[MODELO] Competência da Vara de Família para processar Usucapião Familiar – Memorial pela Apelante

MODELO DE PETIÇÃO

FAMÍLIA. USUCAPIÃO FAMILIAR. COMPETÊNCIA. VARA DE FAMÍLIA

Exmo. Sr. Des. …, DD. Relator da Apelação Cível n. … da … ª Câmara Cível do TJ…

apelante: …

apelado: …

MEMORIAL PELA APELANTE

competência da vara de família para processar e julgar o pedido de usucapião familiar [CC, art. 1.240-A]

precedentes jurisprudenciais de todo território brasileiro

I- MÚLTIPLOS PRECEDENTES PÁTRIOS SOBRE A COMPETÊNCIA DA VARA ESPECIALIZADA DE FAMÍLIA PARA PROCESSAR E JULGAR A USUCAPIÃO FAMILIAR[1]

1. A insurgência da ora apelante se prende à parte da sentença que diz respeito ao acolhimento da preliminar de incompetência do d. juízo da Vara de Família para processar e decidir acerca da usucapião familiar prevista no art. 1.240-A do Código Civil, que foi pedido cumuladamente com o decreto de divórcio na peça de introito.

2. Entendeu a v. sentença que não tem competência para apreciar o pedido de usucapião familiar, pois se trata de direito real e não pessoal, apontando como competente a Vara de Registros Públicos.

3. No entanto, se não é competente para processar e julgar o pedido cumulado, a sentença haveria de remeter essa questão para o juízo cível, mas não a decidir [como na hipótese vertente], cujo efeito é o mesmo de indeferir uma matéria que o próprio sentenciante entendeu ser incompetente.

4. Data venia, a matéria evoluiu no direito pátrio, emergindo para o mundo jurídico vários precedentes jurisprudenciais, que vieram dar guarida à tese esposada pela aqui apelante, no sentido de ser a vara especializada de família competente para decidir o pedido de usucapião familiar.

5. Faz-se na dianteira um confronto analítico e detalhada da presente causa com os arestos ora encampados, a fim de evidenciar para o d. relator e a egrégia Câmara, motivos suficientes para o provimento recursal. Ei-los de per si:

AGRAVO DE INSTRUMENTO – PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO DE DIVÓRCIO – ARGUIÇÃO DE USUCAPIÃO COMO TESE DEFENSIVA – ADMISSIBILIDADE – COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA AÇÃO PRINCIPAL – SÚM. Nº 237 DO STF – DAR PROVIMENTO. 1. A Súmula nº 237 do STF dispõe sobre a possibilidade de a usucapião ser arguída como tese de defesa, sem restringir sua aplicação às ações possessórias. 2. Sendo possível a arguição de usucapião familiar como defesa em ação de divórcio, não há que se falar em incompetência do juízo de família para processar e decidir sobre o tema, sob pena de se tolher o direito de defesa da agravante. 3. Recurso a que se dá provimento para determinar que o juízo a quo conheça da matéria e sobre ela decida (TJMG, Agravo de Instrumento n. 1.0702.13.087767-4/001, Des. Rel. Sandra Fonseca, DJ 24/04/2015).

CONFRONTO ANALÍTICO

Caso sub judice: trata-se de ação de divórcio promovida pela ora apelante perante a …ª Vara de Família da Capital, com pedido cumulado de “usucapião familiar”.

Sentença prolatada neste feito: o d. juízo entendeu que a vara especializada de família é incompetente para decidir a “usucapião familiar”, apontando como competente a vara de Registros Públicos.

Entendimento do acórdão indicado: possibilidade de arguição da denominada “usucapião familiar” como matéria de defesa nos autos da ação de divórcio e competência do juízo de família para processar e julgar essa matéria.

Trecho do voto esposado: (…) “Nessa esteira, apesar da competência das Varas de Registros Públicos e, quando inexistentes na comarca, das Varas Cíveis para processar e julgar as ações de usucapião, entendo que a utilização do instituto como matéria de defesa não pode ser tolhida sob a tese de incompetência do juízo, mormente em se tratando de usucapião familiar, matéria amplamente interligada ao Direito de Família.

