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CAPÍTULO XIII – DA SENTENÇA E DA COISA JULGADA

Seção I – Disposições Gerais (art. 485 ao art. 488 do Novo CPC)

Art. 485. Hipóteses de Extinção do Processo Sem Resolução de Mérito

O juiz não resolverá o mérito quando:

I. Indeferir a petição inicial;
II. O processo ficar parado durante mais de 1 (um) ano por negligência das partes;
III. O autor abandonar a causa por mais de 30 (trinta) dias, não promovendo os atos e as diligências que lhe incumbirem;
IV. Verificar a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo;
V. Reconhecer a existência de perempção, de litispendência ou de coisa julgada;
VI. Verificar ausência de legitimidade ou de interesse processual;
VII. Acolher a alegação de existência de convenção de arbitragem ou quando o juízo arbitral reconhecer sua competência;
VIII. Homologar a desistência da ação;
IX. Em caso de morte da parte, se a ação for considerada intransmissível por disposição legal;
X. Nos demais casos previstos neste Código.

§ 1º Nas hipóteses descritas nos incisos II e III, a parte será intimada pessoalmente para suprir a falta no prazo de 5 (cinco) dias.

§ 2º No caso do § 1º:

Quanto ao inciso II, as partes pagarão proporcionalmente as custas;
Quanto ao inciso III, o autor será condenado ao pagamento das despesas e dos honorários de advogado.

§ 3º O juiz conhecerá de ofício a matéria constante dos incisos IV, V, VI e IX, em qualquer tempo e grau de jurisdição, enquanto não ocorrer o trânsito em julgado.

§ 4º Oferecida a contestação, o autor não poderá desistir da ação sem o consentimento do réu.

§ 5º A desistência da ação pode ser apresentada até a sentença.

§ 6º Oferecida a contestação, a extinção do processo por abandono da causa pelo autor depende de requerimento do réu.

§ 7º Interposta a apelação em qualquer dos casos tratados neste artigo, o juiz terá 5 (cinco) dias para se retratar.

Art. 486. Pronunciamento Judicial Sem Resolução de Mérito

O pronunciamento judicial que não resolve o mérito não impede que a parte proponha novamente a ação.

§ 1º No caso de extinção em razão de litispendência e nos casos dos incisos I, IV, VI e VII do art. 485, a propositura de nova ação depende da correção do vício que levou à sentença sem resolução do mérito.

§ 2º A petição inicial não será despachada sem a prova do pagamento ou do depósito das custas e dos honorários de advogado.

§ 3º Se o autor der causa, por três vezes, a sentença fundada em abandono da causa, não poderá propor nova ação contra o réu com o mesmo objeto, ficando-lhe ressalvada a possibilidade de alegar seu direito em defesa.

Art. 487. Hipóteses de Resolução de Mérito

Haverá resolução de mérito quando o juiz:

I. Acolher ou rejeitar o pedido formulado na ação ou na reconvenção;
II. Decidir, de ofício ou a requerimento, sobre a ocorrência de decadência ou prescrição;
III. Homologar:
a) O reconhecimento da procedência do pedido formulado na ação ou na reconvenção;
b) A transação;
c) A renúncia à pretensão formulada na ação ou na reconvenção.

Parágrafo único: Ressalvada a hipótese do § 1º do art. 332, a prescrição e a decadência não serão reconhecidas sem que antes seja dada às partes a oportunidade de se manifestarem.

Art. 488. Resolução de Mérito Sempre que Possível

Sempre que possível, o juiz resolverá o mérito quando a decisão for favorável à parte a quem aproveitaria eventual pronunciamento nos termos do art. 485.

Comentários dos artigos 485 a 488

O Novo Código de Processo Civil (Lei n° 13.105/2015) trouxe atualizações significativas em relação à sentença, definindo-a como o pronunciamento do juiz que põe fim à fase de conhecimento do processo ou extingue a execução, com ou sem julgamento do mérito, conforme os artigos 485 e 487. Essa definição preserva a estrutura tradicional de classificação das sentenças em terminativas, quando não há análise do mérito, e definitivas, quando ocorre o julgamento do mérito.

