[MODELO] *Imunidade Tributária de Entidades Filantrópicas*
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO – 2ª TURMA
APELAÇÃO CÍVEL Nº
APELANTE : UNIÃO FEDERAL/FAZENDA NACIONAL
APELADO : FEDERAÇÃO DAS MISERICÓRDIAS E ENTIDADES FILANTRÓPICAS E BENEFICENTES DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
RELATOR : DES. FED. CASTRO AGUIAR
Egrégia Turma
Trata-se de mandado de segurança impetrado, em caráter preventivo, pela FEDERAÇÃO DAS MISERICÓRDIAS E ENTIDADES FILANTRÓPICAS E BENEFICENTES DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, a postular que a autoridade impetrada, o DELEGADO DA RECEITA FEDERAL NO RIO DE JANEIRO, seja impedido de adotar qualquer medida coercitiva tendente a exigir o pagamento do imposto de renda incidente sobre suas aplicações financeiras, na forma da Lei nº 9.532, de 11.12.1997.
Argumenta o impetrante que, uma vez que as entidades a ela afiliadas foram declaradas de utilidade pública e atendem aos requisitos do art.18 do CTN, o gozo da imunidade tributária instituída pelo art.150, VI “c’’ da Constituição da República lhes deve ser assegurado. Argúi a inconstitucionalidade do art.12 da Lei nº 9.532/97, que limita a imunidade contemplada no texto constitucional.
Às fls.95 foi deferida a cautela liminar.
Solicitadas, vieram aos autos as informações de fls. 118/117 a sustentar, em síntese, que “só poderia se justificar tal imunidade quando a renda, serviços ou patrimônio estivessem ligados estritamente aos fins beneméritos a que se destinam tais entidades e não ao jogo do mercado financeiro”.(sic)
O Ministério Público Federal, em primeira instância, opinou pela concessão da segurança (fls .285/291).
A sentença de fls. 618/623 julgou procedente o pedido, ao argumento de que as aplicações financeiras guardam relação com a atividade fim da instituição, na medida em que visam a preservar o seu patrimônio.
. Inconformada, interpôs a União Federal a apelação de fls.683/662, na qual traz os seguintes argumentos:
- A impetrante não anexou os atos de filiação das sociedades elencadas às fls. 101/110, capazes de comprovar a ligação destas com a recorrida, como havia sido determinado pelo magistrado às fls. 111.
- No mérito, sustenta a constitucionalidade dos arts. 12, 13 e 18 da Lei 9532/97, já que a imunidade do art. 150, VI, ‘c’ da Constituição está condicionada à expressão ‘atendidos os requisitos da lei’, querendo referir-se à lei ordinária.
- A imunidade conferida pelo Legislador Constitucional só se justifica na medida em que as entidades beneficiadas atendam a um fim público, sendo plenamente possível que lei obste o desvirtuamento da finalidade
. Contra-razões às fls.676/685, alegando, além da intempestividade do recurso:
- Os atos de filiação mencionados às fls. 101/110 estão devidamente acostados às fls. 183/221.
- Apesar de o art. 150, VI, ‘c’ da Constituição referir-se a ‘lei’, o art. 186, I, deixa clara a necessidade de lei complementar, já que pretende regular uma limitação constitucional ao poder de tributar.
- Toda e qualquer renda obtida por entidade de assistência social, mesmo que não oriunda de sua finalidade básica, encontra-se protegida pela imunidade, desde que o destino da renda seja integralmente revertido para suas finalidades estatutárias.
É o relatório.
. Mesmo que intempestivo o recurso, o art. 875, II do Código de Processo Civil impõe o reexame necessário da matéria.
. A decisão merece ser mantida.
As limitações constitucionais ao poder de tributar (art.150, CRFB) têm por finalidade impedir que os órgãos competentes para a instituição de tributos invadam áreas que, no interesse da sociedade, precisam ser preservadas de modo especial.
O Constituinte, ao estabelecer que a imunidade das entidades de assistência social compreende apenas o patrimônio, a renda e os serviços relacionados às suas atividades essenciais, não autorizou a tributação de ganhos derivados de aplicações financeiras, como quer a autoridade impetrada.
Se o produto das aplicações financeiras da entidade é utilizado na consecução de seus objetivos, não poderá ser alcançado pela norma tributante, porquanto afastado o seu caráter especulativo. Desde que as entidades referidas no art. 150, VI, ‘c’ atendam às exigências do art.18 do Código Tributário Nacional (não distribuir lucro e aplicar integralmente no país os recursos auferidos nesses investimentos), gozam de imunidade, reconhecendo-se o afirmado vínculo dos ganhos com os objetivos da instituição.
. Elucidativo sobre o tema, parecer do professor do professor ARNOLDO WALD, do qual extraio o seguinte excerto:
“Cumpre salientar, na esteira da melhor doutrina e da jurisprudência dominante de nossos tribunais, que a ausência de fins lucrativos não implica em entender que as entidades em tela não possam auferir lucros no exercício de suas atividades, até porque são estes lucros que podem viabilizar o atendimento adequado das suas finalidades sociais e o aprimoramento dos recursos destinados à prestação de seus serviços, para melhor atender ao interesse público.
