[MODELO] Desconsideração da Personalidade Jurídica – Confusão Patrimonial

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 00ª VARA DE FAMÍLIA DA CIDADE

Ação de Execução de Alimentos

Proc. nº. 334455-86.2018.007.00890.8-001

Autora: Maria de Tal

Réu: João das Quantas

Intermediada por seu mandatário, comparece, com o devido respeito a Vossa Excelência, MARIA DE TAL, já qualificada na exordial desta Ação de Execução de Alimentos, para, com suporte no art. 133 § 2º do Código de Processo Civil, requerer a instauração de

INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA,

(Desconsideração inversa – Confusão Patrimonial)

em razão das justificativas abaixo delineadas.

1 – QUADRO FÁTICO

Em razão do despacho próximo passado, a Exequente fora instada a se manifestar acerca da certidão do aguazil, a qual demora à fl. 11, verso. Assim, com o propósito de proceder com a continuidade do feito, passa a expor estas considerações.

Afirma o meirinho que procurou o Executado para fins de citação. Certificara, por isso, que “…conforme informações dos vizinhos da residência do citando, o senhor João das Quantas mudou-se de seu endereço residencial, indicado no presente mandado há mais de um ano. Não foram informados eventuais novos endereços do mesmo, apesar dos esforços empreendidos por este oficial de justiça.“ (fl. 27, verso)

Depois disso, procurou promover o arresto de bens daquele. Não logrou êxito.

Posteriormente, do que se extrai do arrazoado que repousa às fls. 17/18, a credora pediu o bloqueio de ativos financeiros do devedor, via Bacen-Jud. O resultado, igualmente, fora insatisfatório. A informação do Bacen fora no sentido da existência de R$ 19,90 junto à conta corrente nº. 0000-22, do Banco Delta S/A (fls. 37/38).

Diante disso, requereu a pesquisa no banco de dados da Renavam (fl. 41). Também infrutífera. (fl. 43)

Ainda no afã de perseguir bens do Executado, requereu a este juízo a obtenção, junto à Receita Federal, da declaração do Imposto de Renda, o que foi deferido. Dormita às fls. 47/59 informações dando conta de que esse detém cotas sociais da empresa Sociedade Xista Ltda.

Obtiveram-se certidões nos Cartórios de Registro de Imóveis desta Capital. Constatou que essa sociedade empresária, da qual o Executado detém 95% das cotas sociais, é proprietária de sete imóveis. (docs. 01/07) Além disso, o imóvel objeto da matrícula nº. 005599, do Cartório de Registro de Imóveis da 4ª Zona desta Capital, não obstante registrado em nome da sociedade empresária, tem o fornecimento de energia nominado ao ora devedor de alimentos. (docs. 08/11)

Com efeito, não há dúvida de que o Executado está manipulando, ardilosamente, os recursos financeiros da sociedade empresária, com o propósito único de fraudar sua credora de alimentos.

2 – DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA – TEORIA MAIOR

2.1. Requisitos preenchidos (CPC, art. 133, § 1º c/c CC, art. 50)

Inconteste que os bens da sociedade empresária pertencem, em verdade, ao Executado. Perceba que um deles é um apartamento residencial. E, mais, grande parte desses foi registrada após a dissolução do casamento.

Cediço que a desconsideração da personalidade jurídica reclama que se apresente fundamento com respeito à teoria maior ou, de outro lado, à teoria menor.

A teoria maior, regra em nosso ordenamento, encontra-se disposta na Legislação Substantiva Civil, verbo ad verbum:

CÓDIGO CIVIL

Art. 50 – Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

Já a teoria menor, consoante melhor doutrina, atrela-se tão somente à dificuldade do recebimento de bens do devedor. Assim, um único pressuposto. Quanto à teoria maior, além do obstáculo ao recebimento do crédito, exige, além disso, provar-se o “abuso da personalidade jurídica”.

Nesse compasso, urge transcrever o magistério de Flávio Tartuce, o qual, aludindo às lições de Fábio Ulhoa Coelho, destaca, ad litteram:

Aprofundando, em relação à desconsideração da personalidade jurídica, a doutrina aponta a existência de duas grandes teorias: a teoria maior e a teoria menor. Ensina Fábio Ulhoa Coelho que ‘há duas formulações para a teoria da desconsideração: a maior, pela qual o juiz é autorizado a ignorar a autonomia patrimonial das pessoas jurídicas, como forma de coibir fraudes e abusos praticados através dela, e a menor, em que o simples prejuízo do credor já possibilita afastar a autonomia processual’ (Curso …, 2005, v. 2, p.35). Por óbvio que o Código Civil de 2002 adotou a teoria maior. De qualquer modo, entendemos que o abuso da personalidade jurídica deve ser encarado como forma de abuso de direito, tendo como parâmetro o art. 187 do CC. (TARTUCE, Flávio. Direito civil. Vol. 1. 8ª Ed. São Paulo: Método, 2012, p. 240)