Uma mudança importante ocorre nos casos de extinção do processo sem análise do mérito por inércia das partes. Se o processo ficar parado por mais de um ano ou se o autor abandonar a causa por mais de trinta dias, o juiz deverá intimar pessoalmente a parte responsável para corrigir a situação em cinco dias, um aumento significativo em relação ao prazo de 48 horas previsto no CPC de 1973. Além disso, quando o abandono ocorre após a apresentação da contestação, o pedido de extinção depende de solicitação expressa do réu, conforme orientação da Súmula 240 do STJ.

Nos casos de extinção sem julgamento de mérito, é permitido propor uma nova ação, desde que o vício que causou a sentença anterior seja sanado. A propositura de uma nova demanda nesses casos requer a comprovação do pagamento ou depósito das custas processuais e dos honorários sucumbenciais relativos à ação extinta. A nova sistemática processual também deixou de considerar a possibilidade jurídica do pedido como uma condição da ação, posicionando-a como uma questão de mérito, acompanhando a evolução doutrinária no tema.

Guilherme Rizzo do Amaral comenta que essa mudança reflete uma adequação à teoria eclética de Liebman, que unificou a categoria da possibilidade jurídica com o conceito de interesse de agir. Assim, a análise do mérito pelo juiz ao verificar a viabilidade jurídica do pedido demonstra uma evolução na abordagem processual, incorporando ideias já defendidas por boa parte da doutrina contemporânea.

Outra inovação relevante no Novo CPC é a possibilidade de o juiz se retratar de uma sentença terminativa em até cinco dias após a interposição de recurso de apelação. Esse prazo, embora impróprio, oferece uma oportunidade para que o magistrado reconsidere sua decisão, sempre que julgar necessário. Contudo, essa retratação é facultativa e não está sujeita a recurso, exceto quando se trata do reconhecimento de convenção de arbitragem, que, se rejeitada, pode ser questionada via agravo de instrumento.

O Novo CPC também enfatiza a importância de priorizar o julgamento de mérito, sempre que possível, mesmo em situações que poderiam resultar em uma sentença terminativa. Se a demanda estiver madura para julgamento e uma decisão de mérito for mais benéfica à parte interessada, o juiz deve prosseguir com a análise. Contudo, essa regra não se aplica a casos de nulidade absoluta, como litispendência, coisa julgada ou ausência de condições de ação, onde o princípio da análise de mérito precisa ser afastado para preservar a ordem pública.

Em relação à prescrição e à decadência, o Novo CPC reforça a necessidade de ouvir as partes antes de tomar uma decisão, respeitando o princípio do contraditório e evitando surpresas processuais. A prescrição pode ser reconhecida de ofício pelo juiz, mas a decadência dependerá do tipo — se legal, poderá ser reconhecida de ofício; se convencional, dependerá de manifestação da parte interessada, conforme estipulado no art. 211 do Código Civil.

Essas mudanças no tratamento das sentenças e do julgamento de mérito pelo Novo CPC refletem uma busca por maior segurança jurídica e transparência no processo, enfatizando a participação ativa das partes e a necessidade de decisões mais fundamentadas. A evolução trazida pelo novo código visa fortalecer a cooperação processual e a eficiência na prestação jurisdicional, alinhando-se às demandas contemporâneas por um sistema mais justo e célere.

Seção II – Dos Elementos e dos Efeitos da Sentença

Art. 489. Elementos Essenciais da Sentença

São considerados elementos essenciais da sentença:

I. Relatório: Deve conter os nomes das partes, a identificação do caso, um resumo do pedido e da contestação, além do registro das principais ocorrências durante o andamento do processo.
II. Fundamentos: Nele, o juiz analisará as questões de fato e de direito envolvidas no processo.
III. Dispositivo: Parte onde o juiz decide as questões principais que as partes submeteram à sua apreciação.

