[MODELO] AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE SEXO JURÍDICO NO REGISTRO CIVIL – Competência do Juízo da Vara de Família e Sucessões
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DO ____ª VARA DE FAMÍLIA DA COMARCA ______________________(Conforme art. 319, I, NCPC e organização judiciária da UF)
(NOME DA AUTORA), sexo masculino, (qualificação), com endereço em…, por seus advogados in fine assinados conforme procuração anexada, com endereço profissional (completo), para fins do art. 106, I, do Novo Código de Processo Civil, vem, respeitosamente, a presença de Vossa Excelência, promover a presente:
AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE SEXO JURÍDICO NO REGISTRO CIVIL,
com fundamento no Enunciado 43 do CNJ, nas Leis Federais 6.015/73, 9.708/98, 12.100/09, artigo 4º da Lei de Introdução ao Código Civil, artigo 140 do Novo Código de Processo Civil, inciso XXXV, artigo 5º, da Constituição Federal, além das Normas da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, bem como a ampla Jurisprudência pertinente, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas.
I. OS FATOS E FUNDAMENTOS JURÍDICOS
A parte autora DEBORAH HARRY pretende a retificação de alteração do SEXO JURÍDICO MASCULINO passando a constar SEXO FEMININO em seu registro de casamento e de nascimento.
Esclarece que, por sentença proferida pelo JUÍZO DA VARA DE REGISTROS PÚBLICOS DA COMARCA DE SÃO PAULO a parte autora teve seu prenome alterado de DENNIS para DEBORAH, conforme documentação anexa.
Entretanto, como o presente feito tem objetivo de alteração de estado da pessoa natural e não somente providência retificatória, portanto a competência é do JUÍZO DA FAMÍLIA E SUCESSÕES.
É transgênero feminino, conforme documentos médicos, psicológicos, fotos, declarações que serão apresentados. Por decorrência, enfrenta constrangimentos por constar o SEXO MASCULINO em seu registro civil, mas ter prenome e aparência do GÊNERO FEMININO, que é a verdade real.
Bem por isto, enfrenta muitas dificuldades para se colocar no mercado de trabalho, educacional, social por conta da aparência e nome feminino DEBORAH, mas contar em seu registro civil o sexo jurídico MASCULINO.
Inúmeras vezes foi exposta a situações constrangedoras, como por exemplo, no emprego atual, é tratada como se do SEXO MASCULINO fosse.
Ademais, a empregadora não reconhece o GÊNERO FEMININO, mas sim o GÊNERO MASCULINO, que é o registral. Muito embora os colegas de trabalho a tratem naturalmente como MULHER.
Fará a CIRURGIA DE REDSIGNAÇÃO SEXUAL E TRANSGENITALIZAÇÃO em 2.017, conforme anexos documentos médicos. Mas ainda está impossibilitada de exercer seus direitos inerentes ao ser humano sem passar por constrangimentos, encontrando dificuldade de inserção nos seus papéis sociais.
Assim, a alteração jurídica para SEXO FEMININO em seu registro civil é medida de rigor. Trata-se de direito constitucional de personalidade, de dignidade humana.
Faz acompanhamento médico com o intuito de adequar-se à sua identificação de gênero, pois tem como diagnóstico TRANSTORNO DE IDENTIDADE SEXUAL, apresentando taxas hormonais próprias para o sexo feminino.
Segundo o Diagnóstico de Saúde Mental (DSM-IV), a transexualidade é uma doença enquadrada no TRANSTORNO DE IDENTIDADE DE GÊNERO (TIG F64.0), conforme atesta o laudo psicológico e psiquiátrico, inclusive com indicação para a cirurgia de transgenitalização.
Existem hipóteses permissivas de alteração do sexo, conforme ENUNCIADO 43 CNJ – SAÚDE. Natural que em dado momento a pessoa se canse desta situação desconfortável e tente a via judicial para solução definitiva para os problemas com relação ao sexo que fora registrada.
Trata-se de direito personalíssimo, sendo um dos principais meios de identificação da pessoa e visa à garantia da segurança jurídica, presente no artigo 5º, caput, daConstituição Federal.
