[MODELO] Agravo de Instrumento – Indeferimento da Internação Provisória de Adolescente Autor de Ato Infracional
Agravo de Instrumento contra decisão que indeferiu pedido de internação provisória a Adolescente autor de Ato Infracional
Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia.
Recurso de Agravo por instrumento
Agravante – Ministério Público do Estado da Bahia
Agravado – Rodrigo Rodrigues da Cruz
Representação para aplicação de medida sócio-educativa nº 001/03
Comarca de Teofilândia – Ba
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA, através de seu representante legal em exercício na comarca, nos autos da representação para aplicação de medida sócio educativa ao adolescente infrator acima epigrafado, vem, tempestivamente, à presença de V. Exa., inconformado com a decisão de fls., propor o presente recurso de AGRAVO POR INSTRUMENTO, nos termos dos arts. 522 e seguintes do Código de Processo Civil, requerendo, após o cumprimento das formalidades legais, seja o presente encaminhado, juntamente com as anexas razões para uma das Colendas Câmaras do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado da Bahia.
Em cumprimento ao quanto disposto no inciso III do art. 524 do CPC informa o nome e o endereço do advogado do agravado:
– BRUNO DE MEIRELES GUERRA, Defensor Público titular da comarca de Serrinha e substituto da comarca de Teofilândia, com endereço no Fórum Luis Viana Filho, situado na rua Macário Ferreira, 517, Centro, Serrinha – BA., CEP 48.700-000.
Nestes termos
Pede deferimento.
De Teofilândia para Salvador
Em 06 de junho de 2003.
Audo da Silva Rodrigues
Promotor de Justiça
Documentos que acompanham o presente recurso
1. Certidão da intimação da decisão guerreada
2. Decisão guerreada
3. Cópia da petição inicial da representação para aplicação da medida sócio educativa ao adolescente infrator
AGRAVO POR INSTRUMENTO
Representação para aplicação de medida sócio educativa nº 001/2003
Autor/agravante – Ministério Público do Estado da Bahia
Representado/agravado – Rodrigo Rodrigues da Cruz
“Estabelecer em lei apenas punição aos crimes e esquecer as medidas de ressocialização não vai diminuir a violência. O controle do delito se faz através de um conjunto de atividades de caráter pedagógico, impostas coercitivamente pelo ECA que reorganizem a vida do jovem infrator de maneira que ele possa perceber a importância do respeito ao bem comum”.(Mário Volpi, Oficial dos projetos da UNICEF)
RAZÕES DO AGRAVO
Egrégio Tribunal;
Colenda Câmara;
Ínclitos Desembargadores:
1. Dos fatos.
Em 01 de junho de 2003, após recebimento de auto de apreensão em flagrante e demais documentos, o representante do Ministério Público em exercício na comarca ingressou com representação para aplicação de medida sócio-educativa em face do adolescente infrator/agravado, requerendo, nos termos do arts. 108 e 184 do Estatuto da Criança e Adolescente, a internação provisória, pelas razões expostas na cota de apresentação em anexo, por ter ele praticado o ato infracional descrito no art. 157, § 3º c/c art. 14, II, todos do Código Penal.
Consoante consta no auto de apreensão em flagrante do adolescente infrator/agravado e relatado pelo próprio adolescente quando da sua oitiva pelo Ministério Público, nos termos do art. 179 do ECA, no dia 31 de maio do corrente ano, em companhia de um maior de idade conhecido como “Fá”, saíram do município vizinho de Araci com destino à feira livre do município de Teofilândia.
Após passar todo o dia na feira livre, por volta das 18:00 hs o agravado e “Fá” resolveram voltar para Araci, quando “Fá” perguntou ao gravado se queriam voltar para Araci de carro.
Ato contínuo, o adolescente infrator inquiriu se “Fá” sabia dirigir e como voltariam para casa, tendo “Fá” mostrado ao adolescente um revólver que trazia consigo na cintura.
Aceita a empreitada pelo adolescente/agravado, os dois avistaram um carro no qual estava a vítima Luciano Valverde de Araújo, tendo “Fá” sacado de uma arma e anunciado o assalto, passando a arma para o representado que, com o dedo no gatilho e apontado para a vítima, após esta ter investido contra o representado, deflagrou um tiro atingindo-o, não causando a sua morte por circunstâncias alheias à sua vontade.
