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[MODELO] Habeas Corpus – Princípio da Insignificância – Importação de Mercadorias Estrangeiras

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL PRESIDENTE DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Impetrante: Defensoria Pública da União

Paciente: CLAUDINO BALDISSERA

Autoridade Coatora: Juiz Federal da 1ª Vara Federal Criminal de Curitiba/PR

Referente ao processo n° 2003.70.00.011937-7

A DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO, por meio de seu NÚCLEO DE CURITIBA/PR, que tem endereço na Rua Voluntários da Pátria, 547, bairro Centro, em Curitiba/PR, fone 304-4370, vem impetrar HABEAS CORPUS com PEDIDO DE LIMINAR, contra ato do Juiz Federal da 1ª Vara Federal Criminal de Curitiba/PR, em favor de, CLAUDINO BALDISSERA, brasileiro, serviços gerais, RG 12C-3.436.550, CPF 824.150.139-00, residente e domiciliado na Rua Esteve, s/n., bairro Rio Vermelho, na cidade de Florianópolis/SC, pelos motivos a seguir expostos:

O Órgão do Ministério Público Federal denunciou CLAUDINO BALDISSERA como incurso no artigo 334, caput do Código Penal Brasileiro (descaminho), pela prática do seguinte fato:

Conforme consta das peças de informação em anexo, no dia 07/07/02, a equipe de fiscalização da Inspetoria da Receita Federal em Curitiba, em trabalho de repressão e fiscalização no município de Lapa, cidade sob a jurisdição federal da capital, apreendeu, em poder do denunciado, expressiva quantidade de mercadorias de origem estrangeira desacompanhada de documentos que comprovassem sua regular importação.

Diante de tal irregularidade foi lavrado pela Autoridade Fiscal o Auto de Infração com Apreensão de Mercadorias nº AS00517, à fl. 04, sendo devidamente relacionadas as mercadorias então apreendidas, cujos tributos incidentes (II e IPI) totalizam o montante de R$ 7.244,14, valor este que supera em muito o limite da cota de isenção fixada pelo Ministério da Fazenda, concedida, insta ressaltar, apenas para a aquisição de produtos para uso próprio.

Resta evidenciado assim, que o acusado, ciente da ilegalidade de seu comportamento, transportava mercadorias de origem estrangeira em território nacional, sem a regular comprovação da regularidade fiscal das mercadorias, mediante a supressão dolosa dos tributos aduaneiros incidentes nessa operação, conforme informação de fl. 02, produtos aqueles destinados à atividade comercial, como transparece pela quantidade individual de cada item, bem como da diversidade das mercadorias apreendidas, conduta esta que se subsume ao tipo penal do artigo 334, caput, do Código Penal, na modalidade de contrabando.

Materialidade, como bem demonstra a inclusa representação fiscal para fins penais, e autoria, consoante acima descrito, estão, pois, suficientemente demonstrados para embasar a acusação.

Ante o exposto, é oferecida a presente DENÚNCIA, requerendo o Ministério Público a instauração do competente processo-crime, com a regular citação do denunciado CLAUDIO BALDISSERA, nos termos do artigo 351 do Código de Processo Penal, para ser processado e julgado, de modo que, ao final, seja-lhe imposta a justa sanção legal cominada para a infração cometida no artigo 334, caput, do Código Penal.

O MM. Juiz Federal recebeu a denúncia, nos seguintes termos:

  1. O Ministério Público Federal ofereceu denúncia em face de CLAUDIO BALDISSERA, dando-o como incurso nas sanções do artigo 334, caput do Penal.

Verifico, à fl. 02 do procedimento administrativo em anexo, que o valor dos impostos, em tese elididos, calculados sobre o valor das mercadorias, é alto (II – R$ 1.977,89 e IPI – R$ 5.266,25), razão pela qual inaplicável o princípio da insignificância.

Assim sendo, presentes suficientes indícios de materialidade e autoria, recebo a denúncia de fls. 03/04.