§ 1º Uma decisão judicial, seja interlocutória, sentença ou acórdão, não é considerada fundamentada quando:

I. Se limita a citar ou parafrasear um ato normativo sem explicar sua relação com o caso.
II. Utiliza conceitos jurídicos indeterminados sem justificar sua aplicação ao caso concreto.
III. Invoca motivos que poderiam justificar qualquer outra decisão.
IV. Não aborda todos os argumentos relevantes apresentados no processo que poderiam contrariar a conclusão adotada pelo juiz.
V. Faz referência a precedentes ou súmulas sem identificar os fundamentos que os sustentam e sem demonstrar que o caso julgado se ajusta a esses fundamentos.
VI. Deixa de seguir uma súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem justificar a distinção ou superação do entendimento.

§ 2º Em caso de conflito entre normas, o juiz deve justificar os critérios utilizados para ponderar e explicar as razões que levaram a afastar uma norma em favor de outra.

§ 3º A interpretação da decisão judicial deve considerar todos os seus elementos e estar em conformidade com o princípio da boa-fé.

Art. 490. Resolução de Mérito

O juiz resolverá o mérito acolhendo ou rejeitando, total ou parcialmente, os pedidos formulados pelas partes.

Art. 491. Obrigação de Pagar Quantia

Nas ações que envolvem a obrigação de pagar uma quantia, mesmo que o pedido seja genérico, a decisão deve definir a extensão da obrigação, o índice de correção monetária, a taxa de juros, o termo inicial e a periodicidade de capitalização, salvo quando:

I. Não for possível determinar de forma definitiva o valor devido.
II. A apuração do valor depender de prova complexa ou excessivamente dispendiosa.

§ 1º Nos casos mencionados, o valor será apurado por meio de liquidação.

§ 2º O disposto também se aplica quando um acórdão alterar a sentença original.

Art. 492. Limites da Decisão Judicial

O juiz não pode proferir uma decisão que seja diferente da solicitada, nem condenar a parte em uma quantidade maior ou em objeto diverso do que foi pedido.

Parágrafo único: A decisão deve ser clara e específica, mesmo que se trate de uma relação jurídica condicional.

Art. 493. Consideração de Fatos Supervenientes

Se, após a propositura da ação, algum fato novo influenciar no julgamento do mérito, o juiz deverá considerá-lo, de ofício ou a pedido das partes, ao proferir sua decisão.

Parágrafo único: Caso o juiz constate um fato novo de ofício, ele deve ouvir as partes antes de tomar uma decisão final.

Art. 494. Alteração da Sentença

Após a publicação da sentença, o juiz só poderá alterá-la:

I. Para corrigir inexatidões materiais ou erros de cálculo, de ofício ou a pedido da parte.
II. Por meio de embargos de declaração.

Art. 495. Hipoteca Judiciária

A decisão que condenar o réu ao pagamento de uma prestação em dinheiro ou converter uma obrigação de fazer, não fazer ou dar coisa em prestação pecuniária valerá como título para constituição de hipoteca judiciária.

§ 1º A hipoteca judiciária será constituída:

I. Mesmo que a condenação seja genérica.
II. Ainda que o credor possa promover o cumprimento provisório da sentença ou exista arresto sobre bens do devedor.
III. Mesmo que impugnada por recurso com efeito suspensivo.

§ 2º A hipoteca pode ser registrada mediante apresentação da sentença no cartório de registro imobiliário, sem necessidade de ordem judicial ou declaração expressa do juiz.

§ 3º No prazo de 15 dias após a constituição da hipoteca, a parte deve informar o juízo, que então notificará a outra parte sobre o ato.

§ 4º A hipoteca judiciária confere ao credor o direito de preferência sobre os demais credores, conforme a prioridade do registro.

