Art. 1.009 ao art. 1.014 do Novo CPC
Art. 1.009: Da sentença cabe apelação.
- § 1º: Questões resolvidas durante a fase de conhecimento, cuja decisão não permita agravo de instrumento, não ficam cobertas pela preclusão. Devem ser suscitadas em preliminar de apelação, caso seja interposta contra a decisão final, ou nas contrarrazões.
- § 2º: Se essas questões forem levantadas nas contrarrazões, o recorrente será intimado para se manifestar sobre elas em até 15 (quinze) dias.
- § 3º: A aplicação do disposto no caput deste artigo permanece válida mesmo quando as questões do art. 1.015 compõem um capítulo da sentença.
Art. 1.010: A apelação, interposta por petição direcionada ao juízo de primeiro grau, deverá conter:
- Nomes e qualificação das partes;
- Exposição dos fatos e fundamentos jurídicos;
- Razões para o pedido de reforma ou de nulidade;
- Pedido de nova decisão.
- § 1º: O apelado será intimado para apresentar contrarrazões em até 15 (quinze) dias.
- § 2º: Caso o apelado apresente apelação adesiva, o juiz intimará o apelante para responder nas contrarrazões.
- § 3º: Após essas etapas, previstas nos §§ 1º e 2º, o juiz remeterá os autos ao tribunal, sem necessidade de juízo de admissibilidade.
Art. 1.011: Ao receber o recurso de apelação, o tribunal o distribuirá imediatamente ao relator, que terá as seguintes opções:
- Decidir monocraticamente, apenas nas hipóteses dos incisos III a V do art. 932;
- Elaborar seu voto para que o recurso seja julgado pelo órgão colegiado, caso a decisão monocrática não seja aplicável.
Comentários dos artigos 1009 a 1011
A apelação configura-se como o recurso próprio para questionar uma sentença, seja esta uma análise de mérito ou não, em qualquer procedimento ou tipo de processo. Para que uma decisão judicial permita a interposição desse recurso, deve estar de acordo com o conceito atualizado de sentença, conforme disposto no §1º do art. 203 do novo CPC. Esse artigo pôs fim a uma antiga controvérsia criada pela Lei nº 11.232/2005 ao definir a sentença como o pronunciamento judicial que encerra, com ou sem julgamento de mérito, tanto a fase cognitiva do procedimento comum quanto a execução. Dessa forma, decisões proferidas no curso do processo que abordem o mérito, ainda que impliquem a extinção parcial da ação ou de um dos pedidos do autor, são consideradas decisões interlocutórias, pois não determinam o encerramento total da demanda. Assim, elas cabem no recurso de agravo de instrumento, e não em apelação.
No novo CPC, a apelação passa a ser cabível não só para atacar a sentença, mas também para questionar decisões interlocutórias que não comportem agravo de instrumento, conforme o §1º do art. 1.009. Esse dispositivo limita as possibilidades de recorrer de interlocutórias de forma autônoma, ao contrário do CPC de 1973, que admitia agravo de instrumento em casos onde houvesse risco de lesão grave e de difícil reparação. Dessa forma, a apelação assume o papel de recurso apropriado para contestar essas decisões interlocutórias, sendo que os casos de cabimento de agravo de instrumento estão listados de forma exaustiva no art. 1.015.
Com a eliminação do agravo retido, o novo CPC estabelece a regra de que as decisões interlocutórias que não sejam passíveis de agravo de instrumento não estão sujeitas à preclusão, permitindo que essas questões possam ser levantadas em preliminar nas razões ou contrarrazões da apelação. Esse ajuste racionaliza o procedimento de contestação, restringindo a impugnação de decisões em primeiro grau à apelação. Em consequência, reduz-se o cabimento do agravo de instrumento, exclui-se o agravo retido e altera-se o regime de preclusões, de modo que as decisões interlocutórias não passíveis de agravo de instrumento podem ser reavaliadas apenas na apelação, ampliando assim o efeito devolutivo desse recurso.
Por fim, o §3º do art. 1.009 reforça o princípio da unirrecorribilidade, que estabelece que, contra a sentença, há apenas um recurso adequado: a apelação. Assim, todas as questões decididas na sentença podem ser impugnadas exclusivamente por apelação, tornando incabível o agravo de instrumento para atacar qualquer capítulo específico da sentença.
No que se refere à formalidade do recurso, a apelação deve ser interposta através de petição dirigida ao juízo de primeiro grau, incluindo os dados das partes, a exposição dos fatos e fundamentos jurídicos, as razões para o pedido de reforma ou anulação e o pedido de nova decisão. A ausência dessas razões pode ser considerada como inépcia recursal e resultar no não conhecimento da apelação, conforme o princípio da dialeticidade recursal e o art. 932, III. Este dispositivo atribui ao relator a função de não conhecer um recurso que não conteste especificamente os fundamentos da decisão questionada, assegurando que o recurso esteja devidamente fundamentado.
