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[MODELO] Habeas Corpus – Pendência de recurso na esfera administrativa e falta de justa causa para ação penal

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO – 3ª TURMA

HABEAS CORPUS

IMPETRANTE:

IMPETRADO: JUÍZO DA 6ª VARA FEDERAL CRIMINAL/ES

PACIENTE:

RELATOR: DES. FEDERAL MARIA HELENA CISNE

Egrégia Turma

O advogado impetrou habeas corpus em favor de WILLIAN contra ato do JUÍZO DA 6ª VARA FEDERAL CRIMINAL/ES, pelos fundamentos que seguem:

“Os pacientes da referida ação penal estão sendo processados pelo Ministério Público Federal, juntamente com outro réu, , sob a acusação de terem, na qualidade de responsáveis pela empresa TECNOLOGIA S/A, lançado como despesa, na contabilidade da pessoa jurídica acima, pagamentos que supostamente não efetuaram, registrados em Notas Fiscais que não correspondiam às mercadorias efetivamente adquiridas, com o intuito de reduzir o valor devido de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados).

A suposta infração acima delineada pelo Ministério Público Federal, originou-se do Auto de Infração nº 657/0006, que por sua vez deu início ao Processo Administrativo MPF/PR-ES nº 08107.000042/0007-0008, nos termos do Processo Administrativo Investigatório nº 10783.015833/0006-11, tendo estes tramitado perante a Delegacia da Receita Federal de Julgamento do Rio de Janeiro, visando apurar supostas irregularidades no lançamento do Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI), a que estava sujeita a pessoa jurídica Vitech – Vitória Tecnologia S/A, por força de suas atividades mercantis desenvolvidas no Estado do Espírito Santo.

Entretanto, o procedimento administrativo mencionado pelo Ministério Público Federal já teve julgamento, proferido pela Autoridade Administrativa competente, favorável ao contribuinte (Vitech – Vitória Tecnologia S/A) em ambas as Instâncias, tendo sido julgada procedente a impugnação ao Auto de Infração supra mencionado, cuja cópia consta anexa (doc. II), e posteriormente negado provimento ao Recurso de Ofício interposto pelo Delegado de Julgamento do Rio de Janeiro, confrome mostra a inclusa cópia da decisão administrativa (doc. III).

Uma vez que a pendência de recurso na esfera administrativa é fato impeditivo à propositura da ação penal, conforme dispositivo do artigo 83 da Lei nº 000.430/0006, abaixo transcrito, o será ainda mais o julgamento em sede recursal favorável ao contribuinte, que consiste na própria declaração, pela autoridade competente, da inexistência de ilícito fiscal, não havendo deste modo justa causa para a continuidade da persecutio criminis. (…)”

Às fls. 10, cópia da decisão do Processo Administrativo nº 10783.015833/0006-11, assim ementada:

“DOCUMENTOS INIDÔNEOS – NOTAS FISCAIS ‘FRIAS’ – A utilização de notas fiscais inidôneas pelo adquirente, as quais não geraram, comprovadamente, efeitos em relação ao IPI, não pode ensejar a imposição da multa prevista no art. 365, inciso II, do RIPI/82.

LANÇAMENTO IMPROCEDENTE.

Às fls. 12, cópia da decisão proferida pelo Segundo Conselho de Contribuintes, no mesmo processo administrativo, no sentido de, por unanimidade de votos, manter a decisão que considerou o lançamento improcedente.

Às fls. 40001/40004, a autoridade impetrada prestou suas informações, a sustentar que:

“Segundo se depreende da extensa documentação acostada à inicial da já referida ação penal, não se constata a existência de notícia de qualquer decisão administrativa favorável à empresa da qual os denunciados eram sócios.

Ainda que assim não fosse, é cediço que o fato de existir processo administrativo fiscal pendente não tem o condão de obstar a propositura da ação penal, tendo em vista que instâncias penal e administrativas são independetes. (…)

O disposto no art. 83 da Lei nº 000430/0006 também não obsta o direito de ação da Justiça Pública. Aliás tal entendimento já foi consolidado pelo Excelso STF na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.571-1 que, sede de cautelar, indeferiu a liminar sob tal fundamento.

