[MODELO] Contestação – Ilegitimidade passiva e denunciação à lide ao novo proprietário
Contestação à Ação Sumária de Reparação de Danos em Veículo
Petições – Ações Indenizatórias
O veículo que envolveu-se em acidente de trânsito foi alienado pelo réu antes do evento fatídico. A falta de regularização administrativa é responsabilidade do comprador.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA …. ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE ….
Autos n º ….
…………………………., (qualificação) por sua advogado infra-assinado, a qual recebe intimações em seu Escritório na Rua …. n º …., procuração inclusa (doc. nº ….), respectivamente, vem oferecer sua
CONTESTAÇÃO
à AÇÃO SUMÁRIA DE REPARAÇÃO DE DANOS PROPOSTA POR …., fazendo-o na forma e pelo que passa a expor e requerer:
1- Preliminarmente
Da ilegitimidade passiva
1. Dispõe o art. 3º, do C. P. C., que para propor ou contestar ação é necessário ter interesse e legitimidade. Ao Contestante faltam estes dois pressupostos, uma vez que não era mais proprietário do veículo indicado no Boletim da Autoridade Policial como "Veículo nº 3", fl.. 11-v., como será provado no curso desta defesa.
2. O Requerido alienou o referido automóvel em …/…/…, para o Sr. …., conforme se verifica do Termo de Aditamento de Alienação Fiduciária e Termo de Cessão e Transferência de Direitos, inclusos (docs. nºs. …. e ….)
3. A transferência de titularidade do direito de propriedade do referido veículo junto ao DETRAN é mera formalidade e de inteira responsabilidade do novo proprietário, não podendo o Contestante responder pela falta de diligência do mesmo, o que levou ao equívoco dos Autores, indicando-o como Réu neste processo.
4. Não se pode, portanto, responsabilizar o Requerido pelo acidente, simplesmente porque o novo proprietário se omitiu nas providências de seu interesse, referentes à transferência do automóvel para seu nome junto ao DETRAN.
5. Aliás, sobre o tema, pondera com muita propriedade o acatado …., em sua obra "Da Responsabilidade Civil Automobilística" – pág. 289:
"Responsabilizar-se alguém pelos danos causados por intermédio de um veículo pelo só fato de se encontrar o mesmo registrado em seu nome nos assentos da inspetoria de trânsito, seria, por vezes, simplista ou talvez cômico. Não justo, em tese. Culpa pressupõe, salvo exceções legais, fato próprio, vontade livre de querer, discernimento. Não seria a circunstância de um só registro, não traduzidor de uma verdade, em dado instante, em uma repartição pública, que iria fixar a responsabilidade por fato alheio à vontade e à ciência do ex-dono do veículo, apenas porque a pessoa que dele adquiriu, não se deu pressa em fazer alterar na repartição de trânsito o nome do antigo proprietário."
6. É certo, também, que no direito brasileiro a transferência da propriedade de bens móveis efetiva-se pela tradição. Quanto a isto, não tem se descuidado a jurisprudência, como se observa da decisão do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso:
"Acidente de trânsito. Ação proposta pelo possuidor do veículo. Certificado de propriedade em nome de terceiro. Irrelevância. Tradição. Legitimidade de parte. Ação procedente. A circunstância de estar o certificado de propriedade de um veículo em nome do anterior proprietário não tira a legitimidade ativa daquele que tem em seu poder o recibo de compra, comportando-se como o real proprietário do veículo. Ação julgada procedente ante a prova de o acidente ter ocorrido por culpa do condutor do veículo da Apelante-ré." (ADCOAS 13049091, "Série Jurisprudência. Acidente de Trânsito. Responsabilidade Civil"- págs., 55/56)
7. O 1° Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo caminha na mesma direção:
"Tradição. Acidente de Trânsito. Veículo vendido a terceiro. Falta de transferência na repartição de trânsito. Ação movida contra o antigo proprietário do veículo. Carência. A transferência do domínio de bem móvel opera-se pela tradição e as providências junto à repartição de trânsito se constituem em mero expediente administrativo que não interfere no negócio jurídico." (5ª Câm. Civil do 1º TAC – SP, Apel. n.o 291.486, j. unân. de 28/04/82 – Rel. Juiz Ruy Camilo -RT -574/150. Citado pelo conceituado Wilson Bussada em sua obra "Responsabilidade Civil Interpretada pelos Tribunais" Editora Liber Juris nº 0117 – pág. 104, verbete 33).
Face ao exposto, requer-se a V. Exa. seja acatada a preliminar ora argüida, para o fim de extinguir o processo sem julgamento de mérito, nos termos dos arts. 267, inciso I, e 295, inciso II, do C.P.C., em relação ao ora Requerente, em face de sua manifesta ilegitimidade passiva, condenando-se os Autores nas custas e honorários advocatícios, esta a ser fixada em 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa.
