[MODELO] Alegações Finais – Apropriação Indébita
Apropriação Indébita – Alegações Finais – Via Judicial
Exmo. Sr. Dr. Juiz Federal da (…) Vara Criminal da Comarca de (…)
AÇÃO PENAL Nº (…).
ALEGAÇÕES FINAIS
Paulo O. C. e Maria L. F. C, já qualificados nos autos da Ação Penal acima identificada, por intermédio de seus advogados que esta subscrevem, vem apresentar suas Alegações Finais, na forma do art. 500, inciso III, do CPP, expondo o seguinte:
1) DO RESUMO
O Nobre Representante do Ministério Público, de acordo com a denúncia e as suas Alegações às fls. …. dos autos, pretende imputar aos Réus (proprietários de Parafuseta Indústria e Comércio de Peças Automotivas Ltda.) as sanções do art. 2º , II, da Lei 8.137/0000 e do art. 168-A do Código Penal Brasileiro.
Atribui-lhes, ainda, nessa peça tipificação por omissão própria, com o dolo (animus rem sibi habendi) como elemento subjetivo do tipo do crime em questão.
Diz consubstanciada a materialidade no Auto de Infração Fiscal lavrado pela autoridade previdenciária e pelas notificações de lançamento em Livro da empresa.
Afirma condenáveis os Acusados por serem eles sócios de empresa com contrato social por cota de sociedade limitada, assim cientes do ilícito, e exclui a punibilidade do Acusado …., tomando por verdadeira a configuração deste como sócio figurante de contrato e não administrativo.
2) PRELIMINARES
INÉPCIA DA INICIAL
a) SOBRE O DOLO
Para que ocorra o dolo em qualquer de suas modalidades é necessária a vontade do agente de causar o dano.
Assim também é na Lei 8.137/0000 e na 8.212/0001, não podendo serem os acusados condenados por mera culpa. Ou seja, nestas Leis é indispensável a prova da intenção de lesar o INSS.
Porém, não existiu nenhuma vontade dos acusados em lesarem o INSS e nem mesmo nos autos é demostrada tal vontade.
Sobre o dolo, ou sua ausência, em crimes contra a ordem tributária, assim têm decidido os nossos Tribunais.:
“11602514000 – PROCESSUAL PENAL – APROPRIAÇÃO INDÉBITA – CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS – OMISSÃO DE RECOLHIMENTO – LEI Nº 8.212/0001, ART. 0005, "D"- AÇÃO PENAL – DOLO – AUSÊNCIA – SENTENÇA – FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO – PREQUESTIONAMENTO – Para a caracterização do crime previsto no art. 0005, "d", da Lei nº 8.212/0001, é indispensável a verificação do dolo, elemento subjetivo consistente na vontade de fraudar a previdência, apropriando-se dos valores não recolhidos. – O Recurso Especial fundado na alínea “a” do permissivo constitucional tem como pressuposto de admissibilidade o exame de questão de direito federal, devidamente prequestionada e debatida no acórdão recorrido. – Recurso Especial parcialmente conhecido e nesta extensão desprovido.” (STJ – RESP 425318 – RS – 6ª T. – Rel. Min. Vicente Leal – DJU 10.03.2003) .
“1800007540002 – PENAL – APROPRIAÇÃO INDÉBITA – CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA – I – O réu provou que na época em que não repassou ao INSS as contribuições previdenciárias descontadas dos salários de seus empregados passava por dificuldades financeiras, impossibilitando o pagamento. II – O valor é pequeno, assim como o dos títulos que, como provou, não conseguiu honrar na época. III- Ausência de dolo. IV- Absolvição decretada, face inexigibilidade de conduta diversa, maioria de votos.” (TRF 2ª R. – ACR 2012.02.01.033036-7 – ES – 5ª T. – Rel. p/o Ac. Juiz Antonio Ivan Athié – DJU 1000.05.2003 – p. 316).
Conclui-se, portanto, que se o crime no qual pretendem incutir os acusados necessita de dolo específico para sua finalização e dos autos não se retira nada que o comprove, A INICIAL É INEPTA POR FALTA DE CARACTERIZAÇÃO DO ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO.
b) A INCONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS
As Leis 8.137/0000 e 8.212/0001, nas quais querem inserir os acusados, desrespeitam frontalmente a Constituição da República.
A Carta Magna diz em seu art. 5º, inciso LXVII, que é proibida a prisão por dívida, excetuadas as hipóteses do inadimplemento da pensão alimentícia e do depositário infiel.
Por exclusão, os acusados não se inserem nem na forma de alimentantes, muito menos na forma de depositários.