Contudo, não se pode olvidar que, sendo o direito da personalidade, está diretamente ligado ao princípio da dignidade da pessoa humana. Neste sentido, o entendimento constante do Enunciado 274 da IV Jornada de Direito Civil:
“Artigo 11: Os direitos da personalidade, regulados de maneira não exaustiva pelo Código Civil, são expressões da cláusula geral de tutela da pessoa humana, contida no art. 1º, inc. III, da Constituição (princípio da dignidade da pessoa humana). Em caso de colisão entre eles, como nenhum pode sobrelevar os demais, deve-se aplicar a técnica da ponderação”.
Nesta linha, cabe uma leitura constitucional do direito registral, de modo a que a rigidez e a tecnicidade desse ramo jurídico não sejam fins em si mesmos, mas instrumentos para a efetivação dos princípios da segurança jurídica e da dignidade da pessoa humana.
Premente, então, uma análise mais sensível deste caso, observando-se que é possível que uma decisão estritamente técnica esteja em descompasso com valores constitucionalmente prestigiados, se baseada exclusivamente na letra seca da lei.
De se destacar, ainda, que a questão envolve também a proteção à entidade familiar, princípio amparado pelaConstituição Federal no artigo 203, inciso I.
No caso, inexistente qualquer restrição da parte autora, de modo que os direitos de terceiros estarão preservados, e, afastada a má-fé, que não se presume, conforme demanda o princípio da segurança jurídica, patente que a pretensão da parte autora visa à adequação da identificação merece prosperar, conforme requerido.
Como cediço, a regra é a imutabilidade do sexo, com o que se busca assegurar a perfeita identificação da pessoa, propiciando segurança e a estabilidade nas relações sociais. Até porque, o sexo da pessoa apresenta interesse público, na medida em que se constitui em um dos fundamentais direitos pertinentes à personalidade.
Ele não se põe, no entanto, fundamental apenas na esfera de interesses individuais da pessoa, mas também em esferas de interesse público, no sentido de permitir, a qualquer momento, a perfeita e induvidosa identificação do indivíduo.
Efetivamente, o nome transcende à pessoa, representando, antes de tudo, um interesse público, pelo que, somente em situações muito excepcionais, admitem-se alterações.
Daí o interesse social e público em que ele, no decorrer da existência da pessoa, não experimente significativas alterações, capazes de dificultar uma perfeita identificação ou tumultuar os registros importantes de sua vida.
É direito de qualquer cidadão e o acompanha em todos os atos da sua vida civil, não parece justo que não haja a inclusão do apelido, sobremodo quando não se vislumbra na alteração qualquer prejuízo a terceiros.
Certo que a regra é da imutabilidade, entretanto, a lei também deve servir de instrumento para manter a paz social e harmonizar a vida das pessoas, solucionando seus conflitos, razão pela qual não se justifica um rigorismo exacerbado.
Os direitos das personalidades estão consagrados no Capítulo II do Código Civil pátrio como o conjunto de direitos inerentes à pessoa humana e que estão a ela ligados de modo permanente e sem os quais ela não existiria, razão pela qual são inalienáveis, intransmissíveis, imprescritíveis e irrenunciáveis.
Assim, é o caso do direito à vida, à liberdade física e intelectual, ao corpo, a imagem e ao que o indivíduo entende por honra. A proteção destes direitos supera a tutela civilista e encontra guarida no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, alcançando a categoria de direitos fundamentais.
Dentre as hipóteses relacionadas, a pessoa busca o amparo legal para se livrar das chacotas e constrangimentos sofridos, o que a leva a utilizar e ser reconhecida por sexo diverso do constante em seu registro civil, visando consolidar a modificação adotada ao longo de anos.
Justifica-se a evidente intenção de ter a parte autora recorrido à tutela jurisdicional por não suportar mais os constrangimentos advindos de seu nome, evitar que o problema se perpetue, bem como para visar à consolidação oficial do sexo com o que vem se identificando ao longo dos anos.
A jurisprudência tem admitido a eliminação ou modificação de nomes que exponha as pessoas a ridículo. Inadmissível é que se permita justamente o contrário, ou seja, que acrescente alguém ao seu nome um nome de pouca seriedade, que o poderá sujeitar a chacotas e zombarias.
O artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil (antigo) diz que: "Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum." Portanto, não deve a imutabilidade do prenome ser compreendida em caráter absoluto, pois injusto seria se, em homenagem ao texto da lei, se forçasse uma pessoa a usar um prenome capaz de expô-lo ao sarcasmo por toda sua vida.
O que a sociedade ganha em impor à pessoa um sexo que não escolheu e não deseja mais com ele conviver? Em nome de uma suposta segurança jurídica, não podemos contribuir para a infelicidade cotidiana de alguém e que levam ao desencadeamento do repugnante fenômeno chamado "bullying" o qual deve ser prevenido.
É evidente que a alteração pretendida lhe proporcionará maior inclusão social, emocional, educacional e profissional. É a partir daí que a pessoa se relaciona consigo mesma, com outros e com o mundo, constituindo-se uma representação simbólica da pessoa humana, dando-lhe um traço distintivo e singular perante as pessoas.
Daí porque a sua imutabilidade pode ser flexível, quando o sujeito desejar e não gerar lesão à ordem pública. Vê-se que a regra da imutabilidade deve ser relativizada, como medida de justiça.
De se destacar ainda que a dignidade da pessoa humana conduz a reinterpretação do princípio da veracidade registraria. Principal problema enfrentado pelos transexuais referem-se a ausência de correlação entre a sua identidade gênero e a identidade constante em sua documentação.
Há evidente descompasso entre uma e outra. Quando se analisa a veracidade registraria à luz da dignidade da pessoa humana é o documento que deve se adaptar a pessoa e não a pessoa que deve se adaptar ao documento. Daí porque a análise visual do presente caso demonstra que deve ser deferida a alteração pretendida.
Neste sentido, a utilização do princípio da proporcionalidade também conduz a esta conclusão. O princípio da proporcionalidade conduz a que se analise se determinada intervenção estatal pode ou não interferir nos direitos fundamentais.
No caso dos autos não há proporcionalidade em se impedir a alteração do sexo da parte autora, seja por ausência de adequação, seja por ausência de necessidade, seja por ausência de proporcionalidade em sentido estrito. Assim a procedência do pedido deve ser medida de rigor.
O respeito ao princípio constitucional da segurança jurídica é o grande cerne da questão envolvendo a retificação do registro público, vez que, em tendo a pessoa irregularidades legais ou pendências perante terceiros, não poderá alterar o seu nome justamente porque deverá arcar com suas responsabilidades legais.
Depreende-se que a juntada de certidões e documentos, comprova-se que aquele que pleiteia a retificação de registro jamais se eximiu do cumprimento de suas obrigações como cidadão e não possui pendências judiciais ou comerciais.
Admitir-se que a alteração pretendida representa “mero capricho pessoal”, não tolerado pelo Direito, é retroceder no tempo e dizer-se que a expressão “direitos do homem” refere-se ao ser humano apenas no seu aspecto psicofísico, sem se levar em conta a possibilidade de se interpretar a norma de forma extensiva, facultando ao intérprete o exercício do seu poder de violência simbólica.
Não demonstrada a probabilidade de fraude, nada obsta ao deferimento de alteração de sexo no registro civil. Pretensão enquadrada no rol dos direitos de personalidade, cujo exercício é condicionado à mera manifestação de vontade cabendo ao Judiciário, analisar a ausência de prejuízo ao interesse público e aos apelidos de família para conceder.
II. DO PEDIDO E SUAS ESPECIFICAÇÕES
Requer-se a PROCEDÊNCIA da ação, com a RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL da parte autora DEBORAH HARRY para a retificação de alteração do SEXO JURÍDICO MASCULINO passando a constar SEXO FEMININO em seu registro de casamento e de nascimento.
III. REQUERIMENTOS FINAIS
Requer-se perícia multidisciplinar com psicóloga e assistente social forense para apuração da desconformidade entre sexo biológico e sexo psicológico.
IV. DO VALOR DA CAUSA
Dá-se à causa o valor de R$ 3.000,00.
Termos em que,
Pedem Deferimento.
Local, data.
Nome do Advogado
OAB
ROL DE TESTEMUNHAS
1. Maria, brasileira, Rua xxxxx, local.
1. Joãozinho, brasileiro, Rua xxxx, local.