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[MODELO] Contestação da Ação Cautelar – Repasse da parcela de 25% do ICMS e violação da ordem cronológica dos precatórios

Contestação, Ação Cautelar, repasse da parcela de 25% do ICMS, artigo 158, IV da CF.

EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ….ª. VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA CAPITAL.






Processo n.: ……………………
Ação Cautelar
Autora: ……………………
Ré: ………………………………


A ré, por sua obstante procuradora , nos autos do processo em epígrafe, vem, respeitosamente, à presença de V.Exa., oferecer CONTESTAÇÃO à demanda cautelar, pelos motivos que passa a expor:

Cuida-se de medida cautelar por meio da qual insurge-se a autora contra a forma como se processará o repasse da parcela de 25% do ICMS – parcela constitucionalmente prevista nos termos do artigo 158, IV da Constituição Federal – que couber aos Municípios, em razão da compensação autorizada pela Lei Estadual 10.339, de 1o de julho de 2012, entre débitos tributários de ICMS inscritos e ajuizados e créditos oponíveis contra a …………….. oriundos de sentenças transitadas em julgado e objeto de precatório.

Pretende seja o repasse feito imediatamente por ocasião da extinção da execução (quando da compensação), e não somente quando os valores correspondentes ao precatório utilizado para compensação forem disponibilizados para o Estado, em respeito à ordem cronológica dos precatórios judiciais, estabelecida no artigo 100 da Constituição Federal.

Após tecer diversas considerações atinentes aos princípios constitucionais que presidem o mencionado repasse às municipalidades do percentual que lhes cabe do que houver sido arrecadado a título de ICMS — enfatizando o caráter imediato em que o mencionado repasse há-de consistir, por se tratar, no caso, de genuína titularidade, ou seja, de uma relação de propriedade sobre a parcela em questão –, o Autor impugna diretamente o comando insculpido no artigo 9o do Decreto 44.075, de 2 de julho de 2012, que regulamentou a Lei Estadual 10.339/99. Em seu entender, o referido preceito regulamentar, ao dispor que o repasse deverá ser efetuado pela Secretaria da Fazenda “na data correspondente ao pagamento do precatório na respectiva ordem cronológica”, viola a regra do § 1o do artigo 4o da Lei Complementar 63/90, diploma este que disciplina as remessas para os municípios das parcelas de IPVA e ICMS que lhes pertencem. Segundo o art. 4o, § 1o em comento, com efeito, nas hipóteses de ser o crédito de ICMS extinto por compensação (caso dos autos) ou transação, “a repartição estadual deverá, mo mesmo ato, efetuar o depósito ou a remessa dos 25%” pertencentes aos municípios.

Vale dizer, o Autor, ao que parece, entende que a compensação autorizada pela Lei Estadual 10.339/99 tem lugar em momento anterior, talvez bem anterior, àquele indicado no art. 9o do Decreto 44.075/99: ela se operaria tão-logo deferido fosse o requerimento protocolado pelo particular interessado (art. 2o e § único da Lei 10.339/99), solicitando o reconhecimento e implementação desta forma específica de extinção do crédito tributário. Como o repasse dos 25%, nos termos do mencionado art. 9o do Decreto 44.075/99, só ocorrerá na data correspondente ao pagamento do precatório, dentro da ordem cronológica previamente estipulada, o Município autor considera que tal disposição regulamentar consagra o atraso na entrega da parcela que lhe cabe daquilo a que tiver direito em virtude da dívida de ICMS inscrita e ajuizada, e desta forma compensada.

É contra esse suposto atraso que se volta a medida cautelar, tendo o d.Juízo entendido pela autorização da liminar, que, data maxima vênia, feriu os requisitos ensejadores à sua concessão.

DO LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO

A presente ação objetiva medida judicial que determine o imediato creditamento aos Municípios, na “conta bancária do fundo de participação”, da parcela de 25% a serem repassados aos mesmos.