II – Denunciação à lide
II.a – Do novo proprietário
8. De acordo com o art. 70, inciso II, do Diploma Processual, o Requerido vem denunciar à lide o Sr. …., (qualificação) proprietário do veículo envolvido no sinistro e que lhe pertencia.
Isto posto, requer se digne V. Exa. determinar a citação do denunciado, via postal, de acordo com o art. 222, do C.P.C., para vir integrar a lide, na forma prevista no art. 71, do mesmo códex, suspendendo-se o processo, conforme determina o art. 72, do mesmo Diploma Legal.
II.b – Da seguradora
9. Por sua vez, o veículo que pertenceu ao Contestante e envolvido no sinistro encontrava-se segurado junto à …., pela Apólice nº …., contra danos causados a terceiros, na data do fato, conforme Declaração e Extrato inclusos, expedidos por aquela Cia. Seguradora (docs. nºs. 4/5).
10. Diante disto, vem denunciar à lide, também, a …., estabelecida nesta capital, na Rua …. nº …., o que faz com amparo no citado art. 70, da lei Adjetiva, requerendo sua citação, via postal, conforme faculta o art. 222, do mesmo Diploma Legal, suspendendo-se o processo, a teor do que dispõe o já citado art. 72.
III – Do mérito
11. Para a hipótese absurda de não ser acatada a preliminar da ilegitimidade passiva acima levantada, passa-se ao mérito da causa, na certeza de que não poderá a presente ação ter outra sorte que não sua improcedência.
12. Consoante se observa do Boletim de Ocorrência lavrado pelo Batalhão da Polícia Rodoviária, fl. 11/13 dos Autos, no acidente em pauta envolveram-se 3 (três) automóveis:
12.1 – O …. de cor …., placa …., identificado como "veículo nº 1",
12.2 – O …. de cor …., placa …., identificado como "veículo nº 2",
12.3 – O … de cor …., placa …., identificado como "veículo nº 3",
13. Na exordial, os Autores relatam o acidente da seguinte forma: "1. Nos primeiros minutos do …., dia …/…/…, o primeiro requerente conduzia o automóvel marca …. ano …. placa …., identificado como V-2 no Boletim de Ocorrências apenso (3), pertencente ao segundo requerente, conforme certificado de propriedade anexo (4), pela rodovia …, envolvendo-se em colisão com dois veículos, na altura do Km ……. A visibilidade estava sensivelmente reduzida em razão da chuva e da neblina. O requerente seguia em direção à …., procedente de …., quando de repente avistou, poucos metros a sua frente, um veículo parado na pista em que seguia, voltado em direção contrária a sua (na contramão, portanto), com luzes inteiramente apagadas, sendo impossível evitar a colisão. Frise-se que a batida foi frontal, indicando que este se encontrava na direção de ….Tratava-se de um …., placa …., de …., pertencente a …., primeira requerida, conforme certidão de propriedade apenso (5), e conduzido por …., segundo requerido, veículo este identificado como V-1 no Boletim de Ocorrência apenso, no qual se encontravam quatro moças e um rapaz no momento do acidente, as quais demonstravam haver ingerido bebidas alcóolicas. 3. Em seguida, momentos após, antes que a pista pudesse ser sinalizada, outro veículo, procedente de …., também com a visibilidade reduzida pelo mau tempo, colidiu na traseira do V-2, jogando-o novamente contra o V-1. Este terceiro era um …., placa …., de …. de propriedade de …., terceiro requerido, e conduzido por …., quarto requerido."
14. Pela descrição dos fatos, extrai-se pois, que os condutores do V-1 e do V-2 agiram com manifesta imprudência, infringindo normas básicas do C.N.T., o qual reza em seu art. 90:
"Quando, por motivo de força maior, um veículo não puder ser removido da pista de rolamento ou deva permanecer no respectivo acostamento, o condutor deverá colocar sinalização de forma a prevenir aos demais motoristas."
15. Por outro lado, dispõe o art. 89, do mesmo diploma legal, em seu inciso XXXIV:
"É proibido a todo condutor de veículo: XXXIV – Realizar reparos em veículos na pista de rolamento."
16. Consta do Boletim de Ocorrência, fl. 13:
"Os condutores dos V-1 e V-2, não sinalizaram o local, antes do segundo choque. O local foi sinalizado com triângulo refletivo e vegetação verde, após ter ocorrido o envolvimento dos três veículos."
17. É evidente que o condutor do V-1 não tomou os cuidados indispensáveis à segurança do trânsito, assim como o condutor do V-2, pois, pelas circunstâncias, a providência correta a ser adotada seria alertar os demais usuários da pista do perigo existente, o que não foi feito.
18. Frente as condições de visibilidade decorrentes do mau tempo e do horário do acidente, o que se podia esperar do condutor do veículo causador do acidente, bem como do condutor do V-2, é que colocasse sinalização reforçada no local, o que poderia prevenir e evitar o envolvimentos de outros automóveis. Isto não foi feito e o resultado aí está.