§ 5º Caso a decisão que deu origem à hipoteca seja reformada ou invalidada, a parte que constituiu a hipoteca deverá indenizar os danos sofridos pela outra parte, independentemente de culpa, com liquidação e execução do valor nos próprios autos.

Comentários dos artigos 489 a 495

O legislador, ao valorizar a importância da fundamentação nas decisões judiciais, estabeleceu critérios claros para a motivação das sentenças. Esses parâmetros têm como objetivo assegurar a efetividade de um direito garantido constitucionalmente (art. 93 da Constituição Federal), fundamental para o funcionamento de um Estado de Direito. A fundamentação não apenas oferece transparência ao raciocínio do juiz, mas também permite que as partes possam exercer plenamente seu direito de recorrer, facilitando a análise crítica das decisões pelos tribunais superiores.

Uma decisão judicial sem fundamentação adequada viola o princípio do contraditório e impede um controle efetivo sobre a legalidade e razoabilidade da decisão. Por essa razão, o uso de justificativas vagas, genéricas ou que não estejam relacionadas diretamente ao caso concreto é considerado inaceitável.

Quando uma sentença apresenta falhas em sua fundamentação, fora das hipóteses específicas de cabimento de embargos de declaração, a parte prejudicada deve buscar sua correção através de um recurso de apelação. Esse recurso pode levar à anulação da decisão ou, em alguns casos, ao julgamento direto da matéria pelo tribunal superior, aplicando-se a teoria da causa madura.

O princípio da congruência ou adstrição exige que a sentença esteja limitada aos pedidos feitos pelas partes, evitando erros como decisões citra petita, ultra petita e extra petita. Uma sentença citra petita ocorre quando o juiz deixa de decidir sobre todos os pedidos formulados, caracterizando omissão. Nesse caso, a parte pode interpor embargos de declaração para suprir a falta ou recorrer à apelação, solicitando que o tribunal analise a questão não abordada.

Se a omissão for confirmada e o tribunal julgar que o caso está pronto para decisão, ele poderá resolver a questão diretamente. Alternativamente, poderá devolver o processo ao juiz de origem para que complete a sentença. Em situações de julgamento ultra petita, onde o juiz concede algo além do pedido, o tribunal pode simplesmente ajustar a sentença, excluindo o excesso sem necessidade de retorno à instância inferior. Por outro lado, no caso de uma sentença extra petita, que decide além do que foi requerido, é recomendável que o processo retorne ao juiz de primeiro grau para que seja proferida uma nova decisão, respeitando os limites dos pedidos das partes.

Quando uma sentença citra petita transita em julgado sem que a omissão tenha sido corrigida, não é possível utilizar uma ação rescisória para revisar a decisão. A única solução é ingressar com uma nova ação que trate do pedido não decidido inicialmente.

A sentença também deve abordar detalhadamente os elementos da obrigação imposta, como índices de correção monetária, taxa de juros e termos de capitalização, ainda que tais pontos não tenham sido explicitamente mencionados na petição inicial. Isso garante que todos os aspectos da decisão sejam claramente definidos para as partes envolvidas.

Além disso, ao proferir a sentença, o juiz deve considerar qualquer fato novo que possa influenciar o julgamento do mérito, mesmo que surja após a propositura da ação. É crucial, no entanto, que as partes sejam ouvidas sobre esses novos fatos antes que a decisão seja tomada, respeitando os princípios do contraditório e da não surpresa. A falta dessa oportunidade de manifestação pode resultar na anulação da sentença, caso a parte prejudicada aponte essa falha em sede de recurso.

O cuidado na fundamentação e a observância dos direitos processuais das partes são essenciais para que as decisões judiciais sejam não apenas corretas, mas também legitimadas pelo devido processo legal e pelo respeito ao diálogo processual.