  1. Solicitem-se os antecedentes atualizados junto ao II/PR, II/SC e à SR/DPR/PR. Proceda-se à consulta junto ao Registro único do Rol dos Culpados e à VEP/PR. Certifique a Secretaria acerca da existência de outras ações penais em curso no âmbito da Justiça Federal.
  2. Nos termos da manifestação da fl. 05 item 2.4), oficie-se à Receita Federal solicitando informações acerca da destinação dada às mercadorias apreendidas.
  3. Após, voltem-me conclusos.

Acreditando a Defensoria Pública da União que a conduta perpetrada pelo paciente é atípica, impetra à presente ordem em favor de CLAUDINO BALDISSERA.

In casu, o réu foi supostamente flagrado com mercadorias advindas do estrangeiro, o que teria gerado um desfalque aos cofres públicos da monta de R$ R$ 7.244,14 (sete mil, duzentos e quarenta e quatro reais e quatorze centavos).

Prefacialmente, se faz necessária breve digressão a respeito do princípio da insignificância.

Por seu caráter eminentemente fragmentário, o direito penal há de ser guardado para persecução e punição daquelas lesões a bens jurídicos que, em face de sua importância, necessitam de proteção jurídica substancial, tendo em vista a insuficiência da proteção lhes outorgada pelos outros ramos do direito.

Conforme leciona o eminente ex-Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Francisco de Assis Toledo, no seu Princípios Básicos de Direito Penal, Saraiva, p. 121/122:

“O Direito Penal, por sua natureza fragmentária, só vai até onde seja necessário para a proteção do bem jurídico. Não deve preocupar-se com bagatelas”.

Outrossim, o princípio da insignificância é aplicado in concreto, diante de análise fático-jurídica de cada caso. Não revogação de norma in abstrato pelo poder judiciário, não funcionando o juiz como legislador.

A propósito, vale trazer a lume o entendimento de Eugênio Raul Zafaroni, citado na obra de Carlos Vico Manãs:

“ ‘… Outro fundamento do princípio da insignificância residente na idéia da proporcionalidade que a pena deve guardar em relação à gravidade do bem. Nos casos de ínfima afetação ao bem jurídico, o conteúdo de injusto é tão pequeno que não subsiste qualquer razão para a imposição da reprimenda. Ainda a mínima pena aplicada seria desproporcional à significação social do fato’ (in, O Princípio da Insignificância como excludente de tipicidade no Direito Penal, São Paulo: Saraiva, 1994, p. 58)”.

Atribui-se a Claus Roxin a primeira menção ao princípio da insignificância como princípio. Para ele, o princípio permite na maioria dos tipos penais fazer-se a exclusão, desde o início, dos danos de pouca importância.

De ter-se, ainda, a lição preconizada por Maurício Antonio Ribeiro Lopes, na sua obra Princípio da Insignificância no Direito Penal, RT, 2a edição, p. 146:

“O Direito Penal como já se disse alhures, deve ser visto como um instrumento de controle social ao que, não obstante, só há de acudir-se naqueles casos em que, pela importância dos bens jurídicos em jogo ou por especial virulência com a qual esses bens são atacados, se faz necessária a aplicação da mais enérgica das intervenções que o Estado pode dispor.”

No plano jurisprudencial, o princípio da insignificância já foi reconhecido inclusive no âmbito do Supremo Tribunal Federal, no HABEAS CORPUS nº. 77.003-4 (31), Rel. MIN. MARCO AURELIO, DJ1, 11.09.98, P. 05:

“JUSTA CAUSA – INSIGNIFICÂNCIA DO ATO APONTADO COMO DELITUOSO. Uma vez verificada a insignificância jurídica do ato apontado como delituoso, impõe-se o trancamento da ação penal por falta de justa causa. A isto direcionam os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Consubstancia ato insignificante a contratação isolada de mão-de-obra, visando à atividade de gari, por município, considerado período diminuto, vindo o pedido formulado em reclamação trabalhista a ser julgado improcedente, ante a nulidade da relação jurídica por ausência do concurso público.”

