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[MODELO] Apelação Criminal – Fraude Previdenciária e Condenação

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO – 3ª TURMA

APELAÇÃO CRIMINAL nº 2000.02.01.02310006-8

APELANTE: MARIA AMÉLIA BARRETO BARBOSA

CÉLIA MARIA RANGEL DA SILVA

APELADO: JUSTIÇA PÚBLICA

RELATORA: DES. FEDERAL MARIA HELENA CISNE

Egrégia Turma

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ofereceu denúncia contra ILDA PEREIRA FREITAS, MARIA AMÉLIA BARRETO BARBOSA e CÉLIA MARIA RANGEL DA SILVA como incursas nas penas do art. 171, § 3º do Código Penal (fls. 283), nos seguintes termos:

“Consta dos autos em epígrafe, que a primeira denunciada, com inegável animus delinquendi, requereu e obteve a aposentadoria nº 42/83.074.544.0, junto a Agência Méier do INSS, lesionando à autarquia federal na quantia de CR$ 52.63000,43 (cinqüenta e dois mil, seiscentos e trinta e nove cruzeiros e quarenta e três centavos), em valores históricos, referentes ao período de 31.12.87 a 30.03.0000.

Consistiu a fraude em instruir o requerimento do benefício mencionado, indicando como seu último empregador a firma VIDROSSUL IND. COM. LTDA., firma esta inexistente, como se depreende da informação contida na solicitação de pesquisa 26000/8000 de fls. 07.

Para obter o efetivo sucesso da empreitada delituosa, ILDA contou, com os préstimos criminosos da segunda e terceira denunciadas, servidoras daquele Posto do INSS, responsáveis pela concessão do benefício. Estas, em harmoniosa associação delitiva, concederam a aposentadoria, chancelando o atuar delituoso com a aposição de suas assinaturas no Comando de Concessão Eletrônica (CCE) de fls. 06, gerando assim, manifesto prejuízo em detrimento ao patrimônio do Ente Autárquico.

A materialidade do delito versado, restou estampada pelos documentos insertos no procedimento fiscalizatório ora incluso, levado a efeito pelo INSS.

Assim procedendo, as ora denunciadas, consciente e voluntariamente, em comunhão de desígnios e ações delituosas, incorreram nas penas do artigo 171, §3º do Código Penal (…)”

A sentença de fls. 371/375 CONDENOU a ré ILDA FREITAS a 1 ano e 4 meses de reclusão, e as rés MARIA AMÉLIA BARBOSA e CÉLIA MARIA DA SILVA à pena de 4 anos de reclusão e 40 dias-multa, substituída pelo pagamento de prestação pecuniária de R$ 6.240,00, com base nos seguintes fundamentos:

“(…) Mais do que isso, não tenho dúvidas em afirmar que a 1ª acusada [ILDA PEREIRA FREITAS], efetivamente, dirigiu sua vontade para obter aquele resultado, diante da afirmativa da mesma de que entregou os seus documentos e assinou a requisição para a concessão do benefício, mesmo sabendo que não possuía o tempo de serviço necessário.

Assim sendo, além de restar comprovada a materialidade, diante da documentação juntada aos autos, especialmente, da pesquisa realizada na qual se comprova a inexistência da empresa declarada como último empregador da 1ª acusada (fl. 10) e da folha de CCE (fl. 1000), que gerou o pagamento do benefício fraudulento, certo é que, diante das declarações da 1ª acusada, resta demonstrado, claramente, que a mesma agiu com vontade livre e consciente de, mediante emprego de ardil ou fraude, ainda que por terceiros, obter vantagem ilícita, em prejuízo dos cofres da Previdência Social.

No que tange à 2ª e 3ª acusadas (MARIA AMÉLIA BARRETO BARBOSA e CÉLIA MARIA RANGEL DA SILVA), observo que eram funcionárias do INSS, lotadas no Posto Méier, no setor de concessão de benefícios, à época dos fatos, e que, na qualidade de concessora e revisora, respectivamente, do benefício objeto da denúncia, assinaram o Comando de Concessão Eletrònica (CCE – fls. 000 e 115) que ensejou a inclusão do benefício em favor da 1ª acusada, na folha de pagamento, conforme, inclusive, confirmado pelos depoimentos da 3ª acusada (fls. 204/206 e 241/243).