Em recente artigo, intitulado "Infração Tributária Não é Crime", publicado na revista Boletim Informativo da Saraiva, de agosto de 10000006 (fl. 05), o Doutrinador e Professor Eduardo Marcial Ferreira Jardim, entendendo ser a Lei 8.137/0000 inconstitucional, assim discorre:
"Igual raciocínio aplica-se às hipóteses em que o contribuinte deixa de pagar o tributo supostamente descontado de terceiro, a exemplo do imposto sobre a renda na fonte ou a contribuição previdenciária. Ao contrário dos dizeres literais da legislação de fonte, o que ocorre é o seguinte: ao pagar "x" de salário, o empregado deve pagar "y" de contribuição previdenciária e "z" de imposto de renda na sistemática de fonte. O chamado desconto ou retenção simplesmente inexiste. Mais: se existisse, ainda assim o contribuinte não estaria exercendo a função de depositário, até porque tal conceito vem cristalizado no Código Civil – arts. 1.265/1.267, bem como no CPC, por intermédio dos artigos 14000, 150, 275, inciso II, 824, 825 e 0001000. Não bastasse isso, cumpre lembrar que a Teoria Geral do Direito não autoriza ao legislador subverter conceitos para estipular novas competências não deferidas pelo sistema normativo.
Como se vê, o devedor de tributos, qualquer que seja a hipótese, é devedor de dívida própria, o que torna inadmissível a pretendida criminalização da infração tributária. O grau de absurdidade ganha foros de maior repúdio na medida em que a aludida legislação desrespeita frontalmente a Constituição da República…”
Cabe abrir um parêntese aqui. Os artigos do Código Civil de 100016 citados pelo Professor Eduardo no texto acima transcrito encontram atualmente correspondência com os artigos 627 a 630 do Novo Código Civil. Vale lembrar, ainda, que a matéria atinente a depositário no Novo Código Civil estão elencadas do art. 627 ao 652 e em nenhum dos mencionados artigos contempla a possibilidade do caso em tela.
O contribuinte, em qualquer destes casos, não recebe de ninguém o dinheiro a ser recolhido aos cofres da Fazenda Pública.
O devedor de tributos, qualquer que seja a hipótese, é devedor de dívida própria (ilícito civil).
Inadmissível, portanto, a pretendida criminalização dos acusados na infração tributária pelas Leis 8.137/0000 e 8.212/0001, pois elas igualam o contribuinte ao depositário ou apropriador de dinheiro da Fazenda Pública, o que não acontece no caso concreto.
E, mesmo assim, para que alguém seja considerado depositário infiel de dinheiro da Fazenda Pública, existe o rito da Lei 8.866/0004, que exige a prévia caracterização da situação de depositário infiel (art. 2º) com o ajuizamento da ação civil (art. 3ºe 4º).
c) A POSTERIORIDADE DA LEI 8.212/0001
A denúncia arrola as seguintes datas para as supostas faltas de pagamento dos tributos: ….
Não há que se admitir o uso dessa Lei, em todas as supostas infrações, pois é posterior a estas.
A Lei 8.212 é de 24 de julho de 10000001 e quase todas as supostas infrações são anteriores a esta Lei (com exceção …. e ….).
O Art. 5º, inciso XL, da Constituição Federal estabelece que as Leis não retroagem, salvo somente para beneficiar o réu.
Aqui os acusados estão sendo inseridos em crimes anteriores à Lei 8.212/0001.
Mesmo se tivessem provado a materialidade de alguma infração, nem todas elas estariam inseridas na Lei 8.212/0001, não podendo ser apreciadas para prejudicar os acusados.
Por todo o exposto em preliminares, requer-se, desde já, que seja decretada inepta a denúncia, com a extinção do feito sem julgamento do mérito.
3) NO MÉRITO
A materialidade do suposto crime não está de forma alguma comprovada nos autos.
Para que o suposto crime se concretizasse, seria necessário que tivesse ocorrido a apropriação de dinheiro pertencente à Fazenda Pública.
Verificando-se o documento, acostado aos autos, o Relatório Fiscal do Ministério do Trabalho e da Previdência Social, no qual se baseou o Ministério Público para a denúncia, tem-se estabelecido que:
"Os elementos e comprovantes que serviram de base para a constatação do fato aqui relatado são as folhas de pagamento, rescisões contratuais e recibos de pagamentos de salários."
Documentos estes que eram elaborados pelo Escritório de Contabilidade “Menos Com Menos Dá Mais S/C Ltda.”.
Esse escritório faz a contabilidade de mais de 200 (duzentas) empresas e no fim de cada mês envia as folhas de pagamentos e demais recibos salariais para estas. E neles já vem líquida a parte que deve ser paga ao empregado, ou seja, o valor bruto menos a contribuição da previdência.
Posteriormente, uma vez por mês, o escritório faz um apanhado de todas as contribuições constantes das folhas de pagamentos e recibos, enviando a guia para recolhimento, tanto da contribuição previdenciária do trabalhador quanto da patronal.
E os acusados sempre fizera o pagamento dos empregados, com muita dificuldade, pelo valor líquido, conforme atestam os documentos às fls.