O descaminho consiste em fraude ao pagamento de tributo. O bem tutelado, além do prestigio da Administração Pública, é o interesse econômico-estatal.

No plano jurídico-fiscal, até determinada alçada, o próprio fisco abdica do recolhimento do tributo. Não possui interesse econômico em cobrá-lo, conforme determinação legal.

Assim é que temos a Portaria n. 289, de 31-10-97, que determinou a não inscrição em dívida de débito com a Fazenda Nacional de valor consolidado igual ou inferior a R$ 1.000,00 (um mil reais) e a não execução de R$ 5.000,00 (cinco mil reais)

“Art. 1º Autorizar:

I – a não inscrição, como Dívida Ativa da União, de débitos para com a Fazenda Nacional de valor consolidado igual ou inferior a R$ 1.000,00 (mil reais); e

II – o não ajuizamento das execução fiscais de débitos para com a Fazenda Nacional de valor consolidado igual ou inferior a R$ 5.000,00 (cinco mil reais).”

Posteriormente, foi editada a Portaria n. 248, de 3-8-00, que reduziu os valores para inscrição em dívida ativa a R$ 250,00 (duzentos e cinqüenta reais) e para execução a R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais):

“Art. 1º Autorizar:

I – a não inscrição, como Dívida Ativa da União, de débitos para com a Fazenda Nacional de valor consolidado igual ou inferior a R$ 250,00 (duzentos e cinqüenta reais); e

II – o não ajuizamento das execuções fiscais de débitos para com a Fazenda Nacional de valor consolidado igual ou inferior a R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais).”

Por sua vez, dispõe a Lei n. 10.522 de 19-7-02:

“Art. 20 – Serão arquivados, sem baixa na distribuição, os autos das execuções fiscais de débitos inscritos como Dívida Ativa da União pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional ou por ela cobrados, de valor consolidado igual ou inferior a R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais).”

A Portaria MF n. 49, de 1° de abril de 2004, autorizou a não inscrição como dívida ativa de débitos de valor consolidado igual ou inferior a R$ 1.000,00 (um mil reais) e o não ajuizamento das execuções fiscais de débitos com a Fazenda Nacional de valor consolidado igual ou inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Recentemente a Lei n. 11.033, de 21 de dezembro de 2004, que alterou a Lei n. 10.522/02, consolidou os valores dispostos na Portaria MF n. 49/2004:

"Art. 20. Serão arquivados, sem baixa na distribuição, mediante requerimento do Procurador da Fazenda Nacional, os autos das execuções fiscais de débitos inscritos como Dívida Ativa da União pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional ou por ela cobrados, de valor consolidado igual ou inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Portanto, a importância de R$ 10.000,00 (dez mil reais) é o limite para a cobrança de tributos na esfera cível.

Incide, pois, o princípio da insignificância quando a infração cometida é de pouca monta, insuscetível de causar dano ao bem jurídico tutelado. No caso de valor ilidido inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais), em que não existe prejuízo na esfera cível, não se pode falar em repercussão na esfera penal.

A Quarta Seção firmou orientação de que os débitos inferiores ao limite para a cobrança de tributos na esfera cível, no caso do crime de descaminho, seriam alcançados pelo princípio da insignificância:

“De acordo com a orientação da 4ª Seção deste Tribunal, contra a qual guardo reserva, o patamar para a aplicação do princípio da insignificância, nos crimes de descaminho, é de R$ 2.500,00, com base na Medida Provisória nº 2.176-79, de 23 de agosto de 2001.”

(RSE 2002.71.02.004767-9, rel. Juiz Luiz Fernando Wowk Penteado, DJU de 14-5-03, p. 1116)

Na mesma senda vem se posicionando o STJ:

“HABEAS CORPUS. DESCAMINHO. APREENSÃO DE MERCADORIA DE PEQUENO VALOR. INEXISTÊNCIA DE INTERESSE FISCAL. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. CAUSA SUPRALEGAL DE EXCLUDENTE DE ILICITUDE. PRECEDENTES DO STJ.