19. O condutor do V-3, que era de propriedade do contestante, em momento algum contribuiu para o resultado, pois seguia normalmente pela rodovia quando, então, foi surpreendido pelo bloqueio da pista pelo V-2, o qual se encontrava atravessado na estrada, em cima da linha divisória da pista, em decorrência da incúria do condutor do V-1.
20. Ora, levando-se em considerações os ditames da normal prudência, o V-3 não poderia em função das condições de visibilidade prever que um automóvel estaria no meio da pista de rolamento. A colisão foi inevitável.
21. É evidente que a culpa pelo sinistro não pode ser imputada ao V-3, é claro que este não concorreu para o fato e sim os outros dois, devendo os mesmos suportarem os danos causados.
23. Não bastasse isto, imputar ao Contestante a obrigação de reparar um dano para o qual não concorreu, além de ser um absurdo, é imoral e uma grande injustiça. Neste sentido, ensina ARNALDO MARMITT, em sua obra "Responsabilidade Civil nos Acidentes de Automóvel – Teoria, Prática e Jurisprudência" – Aide Editora -, ao analisar o teor da Súmula 489, do STF:
"A matéria sumulada e seus fundamentos inspiradores desde logo mereceram aceitação. O proprietário do carro causador do acidente passa ser o responsável pelos danos, mesmo que já tivesse transferido a outrem o veículo, pelo simples fato de não transcrição do documento transladativo no cartório competente. Mas não demorou a pacificidade em torno do assunto. Sem desrespeito à superior orientação do Pretório Máximo, juizes e câmaras começaram a expressar entendimento diverso. Raciocinou-se que o certificado de propriedade não confere eficácia à venda, mas, expedido ante apresentação de comprovante de compra e venda, só gera presunção juris tantum de propriedade. O que importa é o recibo de compra e venda. Esse é o documento fundamental, que dá causa ao certificado, que transfere a propriedade, ficando em segundo plano a não extração do certificado ou a falta de registro do recibo em cartório."
24. Mais adiante:
"Na opinião dos integrantes dessa segunda corrente, a aplicação da Súmula aos casos concretos, em alguns casos poderia levar injustiças, pois não se pode obrigar alguém a pagar danos a que não deu causa. O registro no órgão de trânsito vale como presunção de propriedade apenas, operando-se a transferência dominial independentemente da transcrição. A presunção desaparece com a comprovação da venda, e a alteração no registro compete ao comprador, sendo injusto pretender responsabilizar o vendedor, se o comprador se omitir na providência. O certificado não é essencial na transferência do veículo, servindo só para autorizar a sua circulação. O registro no cartório de títulos e documentos apenas colima dar validade erga omnes, facilitando a provas perante terceiros no tocante à propriedade, não tendo, pois maiores repercussões na esfera da responsabilidade civil." (pág. 167).
Continuando, ensina o Mestre:
"No caso não se discute a validade da compra e venda do veículo. O direito da A. deflui do ato ilícito do causador do acidente. Não se contrapõem direitos de propriedade ou de posse, na busca de domínio e da posse do veículo. Não há aqui um terceiro de boa-fé a exigir direitos sobre o veículo, mas um direito indenizatório que pode ser buscado contra o causador do acidente e o dono do veículo. A Súmula 498, pois, não se aplica à espécie." (pág. 169).
E mais adiante, na mesma página:
"Causante direto dos danos sempre é legitimado passivo para a causa reparatória. Compete-lhe indenizar os estragos que fez, ainda que os atribua de fato a terceiro. Se outra pessoa interferiu na concretização do evento danoso, cabe-lhe identificar essa pessoa e responsabilizá-la oportunamente. Não se lhe abre outra alternativa do que ressarcir e depois reembolsar-se do que despendeu, via ação competente. "Nada impede que o autor direto, em ação própria, possa agir contra o terceiro que tenha, culposamente, influído na determinação do evento". (Julgados TARS – 15/293)."
25. Vê-se claramente, Douto Magistrado, que o Contestante em momento algum concorreu para o fato que provocou os danos cuja reparação é buscada nos presentes Autos. O direito brasileiro não admite responsabilização sem culpa, art. 159, do Código Civil, sob pena de ocorrer o empobrecimento sem causa do ora Requerente.
Diante do exposto e pelo mais que será suprido por V. Exa., protestando pela tomada do depoimento pessoal do primeiro Autor e do condutor do veículo que pertenceu ao Contestante, requer a improcedência da ação, condenando-se os Autores nas custas judiciais e verba honorária, esta a ser fixada em 20% (vinte p/cento) sobre o valor dado à causa.
Termos em que,
Pede deferimento.
…., …. de …. de …..
………………
Advogado OAB/…