Tenho ainda que, realmente, a simples assinatura do CCE, pelas acusadas, por si só, não seria suficiente para caracterizar que as mesmas tivessem ciência de que a concessão do documento estaria embasada por uma documentação falsa, já que estas observaram, corretamente, todo o procedimento inerente às funções que lhes cabia exercer, não havendo meios hábeis à época para que elas verificassem a falsidade do documento apresentado no qual constava anotação sobre empresa inexistente.

Entretanto, com suporte no documento de fl. 54, isto é, no termo de declaração prestada por uma funcionária do mesmo setor das acusadas, fica evidente não só a existência de fraudes naquele órgão, como também, a participação da 2ª e 3ª acusadas, que, aliás, segundo aquela, passaram a dividir o produto do crime, às escâncaras.

Desta forma, considerando-se todo o conjunto probatório, entendo restar configurada não só a materialidade do delito, mas, também, ao menos, a participação das 2ª e 3ª acusadas no empreendimento criminoso.”

Às fls. 30004/30005, atendendo ao pedido de fls. 382/383 e à manifestação do Ministério Público às fls. 386/387, o juiz a quo declarou extinta a punibilidade da ré ILDA FREITAS em razão da prescrição da pretensão punitiva com base na pena in concreto, vez que a sentença transitou em julgado para a acusação.

Às fls. 437/454, MARIA AMÉLIA e CÉLIA MARIA apelaram, pedindo sua absolvição ou o reconhecimento da nulidade da sentença – uma vez que o juiz a quo, após indeferir a providência requerida pelo Ministério Público, não lhe devolveu o prazo para alegações finais:

Às fls. 353/354, o douto procurador da República, GINO AUGUSTO DE O. LICCIONE, no prazo previsto para o Ministério Público Federal apresentar as suas Alegações Finais, requereu, apesar de ultrapassada a fase de requerimento de diligências, a quebra do sigilo fiscal e bancário das acusadas, a fim de verificar a compatibilidade entre os ganhos que oficialmente detiveram junto ao INSS e os bens atuais, bem como a pertinência da movimentação bancária.

Realmente, o Ministério Público Federal, como bem afirmou o douto procurador, não é mais um órgão acusador, enquadrando-se hoje na figura de guardião da lei.

Por fim, requereu o seguinte:

“Protesta, desde já, por nova vista dos autos, após a providência ora requerida, para os fins do artigo 500 do Código de Processo Penal.”

(…) O que nos leva a crer que, até aquela data, o douto Procurador ainda não havia formulado um juízo quanto a culpabilidade das denunciadas, tendo em vista a fragilidade das provas apresentadas.(…)

Inexistindo Alegações Finais, ato essencial, é causa de nulidade no processo, pois sem que o Ministério Pùblico pudesse embasar seu pedido, absolvição ou condenação, a defesa não teve a que se apoiar quanto a sua tese de defesa, causando sérios prejuízos, o que resultou na condenação das acusadas.”

“A douta Juíza fundamentou sua sentença apenas com base nas declarações prestadas por SUELENA às fls. 54, que foi funcionária do Setor de concessão, embora não concedesse. (…)

Pois bem, SUELENA em depoimento prestado ao Juízo da 04ª Vara Federal Criminal, perante a presença do Juiz Federal, o Doutor FLÁVIO OLIVEIRA LUCAS,DESMENTIRA O QUE VINHA AFIRMANDO EM DECLARAÇÕES ANTERIORES.

Nesta ocasião, a mesma afirmara que assinara sem ler a declaração prestada ao Grupo de Trabalho do Inspetor MÁRIO MAYRINCK e que, portanto, alguns elementos contidos em depoimento não foram ditos por ela. (…)

Existindo uma dúvida razoável quanto à autoria do fato ilícito e a existência do elemento subjetivo do tipo, o dolo, não há base para a formação de um juízo condenatório. Assim, chegamos a conclusão de que a sentença condenatória se deu apenas com base no depoimento contraditório de uma funcionária que, posteriormente, foi indiciada, tendo em vista serem suas declarações contraditórias.

É imprescindível esclarecer que AS CARTEIRAS NÃO FICAVAM NO PROCESSO e que os funcionários que as extratavam não eram tecnicamente preparados para identificar se o documento era falso ou se os dados eram inverídicos.”

Às fls. 460/464, o Ministério Público apresentou suas contra-razões.

É o relatório.

Entendo que a não devolução dos autos pelo magistrado a quo, suprimindo a oportunidade de manifestação final do Ministério Público, realmente, como querem as rés, configuraria, em princípio, causa de nulidade da sentença.