Ora, tal “parcela” de 25% do ICMS arrecadado é destinado a todos os Municípios dos Estado de São Paulo, sendo que a divisão para cada um é feita de acordo com os respectivos índices de participação, fixada por meio das Leis Estaduais ns. 3.201/81 e 8.510/93, nos termos da Lei Complementar n. 63/90 e artigos 158 e 161 da Constituição Federal.

O interesse processual de fato do Município autor, no presente caso, restringe-se ao valor correspondente ao seu índice de participação, uma vez que somente esta será a sua participação no montante total de 25%. Não obstante, cuida o pedido de repasse da parcela de 25% genericamente, sem estar se fazendo referência apenas àquele valor correspondente ao Município autor.

Como se percebe, a ordem judicial a ser aqui proferida irá obrigatoriamente afetar todos os Municípios do Estado, ao determinar ou não o repasse de valores pertencentes aos mesmos, e, portanto, deverá ser uniforme para todos. Isso porque existe o risco concreto de que algum Magistrado não conceda medida liminar em caso similar ao presente, beneficiando ou não outro Município, ou julgue divergentemente, estabelecendo-se situação jurídica conflitante.

No plano do direito material, portanto, a decisão a ser prolatada no presente feito haverá de interferir, sem dúvida, na esfera jurídica dos demais.

O caso vertente, pois , é daqueles que trazem à luz o instituto do LITISCONSÓRCIO necessário e unitário, a exigir nesta lide a presença de todos os Municípios deste Estado, já que possuem, sem dúvida, interesse na solução a ser aqui proferida.

É a conclusão que nasce do abalizado magistério do ilustre mestre Arruda Alvim, e que merece, sem dúvida, ser lembrado:

“ A doutrina alemã divide o litisconsórcio necessário em litisconsórcio necessário por razões processuais e litisconsórcio por razões de Direito Material….Ocorre o primeiro nas hipóteses em que os efeitos da decisão, necessariamente, atingem a todos os titulares da relação jurídica, estejam, ou não, no processo…
“tendo em vista o primeiro dos motivos fundamentais de ordem processual – sabe-se que encontra sua expressão pratica na extensão subjetiva da coisa julgada a vários litigantes, e , por isso, hão de, necessariamente, estar presentes no processo.

“Entendemos, entretanto, que existe o litisconsórcio necessário-unitário – que é diverso do necessário e do unitário. Trata-se de litisconsórcio necessário unitário, onde existe não só a exigência da presença de todos, por disposição de lei ou não, como, ainda, a exigência de que a sorte no plano do direito material seja a mesma, no sentido da procedência, ou improcedência da ação para todos os litisconsortes.

“No direito brasileiro, parece-nos, sem vislumbrar óbice na redação do artigo 213, que o artigo 47, parágrafo único, deve ser interpretado no sentido de autorizar o juiz a ordenar a integração subjetiva da lide, quer com relação aos litisconsortes ativos quer com relação aos passivos” (Código de Processo Civil Comentado, 1975, págs. 384, 385 e 406).

Consolidando ainda mais essa exegese, há a clareza do artigo 47, do Código de Processo Civil:
Art. 47. Há litisconsórcio necessário, quando por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes: caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo. (grifei).

O caso em matiz é daqueles que exigem o chamamento dos demais interessados. A citação dos litisconsortes necessários constitui pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo (artigo, 267, IV, do Código de Processo Civil) tanto que sua falta acarreta-lhe a nulidade (STF, RTJ 80/611, 95/742; RT 508/202).
Em tal diapasão, comentando o estampado artigo 47, emoldura o grande CELSO AGRÍCOLA BARBI:

“O ensino acerado e dominante é o de CHIOVENDA, para o qual a sentença, proferida sem que tenha sido formado litisconsórcio necessário, considera-se inutiliter datur. Segundo esse autor, a sentença não produz efeitos sem relação aos que não participaram do processo, nem em relação aos que dele participaram” (Comentários ao Código de Processo Civil, 1981, pág. 276, item 304, grifo original).