Oferecida a representação, foi requerida a internação provisória do adolescente. Em primeiro lugar pela gravidade do ato infracional praticado com extrema violência à pessoa. Em segundo, dada a falta de informações de sua vida na comarca onde reside, e, em terceiro, pelo fato de ser residente no município de Simões Filho e ter praticado o ato infracional no município de Teofilândia.
Não obstante os argumentos despendidos no requerimento formulado, o M.M. Juízo “a quo”, equivocadamente, desprezando a gravidade do delito, a instabilidade e repercussão social, a preservação do próprio adolescente, e o fato de não residir no município de Teofilândia, resolveu indeferir o pedido de internação provisória formulado pelo agravante nos seguintes termos:
“Decido: Embora haja de fato nos autos indícios suficientes de autoria e de materialidade do ato infracional, faltam os indispensáveis antecedentes do adolescente infrator, não havendo demonstração liminar de sua periculosidade a gravidade do delito em tela, por si só não é suficiente para a imposição da medida extrema requerida ab-initio pelo Ministério Público, considerando-se, especialmente o modo como atuou o menor para o cometimento do ato infracional. De modo que indefiro por hora a internação provisória do adolescente Rodrigo Rodrigues da Cruz.”
Além da precária fundamentação para o indeferimento da medida extremamente necessária, a decisão guerreada é contraditória em alguns pontos e despreza totalmente a ação e o resultado da conduta praticada pelo adolescente infrator.
Inicialmente reconhece que “haja de fato nos autos indícios suficientes de autoria e de materialidade do ato infracional” e reconhece como “indispensáveis” os antecedentes do adolescente infrator. Infelizmente, para o Juiz “a quo” mesmo reconhecendo a gravidade do delito, o adolescente não pode ser periculoso, muito embora tenha confessado os detalhes do ato. Por fim, ao contrário do quanto aduzindo pelo M.M. Juízo “a quo”, a medida não é “extrema”, consoante adiante será demonstrado.
Admitir como plausíveis os argumentos defendidos pela autoridade judiciária para indeferir o pedido formulado é querer fazer crer que um indivíduo que comete ato infracional de tamanha gravidade, como arma em punho e ainda deflagra um tiro atingindo a vítima não tem a personalidade voltada para a delinqüência. Ledo engano! Que não é marginal, nunca foi ou nunca pensou em ser, jamais cometeria um ato dessa natureza.
2. Internação provisória – gravidade do ato infracional – presença dos requisitos elencados no art. 108 do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90)
As medidas sócio-educativas constantes no ECA, ao contrário de terem um caráter punitivo ao adolescente infrator, têm natureza educativa e principalmente a intenção de ressocializar o adolescente para um novo convívio na sociedade. É educar mais ainda, mostrar o lado penunbro da marginalidade e, sobretudo, tentar impedir que novos atos infracionais sejam praticados por esses adolescentes quando cumprida a medida imposta.
Para o adolescente autor de ato infracional a proposta é de que, no contexto da proteção integral, receba ele medidas sócio-educativas (não punitivas), tendentes a interferir no seu processo de desenvolvimento objetivando melhor compreensão da realidade e efetiva integração social.
Neste esteira de pensamento, casos há que, pela gravidade do ato praticado, pela repercussão e, sobretudo pela preservação do próprio adolescente infrator, seja determinado, até mesmo de ofício, a internação provisória do adolescente antes da sentença final no processo de representação para aplicação da medida sócio-educativa.
Assim é que a matéria vem regulada no art. 108 do ECA ao dispor que:
“art. 108 – A internação, antes da sentença, pode ser determinada pelo prazo máximo de quarenta e cinco dias.
Parágrafo único – A decisão deverá ser fundamentada e basear-se em indícios suficientes de autoria e materialidade, demonstrada a necessidade imperiosa da medida.”
Poder-se-ia até parecer uma antecipação da sentença que, sem sombra de dúvidas, aplicar-se-ia ao adolescente infrator a medida sócio-educativa de internação. Mas, os estabelecimentos adequados não constituem “prisões” para adolescentes. Ao contrário, representam verdadeiros instrumentos de educação e formação, com completa infra-estrutura para abrigar esses menores infratores.