Caso assim não fosse, a ré teria de ajuizar ação de usucapião perante o juízo competente, frustrando e cerceando seu direito de defesa”.

Conclusão: a inteligência do acórdão apontado é óbvia e reafirma os termos da presente apelação, no sentido de que compete ao juízo familiar apreciar o pedido de “usucapião familiar”.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. Ação de Reconhecimento e Dissolução de União Estável. RECONVENÇÃO. pedido relativo à usucapião familiar. cabimento. matéria afeta à competência do juízo de família.

1.Nos termos do art. 315 do Código de Processo Civil, a reconvenção é cabível nas hipóteses em que há conexão "com a ação principal ou com o fundamento da defesa".

2. Na hipótese vertente, a reconvenção apresentada pela ora agravante tem por objeto a usucapião familiar do imóvel de propriedade do ex-companheiro, sendo conexa com o fundamento da defesa apresentada, razão pela qual deve ser recebida e devidamente processada pelo Juízo de Família.

3. Agravo de Instrumento conhecido e provido.

(TJDF, Processo n. 0018479-84.2014.8.07.0000, Acórdão n.854303, 20140020183463AGI, Relator: NÍDIA CORRÊA LIMA 3ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 04/03/2015, Publicado no DJE: 13/03/2015. Pág.: 525).

CONFRONTO ANALÍTICO

Caso sub judice: trata-se de ação de divórcio promovida pela ora apelante perante a …ª Vara de Família da Capital, com pedido cumulado de “usucapião familiar”.

Sentença prolatada neste feito: o d. juízo entendeu que a vara especializada de família é incompetente para decidir a “usucapião familiar”, apontando como competente a vara de Registros Públicos.

Entendimento do acórdão indicado: alegada a “usucapião familiar” em sede de reconvenção na ação de reconhecimento e dissolução de união estável, a competência para julgamento é da vara de família.

Trecho do voto esposado: (…) “Na hipótese vertente, a reconvenção apresentada pela ora agravante tem por objeto a usucapião familiar do imóvel de propriedade do ex-companheiro, sendo conexa com o fundamento da defesa apresentada, razão pela qual deve ser recebida e devidamente processada pelo Juízo de Família”.

Conclusão: a inteligência do acórdão apontado é óbvia e reafirma os termos da presente apelação, no sentido de que compete ao juízo familiar apreciar o pedido de “usucapião familiar”.

“CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO DE USUCAPIÃO POR ABANDONO DO LAR CONJUGAL. COMPETÊNCIA. A ação de usucapião com base em alegação de abandono do lar conjugal envolve ex-cônjuges. Nela debate-se abandono conjugal e existência de bem comum. Em face dessas circunstâncias, entende-se que a competência para processar e julgar tal demanda é do juízo especializado de família. Essa conclusão vale especialmente para o caso concreto, já que a ação de usucapião é conexa (por identidade de objetos) à outra ação declaratória de qualidade sucessória e de exclusão de bens da herança que tramita perante o juízo de família. JULGARAM PROCEDENTE O CONFLITO.” (TJRS, Conflito de Competência Nº 70063771927, Oitava Câmara Cível, Relator: José Pedro de Oliveira Eckert, Julgado em 23/04/2015; Publicação: Diário da Justiça do dia 28/04/2015).

CONFRONTO ANALÍTICO

Caso sub judice: trata-se de ação de divórcio promovida pela ora apelante perante a …ª Vara de Família da Capital, com pedido cumulado de “usucapião familiar”.

Sentença prolatada neste feito: o d. juízo entendeu que a vara especializada de família é incompetente para decidir a “usucapião familiar”, apontando como competente a vara de Registros Públicos.

Entendimento do acórdão indicado: o TJRS, ao julgar o conflito de competência [entre o juízo da vara Cível e de Família], foi categórico ao afirmar que compete ao juízo especializado de família processar e julgar a “usucapião familiar”.