Pelos motivos ora articulados, é de rigor a citação de todos os Municípios Paulistas, porque esta lide deverá ser decidida, como demonstrado, de maneira uniforme para todos eles.

DA DELIMITAÇÃO DA PRESENTE LIDE:

Caso V.Exa. afaste a hipótese de litisconsórcio ativo necessário, exposta acima, em razão da dificuldade em se operacionalizar tal procedimento, – o que por sua vez bem demonstra a impraticabilidade da pretensão da autora, requer a Fazenda do Estado seja o objeto da presente lide delimitado ao repasse do índice de participação individualizado do Município autor, tendo em vista também a falta de interesse de agir com relação às parcelas cabentes aos demais Municípios do Estado, que não estão presente nesta ação, e sobre as quais poderá haver decisões conflitantes em outras lides.

NO MÉRITO:

Verifica-se, pois, a ausência dos elementos fundamentais para a propositura e procedência de uma ação cautelar: periculum in mora e fumus boni iuris.

De acordo com a lição do renomado VICENTE GRECO FILHO, na obra ‘Direito Processual Civil Brasileiro’, vol. 3, ed. Saraiva, 6a. ed. 1992, pág. 151, a finalidade do processo cautelar e das medidas cautelares é assegurar a subsistência e conservação, material e jurídica dos bens jurídicos envolvidos no processo de conhecimento. Ainda, segundo o mestre, na obra citada:

‘Essas medidas têm uma finalidade provisória e instrumental. Provisória porque devem durar até que medida definitiva as substitua ou até que uma situação superveniente as torne desnecessárias; instrumental porque elas não têm finalidade ou objetivo em si mesmas, mas existem em função de outro processo.’

Nesse diapasão, há que se examinar se existe bem jurídico que precise ser protegido, por correr perigo de deterioração em virtude do tempo, a ponto de tornar-se inútil toda a atividade jurisdicional. A resposta para o caso ‘sub judice’ é negativa, uma vez que de qualquer maneira deverá ser respeitada a ordem cronológica do pagamento dos precatórios. Logo, desvirtuada a finalidade cautelar, deverá a presente ação ser julgada improcedente.

A irreparabilidade do dano deve estar presente a amparar a concessão de liminar, antecipando os efeitos da sentença.

E aqui a irreparabilidade do dano está mais presente para a ré em desembolsar para o Município quantias ainda não recebidas, do que para o Município em aguardar o recebimento dos precatórios, em cumprimento à lei.

De todo o modo, tendo sido concedida liminar com os contornos de antecipação de tutela, ainda aqui deve-se ter em mente o preceito do artigo 805 do CPC de tal modo que, registre-se, se cabível medida menos gravosa, sendo esta “suficiente para evitar a lesão”, não cabe a concessão da medida mais gravosa, no caso, a tutela antecipada. E, mais, em se tratando de questão que envolve direito patrimonial, dificilmente caracteriza-se a necessidade de conceder-se a tutela antecipada, pois como bem afirma REIS FRIEDE, citando também LUIZ GUILHERME MARINONI:

“A tutela antecipatória é fundamental para a realização dos direitos não patrimoniais. O nosso sistema processual civil, marcado por uma visão de mundo centrada no “ter”, está estruturado para a tutela dos direito patrimoniais, ou seja, para a restauração do direito violado. Para a efetividade da tutela dos direitos não patrimoniais, não é suficiente uma tutela reparatória: é necessária uma tutela jurisdicional capaz de impedir a lesão do direito. Sem dúvida, a tutela antecipatória “é a mais idônea das tutelas no domínio nos direitos da personalidade, por prevenir agressões ilícitas emergentes do progresso técnico e tecnológico, especialmente das novas e sofisticadas tecnologias informáticas e publicitárias, domínio em que a importância e a natureza pessoal e extra patrimonial dos valores em presença tornam insuficiente e inadequada a tutela ressarcidora.” (Luiz Guilherme Marinoni, ob. Cit.., págs. 57/60)(Trecho extraído de Reis Friede, “Liminares em tutela cautelar e tutela antecipatória”, Ed. Destaque, 1996, pág. 105).