Ocorre, porém, que apenas ao próprio prejudicado – é dizer, no caso específico, o próprio Ministério Público – era dado invocar o vício em questão, para o fim de postular a decretação da nulidade da sentença objeto do recurso. No Processo Penal, “nenhuma das partes poderá argüir nulidade a que haja dado causa, ou para que tenha concorrido, ou referente a formalidade cuja observância só à parte contrária interesse”.

Da ausência de alegações finais de acusação não resultou qualquer prejuízo para a defesa, porque nada existe nos autos a autorizar a conclusão de que o Ministério Público Federal, revendo o ponto de vista que até o indigitado momento sustentara, estivesse prestes a postular a absolvição dos acusados. De mais a mais, à defesa foram asseguradas todas as oportunidades para impugnar cada um dos fatos delituosos narrados na denúncia e mesmo apontar eventuais nulidades no processo.

No sentido da inexistência de nulidade, transcrevo as seguintes ementas:

PROCESSO PENAL. PENAL. COMPETENCIA. ESTELIONATO. PREJUIZO SUPORTADO PELA CAIXA ECONOMICA FEDERAL. FALTA DE APRESENTAÇÃO DE ALEGAÇÕES FINAIS. NULIDADE. INOCORRENCIA. PENAL. DOSIMETRIA. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA. ERRO DE PROIBIÇÃO. PRISÃO SEMI-ABERTA.

2. A falta de apresentação de alegações finais por parte do Ministério Público não constitui cerceamento de defesa; e as apresentadas sucintamente não geram nulidade, por não se constituirem em peça essencial do processo.

(TRF – 1ª Região – Decisão de 15-03-10000003 – ACR 0000.118813-3/MG – Relator JUIZ TOURINHO NETO)

PENAL – ROUBO – FALTA DE ALEGAÇÕES FINAIS POR PARTE DA ACUSAÇÃO NÃO ACARRETA NULIDADE – PROVAS TESTEMUNHAIS – ADMISSIBILIDADE – RECURSO PROVIDO.

I – Se em Alegações Finais o Ministério Público manifestou-se tão somente quanto à competência, não adentrando ao mérito, não se fala em nulidade porquanto nenhum prejuízo sofreu a acusação ou a defesa.

Inteligência do artigo 563 CPP. Preliminar rejeitada.

(TRF – 3ª Região – Decisão de 28-03-10000005 – ACR 0002.300300004-0/SP – Relator JUIZ SINVAL ANTUNES)

Quanto ao mérito, creio que, de fato, a verdade real poderia haver sido melhor elucidada caso deferida a requisição de quebra do sigilo fiscal e bancário das acusadas (fls. 353/354), para o fim específico de permitir “verificar a compatibilidade entre os ganhos que oficialmente detiveram junto ao INSS e os bens atuais, bem como a pertinência da movimentação bancária”. Negado o pedido, a condenação fundamentou-se exclusivamente na frágil declaração de fls. 54, posteriormente retificada em juízo pela própria declarante (fls. 457/458).

É caso, então, de dar provimento ao recurso para absolver as recorrentes.

Existe, além disso, questão outra, até agora não suscitada nestes autos, a apontar na mesma direção: a sentença de fls. 371 menciona que “no decorrer do ano de 100084, a 1ª acusada, em harmoniosa associação delitiva com as demais, requereu e obteve, ilicitamente, benefício previdenciário”; a denúncia, apesar de não especificar a data do crime, esclarece que o benefício fraudulento foi percebido entre 31.12.87 e 30.03.0000; o documento assinado ilegalmente por MARIA AMÉLIA e por CÉLIA MARIA, por sua vez, data de 23.05.88 (fls. 6 e 115).

Como a pena imposta é de 4 anos, e a sentença já transitou em julgado para a acusação (cf. certidão de fls. 403), a prescrição pela pena in concreto se opera em 8 anos, por força do art. 10000, IV c/c art. 110, §1º, ambos do Código Penal.

Considerado o lapso de nove anos e meio entre o dia em que o crime se consumou (23.05.100088, na pior das hipóteses, fls. 6 e 115) e a data de recebimento da denúncia (06.11.100077, fls. 20000), o caso é de se reconhecer a prescrição para declarar extinta a punibilidade das acusadas.

É o parecer.

Rio de Janeiro, 21 de julho de 2000.

JOSÉ HOMERO DE ANDRADE

Procurador Regional da República

Acrim56 – isdaf

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