1. Não se vislumbra na hipótese a existência de ilícito fiscal, o que se torna inviável a imputação do delito de descaminho ao paciente, uma vez que a conduta que se lhe imputa a peça acusatória não chegou a lesar o bem jurídico tutelado, qual seja, a Administração Pública em seu interesse fiscal.

2. Aplicação do princípio da insignificância como causa supralegal de exclusão da tipicidade. Precedentes do STJ.

3. Habeas corpus concedido.”

(HC n. 21071, rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 17-3-03, p. 245)

Segundo informações constantes na denúncia o valor consolidado da dívida alcança o montante de R$ R$ 7.244,14 (sete mil, duzentos e quarenta e quatro reais e quatorze centavos).

Há que se dizer que o nosso Regional considera para aferição do princípio da insignificância o valor do tributo devido sem a multa. Nestes termos noticiou o informativo criminal de maio de 2003 (RSE n. 2003.70.05.000879-4, rel. Des. Federal Volkmer de Castilho, decisão de 27-5-03):

“No crime de descaminho, para aferição do valor dos impostos devidos e, portanto, do patamar máximo para aplicação do princípio da insignificância, não deve ser computada a multa. Decisão por maioria.”

Assim, no caso em tela, o valor não recolhido é inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais), aplicando-se, por conseguinte, o princípio da insignificância, porquanto se a normatividade jurídico-fiscal considera determinado valor como irrisório para fins de cobrança da dívida, com maior razão não poderá ser repreendido penalmente.

Há que se dizer que não é possível caracterizar a habitualidade no caso em tela, visto que há apenas uma única Ação Penal na Vara de Joinville com objeto semelhante.

Portanto, inexiste habitualidade se contra o paciente tramitava apenas uma ação penal em Joinville e outra em Florianópolis. Habitualidade caracteriza-se pela prática reiterada de conduta.

Ademais, segundo decisão prolatada pelo Desembargador Federal JOSÉ LUIZ B. GERMANO DA SILVA, habitualidade somente se caracterizaria se houvesse no mínimo três incursões no tipo penal:

PENAL. PROCESSO PENAL. DESCAMINHO. HABITUALIDADE CRIMINOSA. EXISTÊNCIA DE REGISTROS ANTERIORES. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE.

– Havendo prática de descaminho com a ilusão de impostos em valor não superior ao patamar de R$ 2.500,00, da Lei nº 10.522/2002, é possível a aplicação do princípio da insignificância penal.

– A habitualidade exigida para afastar-se o princípio da bagatela não pode ser vista, simplesmente, como mais de um processo ou registro de prática idêntica, sendo necessárias várias práticas de descaminho, assim compreendidas, no mínimo, três incursões no tipo penal.

– Precedentes desta Corte.

– Recurso a que se nega provimento.

(RSE 2003.71.04.011330-3, DJU de 5-5-04, p. 1476)

Com fulcro no artigo 647 e seguintes do CPP, está evidente a necessidade do trancamento da ação penal em favor do paciente, posto à falta de justa causa frente a atipicidade do fato a ele imputado.

DA CONCESSÃO DA LIMINAR

Como as provas juntadas, anexadas à presente comprovam que o paciente não enseja perigo para a sociedade, que o fato por ele praticado é atípico, roga-se pela liminar, com intuito de minimizar os danos já sofridos e cessar mais danos que este possa sofrer.

DO PEDIDO

Pelo acima exposto, requer o impetrante a esse Egrégio Tribunal:

1) Que seja concedida a Liminar requerida, determinando-se o trancamento da ação penal 2003.70.00.011937-7;

2) seja concedida a ordem, com fundamento no art. 647 e seguintes do CPP, cessando a coação ilegal, determinado o trancamento da ação penal em relação ao paciente, acerca do crime tipificado no artigo art. 334 do CP;

Termos em que,

Pede deferimento.

Curitiba, 14 de fevereiro de 2005.

Wilza Carla Folchini Barreiros

Defensora Pública da União

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