Trecho do voto esposado: (…) Em princípio, verifica-se que demandas dessa natureza envolvem cônjuges ou ex-cônjuges; tem por objeto bens comuns (na dicção da lei, “propriedade dividida com ex-cônjuge ou ex-companheiro”); e tem como ponto de partida a ocorrência ou não de abandono do lar conjugal. (…). Em se tratando de demanda que objetiva o reconhecimento do domínio sobre bem imóvel por meio de usucapião por abandono do lar – cuja causa de pedir está intimamente ligada ao comportamento da requerida quando da ruptura da convivência familiar -, e, também, levando em consideração o ajuizamento de demanda declaratória da qualidade sucessória e de exclusão de bens da herança, que tramita na Vara da Família, não há como negar a conveniência de que seu processamento e julgamento ocorram pela mesma vara, qual seja, da Família.

Conclusão: a inteligência do acórdão apontado é óbvia e reafirma os termos da presente apelação, no sentido de que compete ao juízo familiar apreciar o pedido de “usucapião familiar”.

“CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. VARA DE FAMÍLIA E VARA CÍVEL. USUCAPIÃO POR ABANDONO DO LAR. Considerando que a causa de pedir está intimamente ligada ao comportamento da parte requerida quando da ruptura da convivência familiar, não há como negar a competência da Vara de Família. JULGARAM PROCEDENTE O CONFLITO. UNÂNIME.” (TJRS, Conflito de Competência Nº 70070215918, Vigésima Câmara Cível, Relator: Glênio José Wasserstein Hekman, Julgado em 24/08/2016; Publicação: Diário da Justiça do dia 01/09/2016).

CONFRONTO ANALÍTICO

Caso sub judice: trata-se de ação de divórcio promovida pela ora apelante perante a …ª Vara de Família da Capital, com pedido cumulado de “usucapião familiar”.

Sentença prolatada neste feito: o d. juízo entendeu que a vara especializada de família é incompetente para decidir a “usucapião familiar”, apontando como competente a vara de Registros Públicos.

Entendimento do acórdão indicado: o TJRS, ao julgar o conflito de competência [entre o juízo da vara Cível e de Família], foi categórico ao afirmar que compete ao juízo especializado de família processar e julgar a “usucapião familiar”.

Trecho do voto esposado: (…) No caso, tratando-se de demanda que envolve cônjuges ou ex-cônjuges, e que tem por objeto temática que envolve a relação familiar, ao menos em princípio e, em tese, cabe projetar que a competência para processar e julgar demandas que versam sobre essa modalidade peculiar de usucapião são de competência do juízo especializado de família.

Por sua vez, a causa de pedir está intimamente ligada ao comportamento da parte requerida quando da ruptura da convivência familiar, o que autoriza a declaração de competência da Vara de Família.

Conclusão: a inteligência do acórdão apontado é óbvia e reafirma os termos da presente apelação, no sentido de que compete ao juízo familiar apreciar o pedido de “usucapião familiar”.

“CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA POR ABANDONO DE LAR. RELAÇÃO FAMILIAR PRÉ-EXISTENTE. TUTELA DO DIREITO DE PROPRIEDADE. PROTEÇÃO DO LAR. JUÍZO DE FAMÍLIA. PROCEDÊNCIA.

1. A usucapião especial urbana por abandono de lar, como todas as espécies de usucapião, visa à declaração de titularidade de um direito real, qual seja, o direito de propriedade sobre determinado imóvel. Todavia, esse direito real decorre de uma relação familiar pré-existente, de modo que a nova modalidade de usucapião visa não apenas à tutela do direito de propriedade, mas, principalmente, a proteção do lar familiar e daqueles que lá residem.

2. O art. 1.240-A, do CC, destina-se à proteção do direito real de habitação do cônjuge ou companheiro supérstite, já presente em nosso ordenamento jurídico, bem como à proteção do lar e da unidade familiar erguida pelo ex-casal durante o período da vida em comum. Daí porque o referido dispositivo elenca requisitos que se inserem no âmbito do direito familiar, o que impõe a análise, por parte do magistrado, das seguintes questões: (i) a existência de uma relação familiar (casamento ou união estável); (ii) o regime de bens que vigorava durante a existência da relação familiar; (iii) a ocorrência de separação de fato; (iv) o abandono do lar por parte de ex-cônjuge ou ex-companheiro; (iv) a co-propriedade do imóvel por ambos os ex-cônjuges ou ex-companheiros.