Disso não discrepam Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald:

Ora, a partir do momento em que resta evidenciado o abuso do direito associativo, a fraude imposta a terceiros através do uso do véu protetivo da pessoa jurídica, o desvio da finalidade almejada pela empresa ou mesmo a (tão comum) promiscuidade entre as esferas patrimoniais do sócio e da empresa, configura-se o uso indevido(irregular) do direito de associar, autorizando-se a desconsideração do principio da separação, permitindo que o credor busque diretamente no patrimônio dos sócios a satisfação da obrigação que não pode ser atendida pelo patrimônio da empresa. (FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direito Civil – Teoria Geral. 8ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 379)

2.1.1. Pressuposto do “óbice no recebimento do crédito”

Inarredável o embaraço ao recebimento do crédito alimentar. A propósito, confira-se a certidão do meirinho. Tal-qualmente as tentativas frustradas de constrição de ativos financeiros, de veículos. Para além disso, há ocultação de bens, quando registrados em nome da sociedade empresária.

2.1.2. Requisito da “confusão patrimonial”

Demais disso, inegavelmente os bens da sociedade empresária pertencem, em verdade, ao Executado. Um deles, até, apartamento residencial. Assome-se grande parte desses registrados após a dissolução do casamento.

Assim, a empresa está sendo manipulada, ardilosamente, à prática de atos ilícitos. Desse modo, o único caminho é aplicar a teoria jurídica em mira ( disregard of legal entity ). Com isso, possibilitará atingir bens do patrimônio da sociedade empresária.

Com efeito, esse proceder se encaixa em uma das previsões possíveis de desconsideração da personalidade jurídica (inversa), ou seja, em face da confusão patrimonial. (CC, art. 50)

Nesse passo, é de todo oportuno trazer à baila o entendimento de Sebastião de Assis Neto, quando, lecionando acerca da confusão patrimonial, dispõe, verbo ad verbum:

Mas podemos citar também a hipótese em que determinado bem ou objeto utilizado pra os interesses da pessoa jurídica é adquirido e colocado/registrado em nome do sócio ou proprietário, em clara simulação para prejuízo dos interesses de terceiros. Nesse caso, a confusão patrimonial (bem de propriedade formal do sócio ou proprietário, mas de comínio de fato da pessoa jurídica) autoriza a desconsideração da personalidade jurídica para atingimento desse objeto para fins de satisfação do interesse do credor. “ (ASSIS NETO, Sebastião José. Manual de Direito Civil. — Salvador: Juspodivm, 2013, p. 214)

Nessa mesma ordem de ideias, bem apregoa Carlos Roberto Gonçalves. Ipisis litteris:

“ Caracteriza-se a desconsideração inversa quando é afastado o princípio da autonomia patrimonial da pessoa jurídica para responsabilizar a sociedade por obrigações do sócio, como, por exemplo, na hipótese de um dos cônjuges, ao adquirir bens de maior valor, registrá-los em nome da pessoa jurídica sob seu controle, para livrá-los da partilha a ser realizada nos autos da separação judicial. Ao se desconsiderar a autonomia patrimonial, será possível responsabilizar a pessoa jurídica pelo devido ao ex-cônjuge do sócio. (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 5ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 218)

Não por outro motivo considera a jurisprudência que:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. FAMÍLIA.

Reconhecimento e dissolução de união estável, guarda e alimentos. Decisão agravada que acolhe pedido de inclusão das empresas administradas pelo varão no polo passivo, bem como fixa alimentos em favor do filho menor e da ex-companheira, estabelecendo a guarda unilateral do menor à genitora. Recurso do varão. I. Desconsideração inversa da personalidade jurídica. Possibilidade. Indícios suficientes de confusão patrimonial e utilização de interpostas pessoas com o fito de frustrar a meação. Requerimento que não depende da instauração de incidente, podendo ser formulado na petição inicial. Exgese do art. 134, §2º, do NCPC. II. Alimentos ao filho menor. Redução. Descabimento. Necessidades presumidas do adolescente. Ausência de prova segura quanto à propalada incapacidade do genitor. Indícios de que o alimentante pode mais do que alega. Manutenção impositiva do encargo. III. Alimentos à ex-companheira. Necessidade demonstrada. Labor jamais exercido ao longo do companheirismo. Valor, contudo, que merece adequação. Verba que tem caráter transitório e auxiliar, não se destinando à manutenção do padrão de vida anterior. Ausência de prova robusta quanto aos dispêndios necessários. Redução da obrigação. lV. Guarda do filho adolescente. Inversão injustificada. Compartilhamento, entretanto, possível. Ausência de fatos que desabonem a conduta de quaisquer dos genitores. Dissenso quanto à partilha que não deve servir de impeço à harmônica convivência das partes na estrita observância do que respeita ao filho menor. Regra do art. 1.584, §2º, do CC/02 que deve ser aplicada, sem prejuízo de revisão futura, se assim recomendar o melhor interesse do adolescente. Agravo de instrumento conhecido e parcialmente provido. (TJSC; AI 4024870-08.2017.8.24.0000; Içara; Primeira Câmara de Direito Civil; Rel. Des. Jorge Luis Costa Beber; DJSC 06/03/2018; Pag. 143)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DA PERSONALIDADE JURÍDICA. REQUISITOS LEGAIS. ABUSO DA PERSONALIDADE. FRUSTRAÇÃO DA EXECUÇÃO. OCULTAÇÃO DE PATRIMÔNIO. ACUIDADE DA DECISÃO.