Uma vez interposto o recurso de apelação, o apelado é intimado para apresentar contrarrazões dentro do prazo de 15 dias. Caso haja interposição de apelação adesiva, o apelante será também intimado a contrarrazoar. Após a apresentação das contrarrazões, os autos são encaminhados ao tribunal, sem necessidade de juízo de admissibilidade pelo juiz de primeiro grau. Esse procedimento representa uma inovação do novo CPC, que delega exclusivamente ao tribunal a análise de admissibilidade da apelação, eliminando uma fase de recorribilidade desnecessária e buscando maior celeridade processual. Assim, a análise sobre a admissibilidade da apelação e a declaração dos efeitos em que é recebida cabe agora exclusivamente ao tribunal, otimizando o trâmite.
Ao ser recebida pelo tribunal, a apelação pode ser julgada monocraticamente pelo relator nas situações previstas nos incisos III a V do art. 932. Essas hipóteses incluem a inadmissibilidade do recurso, decisões prejudicadas ou que não abordem os fundamentos da decisão recorrida. Além disso, o relator pode dar provimento monocrático à apelação se a decisão recorrida contrariar súmula ou entendimento consolidado em julgamento de recursos repetitivos. Caso a situação não permita decisão monocrática, a apelação é levada para julgamento pelo órgão colegiado, assegurando-se a observância do contraditório.
Art. 1.012. A apelação terá efeito suspensivo.
§ 1o Além de outras hipóteses previstas em lei, começa a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que:
- I – homologa divisão ou demarcação de terras;
- II – condena a pagar alimentos;
- III – extingue sem resolução do mérito ou julga improcedentes os embargos do executado;
- IV – julga procedente o pedido de instituição de arbitragem;
- V – confirma, concede ou revoga tutela provisória;
- VI – decreta a interdição.
§ 2o Nos casos do § 1o, o apelado poderá promover o pedido de cumprimento provisório depois de publicada a sentença.
§ 3o O pedido de concessão de efeito suspensivo nas hipóteses do § 1o poderá ser formulado por requerimento dirigido ao:
- I – tribunal, no período compreendido entre a interposição da apelação e sua distribuição, ficando o relator designado para seu exame prevento para julgá-la;
- II – relator, se já distribuída a apelação.
§ 4o Nas hipóteses do § 1o a eficácia da sentença poderá ser suspensa pelo relator se o apelante demonstrar a probabilidade de provimento do recurso ou se, sendo relevante a fundamentação, houver risco de dano grave ou de difícil reparação.
Art. 1.013. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.
§ 1o Serão, porém, objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desde que relativas ao capítulo impugnado.
§ 2o Quando o pedido ou a defesa tiver mais de um fundamento e o juiz acolher apenas um deles, a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento dos demais.
§ 3o Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando:
- I – reformar sentença fundada no art. 485;
- II – decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa de pedir;
- III – constatar a omissão no exame de um dos pedidos, hipótese em que poderá julgá-lo;
- IV – decretar a nulidade de sentença por falta de fundamentação.
§ 4o Quando reformar sentença que reconheça a decadência ou a prescrição, o tribunal, se possível, julgará o mérito, examinando as demais questões, sem determinar o retorno do processo ao juízo de primeiro grau.
§ 5o O capítulo da sentença que confirma, concede ou revoga a tutela provisória é impugnável na apelação.
Art. 1.014. As questões de fato não propostas no juízo inferior poderão ser suscitadas na apelação, se a parte provar que deixou de fazê-lo por motivo de força maior.
Comentários dos artigos 1012 a 1014
O recurso de apelação, de forma geral, tem efeito suspensivo, o que impede a execução imediata da sentença enquanto o recurso estiver em trâmite. No entanto, o Novo Código de Processo Civil (NCPC) trouxe algumas exceções, permitindo a execução provisória em certos casos específicos, apesar do efeito suspensivo. O princípio geral estabelecido no artigo 995 do NCPC é de que “os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão judicial em sentido contrário”.
Existem situações em que a apelação não possui efeito suspensivo, e essas exceções estão listadas no parágrafo 1º do artigo 1.012 do NCPC. Nessas situações, o legislador não se baseou no tipo de processo, procedimento ou no meio de prova para definir a supressão do efeito suspensivo, mas, sim, no objeto do processo. Com isso, foi atribuída maior necessidade de eficácia imediata em determinadas circunstâncias. A primeira dessas hipóteses é quando a sentença homologa a divisão ou demarcação de terras, um procedimento especial destinado a obrigar condôminos a dividir a propriedade comum ou a definir limites de propriedades vizinhas. Esse procedimento ocorre em duas fases complementares, e a apelação terá apenas efeito devolutivo na sentença de homologação da divisão ou demarcação.