3. Diante de todo o exposto, entendo que o juízo competente para conhecer da ação de usucapião especial urbana por abandono de lar é o que responde pelos feitos da família, dispensando-se, em princípio, a utilização do rito especial.

4. E, tendo em vista que a Lei nº 3.716/79 (Lei de Organização Judiciária do Estado do Piauí), em seu art. 43, inc. II, determina que a 3ª Vara Cível da Comarca de Parnaíba – PI possui competência exclusiva para processar e julgar os feitos da família, resta claro que a ela deverá ser redistribuída a presente Ação de Usucapião Especial Urbana por Abandono de Lar.

5. Isto posto, julgo procedente o presente Conflito de Competência, no sentido de que a Ação de Usucapião Especial Urbana por Abandono do Lar (Proc. nº 0003328-81.2011.8.18.0031) seja processada e julgada pela 3ª Vara Cível da Comarca de Parnaíba – PI, que possui competência exclusiva para os feitos da família, nos termos do inc. II, do art. 43, da Lei nº 3.716/79.” (TJPI, Conflito de competência Nº 2012.0001.000142-0, Relator: Des. José Ribamar Oliveira, Tribunal Pleno, Data de Julgamento: 18/04/2013).

CONFRONTO ANALÍTICO

Caso sub judice: trata-se de ação de divórcio promovida pela ora apelante perante a …ª Vara de Família da Capital, com pedido cumulado de “usucapião familiar”.

Sentença prolatada neste feito: o d. juízo entendeu que a vara especializada de família é incompetente para decidir a “usucapião familiar”, apontando como competente a vara de Registros Públicos.

Entendimento do acórdão indicado: a competência para julgar a “usucapião familiar” é da vara de Família.

Trecho do voto esposado: (…) “Conforme relatado, o presente processo visa aferir a competência para o julgamento de Ação de Usucapião Especial Urbana por Abandono do Lar (Proc. n. …).

(…) para o deferimento da usucapião especial urbana por abandono familiar, se faz necessária a presença dos seguintes requisitos: (i) o imóvel deve ser urbano; (ii) não ultrapassar 250 m² (duzentos e cinquenta metro quadrados); (iii) o imóvel deve ser de propriedade dos ex-cônjuges ou ex-companheiros; (iv) o ex-cônjuge ou ex-companheiro usucapiente deve ter exercido posse direta e exclusiva sobre o imóvel por 2 (dois) anos ininterruptos e sem oposição; (v) o ex-cônjuge ou ex-companheiro usucapido deve ter abandonado o lar; (vi) o usucapiente não pode ser proprietário de outro imóvel (urbano ou rural). Ademais, essa forma de aquisição de propriedade somente pode ser reconhecida uma única vez (art. 1240-A, §1º, CC)…

Todavia, além dos requisitos gerais exigidos pelo art. 1.240, do CC, e art. 183, da CF, a usucapião especial urbana por abandono de lar exige, para sua configuração, a presença de requisitos que se relacionam intimamente com o direito de família, quais sejam: (i) o imóvel deve ser da propriedade ambos ex-cônjuges ou ex-companheiros; (ii) o ex-cônjuge ou ex-companheiro usucapido deve ter abandonado o lar.

Daí decorre que o instituto da usucapião especial urbana por abandono de lar tem incidência restrita entre os componentes da entidade familiar, sendo esse o seu âmbito exclusivo de aplicação, uma vez que o comando somente pode atingir ex-cônjuges e ex-companheiros. Já a usucapião especial urbana prevista no art. 1.240, do CC, e no art. 183, da CF, diga-se por oportuno, pode ser aplicada a todos indistintamente.