Da inexistência do fumus boni iure amparando o pedido do autor:

Consoante se asseverou linhas atrás, o Autor, em toda a sua argumentação, sempre partiu do pressuposto, para ele um dado inquestionável, de que a compensação permitida pela Lei Estadual 10.339, de 1o de julho de 2012, dá-se sempre em algum momento anterior àquele designado no art. 9o do Decreto 44.075/99 como o devido para o repasse da quota pertencente aos municípios, a “data correspondente ao pagamento do precatório na respectiva ordem cronológica”.

Chama a atenção, a propósito, que o Autor não declare, em parte alguma de sua peça exordial, qual seria exatamente este momento. Ou melhor, ele indica diversas vezes que, em atenção ao determinado no Parágrafo 1o do art. 4o da Lei Complementar 63/90, o depósito da quota-parte do Município deveria ser efetuado na própria ocasião em que concretizada a compensação, mas não é fornecida, pelo Autor, com a precisão que se era de esperar de sua parte, qual o momento exato, dentro do processo descrito seja no artigo 2o da Lei 10.339/99, e seu Parágrafo Único, seja nos artigos 4o, 5o, 6o e 8o do Decreto regulamentador (D. 44.075/99), em que se deveria considerar finda e perfeita a compensação em causa: no momento em que protocolado o pedido do interessado?, no momento em que aceito este pedido após o exame prévio a que aludem o art. 2o, Par. Único da Lei e art. 5o do Decreto?, no momento em que deferido pela PGE o requerimento do interessado?, no momento em que comunicada aos Juízos pertinentes a existência de compensação nos termos do estipulado pela Lei 10.339/99? E, na última alternativa, bastará a comunicação ao Juízo da execução fiscal? Ou, ao contrário, bastará seja informado o Juízo da demanda de onde se originou o precatório? Ou somente após a comunicação aos dois Juízos? Ou após a ciência destas comunicações?

O silêncio do Autor a este respeito revela-se sobremaneira sintomático. Ao que se dessume da leitura da inicial, o Município maneja, ou crê fazê-lo, com muita facilidade o disposto no tantas vezes invocado artigo 4o e seu Parágrafo 1o da LC 63/90. A rigor trata-se de uma utilização viciada pela extrema ligeireza, com esperados danos à tarefa exegética acertada, equilibrada e justa dos dizeres legais.

Com efeito, a dificuldade com que se depara o autor para precisar o exato momento em que, no amplo processo que leva à compensação autorizada pela Lei Estadual 10.339/99, deverá o Estado proceder ao depósito em sua conta, aberta para tal desiderato, da quota que lhe cabe do ICMS auferido por meio desta forma especial de extinção de crédito tributário, tal dificuldade prende-se a que, ao contrário do que pretende o Autor, a compensação em causa não equivale a um ato que se esgote num único lance, mas representa, protraindo-se no tempo, um ato complexo, dotado de várias fases, e que não se aperfeiçoa senão quando, para os dois “atores” ou sujeitos do processo, o benefício que almejam com a compensação é efetivamente realizado: para o particular, a extinção da execução fiscal em curso, ou a sua continuação por saldo devedor, naturalmente inferior, calculado após o encontro das contas; para o Estado, o não ter de quitar valor algum devido por precatório, ou o ter de honrar valor inferior ao inicialmente previsto, e, em ambos os casos, na data estipulada pela ordem cronológica para esse tipo de pagamento.