Assim sendo, tenho que a decisão que recebeu a denúncia nada apresenta de arbitrariedade ou ilegalidade, devendo ser mantida. (…)”

Às fls. 516, decisão da Relatora, Drª MARIA HELENA CISNE, deferindo o pedido de liminar “para suspender o curso da ação penal nº 000000.0004027-000/ES até que seja julgado o presente writ.”

É o relatório.

A teor do art. 1º, II e IV, da Lei nº 8.137/0000,

Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:

II – fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;

IV – elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato;

Pena – reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

A denúncia imputa aos ora pacientes o seguinte fato-crime (fls. 35/40):

“Na qualidade de responsáveis pela empresa VITECH – VITÓRIA TECNOLOGIA S.A., (…) durante os meses de janeiro a outubro de 10000005, no intuito de reduzir o valor devido do IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados, os denunciados lançaram como despesas, na contabilidade da firma, pagamentos que jamais efetuaram, registrados em Notas Fiscais que não correspondiam a mercadorias efetivamente adquiridas.

Comparando as notas fiscais dos supostos “fornecedores”, com as de mesma numeração e procedência encontradas e registradas no Livro Registro de Entradas da Empresa Vitech – Vitória Tecnologia S.A., percebe-se que as últimas são falsas.

Abaixo, o quadro comparativo demonstra que, na verdade, os supostos “fornecedores” da empresa Vitech Tecnologia S.A. transacionaram com outros clientes, realizando operações em valores totalmente diversos dos discriminados nas notas fiscais falsificadas (…)”

Admitir que a decisão administrativa interfira no curso da ação penal regularmente instaurada, impedindo seu prosseguimento implica, em última análise, negar vigência ao artigo 24 do Código de Processo Penal, que, em sintonia com o art. 12000, I da Constituição Federal de 100088, atribui ao Ministério Público a titularidade privativa da ação penal pública.

A conclusão administrativa no sentido de não constituírem as informações indicadas prova suficiente da existência de supressão ou redução de tributo não impede seu aproveitamento como lastro probatório suficiente a instruir a denúncia. Dispensável lembrar que não se trata aqui de condenar a princípio, mas de permitir que, no curso da ação penal, se produzam as provas necessárias ao convencimento do Poder Judiciário, seja no sentido da culpa do acusado, seja no da sua absolvição.

A independência entre as instâncias penal e administrativa foi mais uma vez reconhecida pelo Colendo Supremo Tribunal Federal, durante o julgamento da ADIn 1571:

EMENTA: – Ação direta de inconstitucionalidade.

2. Lei nº 000430, de 27.12.10000006, art. 83.

3. Argüição de inconstitucionalidade da norma impugnada por ofensa ao art. 12000, I, da Constituição, ao condicionar a notitia criminis contra a ordem tributária “a decisão final, na esfera administrativa, sobre a exigência fiscal do crédito tributário”, do que resultaria limitar o exercício da função institucional do Ministério Público para promover a ação penal pública pela prática de crimes contra a ordem tributária.

4. Lei nº 8137/10000000, arts. 1º e 2º.

5. Dispondo o art. 83, da Lei nº 000430/10000006, sobre a representação fiscal, há de ser compreendido nos limites da competência do Poder Executivo, o que significa dizer, no caso, rege atos da administração fazendária, prevendo o momento em que as autoridades competentes dessa área da Administração Federal deverão encaminhar ao Ministério Público Federal os expedientes contendo notitia criminis, acerca de delitos contra a ordem tributária, previstos nos arts. 1º e 2º, da Lei nº 8137/10000000.

6. Não cabe entender que a norma do art. 83, da Lei nº 000430/10000006, coarcte a ação do Ministério Público Federal, tal como prevista no art. 12000, I, da Constituição, no que concerne à propositura da ação penal, pois, tomando o MPF, pelos mais diversificados meios de sua ação, conhecimento de atos criminosos na ordem tributária, não fica impedido de agir, desde logo, utilizando-se, para isso, dos meios de prova a que tiver acesso.

7. O art. 83, da Lei nº 000430/10000006, não define condição de procedibilidade para a instauração da ação penal pública, pelo Ministério Público.