Desta forma, não há qualquer retenção de dinheiro dos funcionários para recolhimento à previdência.
Ocorreu a existência da dívida por falta de recolhimento, não uma apropriação indébita, visto que, para que ocorresse a apropriação indébita seria necessário seguir-se o rito da Lei 8.866/0004, na qual é aberto prazo de 10 dias para recolhimento do tributo.
Não se recolhendo o tributo no prazo estabelecido, assim estaria caracterizada a figura do depositário infiel.
"Penal. Falta de recolhimento de contribuições previdenciárias descontadas de empregado. Natureza do delito previsto no artigo 0005, "d", da Lei 8.212.
Não é a simples existência da dívida que caracteriza a infração, dada a garantia prevista no art. 5º, LXVII, da Constituição Federal. Delito omissivo próprio que não prescinde da demonstração da fraude consistente em descontar a contribuição dos empregados e não recolher os respectivos valores ao órgão da Previdência Social. Superveniência da Lei 8.866/0004, que cria a figura do depositário da Fazenda Pública, da pessoa obrigada a recolher impostos, taxas e contribuições. Nova disciplina que exige a prévia caracterização de depositário infiel (art. 2º) e o ajuizamento da ação civil (art. 3º e 4º). Descrição insuficiente dos fatos na denúncia. Ordem deferida." (Ac. un. da 3ª T do TRF da 5ª R. HC – 406-PE – D.J.U. 05-08-0004, p. 41.676 – in. Bol. iob VERBETE 3/10052).
Muitas vezes, Excelência, a empresa teve que emprestar dinheiro de agiotas a juros exorbitantes, para fazer o "vale" dos empregados.
Chegou ao ponto de somar os valores de 02 (dois) ou 03 (três) meses para pedir que o empregado assinasse a folha de pagamento enviada pelo escritório, de mês anterior, ficando remontada, por vários meses, sem pagamento tanto a folha salarial como a guia de recolhimento previdenciário por total falta de dinheiro.
Como é que a empresa ou seus sócios poderiam apropriar-se de dinheiro do INSS dessa forma, se não estavam nem conseguindo pagar o salário líquido dos empregados?
Em nenhum momento houve a intenção de descontar a contribuição previdenciária do salário dos empregados e ficar com o dinheiro, locupletando-se às custas do INSS.
O que ocorreu, Nobre Julgador, foi a impossibilidade total de pagar o salário dos trabalhadores.
Tanto é que em …. o MM Juiz da ….ª Vara da Fazenda, Falências e concordatas da Comarca de …. decretou a falência da empresa, por total falta de liqüidez, tanto de funcionários como de fornecedores.
Esse fato é devidamente comprovado nos autos pelo depoimento da testemunha de defesa, Síndico da falência (Dr. Ariovaldo V. S.), que diz, ainda, que os acusados não se apropriaram de dinheiro do INSS, mas sim deixaram de pagar os funcionários, estando alguns deles com créditos trabalhistas a receber da falência.
Ou seja, não pagou nem os salários das folhas de pagamentos apresentadas pelo Escritório de Contabilidade.
Se os acusados não conseguiram pagar os salários de seus empregados, logicamente não houve qualquer tipo de desconto previdenciário para ocorrer a apropriação.
Verificando-se, ainda, o depoimento da testemunha de defesa Miguel J. G. (contador do acusado), que acompanhou toda a vida da empresa dos acusados, tem-se (fls. …): “… que não houve uma apropriação de dinheiro do INSS, mas sim uma impossibilidade de fazer até mesmo o pagamento dos empregados”.
Desta forma, Excelência, não houve o dolo genérico, a vontade livre e consciente dos acusados de apropriarem-se indevidamente da contribuição previdenciária descontada de recibos e folhas de pagamentos de seus empregados, como quer fazer crer a Promotoria.
É totalmente improcedente a acusação que é imputada aos acusados, pela não materialização do delito.
Ainda, é improcedente a acusação por estarem as Leis 8.137/0000 e 8.212/0001 em confronto com a Carta Magna de 100088, que proíbe a prisão por dívida.
Se existisse, o que não é o caso, seria um ilícito civil, pelo não recolhimento da contribuição previdenciária, devendo ser cobrado em ação civil própria, habilitando-se o INSS na falência da empresa dos acusados, que, acrescente-se, tem crédito privilegiado sobre os demais credores.
O PEDIDO FINAL
Pelo exposto, pede-se que sejam acatadas as preliminares argüidas, com a conseqüente extinção do feito sem julgamento do mérito.
Mas, se assim não entender Vossa Excelência, no mérito, pede-se a absolvição dos acusados da imputação que imerecidamente lhe foi feita, pois é inocente, não tendo cometido o delito que lhe é imputado.
E a absolvição dos Réus se impõe, como medida de
JUSTIÇA!!
Local, (…data…)