maior ou menor medida, segundo o ordenamento processual local e se subdivide em duas orientações segundo a predominância na segunda fase do procedimento escrito ou oral, o que, até hoje, é matéria de discussão.

"No Brasil, a Constituição Federal assegura o sistema acusatório no processo penal. Estabelece ´o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes" (art. 5º, LV); a ação penal pública é promovida, privativamente, pelo Ministério Público (art. 12000, I), embora se assegure ao ofendido o direito à ação privada subsidiária (art. 5º, LIX); a autoridade julgadora é a autoridade competente – juiz constitucional ou juiz natural (arts. 5º, LIII, 0002 a 126); há publicidade dos atos processuais, podendo a lei restringi-la apenas quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem (art. 5º, LX)."

(in Processo Penal, Ed. Atlas, 10000005, p. 41/42).

No mesmo diapasão, o inigualável Pontes de Miranda:

"Princípio do conhecimento de ofício é o princípio antitético ao Ne iudex procedat ex officio (= não há tutela jurídica sem promoção, = nenhuma ação sem autor).

"Baldo de Ubáldis dizia: "Sententia debet esse conformas liberto". A proposição pertence ao mesmo sistema lógico que o Ne procedat iudex ex offício. O fundamento de política jurídica é amparar os indivíduos quanto a possíveis invasões do órgão do Estado, que postularia e julgaria. Não sendo conforme ao pedido, a sentença poderia ser além, ou fora do pedido, então estaria o juiz a proceder de ofício; não sendo conforme ao pedido, poderia ser aquém dele, e aí não estaria o juiz a proceder de ofício, mas sim a deixar de julgar. Por onde se vê que não é verdade ser o dito de Baldo de Ubáldis conseqüência do Ne procedat iudex ex offício (sem razão Giuseppe Chiovenda, Saggi, I, 157, 158). Os dois não coincidem em toda extensão. O Ne procedat iudex ex offício abrange atos do juiz que não são a sentença, mas o dito de Baldo de Ubáldis veda o decidir-se o citra petita que o Ne procedat iudex ex offício não apanha. Esse mais se parece com o Ne eat iudex ultra petita partium, que não abrange, aliás, tanto (e. g., o extra petita e citra petita), porém alcança qualquer ato postulacional. Outro brocardo é o Iudex secundum allegata et probata a partibus iudicare debet; e esse não faz corresponderem somente pedido e decisão, – exige a continuidade da abertura das questões, através das provas, até à sentença. Tem sobre o dito de Baldo de Ubáldis a vantagem de se referir ao alegado pelo réu."

(in Comentários ao Código de Processo Civil, atualização legislativa de Sergio Bermudes, Ed. Forense, Tomo I, 10000005, p. 50/51).

Como se vê, qualquer interpretação que leve ao raciocínio de não ser os institutos da lei dos Juizados Especiais privativas do Ministério Público estará, além de olvidar a Constituição da República em suas normas e princípios, subvertendo toda a estrutura da processualística moderna, eis que não cabe, e não pode caber, a uma só pessoa as funções de processar e julgar os súditos, não importando, outrossim, se a seara em exame é cível ou penal, posto que o arcabouço do Direito Processual é similar para ambas as disciplinas, sendo ramos de um mesmo tronco.

Ante o exposto, requer o Ministério Público o conhecimento e provimento do recurso interposto.

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