A disciplina legal vem elencada no art. 123 do ECA, onde determina que:
“art. 123 – A internação deverá ser cumprida em entidade exclusiva para adolescentes, em local distinto daquele destinado ao abrigo, obedecida rigorosa separação por critérios de idade, compleição física e gravidade da infração.
Parágrafo único – Durante o período de internação, inclusive provisória, serão obrigatórias atividades pedagógicas”
Nesse mesmo sentido tem sido a posição dos nossos Tribunais acerca da matéria, senão vejamos os arestos abaixo transcritos:
“A medida sócio-educativa consistente na internação em estabelecimento de ensino do menor autor de infrações graves não tem como finalidade a punição deste, mas a sua proteção com vistas à sua recuperação”(TJSP – HC – Rel. Sabino Neto – RT 687/295)
“A medida sócio-educativa objetiva, precipuamente, reintegrar o menor infrator no convívio social, dando-lhe as direções e os limites aceitos pelos seus pares. A medida torna-se necessária até alcançar esse desiderato, e para o qual foi ditada pelo legislador. Desse modo, as medidas constritivas de liberdade visam suprir as deficiências do sistema social, buscando amparar essa parcela da sociedade – os menores infratores -, de modo a inseri-los num padrão normal de conduta social. E, num segundo plano, proteger a sociedade de suas investidas delituosas.”(TJSP – HC 26.300-0 – Rel. Yussef Cahali)
“Seria negacear a verdade e fechar os olhos à realidade não admitir que também os menores podem ser criminosos. Em casos que tais sua segregação se impõe não apenas como mera medida sócio-educativa, mas também e principalmente como proteção da própria comunidade em que vivem”(TJSP – Acv 19.845-0 – Rel. Ney Almada)
No caso dos autos, consoante se depreende dos depoimentos prestados pelo adolescente infrator, tinha ele perfeita ciência da atitude ilícita que praticou, como também a gravidade do ato de deflagrar um tiro e atingir a vítima e, se quisesse desistir do ato, podia fazer perfeitamente.
Não é crível a justificativa de ter sido levado a praticar o ato pela pressão do adulto, seu comparsa. Isto porque, pela violência apreendida, quem não tem ou nunca teve uma mentalidade voltada para a delinqüência JAMAIS aceitaria um suposto “convite” para a prática do ato infracional de tamanha gravidade.
A decisão guerreada que indeferiu o pedido de internação provisória do adolescente pecou em achar que, pela sua situação de menoridade (dezessete anos), a internação provisória poderia influenciá-lo à prática de mais atos infracionais, bem como seriam os antecedentes indispensáveis para a o deferimento da medida. Nesse ponto merece salientar que o tiro poderia ter atingido uma parte vital, poderia ter matado um pai de família, um trabalhador… enfim, um ato violento, brutal e pensado, que merece uma resposta estatal.
A internação, como sustentado e demonstrado anteriormente, tem caráter educativo, e não punitivo, além do fato de preservar o próprio adolescente. Prova disso é que no momento da apreensão em flagrante, vários populares tentaram linchar o adolescente sendo produzidas várias lesões.
Essa situação vivida no município de Teofilândia não é singular num país onde a onda de violência tem crescido a cada dia que passa. A prática de atos ilícitos transcendem, cada vez mais, as fronteiras da idade limite de 18 anos e os adultos têm se utilizado freqüentemente de adolescentes para as mais diversas práticas delitivas. Some-se a isso o sentimento de impunidade e a certeza de cumprimento da medida sócio-educativa imposta pelo prazo máximo de 03 anos.
É essa emoção, esse clamor público, esse sentimento de impunidade que a sociedade sente que também deve ser levado em conta. Não para punir antecipadamente o adolescente, mas tão somente para fazer cumprir as regras do Estatuto nem que para isso tenha que se educar o adolescente segregando-o. Infelizmente, onde falta vontade própria é preciso que o Judiciário faça cumprir a lei impondo ao adolescente uma espécie de “educação forçada!”.