Ou seja, na compensação em tela de análise, ganham as duas partes. Ganha o particular, a partir do momento em que o executivo fiscal contra ele promovido se extingue, ou permanece sendo-lhe exigido valor menor. Ganha o Estado, quando e na medida em que se vê a salvo da necessidade de desembolsar uma quantia que, não fora a compensação acertada, seria obrigado a pagar.

Na hipótese dos autos, por conseguinte, é intuitivo e elementar que indaguemos também, e principalmente, quando e em que medida concretiza-se o ganho do Estado, pois será neste momento, para todos os efeitos, que o resultado da arrecadação de ICMS (na realidade não auferida diretamente, posto que compensada com o débito que o Estado tem para com o particular contribuinte e devedor deste tributo) se mostrará em sua inteireza. Isto é, será no exato momento em que o Estado (obrigado a honrar o valor consignado no precatório, na data prevista na ordem cronológica), ao invés de desembolsar o valor original – chamemo-lo assim – não precisar quitar nada ou tiver de quitar valor menor, será exatamente neste momento que ele obterá o ganho resultante da compensação.

Isto equivale a dizer que antes desta data – a data correspondente ao pagamento do precatório na respectiva ordem cronológica – o Estado nada terá recebido a título de ICMS, ainda que aceita previamente ou mesmo deferida, ou ainda que comunicada aos Juízos respectivos, a compensação de que trata a Lei 10.339/99. Antes daquela data, poderá o particular credor da Fazenda, e ao mesmo tempo devedor de ICMS, auferir o seu ganho próprio, com a extinção do feito executivo ou a sua continuação por saldo inferior. Não o Estado, que nada obterá com essa extinção (muito ao contrário, só perderá). E nada obterá até o momento em que, premido inicialmente a quitar uma determinada quantia, puder, justamente em virtude da compensação, desembolsar quantia menor ou mesmo não desembolsar nada mais.

Estas considerações de caráter marcadamente contábil fazem-se relevantes à compreensão da causa, pois põem a nu o absurdo e a total irrazoabilidade e injustiça da pretensão do Autor veiculada, e que foi concedida liminarmente. Pois, de fato, o que o Município quer é nada menos que a obtenção do valor relativo à sua quota-parte no produto arrecadado de ICMS antes mesmo que este produto seja arrecadado pelo Estado (conquanto arrecadado indiretamente, na data em que deveria honrar o precatório segundo sua ordem cronológica e após o encontro de contas em que consiste a compensação).

A alegação de que o Estado subordinou o “repasse da parcela dos impostos estaduais pertences aos Municípios à ocorrência de evento futuro e incerto” (item ‘2’ da petição inicial) não tem fundamento algum. O evento “futuro e incerto” é apenas o pagamento do precatório, na ordem estabelecida.

Não tem, pois, o Município autor, bem como nenhuma outra municipalidade que possa se beneficiar com a arrecadação indiretamente obtida por meio da compensação, direito à sua quota de 25%, constitucionalmente prevista, antes que o Estado seja beneficiado, ele próprio, com a arrecadação indireta acima referida. E o benefício do Estado, por força da sistemática vigente, de base também ela constitucional, só tem lugar no momento em que, ao invés de pagar certo valor a título de precatório, paga outro, menor, ou não paga nada. E este momento vem a ser precisamente a data em que o precatório haveria de ser honrado segundo a ordem cronológica. Logo, somente nesse momento tem direito o Município a receber a parcela que lhe cabe.

Sustentar o contrário implicaria em se admitir a absurda situação de o Município ter acesso ao ganho, obtido na compensação, antes de o próprio Estado dela se beneficiar. Importaria em se exigir do Estado o que ele ainda não tem.

E o Estado só terá este benefício, convém insistir, na data em que o precatório houver de ser honrado segundo a ordem cronológica. Tal fato não deriva do arbítrio do Estado, mas é imposição da sistemática vigente para a quitação das dívidas das pessoas jurídicas de direito público, consoante os taxativos termos da Constituição Federal, “verbis”:

“Artigo 100 – À exceção dos créditos de natureza alimentícia, os pagamentos devidos pela Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.