Ademais, faz-se necessário destacar que a usucapião especial urbana por abandono do lar deve recair sobre bem comum do ex-casal, ou seja, sobre um imóvel que seja da propriedade de ambos os ex-cônjuges ou ex-companheiros, e não sobre os bens particulares de apenas um deles. Dito de outra forma, na ‘usucapião familiar’, o imóvel usucapiendo deve ser da propriedade tanto do usucapiente quando do réu. Dessa forma, percebe-se que o imóvel usucapido pode ser fruto dos (i) regimes de comunhão total ou parcial, bem como (ii) regime de participação final nos aquestos, caso exista previsão de imóvel comum no pacto pré-nupcial, ou, ainda, do (iii) regime de separação legal, uma vez que Súmula n. 377, do STF, dispõe que os bens adquiridos na constância do casamento se comunicam. Já no regime de separação convencional de bens, resta afastada a possibilidade de deferimento da usucapião por abandono do lar, tendo em vista que, no referido regime, não existe comunicação de patrimônio entre o casal. Já na usucapião especial urbana prevista no art. 1.240, do CC, e no art. 183, da CF, por sua vez, o usucapiente não possui a propriedade sobre o imóvel que pretende usucapir, detendo, tão somente, a posse sobre o imóvel usucapiendo. Diante dessas constatações, não há dúvidas de que o magistrado, ao se deparar com uma ação de usucapião especial urbana por abandono do lar, deverá analisar se, entre as partes da referida ação (usucapiente e réu), existiu um vínculo matrimonial ou uma união estável. Assim, a nova modalidade de usucapião somente poderá ser aplicada se houver o reconhecimento da relação familiar, que é formal e pressuposta do casamento, mas que exige prova específica da união estável. Em ambos os casos, em virtude de o art. 1.240-A, do CC, se referir a ‘ex-casal’, faz-se necessária a prova da separação de fato. Mas, além da prova da existência da relação familiar e da separação de fato, faz-se mister, ainda, a análise do regime de bens pelo qual se sujeitava a relação familiar. (…) Do exposto, evidencia-se que a usucapião especial urbana por abandono do lar, como todas as espécies de usucapião, visa à declaração de titularidade de um direito real, qual seja, o direito de propriedade sobre determinado imóvel. Todavia, esse direito real decorre de uma relação familiar pré-existente, de modo que a nova modalidade de usucapião visa não apenas à tutela do direito de propriedade, mas principalmente, à proteção do lar familiar e daqueles que lá residem.

Em suma, o art. 1.240-A, do CC, destina-se à proteção do direito real de habitação do cônjuge ou companheiro supérstite, já presente em nosso ordenamento jurídico, bem como à proteção do lar e da unidade familiar erguida pelo ex-casal durante o período da vida em comum. Daí porque o referido dispositivo elenca requisitos que se inserem no âmbito do direito familiar…

Conclusão: a inteligência do acórdão apontado é óbvia e reafirma os termos da presente apelação, no sentido de que compete ao juízo familiar apreciar o pedido de “usucapião familiar”.

6. Percebe-se que o outdoor jurisprudencial é assentado em sólidos raciocínios de jaez legal e da dedução lógica na boa aplicação do direito, colocando de uma vez por todas uma pá de cal sobre a discussão.

7. Na oportunidade, vem bem a pêlo as palavras da magistrada carioca, Dra. Maria Aglaé Tedesco Vilardo, Juíza de Direito da 15ª Vara de Família do Estado do Rio de Janeiro, sobre a competência para processar e julgar o pedido de Usucapião Familiar, verbi gratia:

“Discute-se a competência para processamento e julgamento destes feitos, se de Vara Cível ou Vara de Família. O instituto tem fundamentação nas relações familiares. A competência de Vara da Família é prevista no Estado do Rio de Janeiro como sendo aquela que processa e julga, entre outros, os feitos relativos às ações fundadas em direitos e deveres dos cônjuges, um para o outro (art. 85, I, a, do CODJERJ) e acumulação com pedido de caráter patrimonial não altera a competência estabelecida neste artigo (§ 1º). Também correm em Vara de Família as ações decorrentes de união estável e sociedade de fato entre homem e mulher, como entidade familiar (art. 85, I, g, do CODJERJ).

Certo que o instituto do direito das coisas é próprio da competência da Vara Cível, que julga ações de usucapião, não ressalvada expressamente como competência privativa de outros juízos (exigência do art. 84 do CODJERJ). Ao inovar com este instituto conferindo uma nova forma de usucapião com fundamento no direito de família percebe-se a acumulação de pedido de caráter patrimonial decorrente de direitos e deveres dos cônjuges ou companheiros. Portanto, a usucapião fundada em relação de conjugalidade ou companheirismo deve ser julgada e processada em Vara de Família.