Não se tem a mínima dúvida da gravidade do fato, da repercussão social e da violência do ato. Na decisão guerreada observa-se, única e exclusivamente a situação do menor. E a vítima? E toda a sociedade? A decisão, por mais que se deva ter em consideração a proteção integral do adolescente em situação de risco, também tem de levar os fatores externos, os quais, no presente caso, autorizam a internação provisória do adolescente.
Sobre a matéria da internação provisória de adolescentes infratores que cometem atos infracionais desse naipe, essa tem sido a posição dos nossos Tribunais:
“HABEAS CORPUS – ATO INFRACIONAL – REPRESENTAÇÃO – INTERNAÇÃO PROVISÓRIA – ADMISSIBILIDADE SE SE TRATA DE ATO INFRACIONAL COMETIDO MEDIANTE USO DE VIOLÊNCIA À PESSOA – ADOLESCENTE POSSUIDOR DE ANTERIOR PRISÃO POR PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO – NECESSIDADE DA MEDIDA DA INTERNAÇÃO – ORDEM DENEGADA – Tratando-se de ato infracional cometido mediante uso de violência à pessoa, impõe-se a medida de internação provisória do adolescente, ainda mais se se trata de adolescente de alta periculosidade, possuindo outra prisão por ato infracional, devendo a ordem ser denegada.” (TJMS – HC 2012.009911-2 – 2ª T.Crim. – Rel. Des. Rubens Bergonzi Bossay – J. 13.11.2012)
“HABEAS CORPUS – ADOLESCENTE – INTERNAÇÃO PROVISÓRIA – MANUTENÇÃO – Presentes os requisitos elencados nos artigos 108, parágrafo único e 174, ambos do ECA, mantém-se a internação provisória do paciente, uma vez demonstrada a sua necessidade imperiosa ante a extrema gravidade do ato infracional (art. 157,§2º, I e II, do CP). Ordem denegada.” (TJRS – HCO 70004224192 – 8ª C.Cív. – Rel. Des. José Ataídes Siqueira Trindade – J. 25.04.2012)
“HABEAS CORPUS – Ato infracional análogo ao delito de homicídio qualificado. Apreensão em flagrante. Vícios no auto lavrado. Irrelevância. Internação provisória decretada. Necessidade da medida devidamente demonstrada. Ordem denegada.” (TJMG – HC 000.289.987-0/00 – C.Esp.Fér. – Rel. Des. Herculano Rodrigues – J. 18.07.2012)
“PROCESSUAL PENAL – HABEAS CORPUS – ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – APURAÇÃO DE ATO INFRACIONAL, AINDA QUE EQUIPARADO A ESTUPRO OU A ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR – AÇÃO PÚBLICA INCONDICIONADA – DESNECESSIDADE DA REPRESENTAÇÃO DO OFENDIDO COMO CONDIÇÃO DE PROCEDIBILIDADE – PRESENÇA DOS REQUISITOS EXIGIDOS NO ART. 108, DO ECA – MANUTENÇÃO DA MEDIDA DE INTERNAÇÃO PROVISÓRIA – 1) Considerando que a ação sócio-educativa, mesmo tratando-se de ato infracional correspondente a estupro ou a atentado violento ao pudor, é pública incondicionada, a representação do ofendido não constitui condição de procedibilidade para o recebimento da representação ofertada pelo Ministério Público – 2) Ex vi do verbete do art. 108, do estatuto menoril, impõe-se a internação provisória de um menor inimputável quando, havendo indícios suficientes da autoria e prova da materialidade do ato infracional, a necessidade da medida se mostrar imperiosa. (TJAP – HC 078302 – (4712) – Capital – S.Ún. – Rel. Des. Mário Gurtyev – DJAP 27.03.2012)”
3. Do pedido principal.
Ante o exposto, requer o Ministério Público:
a) seja intimado o agravado, pessoalmente, na pessoa do Defensor Público indicado, para, querendo, responder aos termos do presente recurso, no prazo legal;
b) que seja recebido e ao final provido o presente recurso de agravo de instrumento, para, DETERMINAR A INTERNAÇÃO PROVISÓRIA DO ADOLESCENTE INFRATOR RODRIGO RODRIGUES DA CRUZ, nos termos do art. 108 e 184 do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Nestes termos
Pede deferimento.