Seção III – Da Remessa Necessária

Art. 496. Duplo Grau de Jurisdição e Remessa Necessária

As sentenças estão sujeitas ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeitos antes de serem confirmadas pelo tribunal, nos seguintes casos:

I. Sentença proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público.
II. Sentença que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal.

§ 1º Nos casos mencionados, se não for interposta apelação dentro do prazo legal, o juiz deverá remeter os autos ao tribunal. Caso o juiz não faça essa remessa, o presidente do tribunal poderá requisitar os autos.

§ 2º Em qualquer situação mencionada no § 1º, o tribunal procederá ao julgamento da remessa necessária.

§ 3º O disposto neste artigo não se aplica quando a condenação ou o benefício econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a:

I. 1.000 (mil) salários-mínimos, no caso da União e suas autarquias e fundações de direito público.
II. 500 (quinhentos) salários-mínimos, para os Estados, o Distrito Federal, suas autarquias e fundações de direito público, e para os Municípios que são capitais dos Estados.
III. 100 (cem) salários-mínimos, para todos os demais Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público.

§ 4º Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundamentada em:

I. Súmula de tribunal superior.
II. Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos.
III. Entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência.
IV. Orientação vinculante estabelecida no âmbito administrativo do próprio ente público, consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa.

Comentários do artigo 496

A remessa necessária é tradicionalmente vista pela doutrina processual como uma condição para que a sentença tenha plena eficácia, significando que, nos casos onde ela é obrigatória e não realizada, a decisão não se tornará definitiva, impedindo a formação da coisa julgada. O Supremo Tribunal Federal (STF) abordou essa questão na Súmula nº 423, estabelecendo que “não transita em julgado a sentença por haver omitido o recurso ex officio, que se considera interposto ex lege.”

Contudo, há uma falha nessa interpretação, pois o reexame necessário não deve ser tratado como um recurso, ainda que compartilhe algumas semelhanças com ele, como a impossibilidade de agravar a condenação contra a Fazenda Pública (conforme a Súmula 45 do STJ) e a devolução de todos os aspectos da condenação ao tribunal, inclusive os honorários advocatícios (Súmula 325 do STJ).

Apesar de ser obrigatória a remessa necessária, isso não impede que o Ente Público faça uso dos recursos tradicionais. Conforme observa José Miguel Garcia Medina, a jurisprudência consolidou o entendimento de que, mesmo que a remessa necessária não tenha sido realizada, não há nulidade se a apelação interposta pelo Ente Público tiver sido julgada e submetida a uma análise completa da decisão (Novo Código de Processo Civil Comentado, São Paulo: RT, 2015, p. 756).

A manutenção do sistema de remessa necessária para a Fazenda Pública gerou debates acalorados durante a elaboração do novo Código de Processo Civil, com muitos doutrinadores questionando sua relevância. Contudo, prevaleceu a decisão de mantê-lo, ajustando seu modelo para incluir limites monetários específicos, conforme estabelecido nos incisos do art. 496.

Assim, nos casos em que a União, autarquias federais ou fundações federais forem condenadas, a remessa necessária é dispensada se o valor da sentença for inferior a 1.000 salários-mínimos. Para os Estados, suas capitais, o Distrito Federal e suas respectivas autarquias ou fundações, o limite é de até 500 salários-mínimos. No caso dos demais municípios, suas autarquias e fundações, a dispensa é aplicável para condenações de até 100 salários-mínimos.

É importante destacar que esses limites se aplicam apenas às sentenças líquidas, ou seja, quando o valor da condenação é claramente definido. Quando a sentença é ilíquida, a remessa necessária ainda se faz obrigatória, conforme orienta a Súmula nº 490 do STJ, que dispõe que “a dispensa do reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a 60 salários-mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas.”

Nesse sentido, o valor da causa por si só não é suficiente para afastar a obrigatoriedade do reexame se a sentença não for líquida, como ressalta Guilherme Rizzo Amaral, ao afirmar que “afastou-se, assim, o entendimento de que, na hipótese de sentença ilíquida, dever-se-ia tomar o valor dado à causa devidamente atualizado” (Comentários às Alterações do Novo CPC. São Paulo: RT, 2015, p. 604).

