Capítulo I – Da Jurisdição e da Ação (art. 16 ao art. 20 do Novo CPC)

Título I – Da Jurisdição e da Ação (art. 16 ao art. 20 do Novo CPC)

Art. 16. A jurisdição civil é exercida pelos juízes e pelos tribunais em todo o  território nacional, conforme as disposições deste Código. 

Art. 17. Para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade. Art. 18. Ninguém poderá pleitear direito alheio em nome próprio, salvo  quando autorizado pelo ordenamento jurídico. 

Parágrafo único. Havendo substituição processual, o substituído poderá intervir como assistente litisconsorcial. 

Art. 19. O interesse do autor pode limitar-se à declaração: 

I – da existência, da inexistência ou do modo de ser de uma relação jurídica; II – da autenticidade ou da falsidade de documento. 

Art. 20. É admissível a ação meramente declaratória, ainda que tenha ocorri do a violação do direito.

Comentários dos artigos 16 ao 20

Artigo 16:

  1. Ao afirmar que a jurisdição civil será “exercida pelos juízes em todo o território nacional”, o Código de Processo Civil pouco contribui para o entendimento mais profundo do conceito de jurisdição. Esse é um dos temas mais relevantes do processo civil, amplamente discutido por estudiosos como Giuseppe Chiovenda, Enrico Allorio e Francesco Carnelutti, que influenciaram o conceito de jurisdição adotado pelo antigo Código Buzaid. O entendimento anterior via a jurisdição como uma atividade substitutiva do juiz, cujo objetivo era encerrar um litígio com força de coisa julgada, de acordo com a lei.
  2. O conceito de jurisdição não é pacífico. O consenso entre os doutrinadores é que a jurisdição só pode ser compreendida a partir da análise do tipo de Estado em que se insere (liberal, social, etc.).
  3. No Brasil, com a dignidade da pessoa humana como pilar estruturante, o Estado assumiu o compromisso de garantir os direitos fundamentais, tanto no âmbito do direito material quanto no direito processual. Mais do que apenas aplicar a lei, busca-se, através da jurisdição, alcançar uma sentença justa, comprometida com a justiça material e compatível com os princípios constitucionais.
  4. Outras características importantes da jurisdição incluem a estatalidade, a imparcialidade e a irrevisibilidade externa. A jurisdição só pode ser exercida por uma autoridade estatal, sendo o Estado-Juiz a única autoridade competente para realizá-la. Além disso, o Estado-Juiz deve agir de forma imparcial, e suas decisões não podem ser revistas por outros poderes.
  5. A função jurisdicional tem como objetivo a realização do direito, e não apenas a aplicação da lei. A jurisdição não se limita à resolução de conflitos de maneira ideal, mas busca concretizar os direitos fundamentais garantidos pela Constituição.
  6. No Brasil, a jurisdição tem o papel de concretizar as posições jurídicas mínimas, especialmente os direitos fundamentais.
  7. A jurisdição deve ser entendida como uma função estatal destinada a resolver conflitos, como um poder estatal que prevalece sobre a vontade das partes, e como um mecanismo para garantir os direitos fundamentais, sempre respeitando as prescrições constitucionais.
  8. A jurisdição civil pode ser contenciosa, quando há um conflito de interesses entre as partes, ou voluntária, quando não há conflito.

Artigo 17:

  1. O artigo 17 está fortemente relacionado à teoria da ação adotada pelo sistema processual. Segundo doutrinadores como Salvatore Satta e Carmine Punzi, esse é um dos capítulos mais complexos da teoria jurídica.
  2. As teorias da ação são classificadas em monistas (que veem a ação como parte do direito material ou processual) e dualistas (que veem a ação nos dois planos jurídicos).
  3. Na teoria imanentista, representada por Piero Calamandrei, a ação é vista como uma reação à violação de um direito subjetivo. A ação seria um poder inerente ao direito subjetivo, que surge quando há uma violação.
  4. Na teoria concreta do direito de agir, a ação é entendida como um direito autônomo que permite ao indivíduo exigir do Estado uma proteção jurídica, independentemente do direito material em questão.
  5. Na teoria abstrata, a ação é vista como um direito de crédito contra o Estado, que existe independentemente de o autor ter ou não razão no mérito do caso.
  6. A teoria eclética, desenvolvida por Enrico Tullio Liebman, aproxima as teorias concreta e abstrata, afirmando que a ação é um direito processual subjetivo, e seu exercício depende da superação de certas condições, como a legitimidade, o interesse de agir e a possibilidade jurídica do pedido.
  7. Na teoria dualista, há uma distinção clara entre o direito subjetivo, a pretensão e a ação, que são vistos como elementos distintos. A ação processual surge quando o titular do direito busca sua satisfação perante o Estado, criando uma relação jurídica processual.

Artigo 18:

  1. Legitimação ordinária: Como regra, no processo civil individual, as pessoas devem buscar a tutela jurisdicional em nome próprio e para benefício próprio, salvo exceções expressamente previstas em lei.
  2. Legitimação extraordinária: Em casos de substituição processual, alguém pode pleitear em nome próprio, mas em benefício de outrem, desde que haja autorização legal para isso.
  3. No processo coletivo, a tutela dos direitos individuais homogêneos não pode ser proposta por qualquer cidadão, mas apenas por entes legitimados, que atuam como substitutos processuais dos verdadeiros beneficiários.

Artigo 19:

  1. As ações são tradicionalmente classificadas de acordo com a eficácia preponderante da tutela jurisdicional solicitada. A teoria quinária reconhece cinco tipos de ações: declaratória, constitutiva, condenatória, mandamental e executiva lato sensu. Já a teoria ternária reduz essa classificação a três: declaratória, constitutiva e condenatória.
  2. Nas ações meramente declaratórias, o objetivo é que o juiz declare a existência ou inexistência de uma relação jurídica ou determine a autenticidade ou falsidade de um documento. A sentença, nesse caso, é autosatisfativa.

Artigo 20:

  1. O Código de Processo Civil permite que o interesse do demandante se limite à obtenção de uma tutela meramente declaratória, sem a necessidade de comprovar a violação de um direito. A ação pode ser apenas para a declaração de uma situação jurídica.
 

Referências

NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 9 ed. Salvador: Ed. Juspodivm, 2017, p. 59.

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