As disposições constitucional e legal querem, na realidade, significar que estas entidades não podem distribuir quaisquer das parcelas de seu patrimônio, nem os lucros ou rendas auferidos, devendo aplicar integralmente estes rendimentos para a manutenção de seus objetivos institucionais.”
. Essa orientação se harmoniza com aquela predominante na jurisprudência dos diversos Tribunais Regionais Federais. É conferir:
TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE. CONSTITUIÇÃO, ART.150. INC. VI, LETRA C. IOF. INSTITUIÇÃO DE EDUCAÇÃO.
1. NÃO PODE A UNIÃO FAZER INCIDIR O IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES FINANCEIRAS (IOF) SOBRE A RENDA DAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO, SEM FINS LUCRATIVOS, AUFERIDA DE APLICAÇÕES NO MERCADO FINANCEIRO, POR VIOLAR PRECEITO CONSTITUCIONAL (CONSTITUIÇÃO, ART. 150, VI, C).
2. A CONSTITUIÇÃO NÃO FAZ DISTINÇÃO ENTRE OS IMPOSTOS DE QUE ESTÃO IMUNES AS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO, SEM FINS LUCRATIVOS.
3. COMPROVADO QUE A INSTITUIÇÃO EDUCACIONAL NÃO TEM FINS LUCRATIVOS, AINDA QUE NÃO ATENDA DE FORMA INDISCRIMINADA A TODOS OS CARENTES, E QUE TENHA RECEITA PARA FAZER FRENTE AOS CUSTOS OPERACIONAIS, ESTA ELA IMUNE DE QUALQUER IMPOSTO.
(TRF 1ª Região, Remessa Ex-Officio nº 95.01.28225-0, DJ 27.08.95)
TRIBUTÁRIO. CONSTITUCIONAL. INSTITUIÇÃO DE EDUCAÇÃO E ASSISTÊNCIA SOCIAL. IMUNIDADE TRIBUTARIA.
– SOCIEDADE RELIGIOSA, EDUCACIONAL E ASSISTENCIAL GOZA DE IMUNIDADE TRIBUTÁRIA A LUZ DO ART. 19, INCISO III, DA CF/67 E EMENDA N. 1/69 E ART. 18, DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL.
-IMUNIDADE FISCAL TEM NATUREZA CONSTITUCIONAL, DEPENDENDO SUA LIMITAÇÃO DE LEI COMPLEMENTAR, DESCABENDO, PORTANTO, INSTITUTOS MENORES IMPOR-LHES RESTRIÇÕES.
– REMESSA OFICIAL IMPROVIDA.
(TRF 3ª Região, Remessa Ex-Offício nº 93.03.008857-1, DJ 09.12.93
A considerar, no mesmo sentido, o fato de o Supremo Tribunal Federal, na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.802-3, proposta pela Confederação Nacional de Saúde, haver concedido liminar para suspender a vigência dos arts 12, § 1º e § 2º, f, art.13 e art.18 da Lei 9.532/97, conforme noticiado no Informativo 120, em passado recente daquela Corte de Justiça:
“Imunidade Tributária
Prosseguindo no julgamento da ação direta acima mencionada, o Tribunal deferiu a suspensão cautelar de eficácia dos seguintes dispositivos da Lei 9.532/97:
a) § 1º do art. 12, que retira das instituições de educação ou de assistência social a imunidade com relação aos rendimentos e ganhos de capital auferidos em aplicações financeiras de renda fixa ou de renda variável;
b) alínea f do § 2º do art. 12, que estabelece, como condição do gozo da imunidade pelas instituições, a obrigato riedade do recolhimento de tributos retidos sobre os rendimentos por elas pagos ou creditados; e
c) artigos 13, caput, e 18, que prevêem a suspensão do gozo da imunidade tributária como forma de penalidade por ato que constitua infração à legislação tributária.
À primeira vista, reconheceu-se a inconstitucionalidade formal dessas normas, sob o entendimento de que o art. 150, VI, c, da CF ("… atendidos os requisitos da lei;") remete à lei ordinária a competência para estipular requisitos que digam respeito apena s à constituição e ao funcionamento das entidades imunes, e que qualquer limitação ao poder de tributar, como previsto no art. 186, II, da CF, só pode ocorrer mediante lei complementar.
Considerou-se que a discussão sobre se o conceito de instituição de assistência social (CF, art. 150, VI, c) abrange ou não as instituições de previdência social, as de saúde e as de assistência social propriamente ditas será apreciada no julgamento de mérito da ação.
Precedente citado: RE 93.770-RJ (RTJ 102/3 08). ADInMC 1.802-DF, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 27.8.98.”
Com essas considerações, o parecer é pela manutenção da sentença.
Rio de Janeiro,