Par. 1o – É obrigatória a inclusão, no orçamento das entidades de direito público, de verba necessária ao pagamento de seus débitos constantes de precatórios judiciários, apresentados até 1o de julho, data em que terão atualizados seus valores, fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte.

Par. 2o – As dotações orçamentárias e os créditos abertos serão consignados ao Poder Judiciário, recolhendo-se as importâncias respectivas à repartição competente, cabendo ao Presidente do Tribunal que proferir a decisão exequenda determinar o pagamento, segundo as possibilidades do depósito, e autorizar, a requerimento do credor e exclusivamente para o caso de preterimento de seu direito de precedência, o seqüestro da quantia necessária à satisfação do débito.” Tais preceitos constitucionais, inspirados no princípio da moralidade, que deve sempre pautar o relacionamento do Poder Público com os particulares, são trazidos à colação apenas para que se perceba até que ponto encontra-se o Estado coagido a quitar suas dívidas segundo o rigoroso sistema baseado na ordem cronológica acima referida. Não há razão alguma que afaste essa exigência, ainda que o pagamento seja inferior ao inicialmente previsto, por força de compensação. A ordem cronológica tem de ser seguida, sempre que se trate de precatórios oriundos de sentença judicial (à exceção dos créditos de natureza alimentícia), de tal forma que será apenas na data correspondente à apresentação do precatório, segundo a respectiva ordem cronológica, que se terá por extinta, total ou parcialmente (se as dotações orçamentárias para tanto não forem suficientes), o débito da Fazenda Pública para com seus credores. Donde, se para a mencionada extinção bastar à Fazenda o depósito de uma quantia inferior à inicialmente prevista, e menor em decorrência de compensação, será neste momento, e não em outro, anterior ou posterior, que ela será beneficiada.

À luz das considerações precedentes, torna-se manifesto que a leitura que o Município Autor fez da regra inscrita no Parágrafo 1o do artigo 4o da LC 63/90 não pode ser aceita. Reza o mencionado preceito:

“Na hipótese de ser o crédito relativo ao Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação extinto por compensação ou transação, a repartição estadual deverá, no mesmo ato, efetuar o depósito ou a remessa dos 25% (vinte e cinco por cento) pertencentes na conta de que trata este artigo.”

Trata-se, em verdade, de regra antiga, já presente em forma similar na anterior legislação que disciplinava a matéria: o Decreto-Lei 380, de 23/12/68, art. 3o, Par. 3o, e Decreto-Lei 1216, de 9/5/72, art. 3o, Par. 3o., E QUE DEVE SER ANALISADA DENTRO DO SISTEMA LEGISLATIVO VIGENTE, inclusive levando-se em conta a sistemática de pagamento dos precatórios judiciais, que não pode ser afastada pela aplicação da Lei Complementar.

Apega-se a autora nas palavras “no mesmo ato” para induzir o julgador a concluir que por tal ato se haveria de entender algum momento anterior à data de quitação do precatório, segundo sua ordem cronológica, momento este por ele não precisado. Supondo que tal momento fosse, por exemplo, o deferimento do requerimento de compensação protocolado junto à PGE pelo particular interessado, esta seria a ocasião da compensação, e neste “mesmo ato” teria o Estado de depositar 25% da dívida de ICMS compensada, na conta do Município.

Ora, consoante acima exposto, tal exegese implicaria num absurdo e numa injustiça totalmente intoleráveis: obrigaria o Estado a depositar ou repassar em favor do Município o percentual de uma quantia que ele mesmo ainda auferiu!

Como, pois, admitir-se que a Lei Complementar possa consagrar tamanho despropósito? Como admitir que a mesma afaste princípios garantidos pela Constituição?