Além disso, a remessa obrigatória também não se aplica quando a sentença se baseia em (a) súmula de tribunal superior, (b) decisão do STF ou STJ em julgamento de recursos repetitivos, (c) entendimento consolidado em incidentes de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência, ou (d) entendimento alinhado a orientações vinculantes já estabelecidas pelo próprio ente público em pareceres, manifestações ou súmulas administrativas.

Essa estrutura busca tornar o processo mais ágil e eficiente, evitando o reexame desnecessário de decisões que já estão claramente fundamentadas em entendimentos consolidados pelos tribunais ou pelas próprias normas internas do ente público envolvido.

Seção IV – Do Julgamento das Ações Relativas às Prestações de Fazer, de Não Fazer e de Entregar Coisa

Art. 497. Ação para Prestação de Fazer ou Não Fazer

Nas ações que tenham por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, ao julgar procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará medidas que assegurem um resultado prático equivalente ao da tutela específica.

Parágrafo único: Para a concessão da tutela específica destinada a impedir a prática, a repetição ou a continuidade de um ato ilícito, ou para removê-lo, é irrelevante comprovar a ocorrência de dano ou a existência de culpa ou dolo.


Art. 498. Ação para Entrega de Coisa

Em ações que tenham por objeto a entrega de uma coisa, ao conceder a tutela específica, o juiz fixará o prazo para o cumprimento da obrigação.

Parágrafo único: Quando a entrega envolver coisa determinada pelo gênero e pela quantidade, o autor deve especificá-la na petição inicial, caso tenha essa prerrogativa. Se a escolha couber ao réu, ele deverá entregar a coisa individualizada no prazo fixado pelo juiz.


Art. 499. Conversão em Perdas e Danos

A obrigação será convertida em perdas e danos somente se o autor assim requerer ou se a tutela específica ou o resultado prático equivalente se tornarem impossíveis.


Art. 500. Multa para Compelir Cumprimento da Obrigação

A indenização por perdas e danos ocorrerá sem prejuízo da aplicação de multa periódica destinada a compelir o réu a cumprir especificamente a obrigação.


Art. 501. Ação para Emissão de Declaração de Vontade

Na ação que tenha como objeto a emissão de uma declaração de vontade, a sentença que julgar procedente o pedido, após o trânsito em julgado, produzirá todos os efeitos da declaração não emitida.

Comentário dos artigos 497 a 501

Em demandas relacionadas a obrigações de fazer ou não fazer, a preocupação do legislador recaiu sobre a garantia da eficácia do direito material discutido no processo. Dessa forma, o juiz, ao proferir a sentença, deve conceder a tutela específica ou, quando não possível, determinar medidas que assegurem um resultado prático equivalente.

José Miguel Garcia Medina esclarece que “tutela específica” é a execução da obrigação com o objetivo de obter do réu a conduta exata que lhe foi imposta, seja por lei ou contrato. Já o “resultado prático equivalente” ocorre quando o mesmo resultado é alcançado, porém por intermédio de terceiros (Novo Código de Processo Civil Comentado, São Paulo: RT, 2015, p. 759). Essa regra não se aplica apenas à sentença, mas também a outras decisões durante o processo que envolvam esse tipo de obrigação.

Em complemento, a legislação brasileira permite a utilização da tutela inibitória, cuja finalidade é impedir a prática ou a repetição de um ato ilícito. O foco aqui é a prevenção, sendo desnecessária a comprovação do dano, bastando a demonstração da ilicitude da conduta. Não é relevante, ainda, comprovar dolo ou culpa por parte do réu para a concessão dessa tutela.