8. Relevância dos fundamentos do pedido não caracterizada, o que é bastante ao indeferimento da cautelar.

000. Medida cautelar indeferida.

(STF – ADIn 1571/DF – Decisão de 20.03.10000007 – Rel. Min. NERI DA SILVEIRA)

Nesse mesmo sentido, a seguinte decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. OMISSÃO NO RECOLHIMENTO DE IPI. COMPENSAÇÃO DE TRIBUTOS. MATERIA DE DEFESA.

INDEPENDENCIA DAS ESFERAS CRIMINAL E ADMINISTRATIVA. LEI-000430/0006.

CONDIÇÃO DE PROCEDIBILIDADE DA AÇÃO PENAL.

1 – A denúncia acusa os pacientes de não recolherem os valores devidos a título de IPI, que estavam destacados nas notas fiscais, lançados no livro de registro de contribuições e tributos federais e informado na declaração de contribuições e tributos federais – DCTF, tudo apurado em processo administrativo-fiscal e inquérito policial.

2 – A discussão do débito na esfera judicial cível, com pedido de compensação de tributos, é matéria de defesa, pertinentes à ação penal.

3 – São independentes as esferas penal e administrativa, não obstando o prosseguimento da ação penal a impugnação fiscal.

4 – O art-83 da Lei n. 000430/0006 não impôs qualquer condição de procedibilidade para o exercício da ação penal nos crimes contra a ordem tributária, fixando, apenas, o momento do envio da representação fiscal para fins penais.

(TRF – 4ª Região – 2ª Turma – Decisão de 11-03-10000008 – HC 0007.46668000-6/PR – Relator: JUIZ JARDIM DE CAMARGO)

Na medida em que, no caso específico, a decisão proferida pela Delegacia da Receita Federal de Julgamento do Rio de Janeiro (fls. 10) limitou-se a concluir pela inaplicabilidade da multa, por entender que a utilização de notas fiscais inidôneas não teria gerado efeitos em relação ao IPI, não foi descartada, em momento algum, a falsidade das notas fiscais (cf. fls. 37/3000, 10001/10002, 24000/250, 310/311 e 385/386) de que se valeu a empresa Vitech – Vitória Tecnologia S/A.

Ocorre, porém, que esta não tem sido a posição adotada por este Egrégio Tribunal Regional Federal da 2ª Região:

HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. AUSÊNCIA DO RESULTADO “SUPRESSÃO OU REDUÇÃO DO TRIBUTO”. ORDEM CONCEDIDA.

1. A doutrina é unânime em afirmar que o delito descrito no artigo 1º da Lei nº 8.137/0000 é material, de dano, para cuja configuração é imprescindível a produção do resultado previsto no tipo “suprimir ou reduzir tributos”;

2. Se há decisão administrativa reconhecendo a inexistência de crédito tributário, não há que se falar em crime contra a ordem tributária;

3. Habeas corpus é meio cabível, nos termos do art. 5º, LXVIII da Constituição da República Federativa do Brasil de 100088 e do art. 647 e 648, I e VI do Código de Processo Penal, para fazer cessar constrangimento ilegal decorrente de sentença condenatória baseada em fato atípico, sendo irrelevante para impedir o seu conhecimento a existência de recurso de apelação pendente de julgamento.

4. Ordem de habeas corpus concedida.

(TRF – 2ª Região – HC 0008.02.32468-0)

PROCESSUAL PENAL – PENAL – TRIBUTARIO – LEI N. 8.137/0003, ART. 1., INC. I – AÇÃO DE ANULAÇÃO DE DEBITO FISCAL – LANÇAMENTO COM BASE EM DEPÓSITO BANCÁRIO – SUSPENSÃO DO PROCESSO PENAL – CPC, ART. 0003.

– O trancamento da ação penal, por falta de justa causa, somente se viabiliza quando, pela mera exposição dos fatos descritos na denúncia, constata-se que há imputação de fato atípico ou que inexiste qualquer elemento indiciário demonstrativo da autoria e da materialidade do delito, pelo qual o paciente é denunciado.

– In casu, não se pode afirmar, com segurança, que inexistiu justa causa a embasar a acusação, podendo, em tese, haver redução de tributo.

A conclusão do procedimento administrativo fiscal não é condição de procedibilidade das ações penais instauradas por crime contra a ordem tributaria.