Desconsideração inversa da personalidade jurídica. Cognoscível a inclusão de pessoa jurídica de propriedade do sócio, em face da evidente utilização da empresa como meio de ocultação de patrimônio do devedor (art. 50, do Código Civil). Desconsideração inversa ora expressa no artigo 133, §2º, do Novo Código de Processo Civil. Evidenciado o abuso em desfavor do credor, utilização de pessoas jurídicas para a frustração do cumprimento de sentença;. Impugnação do valor da dívida e excesso de garantia repelidos. Argumentos incipientes, sequer instruídos ou especificados (conduta que beira a litigância de má-fé). Valor demonstrado pela requerida e bens constritos insuficientes para a satisfação da execução; AGRAVO DE INSTRUMENTO NÃO PROVIDO. (TJSP; AI 2199531-77.2016.8.26.0000; Ac. 10233108; São Paulo; Trigésima Câmara de Direito Privado; Relª Desª Maria Lúcia Pizzotti; Julg. 08/03/2017; DJESP 15/03/2017)

APELAÇÃO CÍVEL EMBARGOS À EXECUÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. ALEGAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE TÍTULO EXECUTIVO. REJEITADA. CONTRATO FIRMADO POR FUNCIONÁRIO NA SEDE DA EMPRESA DE PROPRIEDADE DO EMBARGANTE/APELANTE. FATO PÚBLICO E NOTÓRIO. TEORIA DA APARÊNCIA. DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DA PERSONALIDADE JURÍDICA. CONFIGURAÇÃO DOS REQUISITOS AUTORIZADORES. COMPROVAÇÃO DA CONFUSÃO PATRIMONIAL. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO

I. Segundo estabelece o art. 370, do CPC, cabe ao Juiz decidir sobre a necessidade de produção de provas, podendo indeferir aquelas meramente protelatórias ou desnecessárias à formação do seu convencimento, mormente no caso concreto em que verificou-se que era possível à parte apelante diligenciar administrativamente para obter os documentos que entende ser imprescindíveis. II. Restando comprovada a confusão patrimonial dos bens do sócio que se valeu da pessoa jurídica para ocultação ou desvio de bens pessoais, com prejuízo aos credores, deve ser deferida a desconsideração inversa da personalidade jurídica. (TJMS; APL 0001004-11.2015.8.12.0043; Primeira Câmara Cível; Relª Desª Tânia Garcia de Freitas Borges; DJMS 23/02/2017; Pág. 136)

É de se concluir, destarte, que a Exequente demonstrara eficazmente todos os pressupostos à desconsideração inversa da personalidade jurídica (CPC, art. 133, §§ 1º e 2º ).

3 – PEDIDOS e REQUERIMENTOS

Posto isso, pleiteia que Vossa Excelência se digne de instaurar o incidente de desconsideração inversa da personalidade jurídica (CPC, art. 133, § 2º c/c art. 134, § 4º) e, para tanto, pede para:

3.1. Requerimentos

( i ) cientificar o setor de distribuição acerca da instauração do presente incidente (CPC, art. 134, § 1º);

( ii ) determinar a citação da sociedade empresária “Sociedade Xista Ltda”, com endereço sito na Rua Delta, nº 000, inscrita no CNPJ(MF) sob o nº 33.444.555/0001-66, para, querendo, manifestar-se (CPC, art. 135).

3.2. Pedidos

( i ) uma vez provada a ocorrência da confusão patrimonial (CC, art. 50), pede-se, por isso, seja proferida decisão interlocutória (CPC, art. 136, caput) de sorte a desconsiderar-se a personalidade jurídica , incluindo aquela no polo passivo desta execução.

Respeitosamente, pede deferimento.

Cidade, 00 de março de 0000.

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