A acusação de que o Estado “toma de empréstimo os recursos dos Municípios” retendo os mesmos ao invés de repassá-los no momento em que a arrecadação estiver sendo realizada fere os princípios da boa-fé. Isso porque é patente que os recursos somente ficam disponíveis para o Estado no momento do pagamento do precatório. Antes desse evento não há como transferir valores para os Municípios, sem que haja efetivo desembolso (não apenas repasse) por parte do Estado. E não existe previsão legal orçamentária para esse desembolso.

Convém neste passo trazer a lume o autorizado magistério de Carlos Maximiliano, consoante o qual…
“…deve o direito ser interpretado inteligentemente: não de modo que a ordem legal envolva um absurdo, prescreva inconveniências, vá ter a conclusões inconsistentes ou impossíveis” (“Hermenêutica e Aplicação do Direito”, n. 179).

A interpretação do Município Autor restringe arbitrariamente, sempre no aparente afã de assim atingir mais facilmente seus propósitos, o sentido da dicção “no mesmo ato”, inserta na norma acima transcrita. Trata-se, com a devida vênia, de péssima hermenêutica, jungida à literalidade do dizer normativo e conducente a resultado absurdo e sumamente injusto.

A exegese correta, por conseguinte, não pode ser outra senão a que privilegie o real sentido do conceito de compensação, o qual não pode se reduzir, como tenciona o Autor, a um ato simples. Em verdade, trata-se de um ato complexo, mormente em se cuidando de compensação de dívida inscrita e ajuizada com dívida exigida por precatório, como na hipótese debatida na presente cautelar. “No mesmo ato”, tal como reza o citado Parágrafo 1o portanto, refere-se ao processo da compensação (ou da transação) como um todo, algo que se perfaz apenas quando as duas partes, incluída naturalmente a Fazenda Pública, obtenha o benefício que lhe cabe nesta forma de extinção de obrigações.

E como visto, o momento em que se perfaz este ato complexo da compensação, para os efeitos de se remeter ou depositar os valores da arrecadação de ICMS cabentes aos municípios, terá de ser aquele indicado com rigor e precisão na norma impugnada pelo Autor, o art. 9o do Decreto 44.075/99: a saber, a “data correspondente ao pagamento do precatório na respectiva ordem cronológica”

Esta, a interpretação correta do dispositivo em comento. Pois, acima de tudo, não é possível nem desejável que outra leitura desta regra obrigue o Estado a repassar ao Município parte do que sequer arrecadou.

Ademais, em caso de procedência do pedido formulado, será o Estado de São Paulo obrigado a desembolsar quantias, ou seja, efetuar “despesa”, sem que haja a devida “receita” para tanto, em violação ao sistema orçamentário. O deferimento do pedido de compensação com a extinção da execução fiscal é apenas uma operação contábil, sendo que somente quando ocorrer a realização financeira da operação, com o pagamento do precatório, haverá a entrada de receita, que imediatamente será transformada em despesa, para a quitação financeira do executivo fiscal. Somente nesse momento poderá ser efetuado o repasse para o Município autor.

Caso haja entendimento no sentido da ilegalidade do Decreto n. 44.075/99 no tocante à matéria impugnada, não poderá tal decisão ter o condão de afastar a aplicação correta do artigo 100 da Constituição Federal.

Demonstrado, portanto, que não existe perigo de dano ao Município, e que não existe o fumus boni iure, muito pelo contrário, a liminar concedida, bem como eventual procedência da ação levaria o Estado de São Paulo a quebrar a ordem cronológica dos precatórios, e a alterar a lei orçamentária anual, pois insere despesa no orçamento do estado para a qual não existe previsão orçamentária, deve a autorização judicial ser revogada, e julgada improcedente a presente ação.

Diante do exposto, requer a ré seja revogada a liminar concedida, e julgada a ação improcedente, condenando-se a autora ao pagamento das verbas de sucumbência, como medida de direito e Justiça!

Termos em que
P. Deferimento

São Paulo, ….de…………….de………

…………………………….
Advogado(a)
OAB/SP n.º ………….

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