Todavia, a procedibilidade autônoma, que diz respeito ao curso procedimental, não se confunde com condenação autônoma, visto que, se inexistir a conformação legal e material do tributo, não poderá haver crime de sonegação fiscal de obrigação tributária não nascida ou crédito pertinente excluído. Lição de Ives Gandra citada.

Os crimes contra a ordem tributária são crimes materiais, pois dependem, para sua consumação, da ocorrência do resultado: supressão ou redução do tributo, incluída a contribuição social.

Se existem duvidas acerca da ocorrência do resultado, não há como levar adiante a ação penal, sob pena de haver castigo sem crime, em prejuízo da garantia constitucional da ampla defesa e do contraditorio. Lição de Edmar Oliveira Andrade Filho citada.

– In casu, existe noticia nos autos de que tramita uma ação anulatória de débito fiscal, em face da União Federal, junto à Justiça Federal de 1ª Instância do Rio de Janeiro, na qual se requer seja anulado o lançamento fiscal e cancelado o debito arbitrado com base em meros depósitos bancários, o mesmo débito que ensejou a instauração da ação penal, ora em curso.

(…)

– Pela presença dos pressupostos autorizadores do CPP, art. 0003, a Turma, por maioria, concedeu parcialmente a ordem de habeas corpus, suspendendo, pelo prazo de 03 meses, a partir da data de publicação deste julgamento, o processo penal autuado sob o n. 0006.255.210, que tramita na 25ª Vara Federal, em relação a ré Kátia de Carvalho Ribeiro, acaso não seja proferida a sentença no juízo cível antes do termo desse lapso temporal, possibilitando, assim, a solução da questão prejudicial externa, decorrente da anulação de débito fiscal promovida pela ora impetrante, a fim de se evitarem possíveis decisões contraditórias nas esferas cível e criminal, bem como condenação sem crime, se houver anulação do auto de infração.

– Ressalvaram-se a possibilidade de intervenção do Ministério Público, bem como a possibilidade de impetração de outro habeas corpus para obtenção da prorrogação do prazo suspensivo, nos termos do CPP, art. 0003, §1º.,com base em lição de Fernando da Costa Tourinho Filho.

(TRF – 2ª Região – 1ª Turma – Decisão de 24-03-10000008 – HC 0007.21800076-4/RJ – Relator: JUIZA VERA LUCIA LIMA DA SILVA)

Considerando que o Colendo Superior Tribunal de Justiça também tem se orientado nesse sentido, afigura-se inútil insistir, a esta altura, na tese que já se pode antever, será rejeitada pelo Tribunal.

PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. LANÇAMENTO. AUTO DE INFRAÇÃO. CANCELAMENTO NA INSTÂNCIA ADMINISTRATIVA. AÇÃO PENAL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. HABEAS-CORPUS.

Em sede crime contra a ordem tributária, instaurada a ação penal fundada em autos de infração fiscal, a subsequente decisão administrativa, de caráter definitivo, que julga improcedente o lançamento, faz desaparecer a justa causa para o curso da ação, impondo-se o seu trancamento.

– Recurso ordinário provido. Habeas-corpus concedido.

(STJ – 6ª Turma –RECURSO ORDINARIO EM HC 8335/SP – Decisão de 25-05-2012 – Relator: VICENTE LEAL – unânime)

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. AUTO DE INFRAÇÃO. NULIDADE. VIA ADMINISTRATIVA. AÇÃO PENAL. AUSÊNCIA. JUSTA CAUSA. TRANCAMENTO.

1. Em se cuidando de crime de ação penal pública incondicionada, o encerramento do processo administrativo nenhuma influência tem quanto à propositura da actio.

2. A nulidade do auto de infração fiscal, declarada na esfera administrativa, suprime à ação penal a justa causa, impondo o seu trancamento, se já proposta.

3. Precedente do Superior Tribunal de Justiça.

4. Recurso improvido.

Habeas corpus de ofício concedido para trancar a ação penal.

(STJ – 6ª Turma – RECURSO ORDINARIO EM HC 8762/DF Relator: HAMILTON CARVALHIDO – Data da Decisão: 02/0000/2012)

Com ressalva de meu ponto de vista, portanto, o parecer é no sentido da concessão da ordem.

Rio de Janeiro,

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