Outra hipótese é quando a sentença condena a prestar alimentos. Nesses casos, a apelação não suspende os efeitos da sentença, permitindo a execução provisória. Há controvérsias sobre se essa regra se aplica também a sentenças que majoram ou reduzem o valor da pensão alimentícia, com a maior parte da doutrina entendendo que a apelação possui apenas efeito devolutivo nesses casos. Alguns autores argumentam que a sentença que majora ou reduz o valor da pensão não é condenatória, mas constitutiva, e, portanto, deveria ter efeito suspensivo.
Além disso, a apelação não terá efeito suspensivo em casos de sentença que extingue sem resolução do mérito ou que julga improcedentes embargos à execução de título extrajudicial, já que a oposição dos embargos, em regra, não suspende a execução. Outra exceção é a sentença que determina a instituição de arbitragem; nesse caso, a apelação também não possui efeito suspensivo, permitindo a continuidade do processo arbitral.
Para as sentenças que confirmam, concedem ou revogam tutela provisória, a apelação tem efeito meramente devolutivo. No contexto do CPC de 1973, o entendimento predominante já era de que o efeito suspensivo da apelação não restauraria a tutela antecipada previamente concedida. Isso reafirma a prioridade do julgamento de mérito da sentença sobre a decisão liminar. No caso de sentença que confirma, concede ou revoga tutela provisória, o NCPC mantém a interpretação já consolidada sob o CPC de 1973, de que o recurso de apelação não suspende os efeitos dessa decisão.
A apelação também não possui efeito suspensivo em sentenças que decretam a interdição. Outras situações onde o efeito suspensivo é excluído pela legislação incluem ações de despejo e revisional de aluguel, bem como a concessão de assistência judiciária gratuita e mandados de segurança. Nessas circunstâncias, após a publicação da sentença, o apelado pode promover o cumprimento provisório, conforme o parágrafo 2º do artigo 1.012.
Nos casos excepcionais em que a apelação não possui efeito suspensivo, o apelante pode solicitar ao tribunal a concessão desse efeito, demonstrando probabilidade de provimento do recurso ou, se relevante a fundamentação, risco de dano grave ou de difícil reparação. Esse pedido é feito diretamente ao tribunal, que tem exclusividade para decidir sobre a concessão do efeito suspensivo, enquanto a apelação é interposta ao juízo de primeiro grau.
O efeito devolutivo da apelação, por sua vez, consiste em devolver ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada no recurso. O artigo 1.013 regula a extensão desse efeito, limitando-o à matéria impugnada e proibindo o julgamento de questões não abrangidas pelo recurso. Assim, o tribunal só pode julgar o que foi efetivamente impugnado pelo recorrente, respeitando os limites do pedido, em linha com os princípios de congruência e dispositivo. O recorrente é quem define a extensão do efeito devolutivo, e o tribunal não pode ultrapassar o que foi devolvido para análise.
No plano da profundidade, o tribunal deve analisar não apenas as questões decididas, mas também aquelas que poderiam ter sido abordadas na sentença, inclusive as passíveis de apreciação de ofício. Dessa forma, mesmo que o apelante tenha solicitado apenas a reforma parcial do julgamento, o tribunal pode examinar toda a matéria e os fundamentos relacionados à extensão definida pelo recorrente.
Quando o processo está em condições de imediato julgamento, o tribunal pode decidir o mérito sem devolver o processo à primeira instância. Essas situações incluem a reforma de sentença terminativa, nulidade da sentença por ausência de fundamentação, e omissão no julgamento de pedidos. Em qualquer dessas hipóteses, o tribunal deve comunicar às partes sua intenção de aplicar a regra, assegurando o princípio do contraditório.
Por fim, o artigo 1.013, parágrafo 5º, encerra a controvérsia sobre o recurso cabível para atacar o capítulo da sentença que confirma, concede ou revoga a tutela antecipada. Em consonância com o princípio da unirrecorribilidade, o capítulo da sentença que trata da tutela provisória deve ser impugnado via apelação, sem possibilidade de fragmentação da sentença para fins de recurso.
As questões de fato não suscitadas em primeira instância, em regra, não podem ser examinadas em apelação, salvo em situações excepcionais previstas no artigo 1.014, como casos de força maior. Em tais situações, a parte pode apresentar novos documentos relativos exclusivamente aos fatos novos.