Nos casos em que a obrigação envolve a emissão de uma declaração de vontade, a sentença que acolhe o pedido substitui a manifestação do réu, produzindo os mesmos efeitos da declaração que deveria ter sido emitida. Medina reforça que, apesar de infungível por sua natureza, a lei admite que outra declaração, desta vez judicial, substitua a do devedor, gerando o efeito jurídico equivalente (Novo Código de Processo Civil Comentado, São Paulo: RT, 2015, p. 764). Um exemplo clássico dessa situação é a ação de adjudicação compulsória, onde o juiz, ao julgar procedente o pedido, determina o registro da transferência de propriedade, mesmo sem a declaração do promitente vendedor.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou, inclusive, a jurisprudência por meio da Súmula 239, que dispõe que a adjudicação compulsória não depende do registro do contrato de promessa de compra e venda no cartório de imóveis.

Para as demandas que têm como objeto a entrega de coisa, a tutela específica deve fixar prazo para o cumprimento da obrigação, sendo possível sua aplicação tanto em direitos pessoais quanto reais, dependendo da natureza da relação obrigacional envolvida. Caso a tutela específica ou o resultado prático equivalente sejam impossíveis, o credor poderá optar pela conversão da obrigação em perdas e danos, sem que isso prejudique a eventual aplicação de multas destinadas a forçar o cumprimento da obrigação.

Seção V – Da Coisa Julgada

Art. 502. Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito que não está mais sujeita a recurso.

Art. 503. A decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei dentro dos limites da questão principal expressamente decidida.

§ 1º O disposto no caput aplica-se à resolução de questão prejudicial, decidida de forma expressa e incidental no processo, desde que:

  • I: Dessa resolução dependa o julgamento do mérito;
  • II: Tenha havido contraditório prévio e efetivo, exceto em caso de revelia;
  • III: O juízo tenha competência em razão da matéria e da pessoa para resolvê-la como questão principal.

§ 2º A hipótese do § 1º não se aplica se houver, no processo, restrições probatórias ou limitações à cognição que impeçam o aprofundamento da análise da questão prejudicial.

Art. 504. Não fazem coisa julgada:

  • I: Os motivos, ainda que relevantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença;
  • II: A verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença.

Art. 505. Nenhum juiz poderá decidir novamente sobre questões já decididas relativas à mesma lide, exceto:

  • I: Se, em caso de relação jurídica de trato continuado, houver modificação no estado de fato ou de direito, permitindo que a parte solicite a revisão do que foi decidido na sentença;
  • II: Nos demais casos previstos em lei.

Art. 506. A sentença faz coisa julgada apenas entre as partes envolvidas, sem prejudicar terceiros.

Art. 507. É vedado à parte discutir no curso do processo questões já decididas, quando ocorreu preclusão sobre elas.

Art. 508. Transitada em julgado a decisão de mérito, consideram-se deduzidas e repelidas todas as alegações e defesas que a parte poderia ter oposto tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido.

Comentários dos artigos 502 a 508

A coisa julgada desempenha um papel essencial como manifestação do princípio da segurança jurídica, um dos pilares fundamentais do Estado de Direito, tendo, inclusive, sido elevada à categoria de garantia constitucional (art. 5º, XXXVI da CF). Sua principal função é assegurar a imutabilidade e indiscutibilidade de decisões de mérito.

O novo Código de Processo Civil (CPC) adota uma definição mais precisa da coisa julgada material, reconhecendo-a como a autoridade que torna imutável a decisão de mérito, após esgotadas as possibilidades de recurso. Essa abordagem é uma evolução em relação ao CPC de 1973, que mencionava a coisa julgada em termos de eficácia da sentença.

A nova definição acolhe o entendimento de Enrico Tulio Liebman, que distinguiu entre eficácia e autoridade da sentença. Além disso, o atual texto normativo refere-se à “decisão de mérito”, o que é relevante, pois decisões interlocutórias, como a decisão parcial de mérito (art. 356), também podem adquirir a força de coisa julgada. Guilherme Rizzo do Amaral ilustra essa possibilidade mencionando decisões sobre liquidação de sentença, incidentes de demandas repetitivas, ou pedidos de exibição de documentos (Comentários às Alterações do Novo CPC. São Paulo: RT, 2015, p. 607).