(…)

A especialização existe para dar maior profundidade no conhecimento de casos peculiares, e as relações entre cônjuges ou companheiros têm suas peculiaridades bem conhecidas daqueles que atuam nestas Varas. Os negócios jurídicos entre familiares possuem repercussão emocional e permitem outro tipo de atuação não comum às Varas Cíveis, inclusive com a realização de acordos que levam em consideração a abordagem psicológica e social das quais são dotadas as Varas de Família de sua equipe técnica. Além disso, certamente estarão em trâmite na Vara de Família outros feitos entre as mesmas partes que poderão de uma só abordagem ser resolvidos junto à usucapião que possivelmente será matéria alegada como defesa em futuras ações de partilha de bens.

A solução mais indicada deverá ser aquela existente nas Varas de Família. É por isso que temos a especialização da justiça. O foco do juízo de família tem algumas peculiaridades diferentes do juízo cível. A partilha do imóvel comum, a doação da parte de um dos cônjuges ou de ambos para os filhos, o uso da totalidade do imóvel por determinado período até que os filhos cresçam, enfim, diversas são as soluções que sempre se apresentaram nas Varas de Família”. (doc. n. …)

8. Ainda sobre a competência para processar e julgar o pedido de “usucapião familiar”, a TURMA TEMÁTICA DE FAMÍLIA, ÓRFÃOS E SUCESSÕES DA DEFENSORIA PÚBLICA DO DISTRITO FEDERAL, pacificaram a discussão com a edição do ENUNCIADO n. 03 – EASJUS, cuja conclusão foi pela possibilidade de se cumular o pedido de “usucapião familiar” nas ações de divórcio e dissolução de união estável, ou ainda em ação autônoma, in verbis:

Enunciado 03: O pedido declaratório de reconhecimento da propriedade decorrente da usucapião familiar pode ser formulado incidentalmente nas ações nas ações de divórcio ou reconhecimento e dissolução de união estável, ou ainda, em ação autônoma, iniciando-se a contagem do período aquisitivo somente após o início da vigência da Lei 12.424/2011.

9. Ora, é ululante raciocinar que se o pedido é realizado de forma cumulado nas ações inerentes à competência do juízo de família [divórcio e reconhecimento de união estável], sem sombras de dúvidas àquele juízo [de família] também será competente para decidir sobre a “usucapião familiar”, maxima venia.

10. Sob outra angularidade, o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, no julgamento do AGRAVO DE INSTRUMENTO n. 20805835020148260000, da relatoria do Des. Percival Nogueira, DJ 03.07.2014, entendeu que a espécie de “usucapião familiar” reclama um abrandamento das formalidades impostas em relação às outras formas de aquisição de propriedade por usucapião, sendo desnecessário no caso concreto, a exigência da planta cartográfica com coordenadas UTM, cuja diligência é custosa e de restrita acessibilidade.

11. Concluiu que essa exigência não pode obstaculizar ou dificultar o acesso da parte ao direito garantido pelo preceito legal, ou mesmo, minimamente, retardar e embaraçar a entrega do provimento jurisdicional buscado.

12. Justifica-se essa atenuação, pois na hipótese in examen, a autora do pleito já é coproprietária com título dominial, não havendo necessidade de se demonstrar a prescrição aquisitiva e juntar aquela enormidade de documentos, vez que as formalidades exigidas encontram-se elencadas no próprio art. 1.240-A do Código Civil.

13. Por tudo isso, espera seja DADO PROVIMENTO AO RECURSO, para decretar a competência do d. juízo da …ª Vara de Família de … para processar e julgar o pedido de usucapião familiar.

II- PEDIDOS

15. Ex positis, após a sempre atenciosa leitura de V.Exa. ao presente memorial, a apelante requer seja DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO para reformar a parte da v. sentença no tocante ao acolhimento da preliminar de incompetência da Vara de Família, determinando-se que o feito retorne ao juízo a quo para processar e julgar o pedido da usucapião familiar (CC, art. 2.140-A).

P. Deferimento.

(Local e data)

(Assinatura e OAB do Advogado)

  1. CC, art. 1.240-A. Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

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