A coisa julgada também pode se estender a questões prejudiciais decididas expressamente, desde que atendidos certos requisitos, como o contraditório, conforme estabelece o art. 9º, que veda decisões contrárias a uma das partes sem que ela tenha sido previamente ouvida, salvo nas hipóteses de revelia. Para que a decisão sobre a questão prejudicial tenha força de coisa julgada, é necessário que: (a) a resolução dessa questão seja essencial ao julgamento do mérito; e (b) o juiz tenha competência em razão da matéria e da pessoa. Contudo, a coisa julgada não se aplica se houver limitações probatórias ou restrições à cognição do juízo que impeçam uma análise aprofundada da questão.

A mera manifestação sobre uma questão prejudicial não é suficiente para gerar coisa julgada. É imprescindível que haja julgamento dessa questão. Embora o novo CPC não seja claro sobre a continuidade da ação declaratória incidental, o reconhecimento da autoridade da coisa julgada sobre questões incidentais sugere que essa ação ainda pode ser utilizada. O Fórum Permanente de Processualistas Civis emitiu o Enunciado 111, que confirma o interesse na ação declaratória incidental para questões prejudiciais.

Nas relações de trato sucessivo, a coisa julgada incorpora implicitamente a cláusula rebus sic stantibus, permitindo que modificações no estado de fato sobre o qual se baseou a sentença possam alterar o conteúdo do julgado, como ocorre em condenações de prestação de alimentos, onde o valor ou até mesmo a obrigação pode ser revisada diante de mudanças no binômio necessidade-possibilidade.

A definição dos limites da coisa julgada é crucial, envolvendo aspectos territoriais, subjetivos e objetivos. Em termos territoriais, a coisa julgada pode ser nacional, estrangeira ou internacional. A coisa julgada nacional é válida em todo o território brasileiro, conforme o art. 16, que estabelece a jurisdição civil em âmbito nacional. No caso de sentenças estrangeiras, a coisa julgada só terá eficácia no Brasil após homologação pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Já a coisa julgada internacional decorre de decisões de cortes internacionais e sua aplicação no Brasil depende de tratados ou convenções internacionais, não sendo necessária homologação pelo STJ.

No que tange aos limites subjetivos, a coisa julgada vincula apenas as partes envolvidas no processo, sem prejudicar terceiros. Contudo, seus efeitos podem, em alguns casos, atingir terceiros de forma reflexa. A eficácia subjetiva se manifesta no plano jurídico, garantindo a definitividade da decisão, embora o beneficiário possa renunciar ao direito que lhe foi reconhecido.

Os limites objetivos da coisa julgada são, via de regra, determinados pelo dispositivo da sentença, não se estendendo aos motivos ou à verdade dos fatos que fundamentaram a decisão. A coisa julgada material, segundo Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, gera três principais efeitos: a eficácia negativa, positiva e preclusiva (Curso de Processo Civil, vol. 2, São Paulo: RT, 2015, p. 634-635). A eficácia negativa impede nova demanda sobre o mesmo objeto, podendo ser alegada como exceção de coisa julgada.

A eficácia positiva permite que a decisão transitada em julgado seja utilizada como base para novas demandas. Já a eficácia preclusiva impede que, após o trânsito em julgado, sejam levantadas alegações que poderiam ter sido feitas durante o processo, conforme previsto no art. 508 do CPC. Contudo, essa eficácia preclusiva se limita às questões internas da causa, envolvendo as mesmas partes, pedido e causa de pedir, conforme destacam Marinoni, Arenhart e Mitidiero (Curso de Processo Civil, vol. 2, São Paulo: RT, 2015, p. 634-635).

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